Discurso durante a 224ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão sobre a necessidade de regras mais rígidas para a atuação das agências reguladoras.

Autor
Pedro Taques (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MT)
Nome completo: José Pedro Gonçalves Taques
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. SENADO. HOMENAGEM.:
  • Reflexão sobre a necessidade de regras mais rígidas para a atuação das agências reguladoras.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Randolfe Rodrigues.
Publicação
Publicação no DSF de 04/12/2012 - Página 65570
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. SENADO. HOMENAGEM.
Indexação
  • COMENTARIO, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, INSTITUIÇÃO PUBLICA, ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO (AGU), DEFESA, PROJETO DE LEI, ASSUNTO, REFORMULAÇÃO, NORMAS, FUNCIONAMENTO, FISCALIZAÇÃO, AGENCIA REGULADORA.
  • EXPECTATIVA, ELEIÇÃO, PRESIDENCIA, SENADO, NECESSIDADE, DEBATE, PROPOSTA, CANDIDATO.
  • HOMENAGEM POSTUMA, CONJUGE, EX SENADOR, ELOGIO, ATIVIDADE, SETOR, COMUNICAÇÃO SOCIAL, ESTADO DE MATO GROSSO (MT).

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, cidadãos que nos acompanham pela Rádio, TV, Agência Senado, eu queria vir aqui para falar só de coisas boas, só elogiar progressos e avanços. Mas aqui, no Congresso, temos uma missão mais difícil: denunciar, investigar e dar resposta aos problemas mais graves que afetam a sociedade brasileira.

            Alguns dizem que alguns Senadores aqui, eu sempre repito isso, seriam udenistas, lacerdistas, coisas dessa qualidade. Esses que assim dizem, no mínimo, não conhecem a história. Algumas pessoas leem a história por orelha de livro - só orelha - e falam que conhecem a história.

            Muito bem, esses problemas explodem a todo momento. É claro que estou falando da operação Porto Seguro, ou porto podre, Sr. Presidente, da Polícia Federal, que desvendou um esquema milionário de compra de decisões administrativas em agências reguladoras e na Advocacia-Geral da União.

            Percebam, senhores, que a Presidenta da República, quando toma posse, assina uma procuração àquele que vai defender os interesses da União. Um advogado que tem capacidade postulatória é um advogado público, o Advogado-Geral da União. O segundo homem na Advocacia-Geral da União envolvido, ao que consta, com ilícitos.

            Nós já estamos examinando o caso concreto, convidando o Ministro da Justiça e o Advogado-Geral da União para vir prestar esclarecimentos a respeito desses fatos. Mas, desde agora, nós todos temos que olhar os fatores profundos que estão por trás desses escândalos. Esse caso da Operação Porto Seguro deixa muito claro o risco em que está envolvido o funcionamento das chamadas agências reguladoras ou autarquias especiais, que precisam - repito, Senador Cristovam -, que precisam de uma reestruturação completa.

            O amigo em casa está se perguntando: qual é a diferença entre uma agência reguladora e uma repartição pública comum? É apenas um ponto, mas o mais importante, um ponto essencial. As decisões dessas agências controlam serviços públicos essenciais, como água, energia, telefonia e uma quantidade imensa, abissal, de recursos públicos, mas esse poder não aparece no Orçamento nem em qualquer forma tradicional de controle público, porque os serviços são prestados em sua maioria por empresas privadas que assumem as responsabilidades que antes eram do Estado. Essas empresas, senhoras e senhores, aliás, são muitas vezes monopólios, já que não é possível ter mais de um prestador em cada local, como nos casos das redes domiciliares de água, esgoto e energia elétrica. A agência reguladora, portanto, é o único ator que pode fiscalizar e gerenciar esse interesse privado, para garantir que ele favoreça, ao invés de prejudicar o interesse público e o cidadão consumidor.

            Não estamos falando de pouca coisa. A Anac decide sobre todo o transporte aéreo no Brasil, um movimento que, em 2010, foi de 77 milhões de pessoas transportadas por avião comercial. E esta Casa apoiou, votou e aprovou um cidadão sem a mínima qualificação para estar na Anac, um cidadão que fazia pequenos negócios e grandes fortunas, pequenos estelionatos, pequenos cambalachos, lá, até agora nessa agência. Setenta e sete milhões de brasileiros sob a responsabilidade de um cidadão como esse. Essa operação, com 77 milhões de brasileiros, gerou uma receita de R$ 21 bilhões para as empresas.

            A Anatel, por exemplo, controla, ou controlava em 2011, a prestação de serviços de 285 milhões de telefones fixos; 242 milhões de telefones móveis, num mercado que faturou R$ 141 bilhões. Repito, R$ 141 bilhões o mercado controlado pela Anatel.

            Por ocasião da criação das agências, e o Senador Cristovam sabe bem disso, nós estávamos discutindo um modelo de Estado que queríamos. Criamos uma agência para que ela pudesse muitas vezes fazer o papel do Legislativo, através das resoluções; o papel do Judiciário, através dos julgamentos administrativos, para que pudéssemos sair dessa lenga-lenga que é o processo legislativo, no que se denomina sociedade de risco, que é muito mais rápido, as condições econômicas precisam ser resolvidas na pressa que o chamado mercado precisa.

            Existem leis, Senador Cristovam, a chamada lex mercatoria, que retira desta Casa muitas decisões, e as agências têm essa importância. Cada agência dessas tem um enorme poder sobre muito dinheiro e sobre a vida do cidadão brasileiro. E a maior parte das suas ações não é facilmente compreensível pela população. Toda agência existe para garantir o cumprimento dos contratos de concessão, sem prejudicar o cidadão consumidor. Os dirigentes das agências têm que ser independentes do interesse das empresas que tem de fiscalizar. Mas muitas vezes, nós sabemos, aqui nesta Casa apoiamos, aprovamos - eu não apoio -, alguns aprovam “a raposa que vai tomar conta do galinheiro”. Mas também devem ser independentes, repito, de qualquer comportamento oportunista do Governo de plantão. Por isso, não podemos aparelhar politicamente e partidariamente essas agências. E o que vemos acontecer nessas agências? Sr. Senador, elas são tratadas como espaço de clientelismo e favorecimento como qualquer outro espaço da máquina pública. Como bem disse o jornal Valor Econômico, em 14 de março deste ano, “quase todas as agências foram aparelhadas por indicações políticas para suas diretorias, com casos quase de piada, anedóticos, senhores, como a presença de um ex-tesoureiro de um Partido em ascensão em uma das agências e um ex-dirigente de um time de basquete. Nada contra o basquete, apesar de ser desprovido verticalmente, conhecido como baixinho, eu não tenho nada contra os que jogam basquete, mas o diretor de uma agência como a ANTT, um ex...

            O SR. PRESIDENTE (Inácio Arruda. Bloco/PC do B - CE) - Mesmo porque existem grandes atletas baixinhos no basquete.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Sim, como existem grandes atletas no volei.

            O SR. PRESIDENTE (Inácio Arruda. Bloco/PC do B - CE) - São os armadores.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - São os armadores. Não é isso? O Senador Inácio bem sabe, já que o Ministro dos Esportes é do seu Partido. S. Exª deve bem conhecer basquete. Mas não vamos falar de basquete. Vamos continuar. “Ou da completa falta de aptidão, como a primeira cúpula da Anac”, como o jornal Valor Econômico disse.

            Já tivemos aqui um caso em que muitos votaram contra. Eu me perfilhei com aqueles. Impedimos, junto com outros Senadores, que o Sr. Bernardo Figueiredo, que era Diretor de uma empresa concessionárias de ferrovias, fosse chefe da Agência que regula a operação das ferrovias. Portanto, ele iria fiscalizar o seu ex-patrão, numa simbiose entre o público e o privado, que nada mais significa do que patrimonialismo, como nós todos conhecemos. As agências deveriam garantir que os contratos de concessão sejam cumpridos. Fazem, hoje, exatamente o contrário. De um lado, foram capturadas pelo interesse corrupto de empresários que tentam distorcer as condições da prestação do serviço para abusar da sua posição de monopólio contra o cidadão consumidor. De outro lado, foram capturadas pelos interesses eleitoreiros do governo de plantão, inchadas de nomeações políticas de técnicos desqualificados, mudando as regras do jogo a todo o momento, o que prejudica aquela parcela das empresas concessionárias que tentam, simplesmente, cumprir os seus contratos e prestar um bom serviço.

            Além disso, Sr. presidente, as agências têm sido coniventes com a concentração de mercado e a eliminação da concorrência na maioria dos setores regulados, que poderiam receber o benefício da competição entre os prestadores. É o caso da telefonia, do transporte aéreo, do transporte ferroviário. O Senador Randolfe fez hoje uma fala exatamente sobre isso, sobre o descaso das agências reguladoras.

            Para minha honra, concedo um aparte ao Senador Cristovam Buarque. Orgulho-me de estar junto a S. Exª no PDT.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Senador, primeiro, garanto que nesse orgulho ganho de V. Exª. Senador, o senhor está trazendo aqui um debate que é, aparentemente, sobre as agências, mas que é muito mais profundo. Nossa democracia está doente. Eu diria até que da maneira como está, Senador Randolfe, está se esgotando, não vai conseguir sobreviver muito tempo. Está se esgotando pela força do corporativismo que alguns conseguem, outros não. As massas apenas recebem as transferências de renda. Ela está se esgotando pela maneira como são financiadas as campanhas; está se esgotando pela maneira como as campanhas são feitas, por marqueteiros, sem nada a ver com as propostas concretas para o futuro. Ela está se esgotando pela maneira como nós, do Congresso, estamos trabalhando. E ela está se esgotando - e é aí que tem a ver com o seu discurso - com a promiscuidade que nós temos entre Estado e Governo, entre Governo e partido, e entre partido e seus líderes. Aí, no fim, os líderes é que mandam no Estado. Isso é característica de ditadura, em que o ditador manda no partido, manda no Governo, e usa o Estado conforme ele quer. Não há possibilidade de a democracia funcionar sem uma separação muito nítida entre Estado e Governo, entre Governo e partido majoritário, e entre partido e o interesse específico de pessoas que são líderes do partido, mas que não são líderes da Nação, nem do Estado. Isso, numa República, é um misto de Justiça, Congresso e Poder Executivo, trabalhando juntos. E não estamos fazendo isso! Em grande parte porque, de repente, cria-se um trator aqui dentro que passa por cima de tudo, uma maioria que nem dialoga com a minoria, que não dialoga, o que também não é forma de democracia. Democracia não e á imposição da maioria sobre a minoria: democracia é a maioria ser capaz de dialogar com a minoria para construir aquilo que é o mais próximo possível de um consenso. Então, nós precisamos alertar para o risco da democracia e para o fato de que o que há hoje não é uma democracia plena. A corrupção não apenas contamina a democracia: ela é a demonstração de que a democracia não é democrática. A mistura Estado e Governo, como através das agências... As agências foram criadas para criar um aparelho do Estado por cima dos interesses do partido no Governo - por isso os mandatos; por isso passam por aqui.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Sim.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Agora, nós não podemos é deixar de refletir sobre o nosso papel. Nós estamos sendo ou coniventes com isso, ou omissos com isso, ou submissos a isso. Alguns são submissos: o que vier do Governo fazem. Outros até dizem: “O que vier do Governo não presta” - é outra forma de submissão, não ao Governo, mas ao seu partido. Agora, às vezes, somos levianos na maneira como a gente aprova o que o Governo manda para cá. A maneira como as sabatinas são feitas é prova de uma submissão dos que apoiam o Governo, de uma leviandade daqueles que não apoiam o Governo, e de uma omissão muito grande. Nós precisamos mudar isso. Essas sabatinas têm de ser para valer! As votações aqui têm que ser para valer! E é preciso acabar com essa história - que não é o caso da presidência das agências - de voto do tipo “quem estiver de acordo que fique como está”. O voto pelo corpo! Tem de haver uma grande reforma dentro desta Casa. Nós vamos ter agora, Senador Arruda, eleição para Presidente do Senado. Está na hora de não nos submetermos, nem nos omitirmos, e discutirmos que projeto o Presidente dos próximos dois anos vai trazer para o Senado. Aparentemente, isso não vai acontecer. Vamos nos reunir em um dia para aprovar no outro o nome que foi indicado pelo partido da maioria. Eu até acho que devemos procurar ter como Presidente alguém do partido majoritário, que é o PMDB. Mas eu quero saber o que ele propõe antes de votar nele. Ou, se eu não quiser votar nele, quem eu ponho no lugar dele, mesmo que seja para marcar uma posição. Nós não estamos bem, as coisas não estão bem. A maneira como a gente aprova, como a gente participa não está bem. E esse fato da agência, Senador, eu acho que V. Exª trouxe um assunto muito importante, porque é grave o que aconteceu! Eu hoje ouvi falar em CPI. Eu não vou dizer CPI ou não, mas o Congresso não pode ficar omisso diante desse escândalo. Ou, pelo menos, alguns de nós têm de deixar claro - esses alguns - que não somos omissos. Às vezes, acho até que a CPI existe não é nem para ela ser feita, porque termina como esta agora, a CPMI, que, apesar desses dois grandes nomes, deu no que deu! Às vezes, eu acho que CPI é só para saber quem assina ou quem não assina, para se diferenciar quem está disposto a levar adiante as investigações ou quem prefere esconder as coisas. Então, talvez seja o caso de aproveitarmos a eleição para Presidente do Senado e forçarmos entre nós, os 81, quem pretende ser candidato a Presidente que diga para quê! E para quê tem que ser muito diferente do que vem sendo nos últimos anos!

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Muito obrigado, Senador Cristovam. O vosso aparte trouxe luzes á minha fala!

            Eu gostaria de dizer, respondendo ao vosso aparte, que vou começar pelo fim. Imagine: um Senador lá na sua base, em seu Estado, não deve ser desejoso de um eleitor de cabresto. Eu quero convencer o meu eleitor a, no dia da eleição, escolher o meu nome - e isso eu fiz na eleição de 2010 e, para minha honra, estou aqui a representar o Estado de Mato Grosso.

            Muito bem, como eu posso defender lá na minha base, lá no meu Estado, a necessidade de um voto consciente, se aqui, quando se fala em eleição para a Presidência da Mesa, ninguém discute propostas? Será que existem Senadores de cabresto? Será que existem Senadores maria vai com as outras? Será que existe Senador que vai ser convencido por cargos em comissões?

            Nós precisamos debater propostas nesta Casa!

            O que V. Exª tocou, Senador Cristovam, é uma das omissões desta Casa. Não me interessa quem seja o candidato a Presidente desta Casa. O que nós devemos fazer é debater propostas. Eu quero ser convencido, como eu busquei o convencimento dos mais de 708 mil mato-grossenses que me mandaram para cá. Eu não aceito, no dia 1º de fevereiro do ano que vem, chegando aqui com a caixa fechada, com aquela fita vermelha, e nós ou alguns Senadores de cabresto votarem neste ou naquele candidato.

            Nós não estamos discutindo nomes neste momento. Nós devemos discutir propostas, compromissos do futuro Presidente do Senado a respeito de temas de relevo para a Nação e para a Federação!

            Exemplo disso?

            Eu quero saber a opinião daquele que deseja ser candidato a Presidente do Senado, que deseja sentar de forma definitiva nessa cadeira, o que ele acha do Senado ser uma extensão do Poder Executivo.

            Eu quero saber o que ele acha da Presidência do Senado ser debatida em jantares na Presidência da República. Esta é uma Casa cujos membros têm dobradiças nas costas ao Poder Executivo? Esse tema precisa ser debatido.

            Eu quero saber do futuro Presidente do Senado o que ele acha, o que ela pensa das medidas provisórias; qual é a sua opinião a respeito da reforma administrativa.

            Esse ou esses, entre outros, são temas que merecem ser agitados, debatidos, desafiados nesta Casa!

            Eu não vou votar em candidato que não traga proposta porque, como eu não quero eleitor de cabresto, eu não sou Senador de cabresto! Eu não sou Senador que vota em cruz! Eu não sou Senador que vota através de carbono!

            Quando eu vim para cá, eu jurei cumprir a Constituição, e a Constituição diz que um Senador precisa ter independência. Independência inclusive no momento de votar. Não aceito que meu voto seja negociado em jantares na Presidência da República e em outros locais.

            Por isso, esse tema nós poderíamos tratar a partir desta semana, porque nós estamos aí a 10 dias úteis, 12 dias úteis de findarmos a Sessão Legislativa, aí nós todos vamos voltar, em 1º de fevereiro, para a 3ª Sessão Legislativa da 54ª Legislatura, e o bolo já está feito, o pacote será entregue, e aí nós teremos Senadores de cabresto.

            Para minha honra, concedo um aparte ao Senador Randolfe e peço a V. Exª, se possível, mais um tempo para que eu possa encerrar a minha fala.

            O Sr. Randolfe Rodrigues (PSOL - AP) - Querido Senador Pedro Taques, serei breve para vossa conclusão. Sobre a questão da eleição à Presidência do Senado, eu creio que o caminho é este: temos que debater um programa para cá mais importante do que o debate de nomes. Mas eu quero retomar, Senador Pedro Taques, o debate sobre as agências reguladoras. Afinal, nós temos que refletir no Estado brasileiro qual o papel de uma agência reguladora. A instituição delas surgiu - já foi definido por V. Exª e pelo Senador Cristovam - como uma espécie de espaço estatal acima dos próprios governos. É por isso que a Presidente da República manda para cá os nomes para serem sabatinados, arguidos e votados no final, aqui pelos membros desta Casa. E as agências têm um papel fundamental: fazer a regulação do mercado, impedir os excessos do mercado.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Randolfe Rodrigues (PSOL - AP) - Aí, remete-nos, Senador Cristovam, a uma reflexão: nós vemos o setor da aviação civil. A Gol compra a Webjet, depois fecha a Webjet, numa clara articulação de prática de oligopólio. A mesma coisa acontece com a TAM. O mercado fica em torno de duas ou três empresas. Onde está a Anac em um papel como esse? A Anac está envolta num escândalo de corrupção, envolvendo um de seus dirigentes. É aí que está a Anac.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - A Anac eu não sei, mas um de seus diretores praticando cambalacho, não é?

            O Sr. Randolfe Rodrigues (PSOL - AP) - Perfeito: praticando tráfico de influência. Então, é nisso que está a Anac. Então, é essa a reflexão. Senador Taques e Senador Cristovam, lamentavelmente, o instrumento de comissões parlamentares de inquérito já está muito gasto. Lamentavelmente. Está gasto porque, na verdade, nós não o utilizamos como deveria. Mas há de se pensar se é situação das agências reguladoras, por um lado, elas envoltas em escândalos de tráfico de influência e corrupção, e, por outro, o mercado, como é no caso da aviação civil, fazendo o que bem quer, fazendo com que o consumidor, o cidadão, pague tarifas de transporte aéreo de quase R$5 mil, que davam para ir e voltar da Europa, enquanto a agência do Estado brasileiro responsável por fazer a mediação não faz. Eu começo a pensar se isso não é um tema para uma investigação mais aprofundada por parte do Parlamento. Cumprimento V. Exª pelo tema que está trazendo, pela coragem de trazer o tema e pela forma como aborda.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Sim. Muito obrigado, Senador Randolfe.

            Nós sabemos que essas agências devem buscar aquele espaço entre a mão invisível do mercado, de Adam Smith, em A Riqueza das Nações, e o que ocorreu nos Estados Unidos, ao final do século XIX, com a Standard Oil, uma grande empresa do Rockefeller, quando ali ele aumentou o preço do carvão, necessário para a calefação, para superar o frio no inverno rigoroso americano, e aí surge a necessidade de regular o mercado, sob pena de o mercado escravizar aquele que tem menos. Aí Keynes, nós sabemos disso, aí chegamos ao Consenso de Washington, aí pulei rapidamente quase 100 anos para que pudéssemos chegar às agências.

            Precisamos mudar profundamente as regras de operação das agências. Os seus dirigentes devem ter regras muito rigorosas para preservação do seu mandato, as condições para nomeação, os seus conhecimentos técnicos, os impedimentos para a saída do cargo, a fiscalização sobre o seu desempenho.

            Temos regras adequadas hoje? Não. Elas são completamente insuficientes.

            Precisamos de regras gerais, muito mais fortes do que as que hoje temos para essas agências.

            A lei que existe, a Lei 9.986, de 2000, é insuficiente.

            Tramita na Câmara dos Deputados, desde 2004, um projeto de lei de iniciativa do próprio Executivo, que dá um primeiro passo nessa direção. Mas precisamos melhorar muito.

            Defendemos algumas normas básicas que são imprescindíveis para resgatar o papel dessas agências.

            Primeiro: os dirigentes não podem ser ou ter sido sócios, contratados, consultores ou empregados das empresas que são fiscalizadas por eles, ou muito menos passar a ter essas relações por um período mínimo de dois anos, antes ou depois do exercício do mandato. Esses dirigentes também têm, evidentemente, de demonstrar experiência profissional direta no setor que vai ser regulado, seja no setor privado, seja no universitário, seja na Administração Pública, respeitando o impedimento que apontei antes. O critério de sua escolha deve ser técnico e não político. O afastamento do mandato dos dirigentes deve ser regulamentado, com uma relação completa das condutas que justifiquem o seu afastamento ou destituição. Por um lado, isso impedirá que pressões meramente políticas possam influenciar as decisões dos dirigentes. Por outro lado, ter uma previsão clara do que leva à perda do mandato permite que a própria sociedade possa cobrar as condutas adequadas.

            Os processos de decisão das agências devem se públicos e transparentes, inclusive com a publicação de todos os relatórios, pareceres e documentos produzidos pela área técnica ou apresentados pela empresas.

            Os quadros técnicos das agências devem ser estruturados em carreiras com servidores concursados.

            Tudo isso, Sr. Presidente, é necessário para organizar um setor regulador que seja capaz de defender o consumidor e o contribuinte, sem se deixar capturar pelos interesses eleitoreiros do governo de plantão - sempre lembrando que o Estado é espacial, e o governo é temporal.

            É uma tarefa legislativa enorme que vai contra interesses poderosos - nós todos sabemos disso. Mas nós não podemos nos omitir a respeito desse tema.

            Eu agradeço a tolerância do tempo, uma vez que entendo que esse tema é de suma importância para que nós possamos consolidar nossa democracia.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/12/2012 - Página 65570