Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro de matéria do jornalista Luiz Cláudio Cunha, publicada pela revista IstoÉ, a respeito de desvio de dinheiro público na administração da Empresa ITAIPU-Binacional.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA. ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • Registro de matéria do jornalista Luiz Cláudio Cunha, publicada pela revista IstoÉ, a respeito de desvio de dinheiro público na administração da Empresa ITAIPU-Binacional.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 07/02/2006 - Página 3253
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA. ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, ISTOE, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DESVIO, FUNDOS PUBLICOS, EMPRESA BINACIONAL, ITAIPU BINACIONAL (ITAIPU), IMPORTANCIA, GOVERNO BRASILEIRO, GOVERNO ESTRANGEIRO, PAIS ESTRANGEIRO, PARAGUAI, APURAÇÃO, FRAUDE.
  • NECESSIDADE, REVISÃO, ACORDO, PERIODO, REGIME MILITAR, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, PARAGUAI, IMPORTANCIA, INSTAURAÇÃO, DEMOCRACIA, MODELO, GESTÃO, ITAIPU BINACIONAL (ITAIPU).
  • COMENTARIO, NOCIVIDADE, EFEITO, PRIVILEGIO, REGIME JURIDICO, ADMINISTRAÇÃO, EMPRESA ESTATAL, EXCESSO, AUTORITARISMO, ARBITRARIEDADE, INDEPENDENCIA, FALTA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, AUSENCIA, OBRIGAÇÃO, PRESTAÇÃO DE CONTAS, IMPOSSIBILIDADE, FISCALIZAÇÃO, RECEITA FEDERAL, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), ISENÇÃO, TRIBUTOS.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Srs. Senadores, creio ser da maior importância registrar matéria publicada pela revista IstoÉ neste final de semana: “Itaipu, US$2 bilhões não-contabilizados. O ex-gerente revela como construiu e como funciona o caixa 2 da maior hidrelétrica do mundo”.

            É um chamamento. É uma convocação. O fato é conhecido há muito, mas creio que o momento é adequado para que as autoridades, tanto do Executivo como do Legislativo, adotem as medidas necessárias para mudar o modelo de gerenciamento da binacional Itaipu.

Para resumir, leio o editorial subscrito pelo editor-chefe da revista IstoÉ, Mário Simas Filho:

Resquícios da ditadura

A reportagem de capa desta edição de ISTOÉ mostra com clareza ímpar o quanto a democracia precisa avançar na maior hidrelétrica do mundo. Os desmandos que ocorrem na binacional Itaipu - dona de um caixa 2 estimado em US$ 2 bilhões - precisam ser contidos e esse é um desafio que cabe aos governos do Brasil e do Paraguai enfrentar. Concebida sob a tutela de regimes militares instalados nos dois países, a Itaipu não segue as leis brasileiras nem paraguaias. Vive sob um regime jurídico próprio, que, como mostra a reportagem, demonstra vulnerabilidade e propicia o bilionário esquema de desvio do dinheiro público. Não é aceitável que em plena democracia empresas estatais não possam ser fiscalizadas por organismos como a Receita Federal e o Tribunal de Contas. O arcabouço jurídico montado pelos militares para gerir a hidrelétrica precisa ser corrigido. Assim como devem ser investigados e responsabilizados, sob os rigores das leis brasileiras e paraguaias, aqueles que se valeram dos artifícios da ditadura para privatizar os recursos públicos. O papel que cabe a esta revista continuará a ser feito. Afinal, como ensina Norberto Bobbio (1909-2004), o filósofo político italiano, uma das tarefas da democracia moderna é promover a transparência nas áreas onde antes reinava o secreto. Ou seja, quanto mais as instituições tradicionalmente fechadas, como tribunais, forças armadas e empresas públicas, se tornarem transparentes, mais a democracia avança e se consolida.

Queremos cumprimentar a revista IstoÉ, especialmente o jornalista Luiz Cláudio Cunha, pelo brilhantismo dessa matéria exclusiva da revista IstoÉ. Usando a expressão “Estado paralelo”, mostra que a binacional Itaipu está desobrigada de prestar contas a qualquer instituição pública. O Tribunal de Contas da União a ela não tem acesso; o Supremo Tribunal Federal também não pode ultrapassar o concreto da binacional Itaipu para chegar até a caixa-preta de mistérios ainda não revelados; o Congresso Nacional não possui nenhum poder de fiscalizá-la. Se nós desejarmos aqui fazer um pedido de informações a respeito de denúncias que eventualmente possam ser veiculadas pela imprensa do País, não saberemos a quem recorrer, não teremos a quem indagar. Ou seja, a binacional Itaipu possui blindagem completa e absoluta, ela está acima do bem e do mal, é intocável.

O apelo que fazemos da tribuna no dia de hoje é o mesmo apelo que faz o presidente do Tribunal de Contas da União: para que se reveja o acordo celebrado entre o Brasil e o Paraguai, no ano de 1973, pelos generais Médici, pelo Brasil, e Alfredo Stroessner, pelo Paraguai.

            A blindagem é perfeita, diz a revista neste comentário:

            Além de maravilha da engenharia, Itaipu é uma jóia da arquitetura jurídica. Brasileiros e paraguaios inventaram uma estatal única no mundo, isenta de tributos e imune a controles. No tratado firmado em 1973 entre os generais Stroessner e Médici, acertou-se que a binacional seria uma “pessoa emergente no campo do direito internacional público”, sobre a qual “não se aplicam as normas de direito interno, constitucionais ou administrativas”, conforme parecer de 1978 do consultor-geral da República, Luiz Rafael Mayer. Itaipu, que prevê faturar US$ 2,6 bilhões em 2006, não padece dos encargos que afligem outras empresas, privadas ou públicas: taxas, impostos, empréstimos compulsórios, nada é cobrado da binacional, privilégio que se estende aos seus fornecedores. Nem a Receita Federal chega lá: uma tentativa de cobrar PIS-Pasep de Itaipu trombou na consultoria em 1990. Os controles interno e externo, na visão do jurista Bandeira de Mello, são feitos pelo Conselho de Administração e pela Eletrobrás - e ninguém mais. Nem o Supremo mete o bedelho ali: “Não cabe ao STF avaliar se os tratados são bons ou ruins para o País”, esquivou-se o presidente Nelson Jobim há um ano. A idéia parece tão boa que o Brasil quer repetir a dose: negocia com a Ucrânia um monstrengo parecido em Alcântara, Maranhão, para fazer ali uma nova base espacial - e binacional, é claro.

            Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é preciso rever esse acordo.

            Os dirigentes de Itaipu têm salários de marajás. Os salários da binacional Itaipu extrapolam os limites da política salarial do nosso País. E Itaipu, com essa blindagem, como diz a revista, “criou uma moeda própria, a Unidade de Correção Monetária (UCM), uma nota fiscal exclusiva, chamada Nota de Débito, e um dólar contábil com cotação autônoma”.

Ora, Sr. Presidente, é incrível que, nos tempos modernos em que vivemos, no Estado de Direito Democrático, admita-se a vigência de arcabouço jurídico que, realmente, só tem sentido em um regime autoritário, em um regime ditatorial.

Os paraguaios também demonstram indignação, como diz o Senador paraguaio, Armando Espínola, líder do oposicionista Partido Liberal Radical Autêntico.

            Estes recursos se distribuem pelo país sem nenhum controle. Temos todo o direito de suspeitar que se utilize o dinheiro para campanhas políticas ou corrupção. O Congresso mandou seis pedidos de informações sobre Itaipu ao Executivo e nunca recebeu uma resposta, lamenta [o Senador do Paraguai].

Evidentemente, não cabe nem mesmo ao Executivo daquele país responder a essas questões.

Enfim, somente um novo acordo, um entendimento do Governo brasileiro com o Governo paraguaio para estabelecer um novo modelo de gerenciamento para a binacional Itaipu, uma empresa que fatura US$2,6 bilhões por ano sem nenhuma forma de fiscalização e controle.

Portanto, Sr. Presidente, o problema está posto pela competente revista IstoÉ, e nós esperamos providências tanto do Governo brasileiro quanto do Governo paraguaio.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Alvaro Dias, gostaria apenas de assinalar que considero importante essa informação dada pela revista IstoÉ, mas notei que se trata de um procedimento que ocorre desde quando foi realizado o tratado entre os dois Governos, o do Brasil e o do Paraguai. Em verdade, essa dificuldade de informação sobre o que se passa com a Itaipu binacional já vem de inúmeros governos. Então, trata-se de uma questão a ser verificada não apenas no Governo presente, mas nos Governos que o precederam.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Sem dúvida, o aparte de V. Exª apenas traduz aquilo que é a realidade. Não é um fato novo. É um fato anterior ao atual Governo, mas esse modelo foi preservado neste Governo.

Evidentemente, esse caixa 2 não existe desde a inauguração de Itaipu. É algo mais recente. O seu criador é o Sr. Laércio Pedroso*, o ex-gerente financeiro. Ele mostra, nessa revista, como construiu esse sistema e como funciona o chamado caixa 2 na maior hidrelétrica do mundo. Portanto, parece-me que essa prática foi inaugurada na Década de 90.

Sem fazer referência àqueles que passaram pela empresa e àqueles que a dirigem nos dias de hoje, estamos apenas convocando os dois Governos, do Paraguai e do Brasil, à responsabilidade, para alterar o arcabouço jurídico que estabelece esse modelo, que só se justificaria no regime autoritário.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/02/2006 - Página 3253