Discurso durante a 116ª Sessão Especial, no Senado Federal

Homenagem a memória do Maestro Sílvio Barbato, que estava no voo 447 da Air France, no dia 31 de maio de 2009.

Autor
Adelmir Santana (DEM - Democratas/DF)
Nome completo: Adelmir Santana
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem a memória do Maestro Sílvio Barbato, que estava no voo 447 da Air France, no dia 31 de maio de 2009.
Publicação
Publicação no DSF de 10/07/2009 - Página 31156
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, REGENTE, COMPOSITOR, VITIMA, ACIDENTE AERONAUTICO, ELOGIO, CONTRIBUIÇÃO, MUSICA ERUDITA, BRASIL, ATUAÇÃO, ORQUESTRA, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), MUNICIPIO, RIO DE JANEIRO (RJ), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).
  • REGISTRO, PARCERIA, REGENTE, ORADOR, QUALIDADE, PRESIDENTE, SERVIÇO SOCIAL DO COMERCIO (SESC), DISTRITO FEDERAL (DF), ESPETACULO, DIVULGAÇÃO, MUSICA ERUDITA.

            O SR. ADELMIR SANTANA (DEM - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Exmº Senador Marconi Perillo; Sr. Senador Líder do PDT, Presidente do PDT do Distrito Federal, ex-Reitor da Universidade de Brasília (UnB), ex-Governador e ex-Ministro Cristovam Buarque; Exmºs Srs. Embaixadores, Membros do Corpo Diplomático aqui presentes; Srª Silviane Barbato, irmã do Maestro Silvio Barbato; familiares e amigos do Maestro Silvio Barbato; Sr. Diretor Regional do Serviço Social do Comércio (Sesc) e amigo do Maestro Silvio Barbato, Sr. José Roberto Sfair Macedo; o Quinteto, ao qual rendo minhas homenagens; Srs. Gerentes das Unidades Operacionais do Sesc no Distrito Federal; Mathias Barbato Bloch, sobrinho do Maestro Silvio Barbato; Bruno Barbato Bloch, também sobrinho do Maestro Silvio Barbato; meus senhores e minhas senhoras; senhores convidados; Srªs e Srs. Senadores, com profundo sentimento, sou autor do requerimento para a realização desta sessão em homenagem ao Maestro Silvio Barbato, um ser humano e um artista do qual me aproximei nos últimos anos e que fará falta, certamente, a todos nós.

            Barbato - como bem disse o nosso Presidente -, que foi Diretor da Orquestra Sinfônica do Teatro Municipal do Rio de Janeiro e da Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional de Brasília, estava entre os passageiros do Vôo 447, da Air France, que desapareceu no Oceano Atlântico no dia 31 de junho.

            Quero aqui também fazer uma homenagem à Coordenadora do Senado Cultural, que participa da organização deste evento, mais um dos eventos do Senado Cultural.

            Mas, continuando, Sr. Presidente, lembro que, como Presidente do Sesc do Distrito Federal, organizei, junto com ele e com toda a equipe do Sesc, um presente para a população de Brasília, no ano de 2007: a montagem da ópera Carmen ao ar livre, prestigiada, naquela oportunidade, por trinta mil pessoas, muitas delas emocionadas ao verem, pela primeira vez, um espetáculo tão sofisticado.

            No entanto, a experiência que mais me marcou, nessa aproximação com Silvio Barbato, aconteceu em 31 de agosto do ano passado, quando não chovia em Brasília há 124 dias. Montamos, também com o Sesc, uma nova ópera, A Flauta Mágica, de Mozart, na Explanada dos Ministérios, prestigiada por mais de 25 mil brasilienses, dentro do Projeto Sesc Sinfonia. De forma quase milagrosa, inesperada mesmo, faltando quinze minutos para o desfecho da ópera, começou uma chuva fina, que se foi intensificando. Isso ocorreu no dia 31 de agosto, como eu disse. Essa ópera contava, entre seus componentes, com pessoas simples, recrutadas na Ceilândia, em Taguatinga, que estavam ávidas para fazer sua apresentação. Seria o apogeu o encerramento dessa ópera. Confesso que fiquei preocupado - e, aí, cresceu minha admiração por Silvio Barbato -, mas, com um jeito carinhoso, ele explicou ao público que o espetáculo seria suspenso para não inutilizar os valiosos instrumentos musicais e para preservar os cabelos das moças presentes. Todos riram e saíram calmamente.

            Prometemos, naquela oportunidade, reapresentar a ópera no Sesc da Ceilândia, uma vez que muitos componentes que não tiveram a oportunidade de se apresentar eram daquela cidade satélite, mas ficaremos devendo essa promessa. Isso não é do nosso feitio, mas o destino, infelizmente, não nos permite que o façamos. Lamentamos muito, muito, que a gente não possa cumprir a promessa, em razão da perda do amigo Maestro.

            Nas últimas semanas, uma infinidade de homenagens foi prestada ao Maestro, em diversos pontos do País e do mundo. Hoje, o plenário do Senado se une àqueles que lamentam a perda de um artista brasileiro tão prestigiado nos grandes centros mundiais e no nosso próprio País.

            Silvio Sergio Bonaccorsi Barbato era carioca, mas quase brasiliense, pela presença na nossa cidade nos últimos trinta anos. Nasceu em 11 de maio de 1959. Foi brilhante maestro e compositor de ópera. Estudou composição e regência com Claudio Santoro, outro maestro já falecido e de profundas ligações com a nossa Capital, com Brasília, com o Distrito Federal.

            Sua trajetória é engrandecedora. Em 1984, Barbato recebeu o diploma de mérito na Accademia Musicale Chiggiana, de Siena. No Conservatório Giuseppe Verdi, em Milão, recebeu o Diploma de Alta Composição e foi homenageado com a Medalha de Ouro de Alta Composição também, tendo sido o único brasileiro, depois de Carlos Gomes, a receber tal honraria. Ainda na Itália, frequentou a classe de Franco Ferrara, colaborando com o maestro Romano Gandolfi no Teatro Alla Scala. Em Chicago, obteve seu PhD em Ópera Italiana.

            Barbato foi, por duas vezes, Diretor Musical e Regente Titular da Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Claudio Santoro, em Brasília, de 1989 a 1992 e de 1999 a 2006 - acho que aqui, inclusive, está compreendido o Governo de Cristovam Buarque. Foi também Regente Titular da Orquestra Sinfônica do Teatro Municipal do Rio de Janeiro e Diretor Musical da Sala Palestrina, na sede da embaixada brasileira em Roma.

            No centenário de Carlos Gomes, a convite de Plácido Domingo, foi o curador da ópera que abriu a temporada da Washington Ópera, O Guarani.

            No Teatro Nacional Claudio Santoro, em Brasília, completou nove temporadas como Diretor Musical.

            Com a orquestra brasiliense, regeu concertos em Roma, em Lisboa, nos Teatros Municipais de São Paulo e do Rio de Janeiro e em diversas outras capitais brasileiras.

            Suas gravações com a Orquestra de Brasília incluem as Sinfonias Brasil - 500 anos e os Clássicos do Samba, com Jamelão, com Ivone Lara e com Martinho da Vila.

            Na Itália, regeu em Roma e nas principais cidades, trabalhando com artistas internacionais, entre os quais, como já citei, Plácido Domingo.

            Diretor musical do filme Villa Lobos, Uma Vida de Paixão, foi premiado com o Grande Prêmio Brasil de Cinema, em 2001, na categoria de melhor trilha musical.

            Doutor em Filosofia da Música pela Universidade de Chicago, foi o terceiro regente da Sinfônica Carioca neste século e o mais jovem músico a comandar uma ópera completa no Teatro Municipal do Rio de Janeiro.

            Tinha apenas 25 anos quando regeu Tosca, de Puccini.

            Pelos trabalhos realizados na área cultural, Barbato recebeu a Medalha da Ordem do Mérito Cultural da Presidência da República e foi promovido ao grau de Comendador da Ordem de Rio Branco.

            Em 2003, compôs o balé Terra Brasilis, que foi apresentado na Itália, no ano seguinte.

            Em 2006, regeu a primeira audição europeia da ópera Colombo, poema coral sinfônico em quatro partes, de Albino Falanca, música de Carlos Gomes, em Catânia, Itália.

            Ainda em 2006, recebeu o encargo de orquestrar o concerto que fechou o ano de Mozart no famoso Teatro Olímpico de Vicenza.

            Em novembro de 2008, estreou sua segunda ópera, Carlos Chagas, na Sala Palestrina, com a presença de oito laureados com o Prêmio Nobel.

            Ainda em 2008, foi finalista do Prêmio Grammy Latino.

            Nos últimos anos, dedicava-se a compor, tendo estreado duas óperas: O Cientista, baseada na vida de Oswaldo Cruz, sob a direção de Eduardo Alvares, e Chagas, sobre a vida de Carlos Chagas Filho.

            Estava elaborando sua terceira ópera, sobre Simon Bolívar, como bem destacou nosso Presidente, obra que, infelizmente, ficou inacabada.

            O Maestro Silvio Barbato desapareceu quando se dirigia a Kiev, na Ucrânia, onde iria fazer uma palestra sobre música russa e música brasileira e apresentaria sua ópera Chagas em versão integral. Tinha, em seguida, programação também em Roma. Ele se entusiasmara bastante, porque tinha a certeza do comparecimento de Sua Santidade, o Papa, para assisti-lo.

            Senhoras e senhores, Silvio Barbato estava ligado às comemorações dos 50 anos de Brasília, que ocorrerão em 2010. Sonhava em montar uma ópera baseada na obra do roqueiro-poeta, também brasiliense, Renato Russo. Seria algo sinfônico, mas extremamente brasiliense, para homenagear a cidade que o adotou.

            Em entrevista feita pelo jornalista Luís Turiba, este ano, Barbato dizia-se uma pessoa muito antenada com os sons das ruas e explicava essa inquietação ao afirmar:

Você pode me encontrar num ensaio da Mangueira; num bar de Brasília, ouvindo uma banda nova; ou numa praça na Itália, ouvindo um músico de rua tocar. É daí que eu tiro a minha inspiração. Minha música e meus projetos nascem do meu piano e numa caminhada por uma cidade qualquer do mundo [explicava, de forma descontraída, ao jornalista Luís Turiba].

            Sobre o Projeto Sesc Sinfonia, que ele tão bem dirigiu aqui na nossa cidade, sob a nossa direção no Sesc, afirmava que pode ser comparado aos grandes projetos mundiais de música, de divulgação e de democratização do acesso à música, comentando: “Trabalhar com o Sesc Sinfonia é fascinante. Estamos na vanguarda de todos os projetos similares em escala mundial”. Era o que dizia ele, com entusiasmo.

            Silvio Barbato adorava apresentações ao ar livre. Na sua opinião, era uma das formas de aproximar a orquestra do povo. Foi definido como “o maestro que adorava estar perto do povo”.

            Levava a Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Cláudio Santoro a todos os cantos do Distrito Federal. Em 2006, numa apresentação da Orquestra no Teatro da Praça, em Taguatinga, na Praça do Relógio, em vez de se trajar como sempre estão os maestros, estava vestido com a camisa da Seleção Brasileira. Era época da Copa do Mundo, e, a todo o momento, ele brincava com a plateia, principalmente falando da Seleção, do Parreira e dos principais jogadores. Fez o público cantar junto com os músicos, ora regendo a orquestra, ora regendo a plateia. As lembranças sobre ele são muitas. Aqui, não vou enumerar todas.

            Augusto Guerra, violoncelista da Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional de Brasília, foi uma das últimas pessoas que falou com Barbato na véspera da viagem. Almoçaram juntos, no Rio de Janeiro. Terminado o almoço, Augusto e Barbato decidiram passear pelas ruas da Gávea. Enquanto caminhavam, diversas pessoas abordaram o Maestro. Sorrindo, Silvio Barbato comentou: “Ah! se eu quisesse ser prefeito! Mas meu grande sonho é me tornar presidente do Flamengo”.

            Sua jovialidade era marcada também pela performance como surfista, acompanhando os dois filhos nas praias cariocas. E, quando ele falava dos filhos, também era uma coisa que nos emocionava muito. Quanto a uma filha que ele tem fora do País, ele me dizia sempre que tinha pensamentos de esquerda. Contava fatos e histórias que realmente nos deixavam sensibilizado.

            Mas não nos podemos esquecer nunca da ligação dele com nossa cidade. Ex-aluno de música da Universidade de Brasília, Barbato chegou ao Distrito Federal nos anos 70, por causa da transferência do pai, ex-professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Veio e marcou presença a todo o momento na cidade, onde era tratado como um ídolo.

            Deixa em todos nós, brasilienses, muita saudade. Junto com sua memória, fica nosso compromisso de manter vivo o Projeto Sesc Sinfonia, a melhor maneira de homenagear o Maestro, que esteve sempre no mesmo nível do povo, a quem amava.

            Esse é o compromisso que nós, do Sesc - eu, como Presidente Regional do Sesc, o nosso Diretor Regional e toda a equipe do Sesc -, assumimos com essa figura que aprendemos a amar e por quem tínhamos um apreço extremamente especial. Externamos isso a seus familiares e a seus amigos.

            Muito obrigado pela atenção. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/07/2009 - Página 31156