Discurso durante a 106ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro da realização da 100ª Conferência Internacional do Trabalho, em Genebra, Suíça, onde foi aprovada convenção que confere aos trabalhadores domésticos os mesmos direitos dos demais trabalhadores.

Autor
Ângela Portela (PT - Partido dos Trabalhadores/RR)
Nome completo: Ângela Maria Gomes Portela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EXERCICIO PROFISSIONAL.:
  • Registro da realização da 100ª Conferência Internacional do Trabalho, em Genebra, Suíça, onde foi aprovada convenção que confere aos trabalhadores domésticos os mesmos direitos dos demais trabalhadores.
Publicação
Publicação no DSF de 23/06/2011 - Página 25292
Assunto
Outros > EXERCICIO PROFISSIONAL.
Indexação
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, CONFERENCIA INTERNACIONAL, ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT), PAIS ESTRANGEIRO, SUIÇA, APROVAÇÃO, CONVENÇÃO, GARANTIA, DIREITOS, TRABALHADOR URBANO, EMPREGADO DOMESTICO, EXPECTATIVA, VALORIZAÇÃO, EXERCICIO PROFISSIONAL, BRASIL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            A SRª ANGELA PORTELA (Bloco/PT - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, é com muita satisfação que venho hoje a esta tribuna para registrar um evento que considero histórico para todos os brasileiros e brasileiras e, especialmente, para aqueles mais de 7 milhões que vivem do trabalho doméstico e que, de forma injustificável, não têm os mesmos direitos das demais categorias profissionais.

            Essa realidade começa a mudar. Durante a 100ª. Conferência Internacional do Trabalho, em Genebra, na Suíça, os países membros da Organização Internacional do Trabalho-OIT, aprovaram na última quinta-feira, 16, uma convenção que confere aos trabalhadores domésticos os mesmos direitos dos demais trabalhadores.

            Trata-se de um avanço notável no reconhecimento de direitos e melhoria das relações de trabalho para uma categoria que, no Brasil, é formada majoritariamente por mulheres e, mais ainda, mulheres negras e pobres, o que evidencia, como já afirmamos neste Plenário, a precarização do trabalho doméstico de um modo geral.

            As mulheres correspondem a 93% dos trabalhadores domésticos no Brasil e mais de 60% delas são negras. Dos 7 milhões de trabalhadoras domésticas, apenas 26% têm carteira assinada e, mesmo estas não desfrutam dos mesmos direitos assegurados na CLT, a Consolidação das Leis do Trabalho.

            Por essas e outras razões, Sr. Presidente, a equiparação das trabalhadoras domésticas às demais categorias é uma das principais bandeiras do meu mandato parlamentar. Na Câmara dos Deputados, apresentamos em 2010 o Projeto de Lei 7570, que estabelece a duração do trabalho, não superior a oito horas diárias e 44 semanais, assim como assegura o pagamento de horas extras, adicional noturno, salário-família, entre outros direitos que regulam as relações de trabalho no nosso País.

            Uma vez que este projeto não passou ainda pela análise da Câmara dos Deputados e, diante das novas orientações da Organização Internacional do Trabalho, estamos apresentando nesta Casa uma Proposta de Emenda à Constituição com as mesmas características.

            Este é o caminho adequado para que o Brasil, que já sinalizou na OIT o interesse de estender os direitos trabalhistas às domésticas, possa ratificar a convenção aprovada na semana passada em Genebra.

            A despeito dos avanços alcançados após a Constituição de 1988, que assegurou uma série de direitos antes negados aos trabalhadores e trabalhadoras domésticas, ainda existe muito a ser feito no sentido de aprimorar a legislação federal para que estes possam alcançar as mesmas condições de trabalho, o mesmo nível de proteção social dos demais.

            A Lei 5.859, de dezembro de 1972, portanto com quase 40 anos, representa um retrato fiel da época, trazendo ainda o ranço do machismo e do viés escravista da nossa sociedade. Esta lei confere aos trabalhadores domésticos férias de 30 dias com pagamento de um terço adicional, estabilidade para gestantes até cinco meses após o parto e o registro no Instituto Nacional do Seguro Social para efeitos de aposentadoria e outros benefícios.

            Com a Constituição de 1988, esses direitos foram ampliados. Foi assegurado aos trabalhadores e trabalhadoras domésticas o salário mínimo, 13º. salário, a irredutibilidade salarial, repouso remunerado, licença maternidade de 120 dias e aviso prévio.

            No entanto, nem a Lei 5.859 nem a Constituição Federal tratam de temas como a jornada de trabalho noturna e o pagamento de horas extras. Essa é uma das razões que fazem com que a carga horária dos trabalhadores e trabalhadoras domésticas chegue a 58 horas semanais, na média. Isto representa 14 horas a mais, por semana, que os demais trabalhadores já protegidos pela legislação, cuja carga horária é de 44 horas semanais.

            Além disso (e o que é ainda mais cruel), as domésticas não têm assegurada a inclusão no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), ficando alijadas da possibilidade de recebimento da multa por demissão sem justa causa e, pior ainda, sem poder recorrer ao Seguro Desemprego, sabendo-se que a rotatividade dos trabalhadores domésticos é uma das maiores no universo do trabalho remunerado.

            Esses são os direitos que ainda são negados, Sr. Presidente e que, agora, o Brasil tem a obrigação de estender a todos os trabalhadores brasileiros, uma vez que nosso país foi um dos principais defensores, no âmbito da OIT, da Convenção do Trabalho Doméstico.

            Nem vamos entrar aqui na questão do preconceito, da discriminação, das dificuldades enfrentadas por milhões de trabalhadoras domésticas deste país, que vão desde as cargas de trabalho abusivas, as duplas e triplas jornadas, os constrangimentos a que são submetidas, enfim... tantas situações que foram muito bem retratadas em recente e amplo estudo realizado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas-IPEA, e que já abordamos aqui neste Plenário em pronunciamento anterior.

            O que queremos, neste momento, é deixar registrada a decisão da Organização Internacional do Trabalho, com o apoio do Brasil, de estender às domésticas os mesmos direitos dos demais trabalhadores. É um passo importante, mas há outros e ainda mais necessários, sendo o mais urgente a ratificação desta Convenção aprovada em Genebra pelo nosso Congresso Nacional. O Brasil tem tudo para sair na frente, para ser o primeiro país a ratificar tal acordo.

            Neste sentido, pedimos o apoio dos demais colegas para avançarmos nesses entendimentos rapidamente, para aprovarmos a Proposta de Emenda à Constituição que pode promover melhoria significativa nas relações de trabalho em nosso país, colocando fim a esta discriminação desnecessária e anacrônica que existe contra os trabalhadores domésticos.

            Todos nós sabemos da importância destas profissionais, das diaristas, babás, motoristas, jardineiros, tantas atividades tão necessárias no nosso dia a dia. São estas profissionais, que atuam exclusivamente nos nossos lares, que desfrutam da nossa inteira confiança, que cuidam das crianças, do preparo das refeições, são eles e elas que permitem a milhões de brasileiros e brasileiras ausentar-se do lar, todos os dias, em busca de novas oportunidades econômicas e financeiras.

            Sem os trabalhadores e trabalhadoras domésticas, a emancipação feminina, tão festejada como um retrato de nossa época, não seria possível. A conquista do mercado de trabalho pelas mulheres - 40 milhões de brasileiras, para ser exata -, não teria se dado na velocidade em que ocorreu se não fosse o inestimável apoio destas profissionais que assumem muitas de nossas atribuições como donas de casa e mães de família.

            Ao equiparar os trabalhadores domésticos aos demais, o Brasil estará corrigindo uma injustiça sem tamanho e, mais importante, estará marcando um novo momento em nosso tão mencionado processo civilizatório.

            É, portanto, com muita alegria, como já disse, Sr. Presidente, que venho a esta Tribuna para registrar a decisão da Organização Internacional do Trabalho, com 396 votos favoráveis e apenas 16 votos contrários.

            Estamos agora diante de uma oportunidade inédita de promover os trabalhadores e trabalhadoras domésticas à cidadania plena. Tenho certeza que esta Casa, que todos aqui compreendem a importância de, rapidamente, incorporar esta decisão à nossa legislação para que, nunca mais neste país, tenhamos trabalhadores de primeira e de segunda classes.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigada.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/06/2011 - Página 25292