Discurso durante a 136ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexões sobre a comemoração em 15 de agosto da adesão do Pará à independência do Brasil, ocorrida em 15 de agosto de 1823.

Autor
Ana Júlia Carepa (PT - Partido dos Trabalhadores/PA)
Nome completo: Ana Júlia de Vasconcelos Carepa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Reflexões sobre a comemoração em 15 de agosto da adesão do Pará à independência do Brasil, ocorrida em 15 de agosto de 1823.
Publicação
Publicação no DSF de 18/08/2005 - Página 28216
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, DATA, HISTORIA, ESTADO DO PARA (PA), ADESÃO, INDEPENDENCIA, BRASIL, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, REVOLUÇÃO, OPOSIÇÃO, DOMINIO, PAIS ESTRANGEIRO, PORTUGAL.
  • REGISTRO, VITIMA, ESTADO DO PARA (PA), HISTORIA, LUTA, JUSTIÇA SOCIAL, LIBERDADE, DIREITOS, TERRAS.

A SRª ANA JÚLIA CAREPA (Bloco/PT - PA. Sem apanhamento taquigráfico.) -

     “Da exploração da borracha à exploração dos minérios. Da chacina do brigue palhaço ao massacre dos sem-terra”

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho hoje a esta tribuna para relatar e homenagear fatos importantes e históricos do Estado do Pará. O mês de agosto é representado por momentos importantes do povo amazônida. Destaco, hoje, o momento histórico da ADESÃO DO PARÁ à independência do Brasil, adesão esta que se deu em 15 de agosto de 1823. É inegável a importância deste momento na história do Pará, ao romper com o governo imperial português.

Todavia, esta emancipação era esperada pela população como uma mudança real na vida das pessoas. Esse ato, infelizmente, na prática nada representou como mudança social e econômica para o povo que ali vivia, que ali vive. O povo continuou afastado das decisões políticas, o poder continuou concentrado nas mãos dos conservadores monárquicos, e perpetuou-se assim, no Brasil-Império, a exploração que já vinha ocorrendo no Brasil-Colônia. Sem dúvida, essa exclusão da cidadania motivou descontentamentos em várias províncias do Brasil e, por conseguinte, várias insurreições foram deflagradas. Em nosso estado, eclodiu o maior movimento popular revolucionário da América latina: A CABANAGEM.

O Pará, na época denominado Província do Grão Pará, compreendia hoje aos Estados do Pará e do Amazonas. Ali surgiu o movimento cabano que, conforme relatou o historiador paraense Carlos Roque, teve origem popular, integrado por políticos brasileiros insatisfeitos, por sem-terra que lutavam por terra, por índios e mestiços que nutriam insatisfação contra os dominadores portugueses - pois continuavam sendo obrigados a trabalhar como escravos nas roças, por negros escravos que já lutavam pela liberdade e por profissionais liberais que defendiam o nacionalismo.

Esses segmentos sociais questionavam o processo de alijamento que o governo imperial brasileiro continuava a estabelecer, reproduzindo as práticas do governo imperial português. Mudaram as instituições e nada mudou: a independência não repercutiu no dia-a-dia das pessoas. A política medíocre e excludente, centralizada no sudeste do país, era a prática. As regiões mais distantes continuavam subservientes às ordens imperialistas.

É importante frisar as marcas catastróficas que ficaram na história de nosso Estado. A Cabanagem resultou na morte de 30 mil amazônidas, quase 40% da população, à época, dentre os quais índios, negros e tapuios (indígenas não aldeados). As massas populares, insatisfeitas, recusavam obediência às políticas estabelecidas pelo governo central. Em vista de tal rebeldia, a Junta Provisória instalada, juntamente com um comandante inglês, aprisionou e asfixiou no porão de um navio 250 pessoas que se rebelaram contra as políticas governamentais. A grande rebelião tomou proporções surpreendentes, com a tomada do poder e a instalação de governos na Província do Grão Pará, finalizados em 1840.

Mesmo tendo sido derrotada, a rebelião teve como conseqüência um elevado número de mortes. Pela ousadia dos rebeldes, a Província obteve saldo positivo, com quebra do monopólio mercantil, a retirada do controle político por parte dos conservadores monárquicos e a quebra do sistema escravagista que ali existia.

A história que relatamos ocorreu há mais de 150 anos. Mas sem dúvida nos remete ao presente: os fatos, tristemente, corroboraram o fato de que as decisões ainda são tomadas a partir de um centro político; e as insatisfações, quando surgem no seio popular, são invariavelmente reprimidas com a barbárie, por meio de prisões, atrocidades e massacres. Há alguma lição a ser tirada desse processo? Se alguma há, é de que o espírito de luta do povo não tem se curvado diante das intimidações e das hostilidades.

O Estado do Pará tem dado sua contribuição à Nação, desde a extração da borracha - marcada na história como a “belle époque” -, passando pela extração do ouro em Serra Pelada, do manganês, do ferro, da bauxita, da exploração da madeira - que tem início com a abertura da Transamazônica-, e com o surgimento dos Grandes Projetos, dentre os quais o da exploração energética, com a instalação da UHE de Tucuruí.

Contudo, escolhas políticas sem planejamento e excludentes trouxeram conseqüências trágicas. Assim como ocorreu em 1823 a chacina dos caboclos paraenses dentro do navio brigue “Palhaço”, ocorreu na década de 80 a chacina dos garimpeiros na ponte sobre o Rio Tocantins em Marabá. E, em 1996, o massacre dos 19 sem-terra no município de El Dourado dos Carajás. Um século em que a sociedade é vitimada pela ação de dirigentes do Estado autoritários e que pouca importância dão aos seus representados.

Outros tantos ainda tombaram ao longo de décadas na luta por ideais, por liberdade e, acima de tudo, por um Estado justo. Hoje, destacamos e homenageamos, nesta data comemorativa do Estado do Pará, alguns desses nomes: a Freira Adelaide Molinari, assassinada em Curionópolis/Pa; os sindicalistas irmãos Canuto, Expedito de Souza e Bené Bandeira; o advogado Gabriel Pimenta e os Deputados Estaduais Paulo Fontelles e João Batista; Irmã Dorothy; todos vítimas do latifúndio que “incomodavam” o Poder por externarem suas idéias.

A comemoração do dia 15 de agosto no Estado do Pará merece que lembremos os que se foram lutando por justiça, liberdade, democracia e independência. Que possamos, ao honrar sua memória, lembrar que a luta continua e nosso compromisso com o futuro é o de buscar, sem descanso, aquilo que encantava nossos antepassados.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/08/2005 - Página 28216