Discurso durante a 120ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre a crise no Senado Federal. Manifestação sobre a interferência do governo na CPI da Petrobrás. Leitura de trecho do Editorial do jornal Folha de S.Paulo, que aborda iniciativa do Presidente Lula na criação de uma nova empresa para gerir o pré-sal.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Reflexão sobre a crise no Senado Federal. Manifestação sobre a interferência do governo na CPI da Petrobrás. Leitura de trecho do Editorial do jornal Folha de S.Paulo, que aborda iniciativa do Presidente Lula na criação de uma nova empresa para gerir o pré-sal.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 15/07/2009 - Página 32747
Assunto
Outros > SENADO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • DEFESA, IMPORTANCIA, PRESERVAÇÃO, SENADO, BRASIL, COMENTARIO, SIMULTANEIDADE, CRISE, PARLAMENTO, PAIS ESTRANGEIRO, GRÃ-BRETANHA, ITALIA, ALEMANHA, FRANÇA.
  • QUESTIONAMENTO, INTERFERENCIA, EXECUTIVO, ATIVIDADE, SENADO, ESPECIFICAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), TENTATIVA, DESVALORIZAÇÃO, TRABALHO, LEGISLATIVO.
  • DEFESA, EMPENHO, MANUTENÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EFICACIA, APURAÇÃO, IRREGULARIDADE, GESTÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).
  • LEITURA, EDITORIAL, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), QUESTIONAMENTO, CONDUTA, GOVERNO, TENTATIVA, RETIRADA, ATENÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), ANUNCIO, CRIAÇÃO, EMPRESA ESTATAL, GESTÃO, EXPLORAÇÃO, PETROLEO, RESERVATORIO, SAL.
  • JUSTIFICAÇÃO, DESNECESSIDADE, CRIAÇÃO, EMPRESA ESTATAL, CAPACIDADE, QUALIFICAÇÃO, SERVIDOR, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), EXPLORAÇÃO, PETROLEO, AGUAS SUBTERRANEAS.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Senador Mão Santa, pela generosidade em final de semestre. Muito obrigado a V. Exª.

            Eu creio que estamos vivendo um momento, Senador Cristovam Buarque, favorável a se pensar em voz alta ou refletir sobre os complexos desígnios que nos atribuem neste momento na função de representar o nosso Estado no Senado Federal, um momento de grande constrangimento para quem é Parlamentar nesta Casa.

            Há poucos dias, fui acordado pela Rádio Jovem Pan, de São Paulo, pelo repórter Anchieta Filho, que me indagava sobre matéria divulgada pelo The Economist, jornal britânico, que estampava em manchete que o Senado brasileiro é a casa dos horrores.

            É evidente que o impacto da indagação me fez reagir de imediato, de forma repentina, sem refletir sequer sobre a indagação. Eu disse: O Senado brasileiro não é a casa dos horrores; lá existem horrorosos que precisam ser colocados para fora, mas o Senado não pode ser denominado casa dos horrores. É uma instituição essencial para o Estado de Direito Democrático. Eu tenho repetido que aqui estão fincados alicerces básicos, fundamentais, do Estado de Direito Democrático. É uma instituição que tem que ser preservada, porque ela é permanente, é definitiva e é insubstituível. Nós não temos como ignorar esta realidade e, portanto, cabe-nos defender esta Instituição.

            É evidente que eu fui relembrar alguns fatos também de outros parlamentos, inclusive do britânico, porque, num linguajar bem popular, é o roto falando do esfarrapado. No parlamento britânico, tivemos escândalos que certamente não são menores do que aqueles que vivemos aqui. E eu não estou colocando essa questão para justificar. Nada justifica o erro e um erro não justifica o outro. Evidentemente, nós não podemos, em razão dos escândalos que existem mundo afora, entender que possamos tê-los aqui.

            Mas eu tenho que lembrar que escândalos assolaram a Câmara dos Comuns do Parlamento do Reino Unido recentemente. O escândalo de desvio de verbas de gabinetes naquele Parlamento provocou a queda do seu Presidente, acusado de tentar abafar o caso, episódios rumorosos envolvendo outros parlamentos da Europa. O do Reino Unido mostrou as agruras que viveu o Primeiro-Ministro Gordon Brown, mesmo depois de ter apresentado a proposta de reforma do Poder Legislativo e de prometer aumentar a sua transparência. Ele não conseguiu reverter a impopularidade crescente em razão dos escândalos.

            Nas eleições europeias, o Partido Trabalhista teve o pior resultado dos últimos cem anos em uma votação nacional, entre outros fatores, pelo escândalo envolvendo a concessão de privilégios a políticos do governo.

            A Itália enfrenta crises sucessivas no seu parlamento. O país que promoveu a Operação Mãos Limpas, que reprimiu com rigor a corrupção na política partidária, não conseguiu estancar a corrupção. O escândalo do mensalão à italiana! Mão Santa, lá também houve o mensalão, um mensalão à italiana, que envolveu o Presidente do Banco Central em tráfico de informações privilegiadas, em uma teia com muitas ramificações. Naquele país a Oposição ganhou terreno em meio a sucessivos escândalos políticos.

            Na Alemanha - vamos recordar os idos de 2005 -, o presidente do parlamento alemão, Rainer Barzel, renunciou sob uma acusação de suborno. Uma CPI no Parlamento alemão arruinou a vida política de muitos políticos.

            O caso da estatal francesa Elf, o maior escândalo de corrupção da França no pós-guerra, não se restringiu à França. As investigações vieram demonstrar que a estatal francesa agia nos meandros da política europeia. Em 92, o chanceler alemão Helmut Kohl, em campanha eleitoral, recebeu expressiva gratificação da estatal francesa pela intermediação na compra de uma refinaria na Alemanha. Parte do dinheiro da venda acabou desviada para o fundo de campanha da de Kohl. O caso terminou abreviando a vida pública do pai da unificação alemã. Os respingos do escândalo alcançaram o governo do então Primeiro-Ministro espanhol, José Maria Aznar.

            O escândalo dos políticos britânicos que utilizaram fundos públicos para pagar contas pessoais retrata a crise ética que se espalhou pelos parlamentos do Velho Mundo.

            Trago à tribuna no dia de hoje, não como justificativa...

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - O Senado romano elegeu o cavalo de Calígula, Incitatus. Está na História.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Não como justificativa, porque não cabe, mas apenas para dizer que não possuem autoridade moral ou política para achincalhar o Senado Federal do Brasil. Nós, sim, devemos criticá-lo. Nós devemos expor as vísceras desta Casa. Nós devemos propor a assepsia geral. Nós não podemos nos conformar com a situação atual.

            Em que pese o recesso de duas semanas, cabe a todos nós o acompanhamento das medidas que foram anunciadas, das providências que foram adotadas. Nós não podemos nos esquecer delas. Acompanhar as ações do Ministério Público. Acompanhar as ações da Polícia Federal. Acompanhar as ações do Tribunal de Contas da União. E aguardar que, quando agosto chegar, o Conselho de Ética cumpra o seu dever, debatendo as representações que porventura até lá sejam protocoladas, a fim de que se julguem aqueles que eventualmente possam ter sido acusados por partidos políticos ou por Parlamentares, encaminhando denúncias ao Conselho de Ética.

            Nós sabemos que há uma desconfiança absoluta, uma descrença em relação ao Conselho Ética constituído. E há aqueles que afirmam taxativamente que é preciso acreditar em Papai Noel para esperar que o Conselho de Ética instalado no dia de ontem possa julgar alguém e condenar. No entanto, o voto no Conselho de Ética é voto aberto, há uma pressão que se expressa no trabalho da imprensa do País e, certamente, os Senadores haverão de assumir a sua responsabilidade em relação ao voto que proferirem no que diz respeito à representação contra o Presidente da Casa.

            Portanto, Sr. Presidente, nós temos que preservar a Instituição acima de tudo, porque o Senado Federal viveu lampejos de independência. Foi aqui que rejeitamos a CPMF contra as imposições do Governo. O Senado Federal, em momento inusitado, devolveu medida provisória inconstitucional. O Senado Federal aprovou projetos de lei contra a orientação do Governo. Eu poderia citar a Emenda nº 29, que diz respeito à fixação de percentual do Orçamento da União para a saúde pública no País. Eu poderia citar os projetos que beneficiam os aposentados e que estão paralisados na Câmara dos Deputados. O Senado Federal votou os itens essenciais da reforma política. O Senado aperfeiçoou projetos que aqui chegaram, de reformas, como o da Previdência, que seriam um desastre ainda maior não fosse a atuação do Senado Federal.

            Até mesmo em relação à reclamada reforma tributária, o Senado promoveu alguns avanços, que foram, lastimavelmente, sepultados na Câmara dos Deputados. Ou seja, o Senado tem exercitado, mesmo que precariamente, o exercício da independência, em que pese, nos últimos dias, especialmente, ficar visível a interferência do Poder Executivo.

            Por que agora se faz presente com força a interferência do Executivo?

            Porque o Senado Federal se encontra agachado. Achincalhado, está rendido à realidade deste momento. Rendeu-se à realidade deste momento e não tem adotado uma postura que possa significar uma reação à altura das necessidades. O Presidente da República tem sim imposto a sua interferência na atividade do Senado Federal.

            Quando se propôs a instalação da CPI da Petrobras, o Presidente tentou desqualificar a iniciativa, tachando-a de impatriótica. Encaminhou ao Senado Federal as forças políticas de que dispõe, mobilizando a Base Aliada para tentar impedir que a CPI se constituísse. Não foi possível. As assinaturas não foram retiradas.

            Numa segunda etapa, o Governo tentou impedir a instalação da CPI, sob as ordens do Presidente da República, que, mesmo no exterior, naquele momento no Oriente Médio, comandava politicamente esse processo. E foi aguardado para a decisão terminativa de que não se instalaria a CPI da Petrobras. E ela não se instalou enquanto teve forças o Governo. Durante quase dois meses de debate, a CPI da Petrobras não se instalou. O Governo não cedeu. Rendou-se a uma jurisprudência consagrada pelo Supremo Tribunal Federal. Um mandado de segurança preparado pelo PSDB e anunciado como fato consumado determinou a mudança. O Governo entendeu que o mandado de segurança poderia ser acolhido com concessão de liminar pelo Supremo Tribunal Federal, e o Presidente Sarney antecipou-se a esse fato e determinou, regimentalmente, em resposta a uma questão de ordem que formulei, que a CPI se instalasse com qualquer quorum.

            Portanto, não houve concessão, não houve cessão; houve rendição. E a CPI foi instalada. E, mais uma vez, o Governo interfere, e isso foi decidido no Palácio do Planalto.

            É bom relembrar que o Ministro Múcio, à saída da reunião com lideranças governistas, informava que o Governo elegeria o Presidente e nomearia o Relator da Comissão Parlamentar de Inquérito. Não compartilharia com a Oposição a administração da CPI, ignorando uma tradição existente nesta Casa, desrespeitando a praxe estabelecida há tantos anos. Impôs, é fato consumado. Nós não podemos considerar de outra forma, é uma CPI chapa branca sim, que tem por objetivo não investigar. Essa é a proposta.

            Nós sabemos das dificuldades que a Oposição enfrentará, aqui não se gera falsa expectativa. Nós temos o dever de, com sinceridade, colocar para a opinião pública que as dificuldades são quase que intransponíveis na CPI. Haverá um acobertamento sim, todos os artifícios serão utilizados para impedir que a investigação se aprofunde, mas nós temos uma alternativa sobre a qual pretendo discorrer logo mais.

            Antes, a propósito da CPI, ontem, o Presidente chegou ao clímax da infelicidade em relação a esse tema. Porque ele não disse que existem aqui no Senado alguns pizzaiolos. Ele disse que todos são pizzaiolos. Essa foi a afirmativa taxativa do Presidente da República.

            Se dissesse que alguns são pizzaiolos, nós avalizaríamos a sua afirmação, subscreveríamos a sua afirmação, porque realmente são aqueles que, impostos pelo Governo, integram CPIs para que nada investiguem. Esses são os pizzaiolos palacianos, são os pizzaiolos governistas, são os fiéis escudeiros, aqueles que, perdoem-me a figura de retórica, se comportam como fiéis cães de guarda do Governo da União, para protegê-lo a qualquer preço.

            Portanto, existem sim pizzaiolos, mas a generalização é injusta e tem que ser repudiada, porque ela afronta a instituição. Como não é a “Casa dos horrores”, mas existem horrorosos, não é uma pizzaria, mas existem os pizzaiolos. É evidente que essa constatação é real, e ela deve ser feita.

            Esse desejo de que a CPI termine em pizza tem que ser desmentido pelos fatos. Apesar da interferência do Governo, indevida, a CPI, mesmo antes da sua instalação, já apresentou resultados inquestionáveis. Um percentual bem superior de brasileiros hoje conhece irregularidades existentes na administração da empresa; antes, desconheciam. O debate que proporcionou a CPI fez com que brasileiros se informassem sobre o loteamento que houve da empresa entre partidários do Governo, causa primeira e fundamental para a precariedade da gestão que hoje se exercita, desqualificando, desprofissionalizando.

            O loteamento político coloca em cargos técnicos pessoas desqualificadas tecnicamente. Com isso, puxa para baixo a qualidade da gestão na empresa. De um lado, representantes do mundo partidário - vários Partidos nomeando, indicando - e, de outro lado, sindicalistas também ocupando o espaço nessa estratégia de cooptação desenvolvida pelo Governo do Presidente Lula. Portanto, é o aparelho mais organizado em nome de um projeto de poder nos últimos tempos. A Petrobras é uma aparelho preparado para dar sustentação a um projeto de poder. Isso justifica a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito, aliás, repito, só o anúncio da existência dela, o debate promovido em torno da sua instalação fez com que a imprensa revelasse outros fatos até então desconhecidos.

            E essa resistência do Governo à instalação da CPI passou a idéia de que o escândalo escondido é maior do que o escândalo conhecido.

            Qual é a função da CPI?

            É claro que as interpretações, muitas vezes distorcidas, levam a população a imaginar que toda CPI termina em pizza.

            Mas qual é a função da CPI? A principal delas é propor transparência, ou seja, é colocar o mal à luz, para que ele possa ser conhecido, identificado, investigado, combatido e, finalmente, condenado. Essa é a função essencial da CPI. Função preponderante também é a de convocar o Ministério Público, que tem autoridade para a investigação judiciária e para a responsabilização civil e criminal daqueles que se envolvem em ilícitos e praticam irregularidades.

            Na França, por exemplo, Senador Mão Santa, quando o Ministério Público começa a atuar, provocado por uma CPI instalada no Parlamento, ela se esgota. Isso é constitucional naquele país. A finalidade dela é convocar o Ministério Público à ação, é provocar o Ministério Público, para que investigue. Alcançado esse objetivo, ela se encerra, não continua os seus trabalhos.

            O que faremos como Minoria nessa CPI da Petrobras, oito a três? Convocaremos constantemente o Ministério Público a agir. Levaremos à CPI todas as denúncias, com o objetivo de investigar. Se a maioria impedir a investigação, nós formularemos representação assinada, subscrita pelos partidos de Oposição, que será encaminhada ao Ministério Público, que instaurará os procedimentos para a investigação judiciária, com a consequente...

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Eu queria dar-lhe uma contribuição. V. Exª conseguiu quantas assinaturas?

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Trinta e duas assinaturas.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - V. Exª tem poder de atrair os 32, eu assinei.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - É evidente que, além dos partidos políticos, nós podemos buscar a adesão e o apoio de Senadores e até mesmo de entidades que se sujeitarem ou que admitirem participar de um pleito dessa natureza, mas é a forma que encontramos para superar os obstáculos que estarão à nossa frente durante os trabalhos da CPI.

            A Minoria não pode desistir. Nós não vamos desistir; vamos levar a CPI. A CPI será o palco, para propor transparência para a publicidade dos fatos, e o Ministério Público será o instrumento adequado para a investigação judiciária. Se não realizamos a investigação na CPI, antecipamos o final dela, porque esse procedimento é normalmente adotado ao final dos trabalhos da CPI, quando há um relatório final, que é votado, aprovado e remetido ao Ministério Público.

            Nesse caso, nós nos anteciparemos e, caso a caso, estaremos formalizando representações que serão encaminhadas ao Ministério Público. Portanto, convocaremos o Ministério Público de forma antecipada a uma ação que, como consequência, terá, certamente, a responsabilização civil e criminal de pessoas envolvidas, se forem confirmadas as irregularidades anunciadas.

            Portanto, é uma forma, Senador Cristovam - vou conceder, já, já, o aparte a V. Exª -, de procedimento, para superarmos as dificuldades de sermos Minoria em uma CPI organizada para impedir a investigação.

            Concedo a V. Exª o aparte.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador Alvaro Dias, nós estamos concluindo o semestre, embora creia que, amanhã, ainda haja sessão - não é certo, Senador Mão Santa...

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Amanhã, às 9 horas. Há uma exigência de que os Senadores pelo Distrito Federal estejam aqui. V. Exª, que lidera, Adelmir Santana, Gim Argello e outros Senadores. Às 09 horas.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Certamente. Mas, Senador Alvaro Dias, creio que estamos concluindo o semestre com o tema fundamental deste semestre. Apesar de tantos projetos aprovados... Amanhã mesmo espero fazer a lista dos projetos, de minha autoria, que avançaram neste semestre, ou se transformando em projeto, ou indo já para a sanção, ou em andamento nas Comissões. Mas os temas centrais foram dois, na verdade, que é um só: a crise que vivemos no Senado e a desmoralização interna do Senado - e a desmoralização por força da intromissão do Poder Executivo aqui dentro. A simples crise que vivemos aqui dentro, por nossa culpa, já é bastante para levar o Senado a uma crise profunda de credibilidade. Agora, ao lado disso, poucos percebem que a intervenção do Presidente da República, com toda a sua força de 80% de popularidade e seu carisma - essa intromissão agrega um dado muito profundo, porque ele é mais permanente do que os outros. Amanhã nós podemos resolver essa crise que está aqui: se o Presidente José Sarney se licenciar; se conseguirmos levar adiante a CPI; se o Conselho de Ética analisar com rigor as acusações contra o Presidente José Sarney, mesmo que ele seja ou não inocentado; se fizermos as reformas. A gente resolve essa crise, mas há uma que vai ficar, Senador: é o fato de que o Presidente, do alto da sua posição de Chefe de Estado e de Governo, diz que os Senadores são fabricantes de pizza. Com todo o respeito aos fabricantes de pizza - e alguns de nós, aqui, poderia sê-lo nos finais de semana, não há problema nenhum -, mas a maneira como ele diz o assunto é a de que somos irrelevantes e que estamos aqui para fazer acordos, quase sempre espúrios, para esconder as coisas erradas deste País. Essa declaração dele vai ter uma conseqüência mais duradoura na desmoralização do Congresso do que todos os erros que cometemos, porque um Presidente sobretudo com dimensão do Presidente Lula, quando fala, é escutado. O que mais me preocupou nessa declaração dele é com o que os jovens passam a pensar de nós, Senadores, além do que já pensavam por nossa culpa. O que eles passam a pensar, quando um Presidente, com a autoridade de tal, diz que aqui o trabalho é irrelevante, ou seja, que o Congresso não tem nenhuma importância. Esse é um gesto profundamente antidemocrático, autoritário e de desprezo,

            Porque os militares nos acusavam de comunistas. Comunistas merecem respeito. É uma denúncia de crítica, de contradição, de enfrentamento, mas de respeito. A maneira como ele nos chamou de fabricantes de pizza não foi elogiando as nossas pizzas como cozinheiros que sejamos; foi no sentido de desmoralizar, de desqualificar o trabalho legislativo. E é por essa razão que, com um grupo que estava aqui hoje de manhã, fizemos um documento pedindo um voto de censura ao Presidente. Foi aceito pela Mesa, foi encaminhado à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e voltará, em algum momento, aqui ao Plenário. As pessoas me perguntam, sobretudo os jornalistas, qual é a consequência disso. Nenhuma concreta. Ninguém está querendo dar o golpe. Isso aqui é um regime presidencialista. Se fosse no parlamentarismo, o primeiro ministro cairia com o voto de censura; mas não é primeiro ministro, ele é Presidente. Ele tem mais seus dezoito meses de Governo, e ninguém vai tocar nesse Governo dele nem no seu mandato. E, se alguém quiser tocar, eu estou lá para defender o mandato dele. Agora, fica registrado o descontentamento hoje e fica registrado para a história inteira. Daqui a cinquenta anos, cem anos, alguém vai estudar a administração do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e vão estudar também a nossa história; e vai ficar registrado que nós protestamos contra um gesto de desprezo dele ao Congresso. Por isso que nós fizemos, sem nenhuma intenção de uma consequência imediata, mas de uma consequência histórica e moral, que eu acho que ele realmente precisa ouvir de nós.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Agradeço, Senador Cristovam Buarque. V. Exª me dá a oportunidade de voltar a este tema, porque, quando disse que vivemos aqui alguns lampejos de independência, eu o disse exatamente porque estava imaginando que esses momentos causam insatisfação ao Presidente da República. Ele não gosta disso. O Presidente, pelo seu comportamento, passa a idéia de que não está preparado para o exercício democrático. Ele é o Presidente da República, deveria levar em conta a liturgia do cargo, e não o faz. Ao contrário, procura banalizar uma instituição fundamental como é o Legislativo.

            O Presidente da República revela que possui alguns resquícios autoritários. Não é esse o comportamento de um democrata que respeita as opiniões contrárias e que, sobretudo, respeita a oposição. O Presidente se irrita muito com a oposição e ele deveria ser grato a ela, porque tem sido muito generosa com ele. Nós somos criticados por boa parte da sociedade brasileira porque não ousamos como oposição.

            Eu me lembro da CPI dos Correios, quando aqui chegou, sem ser convocado, o publicitário Duda Mendonça e fez declarações impactantes, que colocaram o Presidente da República em meio a ilícitos praticados durante a campanha eleitoral e durante o exercício do seu mandato na Presidência da República. Ao ouvir as acusações de Duda, eu vim àquela tribuna e disse: “Nós não podemos, de forma alguma, deixar de debater a possibilidade do impeachment do Presidente”. E eu elaborei um voto em separado naquela Comissão, que foi arquivado com a aprovação do relatório oficial do Deputado Osmar Serraglio, e, nesse voto em separado, propunha exatamente a instauração de um processo de impeachment.

            O Procurador da República, quando denunciou quarenta e falou em organização criminosa instalada no Governo Federal, deixou implícito o nome do líder dessa organização. Não há como não entender dessa forma.

            Portanto, o Presidente da República deveria ser grato à oposição. Nós não estamos pedindo a sua gratidão, mas nós estamos cobrando dele respeito à instituição. Não há como não interpretar como desrespeitosa à instituição a sua afirmação no dia de ontem, generalizando. E, quando se generaliza, atinge a instituição como um todo.

            Mas eu não quero, Sr. Presidente Mão Santa, exagerar no uso do tempo. Mas eu gostaria de dizer que o Presidente da República, ao que me parece, buscou uma forma de se contrapor às investigações com a antecipação do encaminhamento ao Congresso Nacional da sua proposta sobre a regulação do pré-sal.

            Trago à tribuna um editorial da Folha de S.Paulo que é oportuno, lúcido, isento e realista. Aborda exatamente essa iniciativa do Presidente Lula e diz que “a gestão Lula não elucida dúvidas cruciais do seu modelo para o pré-sal, projeto que correrá risco político no Congresso”.

            Leio apenas dois ou três parágrafos aqui.

O Palácio do Planalto, numa repisada tática de contrapropaganda, tentou distrair a atenção da opinião pública da CPI da Petrobras, instalada ontem, com o anúncio de um ‘fato positivo’ na área do petróleo. Encontrou às pressas um meio de divulgar o modelo exploratório proposto pelo Executivo para a vasta província do chamado pré-sal.

            Depois, diz aqui o editorial:

O Governo confirmou sua proposta já conhecida: pretende criar uma estatal para gerir os novos campos e adotar, ali, um modelo denominado partilha de produção. Nenhuma definição foi divulgada acerca do que mais importa: que parcela da riqueza extraída ficará com o Estado e como esses recursos públicos serão aplicados.

            Sr. Presidente, Senador Cristovam Buarque, nós queremos preservar a Petrobras como empresa de conceito nacional e internacional, até porque o Brasil vive este grande momento de uma descoberta que é resultante de mais de trinta anos de pesquisa, trinta anos de pesquisa, embora alguns pretendam atribuir ao atual Governo os méritos totais pela descoberta do pré-sal. Há trinta anos, mesmo quando o Presidente Geisel se posicionava contra a pesquisa, por não acreditar no seu sucesso, a Petrobras, numa demonstração de independência, pesquisava, e o resultado é essa descoberta de que, pelo que se avalia, tem o nosso País um patrimônio extraordinário nas profundezas do mar.

            Não somos favoráveis à criação de uma nova empresa. Nenhuma empresa, no mundo, domina a tecnologia de exploração de petróleo em águas profundas como a Petrobras. Nenhuma empresa do mundo está qualificada tanto quanto a Petrobras para o exercício dessa atividade. Portanto, não vejo razões para tanto. E as afirmativas que faço são resultantes da consulta a especialistas. Nós não somos donos da verdade, não. Não temos a arrogância de dar lições, de ensinar quem quer que seja. Mas a afirmativa fazemos com segurança exatamente porque tem respaldo na opinião dos especialistas mais credenciados para opinar sobre esse assunto. Então, não há razão para a constituição de uma nova empresa.

            Uma nova empresa, evidentemente, custará e, sobretudo, significará desmerecer a história da Petrobras. Eu não vejo por que desprezar a experiência técnica, a qualificação profissional dos extraordinários quadros funcionais da Petrobras, credenciados, capacitados, habilitados a enfrentar esse desafio do pré-sal.

            De outro lado, diz bem o editorial, o Governo não diz como pretende aplicar os recursos que serão públicos e destinados à União. Nós achamos que, neste caso, sim, competiria ao Governo constituir um fundo para a administração desses recursos, que, a nosso ver - tenho certeza de que o Senador Cristovam Buarque pensa da mesma forma -, deveriam ser recursos destinados de forma absoluta à educação. Nós estaríamos, dessa forma, assumindo um compromisso com o futuro do País se determinássemos - independentemente de quem venha a ser Presidente da República -, prioritariamente e antecipadamente, que os recursos oriundos da exploração do pré-sal, que pertencem à União, serão destinados exclusivamente à educação no Brasil. Eu creio que isso é fundamental. Se o Governo fizer isso, terá o nosso apoio. O nosso apoio não terá para a criação de um novo cabide de empregos. Isso, não! Para uma nova empresa, que possa se constituir com outros objetivos, não terá o nosso apoio, porque a Petrobras é suficiente para a administração desse desafio que virá.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Com prazer, Senador.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Só para dizer que o projeto que vincula os royalties do pré-sal à educação já existe; está caminhando aqui há quase seis meses, assinado pelo Senador Tasso Jereissati e por mim próprio. Esse projeto está aqui. Se o Governo quiser, basta um gesto dele que esse projeto é aprovado imediatamente. É o que estão fazendo alguns países, e está dando certo: utilizar a riqueza de hoje - que vai terminar, pois o petróleo acaba - para gerar uma riqueza permanente para amanhã, que é o conhecimento, até porque a única energia que existe é a do cérebro. O petróleo é uma lama; é preciso inteligência para transformar a lama em energia. O ar é o ar; é preciso inteligência para transformar o ar em energia, transformar o sol em energia, transformar a água em energia. É a inteligência que gera energia. Então, esse projeto já existe, e eu fico feliz que o senhor esteja trazendo o assunto. Bastaria o Governo querer fazer, mas não é o que, aparentemente, o Ministro de Minas e Energia disse. Ele disse em diversos investimentos e também na educação. Esse é um ponto. O segundo é que, embora eu e o Senador Tasso defendamos isso, não dá para esperar o pré-sal para começar a investir para valer em educação. O dinheiro do pré-sal ninguém sabe quando virá. Ninguém sabe; é uma hipótese ainda. E a educação está aí, sendo necessária, porque as crianças não vão esperar o pré-sal para começar a crescer. O Presidente Lula, por mais poder que tenha, não pode amanhã baixar uma medida provisória dizendo: crianças, vocês esperem para crescer depois que a gente perfurar o pré-sal, extrair e vender o petróleo para, então, colocar o dinheiro na escola. As crianças vão continuar crescendo, e o dinheiro da educação tem que sair já, embora tenha sido pensando lá na frente que esse projeto foi apresentado.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Cristovam.

            É evidente que esse projeto terá o nosso apoio e, lamentavelmente, o Governo não tem demonstrado esse interesse em prestigiar o Parlamento, assimilando projetos que aqui tramitam. Nós sabemos que o itinerário de um projeto como esse é tortuoso pelos escaninhos da atividade, mas nós achamos que há tempo ainda para o Governo rever esse posicionamento e definir com clareza a aplicação desses recursos.

            Senador Mão Santa, eu estou concluindo e quero pedir a V. Exª que autorize a publicação, na íntegra, deste editorial da Folha de S.Paulo a que fiz referência.

            Ao final deste editorial afirma-se o seguinte:

O Brasil não deveria imitar nações que afogam seu futuro no petróleo abundante do presente. É preciso assegurar hoje que o dinheiro do petróleo ajude a modernizar o país - para que se torne mais rico, justo e produtivo mesmo quando os postos do pré-sal estiverem exauridos.

            Sr. Presidente, espero que a CPI da Petrobras revele as mazelas existentes na empresa, mas que seja o instrumento para recolocá-la no patamar de competência técnica e qualificação profissional que fez a sua história de tantos anos.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SENADOR ALVARO DIAS EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Petróleo em partilha”, Folha de S. Paulo.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/07/2009 - Página 32747