Discurso durante a 56ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com as cenas de violência no sul do Estado do Pará, patrocinadas por integrantes do MST contra produtores rurais. Questionamento sobre o acúmulo de mandados de reintegração de posse sem o devido cumprimento, por parte da Governadora do Estado do Pará.

Autor
Kátia Abreu (DEM - Democratas/TO)
Nome completo: Kátia Regina de Abreu
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA. ESTADO DO PARA (PA), GOVERNO ESTADUAL.:
  • Preocupação com as cenas de violência no sul do Estado do Pará, patrocinadas por integrantes do MST contra produtores rurais. Questionamento sobre o acúmulo de mandados de reintegração de posse sem o devido cumprimento, por parte da Governadora do Estado do Pará.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Flexa Ribeiro, Gilberto Goellner, Jayme Campos, José Nery, Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 23/04/2009 - Página 12215
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA. ESTADO DO PARA (PA), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • COMENTARIO, NOTICIARIO, IMPRENSA, TELEJORNAL, GRAVIDADE, VIOLENCIA, CAMPO, ESTADO DO PARA (PA), CONFLITO, SEM-TERRA, PRODUTOR RURAL, CONTRADIÇÃO, SITUAÇÃO, BRASIL, EFICIENCIA, AGRICULTURA, PECUARIA, EXPORTAÇÃO, REGISTRO, DADOS, PARTICIPAÇÃO, PEQUENO PRODUTOR RURAL.
  • ANALISE, DADOS, SUPERIORIDADE, TERRAS, ESTADO DO PARA (PA), DISPONIBILIDADE, REFORMA AGRARIA.
  • QUALIDADE, PRESIDENTE, CONFEDERAÇÃO DA AGRICULTURA E PECUARIA DO BRASIL (CNA), PEDIDO, TRIBUNAL DE JUSTIÇA, PROCURADORIA GERAL DA REPUBLICA, INTERVENÇÃO FEDERAL, ESTADO DO PARA (PA), OBJETIVO, CUMPRIMENTO, GOVERNO ESTADUAL, REINTEGRAÇÃO DE POSSE, REPUDIO, ORADOR, NEGLIGENCIA, GOVERNADOR, INCENTIVO, ILEGALIDADE, INVASÃO, NECESSIDADE, RESPEITO, ESTADO DE DIREITO, REQUISITOS, DESENVOLVIMENTO AGRARIO.
  • SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE, SENADO, COBRANÇA, GOVERNADOR, ESTADO DO PARA (PA), CUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO, REPUDIO, ABANDONO, TRABALHADOR RURAL, FAVORECIMENTO, SEM-TERRA, QUESTIONAMENTO, RECEBIMENTO, RECURSOS, SETOR PUBLICO, APREENSÃO, CRESCIMENTO, VIOLENCIA.
  • DENUNCIA, PRECARIEDADE, INFRAESTRUTURA, ABANDONO, ASSENTAMENTO RURAL, REFORMA AGRARIA, NECESSIDADE, APOIO, PRODUÇÃO, EMPREGO, DEFESA, AGRICULTURA, EXPORTAÇÃO, CRIAÇÃO, RIQUEZAS, PAIS.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO. Pela Liderança. Sem revisão da oradora.) - Muito obrigada, meu Presidente. Suas palavras me reanimam e me estimulam muito. Muito obrigada.

Sr. Presidente, colegas Senadores e Senadoras, venho a esta tribuna hoje falar de um triste assunto que, com certeza, todos os senhores e senhoras acompanharam, no final de semana, especialmente domingo, na Rede Globo, no Fantástico, e que vem-se repetindo em todos os canais, nos demais canais de televisão do País: as cenas de bangue-bangue explícito no sul do Estado do Pará, em que vimos o enfrentamento - triste - do MST contra produtores. Tiros, brigas, ferimentos e, ainda, quase mortes. Cenas que são idênticas a filmes de bangue-bangue; que se nós mostrássemos em qualquer país do mundo, do primeiro mundo, jamais poderiam admitir e acreditar que aquelas cenas aconteceram no Brasil.

Entre os emergentes, o País mais promissor do mundo; um País que tem um agronegócio invejado nos quatro cantos do mundo; um País que tem a melhor eficiência, a melhor competitividade de seus produtores em comparação aos outros do mundo afora.

Sem sombra de dúvida, o agronegócio brasileiro é o campeão do mundo. Nós podemos nos orgulhar de que a produção agropecuária brasileira é a campeã. Nós conquistamos essa bandeira, nós conquistamos essa posição por meio de muito trabalho, de muita persistência, de muita dedicação dos produtores do País, de todos os tamanhos: pequenos, médios e grandes.

Este é um País que tem 850 milhões de hectares e cinco milhões de propriedades rurais espalhadas por esse território. Se nós somarmos os Estados Unidos, o Canadá, a Argentina e a Austrália, juntos, eles têm 2.700.000 propriedades rurais. Nós temos, sozinhos, 5 milhões de propriedades rurais, sendo que quatro milhões são compostas por pequenas propriedades rurais.

Mesmo os produtores rurais, representados pela CNA, que são um milhão e duzentos mil proprietários rurais, 56% dos proprietários que a CNA representa são pequenos produtores rurais espalhados por todo este País. Isso demonstra o quanto o nosso País tem hegemonia sua na divisão de terras.

Quero lembrar que o que assistimos ontem é incompatível com o agronegócio que alcançou o pódio da produção, da tecnologia e da produtividade; é incompatível com o tanto de terra que este País tem; é incompatível especialmente com o Estado do Pará, um Estado promissor, um Estado próspero, um Estado rico, que tem, Sr. Presidente, já desapropriados mais de 14 milhões de hectares, onde ainda não foram assentados trabalhadores; à disposição da reforma agrária. Famílias que estão esperando, com as terras disponíveis, e que ainda não conseguiram ser efetivadas.

Esta é a maravilha do nosso País, que tem terra para todo mundo, que tem espaço para todos nós, terra suficiente para assentar 200 mil famílias no Pará.

E nós ainda estamos assistindo àquela cena de terror em que produtores e MST se enfrentam como se morassem num País onde não houvesse democracia e onde não houvesse Estado de direito, onde não houvesse leis e onde não houvesse Constituição.

Sr. Presidente, estive, há quarenta dias, em Belém, no Pará, e protocolei, no Tribunal de Justiça daquele Estado, com muito pesar, com muita tristeza, um pedido de intervenção federal no Governo do Pará para o cumprimento das reintegrações de posse.

Acreditem se quiserem, são mais de mil invasões pelo Estado do Pará afora; são 350 pedidos de reintegração de posse; são 111 mandados já efetivados pelo Judiciário, e nada cumprido. E não existe a menor disposição do cumprimento desses mandados. Cento e onze! Depois de quarenta dias da minha ida como presidente da CNA ao Pará, nada aconteceu! Infelizmente, a Governadora Ana Júlia Carepa não se sensibilizou em respeitar a justiça. Em quarenta dias, nada foi feito. E, agora há pouco, saí da Procuradoria-Geral da República, tendo protocolado, junto ao Procurador-Geral, outro pedido de intervenção federal para que possamos contar com a justiça deste País.

Queremos apenas a legalidade. Os produtores, a Federação da Agricultura do Pará, a CNA, não estamos pedindo nada mais nada menos do que: atendam às ordens dos juízes do Pará. Isso não é um assunto novo. Isso é um assunto recorrente, não é uma novidade no Pará. Ao longo dos anos, estamos acompanhando os conflitos que são originários, não só do Pará, mas de outros Estados, mas mais fortemente lá, porque as reintegrações não são cumpridas, e isso motiva e estimula esses movimentos criminosos para que possam se estender e agravar, cada vez mais, como vimos ontem.

Nós gostaríamos, Sr. Presidente, - por isso digo, com tristeza, que protocolamos mais uma vez, hoje, um pedido de intervenção federal no Pará - de estar trabalhando como estamos nos outros Estados, no meu Estado Tocantins, no Estado de Goiás, em Mato Grosso do Sul, em Mato Grosso, para o qual me encaminho amanhã, da Senadora Serys, do Senador Jayme Campos, do Senador Gilberto Goellner. Já fomos a Minas Gerais, a São Paulo, para tratar do futuro, tratar do presente, tratar do desenvolvimento agropecuário do País.

Nós não gostaríamos de estar indo ao Pará para tratar de intervenção federal em Governo de ninguém. Mas, graças a Deus, nós somos legalistas e nós estamos usando todos os instrumentos que as leis e a Constituição nos permitem usar. É um direito que temos, porque não estamos conseguindo através do diálogo, da insistência, apesar de o Governo do Pará assistir, todos os dias, ao desespero de centenas de produtores que já perderam as suas terras há mais de dois, três anos, sem a menor esperança de resgate. Perderam todo o seu rebanho, viram suas casas destruídas, as suas cercas de arames derrubadas, as suas reservas legais todas destruídas e arrancada a madeira. E nada é feito naquele lugar.

Nós não podemos fechar os olhos e imaginar que é possível viver num Brasil de ilhas de prosperidade. Nós temos que ser um continente de prosperidade, de obediência civil, de respeito às leis e, principalmente, aos direitos humanos, que, no Pará, o Governo parece não conhecer. O Pará do Senador Flexa, do Senador Mário Couto, do Senador Nery e de tantos Deputados...

Nós gostaríamos de estar no Pará discutindo sobre a questão da aftosa, sobre o Código Florestal, sobre a Medida Provisória nº 458, que trata da titulação de terras em toda Região Norte, inclusive no meu Tocantins. Gostaríamos de estar discutindo, como em todos Estados da Região Norte. O Pará abriga 40% de todos os assentamentos do Brasil. Nós gostaríamos de estar discutindo sobre as proteções sociais que estão acontecendo nos assentamentos do Brasil, as emancipações desses produtores, que não são produtores, nem são agricultores familiares, porque não têm o documento da sua terra. Há 10, 15, 20 anos assentados e ainda não são donos daquilo que possuem, que são os assentamentos também.

Nós gostaríamos, Sr. Presidente, de discutir o avanço, a tecnologia, mas, infelizmente, nós temos que desperdiçar o nosso tempo. Desperdiçar, porque não seria necessária nenhuma ação da CNA, nenhuma ação de nenhuma instituição para exigir que a lei seja cumprida. No Estado democrático de direito, a lei é cumprida automaticamente, porque nós não podemos ter desprezo à Justiça, como estamos assistindo no Pará. Nós temos no Brasil um Estado de direito e a separação de Poderes e a Governadora se comporta como se fosse absolutista, como se ela fosse o Executivo, o Judiciário, o Legislativo, como se tudo ela pudesse. A separação de Poderes faz parte do regime democrático. A Justiça decide, o Executivo cumpre e o Legislativo faz as leis. Nós precisamos estar com isso em mente, ou nós vamos comprometer a democracia deste País. Não existe nada nem ninguém nem uma bandeira social que possa ser maior do que as leis de um país. Se não tem o efetivo para cumprir a reintegração de posse, se não tem dinheiro para cumprir a reintegração de posse, que se valha do seu Presidente, que é do seu Partido, porque tenho certeza absoluta de que o Ministério da Justiça daria um passo em favor de cumprir a lei. Mas se recusa e não responde à oferta do Executivo, que ainda ontem ofereceu a Força Federal para que a reintegração pudesse ser cumprida.

Silencia-se e, quando se silencia, ela despreza a Justiça, ela despreza seus produtores e trabalhadores de todos os tamanhos. Ela despreza quem produz alimentos em detrimento de quem produz violência. O Estado do Pará não tem problemas de terra. O Estado do Pará é um Estado grande em que cabem as pessoas que queiram trabalhar de verdade na terra, pessoas que são bem-vindas ao agronegócio brasileiro. Esse agronegócio que está interessado em distribuir conhecimento. Muito mais importante do que distribuir terra é distribuir conhecimento, é distribuir tecnologia, para que esses assentamentos possam tirar mais do pouco que têm, do tamanho diminuto das suas terras.

Queremos, Sr. Presidente, nada mais nada menos o cumprimento da Justiça, o cumprimento das leis e da Constituição. Queremos, Sr. Presidente, que os direitos da pessoa humana sejam respeitados, porque o Pará ofende, de forma deliberada, recorrente, o direito de propriedade e o direito à Justiça.

A tolerância, Sr. Presidente, chegou ao fim. Não há mais como os brasileiros se sentarem diante das televisões e assistirem a um filme de bangue-bangue da vida real. Queremos assistir a filmes de ficção, histórias de ficção que possam divertir as nossas famílias. O Brasil e a sociedade se rebelam contra aquilo a que estão assistindo.

Eu gostaria aqui, de público, de pedir ao Presidente Sarney que, em nome desta Casa, se dirija à Governadora Ana Júlia Carepa.

Esta Casa defende o Estado brasileiro. Não interessa qual Estado, não interessa se o Tocantins, se o Pará, se o Amapá, se o Rio Grande do Sul. Esta Casa tem compromisso com a legislação, tem compromisso com a Constituição, porque foi aqui dentro que ela foi votada.

Eu peço ao Presidente Sarney, que tem sido preciso nas suas ações, que se dirija à Governadora Ana Júlia Carepa no sentido de que ela cumpra a lei votada no Senado e na Câmara dos Deputados. O desrespeito não é só ao Judiciário. Ele inicia aqui, dentro desta Casa, porque fomos nós que aprovamos essas leis, que ela insisti em desobedecer. Ela insisti em comprometer o Estado de direito.

Eu gostaria que esta Casa se manifestasse, assim com o fez o Ministro Gilmar Mendes, Presidente do Supremo Tribunal Federal, que fez a sua parte e foi criticado por alguns por estar tomando partido. Eu acredito, sim, e concordo com eles. Gilmar Mendes tomou partido, sim. Ele tomou o partido da lei, tomou o partido da legalidade. Se ele tivesse se omitido, se ele tivesse silenciado, aí, sim, ele estaria sendo parcial; estaria do lado do crime, da violência e do esbulho possessório.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª me permite um aparte?

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Primeiro, eu gostaria de dar o aparte solicitado pelo Senador Gilberto Goellner. Por favor, Senador.

O Sr. Gilberto Goellner (DEM - MT) - Senadora Kátia Abreu, hoje pela manhã eu conversei com o Senador Flexa Ribeiro a respeito de todos esses acontecimentos que perduram no Estado de S. Exª. Há mais de 30 dias, temos notícia da falta de ação do Executivo daquele Estado, governado pela ex-Senadora Ana Júlia Carepa. Ela insiste em não realizar a reintegração de posse, que teria evitado todos esses confrontos. Senadora, vou propor à Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, da qual participamos, que faça uma comissão para ir até o Estado do Pará acompanhar todos esses acontecimentos, para que o Congresso tenha a oportunidade de avaliar toda a arbitrariedade que está havendo na Justiça em função do cumprimento das reintegrações de posse. Proponho a V. Exª que alguns membros da nossa Comissão de Agricultura e Reforma Agrária vão ao Pará para que tenhamos uma verdadeira avaliação e possamos contribuir para que esse grande número de reintegrações de posse a que V. Exª se referiu seja cumprido, porque é obrigação do Executivo cumpri-las. Muito obrigado.

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Muito obrigada, Senador Goellner. Concordo plenamente. Sua idéia é bastante feliz. Para complementar, acho que devemos formar uma comissão suprapartidária, com um membro de cada partido, para que possamos ir lá não contra partido “a” ou “b”, mas todos a favor da Constituição e das leis.

Concedo um aparte ao Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Prezada Senadora Kátia Abreu, acredito que é preciso compreendermos bem o problema. Também assisti às cenas que aconteceram em propriedade agrícola no Pará e avaliei que, de fato, conforme V. Exª mencionou, pareciam cenas de bangue-bangue. Certamente havia um grande conflito entre as partes. Assisti à entrevista do Secretário de Segurança, que informou que não dispunha, de pronto, de efetivos que pudessem estar ali presentes para evitar o que, infelizmente, aconteceu. Algumas pessoas foram feridas tanto do lado dos seguranças da propriedade, como também do lado dos trabalhadores sem terra, com ameaça aos jornalistas que cobriam o evento. Sem prejuízo da sugestão que o Senador Gilberto Goellner fez, avalio que, num caso como esse, seria interessante a Comissão de Agricultura convidar a Governadora Ana Júlia para aqui falar a respeito do assunto. Seria uma oportunidade para a Governadora - lembro que os Senadores do Pará, muitas vezes, têm criticado a Governadora aqui - falar com os ex-colegas dela, uma vez que ela foi Senadora pelo Estado do Pará, de maneira que tenhamos mais elementos e possamos avaliar todos os aspectos do problema. Nós sabemos perfeitamente que o Estado do Pará, infelizmente, vem sendo, de tempos em tempos, local de conflitos, tais como os havidos em Eldorado dos Carajás, em 11 de abril. Agora, mais uma vez, essa é colocada como uma data sempre de memória pelos trabalhadores do MST, porque avaliam que esse é um tempo de recordação, uma vez que, conforme o Senador José Nery, na semana passada, aqui recordou, não houve ainda conclusão do julgamento nem punição dos responsáveis pela morte de inúmeros trabalhadores em Eldorado dos Carajás. Também houve o episódio da morte da Irmã Dorothy, que foi uma grande tragédia, e agora houve esse problema. De maneira que eu aqui formulo essa sugestão. Quem sabe V. Exª possa, inclusive como membro da Comissão de Agricultura... Eu não sou membro, mas eu assinaria, com prazer, um requerimento nesse sentido. Avalio que, diante da gravidade dos fatos acontecidos e inclusive diante da iniciativa de V. Exª, para que tenha todos os elementos e para que possamos avaliar, mais adequadamente, o que aconteceu ali naquela propriedade, seria interessante podermos ouvir a Governadora Ana Júlia aqui no Senado Federal. É a sugestão que formulo.

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Senador Eduardo Suplicy, eu gostaria de dizer a V. Exª - nós já estamos convivendo há alguns dias aqui no Senado, embora por pouco tempo - que nunca evitei e nunca deixei de debater todos os temas que foram abordados nesta Casa, especialmente nas comissões. Eu apenas confesso a V. Exª que não dou, da minha parte, oportunidade a alguém que descumpre ordem judicial.

Ordem judicial não se discute. Eu tenho isso como princípio. Se eu dou oportunidade a alguém que descumpre ordem judicial de debater o tema, eu estou abrindo uma porta para a aceitação do abalo do Estado de direito.

Portanto, depois que a Governadora Ana Júlia Carepa cumprir as 111 reintegrações de posse, ela pode vir a esta Casa quantas vezes quiser, com a minha presença, que debateremos reforma agrária, como melhorar os assentamentos, como investir nos assentamentos para que eles possam ser inseridos no agronegócio, como terminar com os conflitos no Pará, como amenizar essa situação; estou pronta parceira, como Senadora e como Presidente da CNA, para debater com ela em todos os momentos. Mas se eu discutisse Estado de direito, cumprimento de reintegração de posse, eu estaria desrespeitando a Justiça do meu País. Eu estaria desrespeitando a Justiça do Pará, que determinou a devolução das terras, por parte da Governadora, por meio da Polícia Militar. E não tem nada no mundo que justifique uma violência. Uma violência não justifica a outra.

E o senhor me perdoe, mas eu não aceito o fato de Eldorado dos Carajás e também o fato da Irmã Dorothy servirem de justificativa para o que nós estamos vendo no sul do Pará.

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Concede-me um aparte, nobre Senadora?

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Um minutinho, Senador.

Muito pelo contrário, Eldorado dos Carajás e o caso Irmã Dorothy deviam servir de exemplo para que nós, mais uma vez, ficássemos atentos ao cumprimento das leis, da ordem, da tranquilidade. Porque o que nós precisamos, Senador Suplicy, é proteger os desprotegidos. São os desprotegidos que ficam vulneráveis ao comando de meia dúzia de militantes criminosos que invadem terra e praticam o esbulho possessório.

São pessoas desprotegidas, desempregadas e com fome que se transformam em massa de manobra para acompanhar meia dúzia, financiadas.

Eu quero aqui dizer a esta Casa que nada cai do céu. Se um trabalhador brasileiro quer comer, ele tem que trabalhar e ganhar o seu salário suado para comprar a sua comida. Esses líderes do MST que vivem e se mantêm vinte e quatro horas criando movimentos, movimentando-se de Norte a Sul deste País, vivendo em acampamentos, mobilizando gente, eles vivem do quê? Eu pergunto a esta Casa. Quem os mantêm? A caridade do bolso do contribuinte, através dos recursos repassados pelo Ministério da Reforma Agrária, ou eles estão recebendo doações de voluntários pelo Brasil afora? Eu quero saber onde estão comprando carros? Com que dinheiro estão comprando comida? Como é que sobrevivem esses líderes sem trabalhar? Alguém está financiando essa bandalheira, alguém está financiando o crime e a desordem neste País. E eu desconfio que é o contribuinte, eu desconfio que é aquele que paga mais imposto, que é o trabalhador, porque o imposto neste Pais está no consumo e não na produção e não na renda. Enquanto estiver no consumo, na comida, no café, no açúcar, no feijão, é o trabalhador mais pobre do País que está financiando os senhores líderes do MST para invadir e praticar filme de bangue-bangue para aparecer na televisão. Não há nenhuma violência que justifique a outra. Se nós arrumarmos uma desculpa para que isso possa estar acontecendo, a morte de uma freira ou as mortes em Eldorado dos Carajás, que tem toda a minha solidariedade e a minha contrariedade com relação àqueles dois episódios gravíssimos, mas não servem de desculpa para que a prática do crime possa se repetir como nós assistimos.

Eu não conheço nenhum país do mundo - e estão aí todos os livros dos maiores economistas do mundo -, não existe nenhum país do mundo, que cresceu fortalecido, verdadeiramente, que não tenha, em primeiríssimo lugar, fortalecido o direito de propriedade. Quando eu digo direito de propriedade, eu não falo apenas do pedaço de chão, mas da bicicleta, da casa, de tudo o que você possui, que você trabalhou, que você conseguiu. É através do direito de propriedade que vem o desejo do avanço, que vem o desejo do investimento, que vem o desejo do crescimento, porque você está investindo naquilo que você construiu, naquilo que você fez, naquilo que você trabalhou e comprou. E é através deste poderoso instrumento, que é o direito de propriedade, que todos os países que cresceram, o fizeram rapidamente e são sustentáveis.

Senador Jayme Campos, tem um aparte.

O Sr. Jayme Campos (DEM - MT) - Obrigado, Senadora Kátia Abreu. V. Exª vem, na tarde de hoje, tocar em um assunto muito importante para todo o território nacional. Lamentavelmente eu imagino que esse fato, e outros fatos que já aconteceram no Estado do Pará, estão trazendo, com certeza, quase uma escola de maus brasileiros. Lamentavelmente assistimos na televisão, na semana passada, o fato da propriedade em Xapinguá. E o que me chama muito a atenção é entender que essa é uma facção do crime que está sendo construída no Brasil. Aos poucos, se organizando, na medida em que aqueles que usam jornalistas da Rede Globo, repórteres do jornal do Pará para fazer barreira para invadir uma propriedade, eu imagino que isso é muito ruim no Estado democrático de direito em que nós vivemos. V. Exª chama a atenção aqui do Poder Judiciário, lá, sobretudo da Governadora do Pará, que não tem cumprido os mandados de reintegração de posse. É constitucional, é legal, e eu imagino que a segurança jurídica do Estado praticamente acabou, exauriu-se no tempo e no espaço. O próprio Secretário de Segurança Pública vai para a frente das câmeras de televisão dizer que o Estado está impossibilitado de buscar a reintegração de posse, por falta de material humano, em face do próprio desarmamento. Ora, isso não pode acontecer nunca, Senadora Kátia Abreu. Num Estado, como V. Exª bem disse, que tem algo parecido a quase duzentos, trezentos, quatrocentos, quinhentos mil hectares de terras já desapropriados para assentamentos vemos um bando, pode-se dizer que foi uma ação de quadrilha aquilo que apresentaram diante da televisão, num verdadeiro vandalismo, invadindo uma propriedade que eu imagino que tenha os documentos legais, a sua escritura pública...

(Interrupção do som.)

O Sr. Jayme Campos (DEM - MT) - E ali o Governo, agindo de forma irresponsável a sua Governadora, não dá segurança àqueles proprietários. Por isso, tenho certeza de que algo tem de ser feito. Quando V. Exª vai ao Estado do Pará e protocola um pedido de intervenção, é mais do que justo. Imagino que o Supremo Tribunal Federal tem de tomar as devidas providências, até porque o Poder Judiciário daquele Estado está sendo conivente, porque mandado de segurança, ou seja, reintegração de posse tem de ser cumprido. Fui Governador de Mato Grosso e todos os mandados que chegaram ao Poder Executivo foram cumpridos. Imagino que no Estado do Pará tem de ser cumprido urgentemente, caso contrário isso vai se desencadear em todo o Brasil. Aqui mesmo estou lendo um site de Mato Grosso que diz que no dia de ontem interditaram também a BR-174; tem mais de três ou quatro mil caminhões e automóveis parados em uma rodovia importante de Mato Grosso e isso fruto certamente desse movimento que está sendo desencadeado no Pará e está repercutindo também em outros Estados. Ainda bem que o Governador Blairo Maggi tem cumprido naturalmente os mandados de reintegração de posse. Portanto, é com tristeza que eu vejo, sobretudo, em um País com dimensões continentais como este, que tem terra em abundância para fazer os assentamentos e dar oportunidade a quem não tem uma propriedade, de ter o seu direito à terra, de produzir, constituir a sua família, e dar com certeza uma nova perspectiva de vida. Agora, nós não podemos, em hipótese alguma, concordar com esse vandalismo. O País hoje está pior do que no tempo do cangaço de Lampião, por falta de o Governo Federal assumir as suas responsabilidades. O Incra, lamentavelmente, é um dos órgãos que não tem feito nada, é o mais incompetente deste País! O Incra tem colaborado sobremaneira... Eu imagino que deixou de ser uma política de direito à reforma agrária, mas, sim, um viés político partidário. Descambou para um lado que não podemos permitir. Nós Senadores e Congressistas, que certamente fazemos as leis, temos de fazer alguma coisa. Caso contrário, Senadora Kátia, o direito à propriedade, que é um direito constitucional de todos os brasileiros, tem de ser rasgado e jogado na lata do lixo. Portanto, sou solidário a V. Exª e espero que algo seja feito na defesa intransigente daquilo que é legal, constitucional e moral: o direito de propriedade tem que ser respeitado em sua plenitude. Muito obrigado e parabéns pelo seu pronunciamento.

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Obrigada, Senador Campos. V. Exª disse bem, o direito de propriedade é um direito humano, está na Constituição, está na lei. E é exatamente essa a nossa preocupação. Por que estamos trabalhando com tanto vigor, seriedade e determinação? É exatamente a preocupação de que esses movimentos possam se alastrar por todo o País, porque, se não cumpre num lugar, eles vão ficar tentados a fazer em outros. No meu Estado de Tocantins, assim como no seu Estado de Mato Grosso, cumprimento de reintegração de posse é cumprida imediatamente, porque, à medida em que você acumula as reintegrações de posse sem cumprir, você vai criando um passivo de violência, que depois é difícil de ser restabelecido.

Então, esse acúmulo de reintegração sem cumprir no Pará é um péssimo exemplo para o Brasil que a Governadora Ana Júlia tem dado àqueles movimentos sociais que praticam a violência. Não são todos os movimentos sociais. Têm movimentos sociais que reivindicam pedaços de terra, que reivindicam trabalho, mas que não praticam a violência e têm todo o nosso respeito. Mas aqueles que se escondem por detrás de uma sigla, que montam suas empresas jurídicas para captar dinheiro do contribuinte, mas na frente colocam uma fachada para não serem criminalizados, esses me recuso a debater.

Concedo um aparte ao Senador José Nery.

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Senadora Kátia Abreu, permita-me, nessa questão que V. Exª traz à tribuna, expressar aqui um posicionamento contrário à posição e às idéias que V. Exª está manifestando, não só aqui no plenário, mas em várias comissões desta Casa, porque nesses fatos relacionados com os conflitos agrários no Pará e, em especial, o que ocorreu no último sábado em Xinguara, em uma das fazendas cujo proprietário é o banqueiro Daniel Dantas, dono do Grupo Opportunity, envolvido em vários casos de corrupção,

(Interrupção do som.)

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Vale perguntar: quem são mesmo os criminosos nessa questão fundiária? Porque o Brasil assistiu a quem estava empunhando armas, atirando, e que levou quase a uma situação de chacina sete trabalhadores sem terra e um segurança privado da empresa da Fazenda Espírito Santo. Não precisava estar lá para ser testemunha porque a televisão mostrou para todo o País quem atirou, quem promoveu o que quase se transformou numa chacina, em uma terra em que o Governo do Estado, dirigindo-se ao Poder Judiciário, desde 30 de janeiro, tem o pedido de cancelamento dos títulos que foram antes apropriados por oligarquias da região, as quais venderam essas terras ao Sr. Daniel Dantas, do Grupo Opportunity. Há um questionamento claro de que aquelas terras pertencem ao Estado, à União e, portanto, são terras griladas. Não é justo que os trabalhadores rurais sem terra, em um País com tanta terra, vivam ameaçados do seu direito, direito também à propriedade sim, direito de ser um pequeno produtor, de produzir, coisa que não é garantida a milhões de brasileiros que vivem lutando por um pedaço de terra, e que ainda sofrem, Senadora Kátia Abreu, a violência do Estado, que não reconhece o direito de propriedade, o direito à vida dessas pessoas, que apenas querem um pedaço de terra para trabalhar, para viver com dignidade. Portanto, há duas semanas, na reunião daquilo que seria a Comissão de Conflitos Agrários - de mediação de conflitos agrários - na qual V. Exª estava presente, bem como vários Deputados Federais e Senadores, em Marabá, tomei conhecimento de algumas das exortações que foram feitas e que, inclusive, incentivavam, ao arrepio da lei, que seguranças fossem contratados pelas fazendas para defenderem o direito de propriedade. Isso é ilegal, isso é criminoso, isso atenta contra o Estado de direito daqueles que estavam ali defendendo essas bandeiras, porque, se há ilegalidade, exijamos do Judiciário, da Polícia e do Estado, o cumprimento da lei. No entanto, se forem verdadeiras as versões que saíram na imprensa...

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - Senador José Nery, V. Exª é o próximo orador. Eu vou dar tempo para que V. Exª conclua, mas V. Exª é o próximo orador. Pergunto se V. Exª irá desistir da inscrição.

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Presidente Romeu Tuma, lamentavelmente, aqui, quando se ousa questionar certos posicionamentos, há sempre uma forma de interromper. Muito embora eu tenha que fazer meu pronunciamento posteriormente... Não vou desistir da minha inscrição.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - Eu não estou intercedendo na sua palavra. Eu estou dizendo que V. Exª é o próximo.

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Certo. Mas, neste momento, eu não estou inscrito para falar.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - É que a Senadora Kátia Abreu já está há muito mais tempo...

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Mas a Senadora Kátia Abreu está fazendo um pronunciamento e recebendo aqui aparte de seus colegas...

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - Como Líder. Ela está pelo Partido.

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Tenho certeza de que ela acolhe e escuta cada um de nós, mesmo que seja um posicionamento contrário, diferente das afirmações que está fazendo. O espírito democrático é isso. Então, agora, por enquanto, estou fazendo um aparte à Senadora Kátia Abreu, mencionando aquela reunião de Marabá, e a conseqüência dela, não sei se por ela, também por outras razões. Nos dez dias seguintes, houve mais uma morte no Pará, em Tucuruí: uma liderança dos trabalhadores rurais, o agricultor, a liderança sindical, o companheiro Raimundinho foi assassinado em circunstância até agora não esclarecida. No entanto, não vi nenhum pronunciamento de questionamento à violência, à morte de mais um trabalhador rural. Quando aconteceu o fato em Pernambuco, lamentavelmente - não defendo a violência de parte nenhuma, de um lado ou outro -, houve aqui, neste plenário, pronunciamentos dos mais contundentes possíveis. Inclusive houve pronunciamento do Ministro do Supremo Tribunal Federal, que muitas vezes deveria se manifestar nos autos dos processos e se manifesta falando sobre tudo e sobre todos no Supremo Tribunal Federal. Portanto, quanto a esta questão em particular, há várias versões, entre elas a que diz que houve uma emboscada por parte dos seguranças ou capangas da Fazenda Espírito Santo, fazenda que tem seu título questionado por ser acusada de grilagem. Houve uma emboscada e todos viram quem estava atirando. Alguém viu algum trabalhador atirando em algum segurança da fazenda? Pelo contrário, eram os seguranças privados das empresas que fornecem...

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Senador Nery, por gentileza, eu lhe concedi um aparte mais do que justificado pelo seu tempo. V. Exª poderia resumir, por favor, porque quero lhe responder? Depois V. Exª usa da tribuna.

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Pois não. Eu queria dizer à V. Exª que naquela questão específica de Xinguara, no último sábado, ficou...

(Interrupção do som.)

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - É só contabilizar os que foram vitimados por conta daquele confronto. Sete trabalhadores baleados, atendidos nos hospitais da região, e um empregado ou segurança da Fazenda Espírito Santo. Portanto, o Governo do Pará solicitou, desde o dia 2 de abril, que a Força Nacional permanecesse no Estado ou fosse ao Estado para contribuir nessas ações relacionadas ao apaziguamento da situação de conflito agrário do Pará, mas o Ministério da Justiça, infelizmente, não respondeu afirmativamente. Então, que eles aproveitem a ocasião, Senadora Kátia Abreu, para cobrar do Ministério da Justiça o envio da Força Nacional a fim de contribuir no acompanhamento desses fatos tão vergonhosos, que envergonham o Pará e o Brasil. Também quero dizer que estou propondo à Comissão de Direitos Humanos, Presidente Romeu Tuma, que uma Comissão de Senadores, em diligência, vá ao sul do Pará para, de fato, apurar e acompanhar o que aconteceu a fim de que o País e o Senado Federal tenham a exata dimensão da gravidade dos problemas que lá ocorreram. Agradeço a V. Exª, ao final, o aparte concedido, mesmo sabendo que nessa questão temos pontos de vista bastante diferentes, inclusive porque o pedido de intervenção federal no Pará, a meu ver, não agride a Governadora, como V. Exª pensa. Não agride. O Estado de direito é de todos os paraenses. Se é verdade que, quando Ana Júlia recebeu o governo, havia 175 reintegrações de posse não executadas, é claro que há também, no governo da ex-Senadora Ana Júlia, reintegrações não executadas. Porém, é bom que se diga, que 40 reintegrações, infelizmente, foram concedidas, muitas vezes negando o direito à terra de trabalhadores, que querem, nada mais, nada menos, do que o direito de produzir, de trabalhar tal qual os grandes proprietários.

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Sr. Presidente...

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Porém, terra grilada, não. Muito obrigado a V. Exª.

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - E terra invadida também não, Senador. V. Exª, como Senador da República, tenho certeza absoluta, não defende o esbulho possessório. E já estamos cansados, de certa forma, de determinados discursos que se pretendem humanistas, mas que, na verdade, vêm revestidos de ideologias não mais palpáveis para os dias de hoje.

Nós não estamos falando aqui, Senador Nery - e não coloque palavras na minha boca - de assentamento, não. Eu, ao contrário. E a CNA e a Federação da Agricultura montaram um gabinete social no sul do Pará para ajudar os assentamentos que estão lá, desprotegidos como todos deste País. Assentamento não tem nada a ver com MST e invasor de terra, que quer tomar terra na marra.

Se V. Exª acha que o empresário A, B ou C é um criminoso e não merece ter aquela terra, a sua Governadora pode pedir a desapropriação das terras e assim proceder conforme a lei.

O que estamos discutindo neste momento não é a defesa individual de CPF e nem de carteira de identidade de ninguém, mas a nossa defesa aqui é da Constituição Federal. Nós aqui estamos defendendo é o Estado de direito.

Então, falar aqui em arrepio da lei, arrepio da lei...

Eu quero lembrar algo que nos preocupa muito, caso V. Exª não conheça o Código Civil. O art. 1.210 trata dos efeitos da posse: “Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente (...)” .

Parágrafo 1º do art. 1.210, Senador Nery: “§ 1° O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável (...)”.

Então, o que me preocupa é justamente que a lei permite a defesa. Nós não queremos que isso aconteça. Os produtores do Pará, do sul do Pará, tiveram a tolerância máxima, e nós esperamos que eles tenham mais tolerância no sentido de que a lei possa ser cumprida. Mas nós não podemos segurar aqueles cuja paciência está se esgotando. São três, quatro anos de fazenda invadida sem ser devolvida. Paciência tem limite! Tolerância tem limite! O que nós queremos é apenas o cumprimento da lei.

E, se V. Exª não ouviu, eu disse que o Pará já tem terras desapropriadas o suficiente para assentar 200 mil famílias, que são bem-vindas no agronegócio brasileiro.

Então, acostumou-se, e, enquanto eu estiver presente, não permitirei. Vamos fazer as rupturas de que o Brasil precisa. Nós estamos falando de MST, descumprimento de lei, não estamos falando de assentamento, Senador. Não coloque palavras na minha boca, porque isso é injusto de sua parte. Isso não é correto, não é leal. Nós não estamos falando de assentamento.

Eu queria que V. Exª conhecesse o estado em que se encontram os assentamentos no seu Estado, que o senhor não conhece, com certeza...

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Tanto conheço, Senadora. Permite-me?

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - ... o estado de depreciação, de falta de infraestrutura, de abandono. Não só no Estado do Pará, mas em todo o Brasil. São seres humanos brasileiros, abandonados à própria sorte, sem estrada, sem casa, sem moradia, sem banheiro dentro de casa, sem chão, sem telha, largados de qualquer jeito.

São pessoas que merecem o nosso respeito, a nossa solidariedade, assim como aqueles que também não têm terra. Mas não é dessa forma, não é estragando o seu Estado, não é afastando o empresário, porque o empresário vai embora junto com o emprego. O investimento leva o emprego embora, e não é isso que essas pessoas querem. Essas pessoas querem sobreviver, essas pessoas precisam de salário, essas pessoas precisam de trabalho para viver com dignidade.

Encerro, Sr. Presidente, agradecendo a sua tolerância e a sua paciência e pedindo aos colegas Senadores e Senadoras desculpas, talvez, um pouco, pela exaltação.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Mas não permitiremos mais que esses grandes fazendeiros, mencionados de forma debochada pelo Senador, esses fazendeiros que garantem a balança comercial brasileira positivada, esses fazendeiros que garantem um terço do PIB, um terço das exportações, um terço do emprego, sejam falados da forma desprezível, como aqui fomos citados.

Não é isso que queremos. Estamos prontos para que todos aqueles que têm um palmo de chão possam receber a mesma tecnologia que os médios, os grandes e os pequenos produtores do Paraná, de Santa Catarina, do Rio Grande do Sul. Que todos possam fazer parte de um grande continente de prosperidade e não de guerrilha, não de revolta, não de atrocidades, como vimos domingo.

Todos têm o nosso respeito. O que não tem o nosso respeito, o que não tem o meu respeito é o insulto à lei, é o insulto ao Judiciário deste País, porque o pior caminho que podemos escolher...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - ... é o caminho da ditadura, é o caminho do enfraquecimento da democracia. E isso não vamos permitir, porque nós brasileiros nos acostumamos com a democracia, graças a Deus.

Ouço o Senador Eduardo Azeredo.

O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Senadora Kátia, quero dar todo meu apoio. A questão está muito bem colocada: chega dessa bagunça na área rural. O MST, há muito tempo, deixou de ser um movimento que defendesse as pessoas sem-terra. Ele é um movimento político, é um movimento fora da lei, é um movimento que recebe dinheiro público e que não presta conta desse dinheiro. Dessa maneira, nós temos que ter uma posição muito clara em relação a isso. A questão dos sem-terra, da violência no Pará tem que ser enfrentada, sim, e tem que ser denunciada. Não dá para nós confundirmos as coisas. Colocou muito bem V. Exª, como Presidente da CNA, como Senadora e como líder da área rural. Não é questão de defender a área rural, é defender o Brasil, defender o Estado de direito, defender que haja o mínimo de respeito em todas as relações entre quem tem terra e quem não tem terra. É preciso haver assentamento, sim, mas assentamento que tenha apoio de governo, não é exatamente assentamento como os que estão por aí, não. Dessa maneira, tenha todo o apoio nosso.

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Muito obrigada, Senador Azeredo.

Quero aqui, inclusive, comentar a respeito do Governador de Minas Gerais, Aécio Neves, que tem também, a exemplo de vários Governadores do Brasil, sido duro e solícito à legislação e cumprido os mandados de reintegração de posse imediatamente à decisão judicial. Parabéns ao seu Estado e ao seu Governador, assim como ao meu, do Tocantins; como Blairo Maggi, de Mato Grosso; como André Puccinelli, do Mato Grosso do Sul, enfim, vários tantos outros que cumprem a lei à risca e cujos Estados, portanto, vivem em paz.

Concedo ao Senador Flexa Ribeiro um aparte.

O Sr. Flexa Ribeiro (PSDB - PA) - Senadora Kátia Abreu, eu estava fora, em uma audiência no Dnit, para tratar da hidrovia do Capim, com o Prefeito de Paragominas, nosso companheiro Adnan Demachkl, mas vinha escutando o pronunciamento de V. Exª e os apartes. Graças a Deus, cheguei a tempo de aparteá-la porque farei também um pronunciamento, ainda hoje, a respeito do caos que se instalou no Estado do Pará. V. Exª tem toda razão. Lamentavelmente, eu pude escutar, no caminho para o plenário, o aparte que o Senador Nery fez a V. Exª, confundindo assentamento com o invasão. Não tem nada a ver uma coisa com a outra. Lamentavelmente, o Estado do Pará está na mídia nacional e internacional por desgoverno, por falta de ação do Governo que lá está instalado. A própria televisão mostrou. O MST, para mim, um movimento marginal, à margem da lei, está tão instruído que o seu líder disse: “Não, não queríamos invadir a sede da fazenda, queríamos resgatar um companheiro nosso que estava refém.” Isso é um absurdo. Não havia refém nenhum. Foi mostrado. Graças a Deus, a televisão estava lá e pôde presenciar e filmar a forma como eles agem. V. Exª já deu a razão. Existem hoje, no Pará, terras desapropriadas onde se podem assentar duzentas mil famílias. Para que invadir mais terras? Basta que o Incra faça seu trabalho, seu dever de casa, que assente as famílias nas áreas já desapropriadas. Ou o Incra quer se tornar a maior imobiliária do País, quer fazer negócios com desapropriação de terras? Parece-me que não é esse o caminho. O Estado de direito tem de ser respeitado. Se existem dúvidas, que se vá esclarecê-las. Agora, pior do que permitir invasões é alimentar ou induzir que se façam novas invasões no Estado. Isso não podemos admitir. V. Exª, como Líder do setor do agronegócio, pede a intervenção no Estado.

Não é só na área de segurança, não é só na questão da....

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Do direito de propriedade.

O Sr. Flexa Ribeiro (PSDB - PA) - ...não é só na retirada dos invasores, na devolução das terras...

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Na reintegração.

O Sr. Flexa Ribeiro (PSDB - PA) - ... na reintegração das terras, é na questão da saúde, é na questão da educação. Realmente, é lamentável, como paraense, como Senador da República pelo Estado do Pará, que eu tenha de dizer ao Brasil que, no Pará, não existe Estado de direito. Existe, sim, Estado de direito violado. 

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Obrigada, Senador.

Encerro, Sr. Presidente, deixando aqui um pedido, uma solicitação ao Tribunal de Justiça do Estado do Pará, que nos recebeu tão bem, com tanta atenção, no dia em que fomos lá protocolar a intervenção: que possa tomar alguma medida cabível, que possa decidir sobre esse assunto, antes que as coisas se agravem cada vez mais, e nós possamos ver ainda mortes, massacres entre invasores e proprietários de terra, que não é o que o Brasil quer.

Peço ao Procurador Geral da República - hoje protocolei mais uma intervenção - que nos ajude, neste momento, a resgatar o Estado de direito no Pará.

Peço ao Ministro da Justiça, ao Presidente da República, ao Ministro Gilmar Mendes, aos meus colegas, Senadores, ao Presidente do Senado, José Sarney, que possamos todos tomar uma providência não contra determinadas pessoas, não contra uma pessoa especificamente, mas a favor do Brasil, a favor da nossa paz, a favor da nossa produção.

Nós estamos diante de uma grave crise econômica internacional. Nós precisamos nos unir. Nós precisamos de tranqüilidade para resolver...

(Interrupção do som.)

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Precisamos de tranqüilidade, a maior tranqüilidade possível, para resolver os graves problemas que nós estamos enfrentando na economia, neste momento.

Não é hora de guerrearmos entre nós.

É hora de nós cumprirmos a lei e trabalharmos contra a crise, a favor do emprego, contra as injustiças sociais, pelos assentamentos do País, por aqueles desempregados, por aqueles que passam fome, pelos doentes, que não têm saúde. Que possamos, Sr. Presidente, nós, todos os brasileiros, nos unirmos no cumprimento da democracia, do regime democrático, do Estado de Direito, da separação dos poderes e da paz no nosso País. É isso que queremos. Não queremos ter brigas com ninguém. Precisamos das brigas boas com outros países, com outros concorrentes, produtores de comida, mas não entre nós, brasileiros. Não há necessidade disso. Temos terras para quem quiser plantar, para quem quiser produzir.

Muito obrigada, Sr. Presidente.

O Sr. Romeu Tuma (PTB - SP) - Senadora, da Presidência, eu não poderia fazer uso do palavra.

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Senador Romeu Tuma, que ficou na Presidência por todo esse período e que gostaria de falar, sua opinião é importantíssima.

O Sr. Romeu Tuma (PTB - SP) - Eu vejo as aflições de V. Exª e de todos os Parlamentares com a situação que está ocorrendo. Como está sendo ferido o Estado de Direito e o ordenamento jurídico brasileiro, acredito que, em última instância, Senadora Kátia, que está apelando para a área jurídica do Pará, daqui a pouco, o Supremo poderá pedir, para garantir a manutenção do Estado de Direito, a intervenção das Forças Armadas para cumprir a decisão judicial, que é lei. Qualquer decisão judicial é lei. Ela pode ser modificada em instância superior. Mas isso me preocupa. Chegar ao ponto de ter de pedir a intervenção das Forças Armadas para retirar invasores de terra de propriedade de terceiros é uma preocupação grande. Desculpe-me a interrupção.

A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Obrigada, Senador. Sua experiência é extraordinária na área de segurança pública, e sua palavra é muito importante para todos nós, já que esteve à frente da Polícia Federal.

Muito obrigado, então, Sr. Presidente.

Minha solidariedade aos jornalistas que serviram de escudo nesse movimento, que passaram por momentos terríveis como reféns, por toda sorte de terror. Espero que possamos resolver esses problemas o mais rápido possível. Tenho certeza de que iremos resolvê-los.

Muito obrigada.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/04/2009 - Página 12215