Discurso durante a 156ª Sessão Especial, no Senado Federal

Comemoração ao Dia Internacional da Democracia.

Autor
Efraim Morais (DEM - Democratas/PB)
Nome completo: Efraim de Araújo Morais
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. ESTADO DEMOCRATICO.:
  • Comemoração ao Dia Internacional da Democracia.
Publicação
Publicação no DSF de 16/09/2009 - Página 43476
Assunto
Outros > HOMENAGEM. ESTADO DEMOCRATICO.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA INTERNACIONAL, DEMOCRACIA, INICIATIVA, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), OPORTUNIDADE, DISCUSSÃO.
  • REGISTRO, CONCLAMAÇÃO, UNIÃO INTERPARLAMENTAR, DEBATE, AMEAÇA, ESTADO DEMOCRATICO, AMERICA LATINA, COMENTARIO, ATUAÇÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, ARGENTINA, OFENSA, LIBERDADE DE IMPRENSA, INTIMIDAÇÃO, EMISSORA, TELEVISÃO, JORNAL, ANALISE, SITUAÇÃO, BRASIL, VIGILANCIA, DEMOCRACIA, COMPROMISSO, ESTADO DE DIREITO, ESPECIFICAÇÃO, DESEQUILIBRIO, PODERES CONSTITUCIONAIS, NECESSIDADE, APERFEIÇOAMENTO, RECUPERAÇÃO, CONFIANÇA, CLASSE POLITICA, BUSCA, JUSTIÇA, PACTO, FEDERAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, EXECUÇÃO ORÇAMENTARIA, REFORMA TRIBUTARIA.
  • COMENTARIO, RESPONSABILIDADE, LIDERANÇA, BRASIL, AMERICA LATINA, ANUNCIO, DECISÃO, CONGRESSO NACIONAL, INGRESSO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), QUESTIONAMENTO, ORADOR, DESCUMPRIMENTO, CLAUSULA, DEMOCRACIA, REQUISITOS, FILIAÇÃO, APREENSÃO, CRESCIMENTO, AUTORITARISMO, GOVERNO ESTRANGEIRO.
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ANTECIPAÇÃO, CAMPANHA ELEITORAL, FAVORECIMENTO, PERMANENCIA, PODER, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), PREJUIZO, DEMOCRACIA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. EFRAIM MORAIS (DEM - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente desta sessão, Senador Mão Santa; Senador Marco Maciel; Senador Fernando Collor; Srªs e Srs. Senadores; minhas senhoras e meus senhores; também cumprimento os nossos amigos e amigas do Coral do Senado Federal, que executaram o Hino Nacional; a nossa funcionária e cantora, Vanessa Pinheiro, que, acompanhada do violonista Fabiano Borges, trouxe-nos a bela cancão “Coração de Estudante”.

            O Dia Internacional da Democracia, instituído pela ONU em 2008, teve e tem como objetivo provocar nos países-membros - o que inclui o Brasil - reflexão constante a respeito do tema. Ao fazê-lo, a ONU deixou implícita a atualidade do velho adágio, segundo o qual “o preço da liberdade é a eterna vigilância”.

            Por sua vez, a União Interparlamentar - organismo internacional do qual sou presidente para o Brasil - conclama a todos os países-membros a participarem desse fórum de discussão.

            De fato, supor que a democracia é conquista livre de ameaças é não acompanhar o que se passa no mundo contemporâneo, onde ainda vicejam práticas autoritárias dos regimes fundamentalistas e marxistas. É ignorar mesmo o que se passa a nosso redor nesta sofrida América Latina.

            Há duas semanas, Sr. Presidente, senhoras e senhores, forças políticas, ligadas ao Presidente venezuelano Hugo Chávez, invadiram a sede da única emissora de televisão naquele país, a Globovision - que ainda exerce a liberdade de informar com independência -, e promoveram um quebra-quebra, agredindo funcionários e destruindo equipamentos, em sua fúria autoritária.

            Semana passada, em Buenos Aires, o jornal Clarín, que também exerce com independência seu ofício, foi visitado por um batalhão de fiscais tributários do governo, em nítida ação intimidatória, cuja intenção subjacente era silenciá-lo.

            No Brasil, vivemos, desde 1985, com a posse do Governo Sarney, o mais longo período de continuidade democrática desde a Proclamação da República. São 24 anos de democracia e 21 de uma Constituição que afirma que professamos o Estado democrático de Direito, e não apenas, como antes se afirmava, um Estado de Direito.

            A explicação de Estado democrático de Direito ressalta o compromisso de permanência na democracia, independentemente de ideologias ou de crises, por mais graves que sejam.

            O capítulo dos deveres e direitos individuais e coletivos da Constituição Federal de 1988 tem sido citado como um dos mais avançados o mundo. Temos liberdade de imprensa, liberdade de ir e vir, liberdade de organização partidária, liberdade ideológica. Significa, então, que não corremos riscos? Em tese, sim. Mas, na prática, não. Sabemos que há muito a aperfeiçoar, e, se não o fizermos, nos afastaremos do compromisso constitucional.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ainda somos governados por meio de medidas provisórias, que tornam esta Casa, em diversos momentos, mero cartório homologatório de decisões do Executivo. 

            A independência dos Poderes é constantemente ameaçada e ignorada em nosso País. Ainda testemunhamos, de maneira recorrente, a tentativa do Poder Executivo de tutelar os demais Poderes, sobrepondo-se a decisões que não lhe cabem ou que não deveriam ser compartilhadas.

            Há pouco, vimos a concessão por parte do Ministério da Justiça de refúgio político a um condenado por crimes comuns pela Justiça italiana e condenado também pelo Tribunal de Direitos Humanos da União Européia, que - diga-se de passagem - costuma ser generoso em suas avaliações.

            A Constituição brasileira atribui ao Supremo Tribunal Federal decidir se o criminoso é comum ou político. Pois bem, ignorando essa premissa, o Executivo ignorou a Constituição e sobrepôs-se ao Judiciário, concedendo o refúgio a um terrorista.

            Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, senhoras e senhores, eu poderia citar aqui outros exemplos análogos de sobreposição. O essencial, porém, é constatar que, embora já não padeçamos da moléstia autoritária, ainda temos muito a aperfeiçoar. A democracia entre nós ainda é obra em aberto.

            O descrédito que cerca hoje a atividade política - e que põe em risco a democracia, já que ela não existe sem Congresso e Partidos - mostra a imperfeição do nosso sistema político.

            A relação de troca e barganha que persiste entre governo e base parlamentar aliada expõe a atividade política à execração pública. Temos muito aí a examinar - e a reformar. Não se trata apenas de mexer na lei eleitoral, como o faz neste momento o Senado. Isso, claro, é importante, mas é apenas um aspecto do problema.

            O pacto federativo imperfeito e injusto exacerba o poder central e gera distorções na conduta dos agentes políticos.

            O próprio orçamento autorizativo, que dá ao Executivo a prerrogativa de decidir se cumprirá ou não a Lei de Diretrizes Orçamentárias que o Congresso anualmente aprova, é uma das fontes mais abundantes da corrupção na política brasileira.

            Somente um orçamento impositivo sanearia as práticas dali decorrentes, que tornam as emendas parlamentares objeto de barganha e tornam rotineiras as interferências do Executivo no Legislativo. Tudo isso corrói nossa democracia e a fragiliza.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vemos hoje as prefeituras do País em regime de falência, sem condições sequer de honrar a folha de pagamentos, em decorrência de o governo central ter, unilateralmente, concedido isenções altamente questionáveis de impostos que alimentavam o Fundo de Participação dos Municípios.

            Tratou-se de ato autoritário, decidido por tecnocratas em Brasília, sem anuência do Congresso, sem debate público e sem consulta aos interesses dos demais entes federativos.

            Há muito reclama-se uma reforma tributária justa e eficaz, sempre protelada, o que mantém o Governo central hipertrofiado em prejuízo da Federação. Tudo isso faz parte do debate democrático, que, como já disse, não se resume a um mero exame da legislação eleitoral, embora não a exclua.

            Em dezembro de 2007, esta Casa, em sessão histórica, revogou a CPMF, um imposto que julgou injusto e contraproducente. O Governo, que numa democracia tem que acatar a vontade soberana do Legislativo, não se conformou com a decisão e já providenciou um imposto análogo, a famosa Contribuição Social para a Saúde (CSS), para substituí-la. Ignora, assim, por meio de subterfúgios, o princípio segundo o qual não se pode apresentar numa mesma legislatura uma proposta já avaliada - e rejeitada. Isso é também agressão aos fundamentos da democracia.

            São questões que, como se sabe, há muito são objeto de queixas, denúncias e protestos, mas que raramente se articulam com o diagnóstico de que estão na base do desgaste de nosso sistema político. E que, por isso mesmo, devem integrar a reflexão em torno de nossa saúde democrática.

            Por todos esses motivos, julguei oportuno propor esta sessão solene, dando eco nesta Casa à decisão da ONU, de modo que o Senado Federal possa também dedicar a este tema - a democracia - alguns momentos de reflexão.

            Churchill tornou célebre a sentença segundo a qual a democracia é o pior dos regimes, excetuados todos os outros. Ou seja, não é perfeita, mas é o melhor que temos. Mais que isso, se não é perfeita - e não é -, cabe zelo contínuo e obstinado em preservá-la.

            Otávio Mangabeira, Sr. Presidente, cunhou outra imagem definitiva, comparado-a a uma “plantinha tenra”, que exige cuidados permanentes para que não morra. E esses cuidados não são apenas retóricos. Precisam ir às raízes dos males que a enfernizam e resultar em medidas terapêuticas eficazes.

            Quanto a isso, não basta olhar apenas as questões internas do País. É preciso cuidar também de sua política externa. É preciso levar em consideração a liderança regional que o País exerce e os parceiros que escolhe.

            Temos à nossa volta alguns governos - e citaria, além da já mencionada Venezuela, o Equador, a Bolívia e outros - que exibem conduta pouco ortodoxa (para dizer o mínimo) em relação à prática democrática. Ignoram, quando lhes é conveniente, a Constituição e não hesitam em recorrer à força para impor a vontade de seus governantes.

            Esta Casa será em breve, Sr. Presidente, chamada a decidir sobre o ingresso da Venezuela no Mercosul. Em circunstâncias normais, seria uma honra para nós, que integramos aquele bloco continental, contar com a parceria de um país-irmão.

            Ocorre que não podemos ignorar a cláusula democrática que condiciona a filiação. Se a ignorarmos, como fizemos em relação ao ingresso de Cuba na OEA, estaremos nos descuidando no trato da “plantinha tenra” de que falava Otávio Mangabeira.

            A liderança brasileira no Continente implica responsabilidade, pela influência que exerce. A escalada autoritária na América Latina é visível. Se, nas décadas de 60 a 80, essa escalada se deu pela direita, agora se dá pela esquerda.

            O bolivarismo, propagado por Chavez, é de índole autoritária e já se mostrou incompatível com a democracia. E vemos, da parte do Governo brasileiro, explícita simpatia e apoio ao Governo Chavez. E isso nos preocupa.

            Achamos que é o ambiente democrático que saneia os extremismos, permite que as diversas facções ideológicas encontrem pontos de equilíbrio e interlocução e propicia o aprimoramento das instituições. Os partidos alternam-se no poder, sem prejuízo da saúde das instituições, que devem pairar acima dos interesses de facção.

            O que percebemos, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que percebemos, no entanto, é bem diferente. A tentativa de perpetuação no poder. Falou-se, inicialmente, em terceiro mandato para Lula, com a apresentação de duas PECs na Câmara, por parte de correligionários do Presidente, a exemplo do que fazem Hugo Chávez e Evo Morales.

            Constatada a reação em contrário - não só desta Casa, mas da própria sociedade -, antecipou-se a campanha eleitoral, com o Presidente lançando prematuramente sua candidata e vinculando seu nome a um conjunto de obras, o PAC, que constitui a sua plataforma eleitoral.

            Até o pré-sal, Sr. Presidente, patrimônio do povo brasileiro, vincula-se à questão eleitoral. Também isso viola a prática democrática, que prevê a isonomia entre os candidatos e um calendário eleitoral a ser observado - o que não ocorre.

            O uso da máquina estatal em favor de candidatos ou facções é outra prática antidemocrática, que se serve da democracia para desmoralizá-la. Não há democracia sem isonomia, assim como não há democracia que incentive a luta de classes. E isso tem sido negligenciado no Brasil.

            Por tudo isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esta sessão solene - que, espero, se consagre na agenda do Senado - é bem mais que um evento protocolar.

            É uma oportunidade de reflexão em defesa da política e da sociedade brasileira, que hoje tem dela uma impressão negativa, mas que precisa saber que só se saneia a democracia com mais democracia - o que equivale a dizer que os males da política só encontram cura na própria política.

            É este, Srªs e Srs. Senadores, é este o testemunho que aqui deixo, na certeza de que, na linha do pensamento de Churchill, se a democracia produz sequelas, nenhuma é maior que as que ajuda a evitar.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. (Palmas.)


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