Discurso durante a 231ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Manifestação contrária à possibilidade de doação feita por pessoas jurídicas em campanhas eleitorais.

Autor
Ruben Figueiró (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MS)
Nome completo: Ruben Figueiró de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO, LEGISLAÇÃO ELEITORAL.:
  • Manifestação contrária à possibilidade de doação feita por pessoas jurídicas em campanhas eleitorais.
Publicação
Publicação no DSF de 19/12/2013 - Página 97974
Assunto
Outros > JUDICIARIO, LEGISLAÇÃO ELEITORAL.
Indexação
  • CRITICA, REFERENCIA, SISTEMA, FINANCIAMENTO, SETOR PRIVADO, CAMPANHA ELEITORAL, PAIS, MOTIVO, CORRUPÇÃO, REGISTRO, APOIO, VOTAÇÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), PROPOSTA, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), FATO, EXTINÇÃO, PAGAMENTO, EMPRESA, PATROCINIO, ELEIÇÕES.

            O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco Minoria/PSDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, nobre Senador Roberto Requião, eu desejo somar-me às expressões do Senador Francisco Dornelles para dizer a V. Exª que tem também o meu respeito e a minha admiração pela sua condução como homem público não só do Paraná, mas de todo o nosso País.

            No início das minhas palavras, eu quero cumprimentar os ouvintes da Rádio Senado, os telespectadores da TV Senado e, sobretudo, os funcionários que servem à Mesa desta sessão, aqueles que trabalham na segurança do plenário, todos os jornalistas e demais pessoas que nos honram aqui com a sua presença, desejando a todos não só um feliz Natal, mas um ano de 2014 venturoso, em que Deus sempre nos proteja nos nossos passos e nas nossas ações.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o debate que atualmente vem sendo travado no âmbito do Supremo Tribunal Federal em torno das doações de campanha eleitorais tem grande potencial para transformar o modus operandi da política brasileira.

            À medida que os Ministros definam seus votos, julgando a ação da Ordem dos Advogados do Brasil com vistas a extinguir o financiamento de campanhas por pessoas jurídicas, estaremos dando passos importantes para imaginar outras maneiras de fazer campanhas eleitorais no Brasil, sem o peso sufocante dos grandes conglomerados empresariais.

            O fato concreto é que, do jeito que está, não pode mais ficar. Estamos cientes de que o atual modelo é nefasto. Como todos sabem, os grandes escândalos de corrupção na história recente do País tiveram origem no processo deletério de financiamento de campanha. Qualquer eleitor brasileiro percebe quando a disputa acontece de maneira desigual, injusta, anômala, ou seja, quando há dinheiro farto nas mãos de alguns candidatos, enquanto outros dispõem de parcos recursos, para enfrentar pleitos cada vez mais caros e sofisticados.

            Certamente, é indispensável dizer quem tem mais chance de se eleger. E muitas vezes o dinheiro acaba por determinar a escolha de candidatos pouco comprometidos com os verdadeiros interesses da sociedade. E, assim, cria-se um círculo vicioso, no qual o dinheiro desvirtua a política e o fazer político, sobretudo quando acreditamos que ela deve ser aquela atividade nobre de bem servir à Nação.

            Reparem, Srªs e Srs. Senadores, que o tema da ética na política passou a ser cada vez mais importante, a partir do momento em que a natureza da campanha eleitoral deixou de ser aquela em que o candidato fazia compromissos efetivos com a sociedade, em contato corpo a corpo, olho no olho, com estrutura modesta e ajuda de amigos e companheiros, e passou a funcionar com a lógica do marketing sofisticado, decorrente da modernização das comunicações de massas.

            Assim, as campanhas passaram a ser impessoais, dependendo de fartos recursos e imensas estruturas, fazendo com que a imagem passasse a ser mais importante do que os valores intrínsecos dos candidatos. A partir desse momento, a política entrou nesse turbilhão de distorções, levando-nos à descrença e à sensação de que todos são iguais e de que se diluiu o sentido verdadeiro de fazer política como maneira de servir à comunidade.

            Não quero aqui enaltecer qualquer saudosismo ingênuo, acreditando que tudo na vida deve permanecer sempre a mesma coisa, alheia ao fato de que existe uma natural evolução da vida. O que reclamo é a perda da essência da chamada boa política, aquela feita às claras, com transparência, bem intencionada, com valores republicanos, que, infelizmente, mudou muito à medida que as grandes empresas tomaram conta do processo eleitoral.

            Sabemos, Excelências, que há uma imensa crise de valores permeando toda a sociedade. Mas acredito que a política pode ser o paradigma de mudanças de rumo de nossa vida institucional, tornando-nos um País menos desigual, mais justo, mais fraterno, funcionando sob a égide do Estado democrático de direito.

            Srªs e Srs. Senadores, li, neste fim de semana, um editorial esclarecedor do jornal O Estado de S. Paulo intitulado "Germe de uma Revolução". O texto é esclarecedor. Somos informados de que, dos R$6 bilhões arrecadados pelos candidatos na última eleição nacional, cerca de 95% vieram de 1.900 pessoas jurídicas.

            Calcula-se que, para ter chances reais nas urnas, um candidato a Deputado Federal precisa desembolsar, em média, R$1 milhão - creio que muito mais; a Governador, R$23 milhões; a Presidente da República, R$300 milhões; e ao Senado, R$4,5 milhões. E, quanto maior o dispêndio, maior a probabilidade de êxito.

            Mais importante ainda, calcula-se que, para cada R$1 doado por uma empresa, ela terá um retorno 8,5 vezes maior, sob a forma de contratos obtidos com os governos que ajudou a eleger - razão por que as empreiteiras lideram com folga as listas de financiadores agrupados por setor.

            O texto ainda ironiza esse quadro, lembrando que o termo "doação" é um eufemismo. O mais correto seria "investimento".

            Ressalto ainda um trecho do editorial de O Estado de S.Paulo:

Tudo isso produz uma deturpação grotesca do princípio da igualdade de oportunidades eleitorais para votantes e votados, almejada pela legislação, como requisito da representatividade que se espera do Congresso, Assembleias e Câmaras e da legitimidade dos governantes - uma coisa e outra, por sua vez, indispensáveis ao sistema democrático.

            Por esse motivo, Srªs e Srs. Senadores, vejo com bons olhos a proposta da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em torno da supressão das doações de empresas para as campanhas eleitorais. Concordo com a premissa de que pessoas jurídicas não votam, portanto não podem, de maneira nenhuma, influir determinantemente num processo de escolha democrática. Quem vota é o cidadão. A esse cabe todo o poder para escolher seus representantes.

            Além disso, há que se estabelecer um sistema de igualdade para que aqueles mais ricos também não possam influir economicamente, sobrepondo-se aos mais pobres. O processo democrático deve ser respeitado, no sentido de fazer a lógica de que uma pessoa valha um voto. Essa é a manifestação do respeitável jornal O Estado de S.Paulo.

            Sei que há opiniões divergentes, Srªs e Srs. Senadores. Muitos alegam que, não havendo doações de empresas, haverá aumento do famoso caixa dois nas campanhas, pois as doações acontecerão de qualquer maneira, ao arrepio da lei. Outros alegam que isso beneficiará o Partido do Governo, porque, em decorrência disso, tem maior capacidade de driblar a legislação e obter vantagens entre as grandes empresas, ONGs, sindicatos, etc. Mais ainda: que, mudando a natureza das doações, o próximo passo será a implantação do financiamento público de campanha, algo que dificilmente será aceito pela sociedade brasileira, em função da estranheza que tal proposta provocará no atual cenário institucional brasileiro.

            Compreendo, Excelências, os temores colocados nas argumentações divergentes. Mas é preciso ressaltar que, para qualquer mudança, será necessária sempre fiscalização mais rigorosa, pois o próprio eleitor deve ser estimulado a perceber as diferenças entre uma campanha feita dentro da lei e outra feita de maneira irregular, fora dos padrões da normalidade democrática. Temos que confiar na percepção da sociedade no momento de fazer a filtragem entre aqueles que buscam a política para o enriquecimento pessoal e outros que buscam a política devido à vocação de servir à comunidade.

            Há também, Srs. Senadores e Srªs Senadoras, outro aspecto deste debate que sei que tem sido motivo de grande preocupação para que haja o equilíbrio entre os Poderes: o ativismo do Supremo Tribunal Federal. Vejo que essa é uma questão que dificilmente será pacificada entre todos aqueles que estudam e acompanham o intenso processo de judicialização das atividades dos Poderes.

            Neste caso, vejo que o Judiciário está agindo por provocação de uma entidade que tem funda representatividade na sociedade civil. Sou da opinião de que o assunto é de extrema importância institucional. Na minha vida política, posso dizer de peito aberto: nunca solicitei a empresas que contribuíssem para minhas campanhas. Sempre obtive ajuda de pessoas físicas, companheiros que acreditavam em minha luta e em meus propósitos. Foi assim que fui eleito Deputado Estadual e Federal. Sim, os tempos eram outros: a atividade política não tinha o atual vezo de "profissionalismo" de agora.

            O Professor e ex-Ministro Almir Pazzianotto, em recente análise, concorda comigo:

Provocado por quem dispõe de legitimidade e competência, o Supremo é obrigado a se manifestar para suprir a ausência do Legislativo, como sucedeu quando legislou sobre aviso prévio e adicional de insalubridade. O barulho agora decorre do fato de o STF enfrentar temas de natureza eleitoral, como o financiamento público de campanha, número de Deputados por Estado, votos dados em candidatos envolvidos em acusações criminais, e assim sucessivamente.

            Srªs e Srs. Senadores, vamos dar chance ao debate aberto, aceitando as perspectivas de mudanças. É isto que a sociedade brasileira espera de todos nós: reflexão, ponderação, sintonia com as aspirações sociais, emanadas de um momento histórico rico e complexo, que não permite nem admite soluções fáceis.

            Sr. Presidente, com este meu modesto pronunciamento, quero significar a minha posição a respeito desta importante questão. E o faço na minha serena confiança de que o Congresso Nacional haverá, ainda num ano eleitoral como o próximo, de definir sobre questões tão importantes como estas aqui abordadas, porque, acima de tudo, nós devemos preservar o primado da nossa representatividade e o respeito pela ação dos demais Poderes.

            Muito obrigado, Excelência.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/12/2013 - Página 97974