Discurso durante a 143ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Denúncias de subordinação da Petrobras a interesses políticos e eleitorais, que poderiam levar o País a prejuízos irrecuperáveis. Repercussão a artigo publicado no diário britânico Financial Times, que alerta para o risco de o Presidente Lula "por em risco seu legado" por conta das polêmicas envolvendo as políticas de seu governo para o petróleo.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA. ELEIÇÕES.:
  • Denúncias de subordinação da Petrobras a interesses políticos e eleitorais, que poderiam levar o País a prejuízos irrecuperáveis. Repercussão a artigo publicado no diário britânico Financial Times, que alerta para o risco de o Presidente Lula "por em risco seu legado" por conta das polêmicas envolvendo as políticas de seu governo para o petróleo.
Publicação
Publicação no DSF de 19/08/2010 - Página 42477
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA. ELEIÇÕES.
Indexação
  • CRITICA, GESTÃO, GOVERNO FEDERAL, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), MANIPULAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), SENADO, IMPEDIMENTO, EFETIVAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, EFEITO, SAIDA, BANCADA, OPOSIÇÃO, REGISTRO, ENCAMINHAMENTO, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, ATUAÇÃO, EMPRESA ESTATAL.
  • PROTESTO, REGIME DE URGENCIA, PROPOSIÇÃO, REGULAMENTAÇÃO, EXPLORAÇÃO, PETROLEO, RESERVATORIO, SAL.
  • APREENSÃO, PROCESSO, CAPITALIZAÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), QUESTIONAMENTO, CAPACIDADE, INVESTIMENTO PUBLICO, LEITURA, TRECHO, DOCUMENTO, OPINIÃO, ESPECIALISTA, EXPOSIÇÃO, RISCOS, PLANO, EXPLORAÇÃO, PETROLEO, RESERVATORIO, SAL, CRITICA, ORADOR, SUBORDINAÇÃO, EMPRESA ESTATAL, INTERESSE, NATUREZA POLITICA, ELEIÇÕES, GRAVIDADE, DESVALORIZAÇÃO, AMBITO, BOLSA DE VALORES.
  • QUESTIONAMENTO, PROMESSA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONSTRUÇÃO, REFINARIA, ESTADO DO MARANHÃO (MA), ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DESRESPEITO, ESTUDO TECNICO, FALTA, PRIORIDADE.
  • LEITURA, TRECHO, ENTREVISTA, ECONOMISTA, PAIS ESTRANGEIRO, GRÃ-BRETANHA, CRITICA, GOVERNO BRASILEIRO, MANIPULAÇÃO, INFORMAÇÃO, CAPACIDADE, PRODUÇÃO, PETROLEO, OBJETIVO, FAVORECIMENTO, CANDIDATO, SUCESSÃO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, RISCOS, COMPROMETIMENTO, ECONOMIA, BRASIL.

            O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, já há um bom tempo estamos questionando o comportamento do Governo na administração da Petrobras, que vem promovendo um gerenciamento que consideramos claudicante e que semeia, de certa forma - isso nós podemos afirmar com certa tranquilidade -, situações complexas para o futuro.

            Refiro-me também ao plano ético, já que propusemos uma CPI, que foi instalada no Senado Federal e, depois, foi manipulada pelo Governo, com todas as suas forças, para impedir que as investigações se aprofundassem, o que obrigou a oposição a dela se retirar para não compactuar com a farsa ensaiada. Encaminhamos ao Procurador-Geral da República dezoito representações com as denúncias mais graves que encontramos nesse ensaio de investigação que pudemos realizar.

            Mas não é só essa a questão. Nós debatemos - e a oposição tentou resistir ao regime de urgência imposto pelo Governo - os projetos que dizem respeito à descoberta do pré-sal: a exploração do pré-sal, a regulação para a exploração do pré-sal, a nova legislação instituída e a empresa criada, a capitalização proposta, o regime de capitalização da empresa que aprovamos aqui - contra o nosso voto, contra o nosso desejo evidentemente. E é sobre isso que venho hoje à tribuna falar.

            O Governo anuncia, para daqui a alguns dias, o ato oficial para a capitalização da empresa, e esse anúncio está provocando dúvidas que dizem respeito exatamente a esse processo de capitalização. O Governo cederá até cinco bilhões de barris de petróleo para aumentar a sua participação acionária na empresa, já que não possui recursos para essa capitalização.

            As dúvidas que esse processo está provocando levaram, por exemplo, o maior investidor individual, o bilionário George Soros, a vender todos os seus papeis da empresa. Isso revela preocupação em relação ao processo de capitalização da Petrobras.

            Há algum tempo, estamos denunciando a subordinação da Petrobras a interesses políticos e eleitorais. Isso não é saudável para o desenvolvimento nacional. A carnavalização do pré-sal vem gerando nos grupos técnicos, integrados pelos profissionais de carreira da empresa, sérias preocupações. Por 38 anos, de 1963 a 2001, o engenheiro Newton Reis Monteiro foi competente servidor da Petrobras. Nessa época, fez pós-graduação em Engenharia de Petróleo pela Universidade de Stanford. De 2001 até 2008, foi integrante do corpo técnico da Agência Nacional do Petróleo. As suas observações são contundentes, e eu as leio agora.

1 - A campanha para a exploração do pré-sal terá de ser revista. Até porque é necessário saber o que vai ocorrer no Brasil. Se o país continuar a crescer e o pré-sal continuar com projeções para dez anos, corremos o risco de perder a autossuficiência;

2 - De uns anos para cá, a Petrobras perdeu grande parte do pessoal especializado. De acordo com a turma de recursos humanos, quase 50% do pessoal da Petrobras tem cinco anos de experiência. São caras competentes, mas falta vivência. Em petróleo há muito de empirismo e de experiência.

3 - Nos anos 60, quando a gente entrava na Petrobras, precisava fazer curso intensivo de inglês para poder falar com os chefes. Não vamos ter gente para tocar tantos projetos. Caso contrário, vamos voltar ao passado, quando entrávamos em uma plataforma e só tinha gringo.

            Nos últimos meses, com a desvalorização acionária, a Petrobras teve seu valor de mercado encolhido em US$52,9 bilhões - isso tem de ser ressaltado - em função da política adotada pelo Governo e que, na nossa visão, guarda uma relação estreita com os interesses políticos eleitoreiros.

            Por exemplo, não se pode concordar com a atitude de se tomar uma reserva prevista como se fosse reserva provada e anunciá-la espetaculosamente, como se estivéssemos diante de uma riqueza incalculável, capaz de resolver todos os problemas econômicos e sociais do nosso País ad eternum. Dessa forma, o Governo colocou a descoberta do pré-sal, que vem sendo trabalhada, que tem sido a causa de investimentos significativos da Petrobras há cerca de trinta anos, que não é uma coisa recente, que não é uma obra do atual Governo, mas uma obra que vem, há décadas, sendo trabalhada por vários governos que se sucederam na República desde o General Ernesto Geisel.

            Portanto, essa política de utilização da empresa como ícone vai atrás do interesse eleitoral, vai desgastando a empresa, vai comprometendo seu patrimônio. E este é um fato real, de visibilidade indiscutível: a Petrobras encolheu nos últimos meses com a desvalorização acionária da ordem de US$52,9 bilhões. As incertezas e indefinições sobre o seu processo de capitalização pela emissão de novas ações, no valor de US$50 bilhões, vêm afetando a valorização dos seus papeis - por isso citei o Sr. George Soros, que é o maior investidor da empresa e que vendeu todos os seus papeis; ele não quer correr riscos.

            O Governo, acionista majoritário, não tendo recursos necessários para aportar no novo aumento de capital, optou, via Congresso, pela cessão onerosa à Petrobras de reservas de petróleo e gás ainda a serem exploradas na camada do pré-sal, em volume equivalente a cinco bilhões de barris de óleo. Até agora, a Agência Nacional do Petróleo, encarregada de identificar os reservatórios para a cessão onerosa, não se manifestou. E o que é fundamental: o volume de reservas exige certificação internacional. Vale dizer, na capitalização da empresa, a União subscreverá as suas ações com saque no futuro. Enquanto os acionistas minoritários subscreverão na proporcionalidade das ações possuídas em dinheiro vivo, o Governo subscreve com base em saque no futuro.

            Paralelamente, na área de refino, objetivos políticos eleitoreiros expressados pelo próprio Presidente da República determinam investimentos desaconselháveis. Seria a construção de quatro novas refinarias no Maranhão, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Rio de Janeiro. Diante do anúncio de uma obra desse porte, quem da oposição vai contestar? Ficará na contramão do desejo da população local, mas, em termos estratégicos, pensando no País, são investimentos desaconselháveis - isso analisado tecnicamente e não com viés eleitoreiro. Eu repito: numa campanha eleitoral, num ano eleitoral, em meio ao processo eleitoral, quem ousaria discordar do Governo, que anuncia empreendimentos desse porte em Estados como Maranhão, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Rio de Janeiro?

            Atendendo a demagogia de governadores, investe contra os estudos e orientação técnica da empresa que sustentam que as refinarias existentes atendem a demanda no Brasil - essa é a opinião de um especialista, não é a minha opinião, não é a opinião do político, é a opinião do técnico, do estudioso.

            No jornal Valor, o próprio Lula afirmou que determinou a mudança dos planos da Petrobras. Ao atropelar o parecer técnico da estatal que sustenta existir capacidade técnica mais do que suficiente nas atuais refinarias para atender a demanda, deixa uma bomba de efeito retardado que terá de ser desarmada, já que será investimento onde não há prioridade.

            E vejam, o próprio Presidente da República assume publicamente a interferência indevida. É evidente que um Presidente da República tem a última palavra em qualquer decisão de Estado, mas, obviamente, cabe a ele responsavelmente atender aos aconselhamentos técnicos. No entanto, na medida em que ele desconsidera o aconselhamento técnico, está desautorizando a equipe de especialistas que, constituindo o corpo técnico da Petrobras, delibera o que é mais importante para a empresa e para o País, e não para o projeto eleitoral comandado pelo Presidente da República. Não há como não denunciar esse fato.

            A responsabilidade da oposição é informar a opinião pública sobre as atitudes do Governo e, neste caso, o Governo adota um caminho que contraria os interesses nacionais, os interesses do povo brasileiro.

            Nos próximos anos, a Petrobras se defrontará com o mais gigantesco programa de investimento petrolífero em todo o mundo. Para isso terá de agenciar recursos humanos, tecnológicos e financeiros crescentes. Competência e capacidade para ser exitosa nesses desafios, a empresa tem, e as tem comprovadamente, comprovou-as ao longo de sua história. Daí a necessidade de priorizar os seus investimentos na exploração do pré-sal, na expansão da Bacia de Campos, em oleodutos, em transportes e na petroquímica, banindo a nociva subordinação da empresa aos objetivos políticos dos governantes de plantão.

            Veja que essa postura do Presidente Lula e do seu governo repercute internacionalmente. Em artigo no influente diário britânico Financial Times, o diretor-executivo do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial, Norman Gall, alerta para o risco de o Presidente Lula “por em risco seu legado” por conta das polêmicas envolvendo as políticas de seu governo para o petróleo. Essa é a repercussão internacional.

            Intitulado “Euforia com o petróleo põe em risco o legado de Lula”, o texto encadeia argumentos críticos ao que o autor considera serem ambições de “escala demasiadamente grande e perfil demasiadamente alto” assumidas pela Petrobras em sintonia com os benefícios políticos para o Governo. É o espetáculo do anúncio, é a festa da inauguração de projetos que, muitas vezes, ficam pelo caminho e não são concluídos.

            Diz o artigo: “Lula está usando a imagem do Brasil como potência petroleira emergente como uma arma política, invocando sentimentos de triunfalismo para ajudar a levar o PT à vitória (eleitoral).

            Em outro trecho, o acadêmico afirma: "Da mesma forma que (na legenda) Ícaro viu suas asas de cera derreterem quando voou perto demais do sol, Lula está arriscando seu legado à medida que as polêmicas se multiplicam em relação às suas políticas petroleiras".

            Entre as controvérsias tratadas pelo artigo, está o que o autor denomina uma "estranha política da descoberta", afirmando que a candidata do Governo à Presidência, Dilma Rousseff, estava à frente do conselho de administração da Petrobras justamente quando o Governo preparava o projeto do pré-sal, que dará mais poderes à estatal sobre as novas reservas.

            A outra questão, para o autor, é a segurança. "A explosão do poço Macondo, da BP, em abril, expôs as dificuldades de exploração petrolífera em águas profundas”, diz.

            Situadas a uma profundidade muito maior no oceano - e bem mais distantes da costa que os poços da BP -, as reservas da Petrobras colocam para a empresa “desafios logísticos” de escala muito mais impressionante, argumenta Gall. Além dos desafios logísticos, obviamente, o custo elevado pode inviabilizar projetos de exploração, especialmente porque a moldagem preferida pelo Governo Lula na formatação do modelo diz respeito a investimentos públicos maiores do que a legislação anterior estabelecia, já que havia um estímulo a investimentos não públicos na exploração do petróleo no País. O sistema adotado priorizou a aplicação de investimentos públicos, que são escassos em nosso País.

            O artigo lembra que a legislação do pré-sal coloca a estatal como operadora única dos campos de petróleo descobertos na área e que os ambiciosos planos da empresa vão requerer investimentos de US$224 bilhões no médio prazo - é o que dizia: o Estado brasileiro terá de aportar recursos volumosos.

            “As necessidades financeiras da companhia são tão grandes agora que fazem parecer pequena a capacidade de investimento do governo federal do Brasil, em um país que precisa desesperadamente gastar mais em infraestrutura e educação.” E nós temos de lembrar aqui que a própria Petrobras tem se socorrido até mesmo de empréstimos junto à Caixa Econômica Federal para fechar o caixa em determinados momentos. Esse fato foi razão de debate aqui no plenário do Senado Federal em mais de uma oportunidade.

            Para Normal Gall, isso também deve “tirar recursos de outras prioridades”, como a Copa do Mundo de 2014, as Olimpíadas de 2016, a hidrelétrica de Belo Monte e o trem-bala entre Rio e São Paulo.

Quando Lula chegou ao poder, em 2003, teve a sabedoria de reconhecer que os brasileiros não aceitariam um retorno à inflação crônica que impediu seu bem-estar durante décadas. Os críticos agora argumentam que o aumento no gasto público, junto com as polêmicas financeiras envolvendo as descobertas de petróleo, pode significar um infeliz retorno ao passado, [escreveu].

Se o Brasil não endireitar suas prioridades, Lula pode descobrir em breve que sua reputação está afundando à mesma profundidade que as reservas de petróleo que tanto entusiasmaram seu país.

            Esse é um alerta que vem de longe, a par do que aqui ocorre quase diariamente, na voz de poucos, evidentemente, porque a oposição, de certa forma, foi dizimada no País. Restaram poucos na oposição. Ela é tão necessária e imprescindível quanto é necessário o Governo. Infeliz o País sem uma oposição responsável, crítica, corajosa, investigativa, fiscalizadora. Nós não nos cansamos de alertar o Governo, praticamente todos os dias, mas sabemos que estamos cumprindo o nosso dever. Em relação à Petrobras, sobretudo, nossa convicções estão arraigadas já há um bom tempo e não podemos ignorá-las. O Governo está caminhando por caminhos tortuosos que podem levar o País a prejuízos irrecuperáveis.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/08/2010 - Página 42477