Discurso durante a 164ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre carta da Sra. Jacy Raduan encaminhada à Presidente Dilma Rousseff sobre o sequestro internacional de seus filhos.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS. POLITICA INTERNACIONAL.:
  • Comentários sobre carta da Sra. Jacy Raduan encaminhada à Presidente Dilma Rousseff sobre o sequestro internacional de seus filhos.
Publicação
Publicação no DSF de 21/09/2011 - Página 38415
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS. POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, JORNALISTA, REDE DE TELECOMUNICAÇÕES, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), MOTIVO, MATERIA, TELEVISÃO, ASSUNTO, SEQUESTRO, FILHO, AUTORIA, PAI, PAIS ESTRANGEIRO, ALEMANHA, REGISTRO, PEDIDO, MÃE, NACIONALIDADE, BRASIL, DEVOLUÇÃO, CRIANÇA.
  • LEITURA, ORADOR, CARTA, REMESSA, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ASSUNTO, PEDIDO, AUXILIO, MÃE, OBJETIVO, DEVOLUÇÃO, FILHO.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Walter Pinheiro, quero aqui cumprimentar o jornalista do Conexão Repórter, do SBT, Roberto Cabrini, por ter tido a iniciativa de realizar uma reportagem que lhe deu grande trabalho, a respeito da Srª Jacy Raduan-Berger.

            Ele se deslocou do Brasil até a Alemanha para verificar, in loco, a dificuldade imensa dessa senhora brasileira, mãe de duas crianças, que está batalhando para que possa ter seus dois filhos de 3 e 5 anos perto dela.

            Ela, inclusive, foi à Comissão de Direitos Humanos, presidida pelo Senador Paulo Paim, e ali recebeu todo o apoio da Senadora Marta Suplicy, da Senadora Angela, da Senadora Ana Rita e de diversos Senadores. Prestou um depoimento importante e, em seguida, esteve com a Ministra Maria do Rosário, relatando os fatos que agora são objetos de carta que ela enviou à Senhora Presidenta Dilma Rousseff, e solicitou-me que eu encaminhasse essa carta nos seguintes termos:

Senhora Presidenta,

Ao cumprimentar Vossa Excelência, encaminho correspondência da Senhora Jacy Raduan-Berger que, como mãe de duas crianças de 3 e 5 anos, passa por situação de grande dificuldade e aflição e solicita a vossa interferência junto à Chanceler da Alemanha Angela Merkel, com o fito de reassumir a guarda e poder repatriar seus filhos, retidos na Alemanha, para o Brasil, conforme correspondência anexa.

O tema já foi levado pela Srª Jacy ao conhecimento da Ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário, que se comprometeu a envidar todos os esforços no sentido de trazer as crianças de volta para o Brasil.

Certo da atenção de Vossa de Excelência, despeço-me.

Cordialmente,

Senador Eduardo Matarazzo Suplicy.

             

            E eis a carta da Srª Jacy Raduan:

A

Excelentíssima Senhora Presidenta da República

Dilma Rousseff

Assunto: Sequestro internacional dos menores Giacomo e Gustavo Raduan Berger.

Senhora Presidenta,

É com grande esperança que me dirijo a Vossa Excelência apelando por interferência a fim de repatriar meus filhos que estão retidos na Alemanha.

Na condição de cidadã brasileira que está retida na Alemanha, em virtude de apreensão dos Passaportes de seus filhos venho a relatar os seguintes fatos e, afinal, encarecer a ajuda de V. Exª:

Sou brasileira nata, com dupla nacionalidade - brasileira e alemã. Formada em direito em São Paulo vim fazer o curso de Mestrado na Alemanha, onde conheci e me casei com um advogado Alemão, tive com ele dois filhos, que têm dupla nacionalidade - brasileira e alemã. Os assentamentos de casamento e nascimento de meus filhos foram registrados em São Paulo.

Aproximadamente dois anos após o casamento dada a dificuldade financeira que estávamos passando, por sugestão de meu ex marido, resolvemos nos mudar para São Paulo, onde teríamos melhores condições de vida, com casa própria e trabalho para mim em escritório de advocacia da família.

Assim é que entregamos o apartamento onde morávamos, vendendo o automóvel de minha propriedade e de uso da família e nos desfizemos de tudo que possuíamos na Alemanha.

Nos instalamos na casa dos meus pais enquanto eu reformava uma casa de minha propriedade, para uso de nossa família, passamos a nos utilizar de automóvel, adquirido por uma sociedade de advogados da qual sou sócia, matriculamos nosso filho em escola curricular e eu assumi intenso trabalho, no patrocínio de inúmeras ações judiciais, enquanto meu marido enviava currículos em busca de trabalho.

Tudo caminhava conforme o esperado, a exceção do relacionamento conjugal que se deteriorava.

Meu marido resolveu voltar para a Alemanha enquanto meus filhos e eu continuamos morando em São Paulo, onde havíamos fixado domicílio.

Promovi uma ação de divórcio, ainda em tramitação, onde obtive a guarda provisória dos filhos.

Decorrido um ano de permanência em São Paulo, o pai insistiu que eu levasse os filhos para visitá-lo, dando garantia de retorno com autorização de viagem obtida no Consulado de Munique.

Com as garantias dadas e a Sentença brasileira de guarda provisória dos filhos, resolvi atender aos seus apelos e viajei para a Alemanha, durante as férias escolares, com compromisso de retorno depois de dois meses.

Aqui chegando, verifiquei que havia sido armada uma cilada. Meu ex-marido, agindo com perfídia, promoveu um procedimento cautelar judicial, alegando que eu pretendia fugir com meus filhos para o Brasil, obteve da Justiça alemã uma liminar de apreensão dos Passaportes de meus filhos, que a partir de então ficaram impedidos de saírem da Alemanha. A partir desse momento, fui torturada psicologicamente pelo Governo Alemão que, desde então, ameaça a tirar meus filhos da família se eu continuar querendo criar meus filhos e, para isso, lutar.

Os filhos foram entregues ao pai, que passou a sonegar o direito de visita à mãe. Razão porque fora tirado dele o direito de estabelecer o local de residência das crianças, cujo direito foi entregue ao Juizado de Menores da cidade onde residimos, Baden-Baden.

Durante algum tempo os filhos passavam 50% com cada um dos genitores mas, face a proposital postergação no julgamento do processo, solicitei permissão judicial para levar meus filhos em viagem para São Paulo, por um período que a Justiça entendesse por razoável, com ampla garantia de retorno, a fim de que eles não perdessem por completo os vínculos sociais e afetivos que tinham no Brasil.

Na audiência para julgamento de minha pretensão, além da negativa da viagem, fora determinada a imediata e abrupta retirada de meus filhos, com a entrega ao pai, para o convívio de 100% do tempo, num ato de coação irresistível, sem me darem a oportunidade de sequer poder me despedir. Senti naquele momento uma incrível dor pela perda de meus filhos, que calou meu coração e minha alma, sem ter tido a oportunidade de prepará-los para este ato violento de isolamento. Passou pela minha cabeça a imagem dos filhos que eram retirados da mãe durante o holocausto. Senti aí a tortura psicológica a que estavam submetendo os meus filhos e, com a utilização deles, a mim.

Cinco dias depois permitiram que meus filhos tivessem contato comigo, em visita vigiada, numa pequena sala do Juizado de Menores, tive que fingir serenidade, face a severa recomendação de que, se demonstrasse emoção, não mais seriam permitidas visitas.

Foi quando contactei a Autoridade Central do Brasil solicitando em razões detalhadas e acompanhadas de provas a repatriação das crianças para o Brasil (São Paulo), local da última residência habitual da família e domicílio da mãe e filhos em processo recém-iniciado.

Durante dois longos meses perdurou estsa situação, com pequena progressão de horários de visitas.

Foi necessário numa derradeira audiência o Perito psicológico judicial alertar o Juizado do mal que estavam causando a essas crianças pela privação do contato com a mãe que os amamentou e criou até recentemente, quando os levou para visitar o pai, podendo criar nelas sequelas. Foi quando o órgão estatal encarregado do destino desses menores de 4 e 2 anos de idade, concedeu o beneplácito de dar o direito de visita à mãe por dois dias semanais.

Em recente reunião no Juizado de Menores, o funcionário encarregado do destino das crianças, por mim indagado das razões desses procedimentos tão impetuosos contra os direitos humanos dos filhos e mãe, foram dadas as seguintes justificativas: 1- Porque a mãe quer retornar e morar no Brasil e o pai não quer; 2- Porque ela se casou com um alemão e agora ele quer morar na Alemanha; 3 - Porque a mãe no trato com o Juizado tem se mostrado agressiva, chegando até a acusá-los de racistas; 4 - Sugerindo que se a mãe quiser ainda ter a chance de ter um contato maior com seus filhos na Alemanha, deverá desistir do procedimento de repatriação que tramita na Alemanha e de divórcio que tramita no Juízo de São Paulo e, por fim, tirar de sua cabeça e da dos filhos o Brasil.

Em resumo, o órgão encarregado do destino dos meus filhos age muito mais com emoção, calcado em sentimentos de vingança e excessivo nacionalismo, deixando de lado os reais interesses dos menores. Com a determinação de convivência integral com o pai, proporcionaram a ele a possibilidade de promover intenso trabalho de alienação parental, impedindo até as crianças de falarem o português.

Diante desse quadro, vim ao Brasil no mês de julho em busca de ajuda política, obtendo a solidariedade de diversos Senadores como Marta Suplicy, Eduardo Suplicy, Paulo Paim, Aloysio Nunes Ferreira, assim como outros que ouviram o meu depoimento em audiência aberta na Comissão de Direitos Humanos, sendo conduzido o pedido de gestão, assinado pelos Senadores Eduardo Suplicy, Marta Suplicy e Paulo Paim, aos Ministérios das Relações Exteriores e da Justiça, assim como à Secretaria de Direitos Humanos. Fui recebida pela Ministra Maria do Rosário, que me prometeu ajudar no que fosse possível. Assim, o caso foi levado ao Subprocurador-Geral da República, o Dr. Eugênio Aragão, grande conhecedor do Direito brasileiro e alemão, que analisou o processo e, depois de contatar a Embaixada alemã, prometeu, por intermédio do Procurador-Geral da República, interferir junto ao Ministério da Justiça alemão, no sentido de que seja respeitada a decisão procedente da Justiça brasileira, que, em processo onde o pai tem amplo direito de defesa, com análise detalhada das provas apresentadas, estabeleceu a competência desta Justiça, outorgando a guarda provisória da mãe e, mais, que a Alemanha cumpra a Convenção de Haia, para, afinal, repatriar Giácomo e Gustavo, hoje com cinco e três anos.

Infelizmente, a Alemanha continua tratando o caso com parcialidade e arbitrariedade. Portanto, vejo como último recurso, no cumprimento das leis internacionais, a interferência de Vossa Excelência, na condição de Presidenta da República do Brasil, que, a exemplo de outros Presidentes, tais como o dos Estados Unidos e da França, junto à Chanceler da Alemanha, Angela Merkel, apelando aos seus sentimentos de mãe e de defensora irredutível dos direitos humanos e aversão a qualquer tipo de tortura.

Cordialmente,

Jacy Raduan-Berger

            Prezado Presidente Senador Walter Pinheiro, acredito na sensibilidade da Presidenta Dilma Rousseff, que tanto tem se distinguido na defesa dos direitos da mulher. Ainda nesses dias, na Organização das Nações Unidas em Nova Iorque, e ainda ontem, em diálogo com a ex-Presidenta do Chile Michelle Bachelet e com a Secretária de Estado Hillary Clinton, deu uma demonstração clara da sua firmeza em defesa dos direitos da pessoa humana, inclusive das mulheres e das crianças. Eu tenho a convicção de que ela, inclusive como mãe e avó, terá a sensibilidade necessária para perceber que uma palavra dela junto à Chanceler alemã Angela Merkel será importante para o bem-estar dessas crianças.

            Queira Deus possa haver um bom entendimento entre o Sr. Berger e a Srª Jacy Raduan-Berger para que se encontre o melhor caminho para a felicidade dos seus filhos, tanto junto à mãe quanto ao pai.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/09/2011 - Página 38415