Pronunciamento de Cássio Cunha Lima em 02/04/2014
Discurso durante a 44ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Indignação com a postura do Governo e de parlamentares que o apoiam em relação à “CPI da Petrobras” por considerar que desrespeita a Constituição brasileira e a democracia.
- Autor
- Cássio Cunha Lima (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PB)
- Nome completo: Cássio Rodrigues da Cunha Lima
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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GOVERNO FEDERAL, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI).:
- Indignação com a postura do Governo e de parlamentares que o apoiam em relação à “CPI da Petrobras” por considerar que desrespeita a Constituição brasileira e a democracia.
- Publicação
- Publicação no DSF de 03/04/2014 - Página 95
- Assunto
- Outros > GOVERNO FEDERAL, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI).
- Indexação
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- DESAPROVAÇÃO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), INTERVENÇÃO, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), DESRESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, DEMOCRACIA, ENFASE, NECESSIDADE, MANUTENÇÃO, FUNÇÃO, FISCALIZAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, ATIVIDADE, EXECUTIVO.
O SR. CÁSSIO CUNHA LIMA (Bloco Minoria/PSDB - PB. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na última segunda-feira, o Brasil, o povo brasileiro lembrou com tristeza os 50 anos do Golpe Militar. E o que estamos vendo com esse episódio da trajetória do País é, 50 anos depois, a repetição de um novo golpe contra a nossa democracia.
Alguns podem achar um tom exagerado em minha fala e na minha comparação. Mas a ausência da democracia, as ditaduras, elas se caracterizam de várias formas. Elas podem se manifestar através de governos ilegítimos, não constituídos pela soberania do voto, mas as ditaduras também se manifestam em governos que, mesmo tendo a legitimidade do voto, não sabem ouvir, não sabem dialogar, não respeitam as instituições e rasgam a Constituição!
E o que está acontecendo nesse grave episódio com a Petrobras e com o desrespeito às instituições e desconsideração com a nossa Constituição por parte do Governo e da maioria política que o Governo tem nesta Casa é algo de extrema gravidade. A comissão parlamentar de inquérito é um instrumento previsto na Constituição para defesa das minorias, sim, mas um instrumento eficaz de fiscalização, que é um dos principais papéis, uma das maiores atribuições que os parlamentos, pelo mundo inteiro, nos países democráticos, possuem. Além de produzir leis, o nosso papel fundamental, pelo que está escrito em nossa Constituição, é acompanhar e fiscalizar os atos do Poder Executivo.
O País, estarrecido, assiste aos escândalos se sucedendo. A oposição consegue, até mesmo com a colaboração de Parlamentares independentes da Base do Governo, o número de assinaturas necessárias para uma investigação com tema específico, como determina a Constituição.
E o telespectador da TV Senado, o povo brasileiro vai tomar conhecimento de que o que aconteceu hoje, neste Parlamento, neste plenário, foi um duro golpe contra a nossa democracia.
Eu estou assustado. A Deputada venezuelana foi hostilizada por representantes da Bancada do Partido dos Trabalhadores na Câmara.
O Governo tem, sim, dentro das regras democráticas, direito de fazer valer a sua maioria, mas não pode golpear a Constituição, nem atentar contra a democracia. E o que foi feito aqui hoje foi um golpe contra a Constituição brasileira.
Por quê? Abriu-se um precedente para que, daqui para a frente, não haja mais comissão parlamentar de inquérito. Tanto eu como o Senador Randolfe, que se encontra aqui no plenário, neste final de sessão - o telespectador às vezes não entende bem como acontece essa dinâmica do Parlamento -, já tendo sido encerrada a Ordem do Dia, estamos aqui para manter vivo - com certeza, esse também é o objetivo do Senador Randolfe - esse tema tão importante para o Brasil e para os brasileiros.
O que se vê é que, daqui para a frente, com o precedente aberto, qualquer Governo, qualquer maioria eventual que se forme acabará com qualquer comissão parlamentar de inquérito. Porque se você abre uma comissão parlamentar de inquérito para apurar tal episódio, a maioria eventual, como aconteceu hoje, vai sobrepondo outros temas, que devem ser investigados também - não estou aqui para defender que se investigue esse ou aquele assunto -, mas de forma separada, com diversas comissões parlamentares de inquérito. Tanto é que o próprio Regimento estabelece o número de CPIs que podem coexistir por Sessão Legislativa.
E o que fez o Governo hoje, com a sua maioria? Um golpe contra a democracia brasileira. O Governo do PT aplicou um golpe contra a nossa democracia, ao usar sua maioria para pegar CPI da Petrobras e vários outros temas que não têm nenhuma relação direta com a CPI original.
E o que vai acontecer na prática? Como bem disse, há algum tempo, o Senador José Agripino na sua fala - nós assistimos a isso, Senador Randolfe na malfadada CPI do Cachoeira -, o Governo usa sua maioria, apresenta os requerimentos e vai votando, paciente e disciplinadamente, requerimento a requerimento, requerimento a requerimento, impedindo a investigação de fato.
Não é possível que a sociedade esteja indiferente a tudo isso, porque não está.
Eu concluo, reforçando aquilo que foi dito pela Senadora Ana Amélia: os que pensam que essa discussão, esse atentado e - repito - esse golpe contra a democracia brasileira praticado hoje ficarão nas paredes do Congresso Nacional se enganam. Temos uma sociedade madura, que possui discernimento e consciência política, porque foi essa sociedade que fez com que o Brasil avançasse. Foi essa mesma sociedade que permitiu, com o seu voto livre e soberano, que, através da vitória do Presidente Lula, o Partido dos Trabalhadores chegasse ao poder. Mas essa mesma sociedade não esperava que, 12 anos depois da assunção ao poder no Brasil, o Partido dos Trabalhadores se transformasse no que se transformou, num Partido que, infelizmente, se distanciou de suas lutas históricas; num Partido que se distanciou dos seus compromissos ideológicos e que abraçou, com todos os métodos, sem limites, um projeto de poder do qual não quer largar, mesmo que o preço para manutenção desse projeto de poder seja golpes contra a democracia.
O Congresso não pode abdicar do seu poder de fiscalização. O Governo não pode manobrar ao ponto de sepultar esse instrumento - que tantas transformações já promoveu no Brasil - que são as comissões parlamentares de inquérito. Muitas não deram em nada; outras tantas produziram efeitos reais de transformação na nossa sociedade.
E quem nos escuta, quem nos vê neste instante tem que tomar conhecimento de que o que o Governo fez hoje foi abrir um precedente para que comissão parlamentar de inquérito não exista mais.
Vamos investigar tudo, mas cada um com o seu próprio ambiente, cada um com sua própria comissão e não com essa manobra que foi feita com o Governo, de colocar vários temas díspares, diferentes, não correlatos numa só comissão parlamentar de inquérito para, usando a sua maioria, com sucessivos requerimentos que serão votados… E cobrem, acompanhem; vocês vão ver que é o que vai acontecer. Não sou adivinho, não tenho bola de cristal, mas é rigorosamente o que vai acontecer.
E, na política, não há problema em você ganhar ou perder - e eu concluo para que possamos ouvir o Senador Randolfe -; na política não há problema nenhum em ganhar ou perder. Na democracia, ganha a maioria, perde a minoria, desde que haja respeito.
O que me preocupa, Sr. Presidente, são os métodos que estão sendo utilizados. E se esses métodos prosperarem, nós caminharemos de forma definitiva para um trajeto que não é o desejo da maioria do povo brasileiro, eu tenho absoluta certeza disso.
Ganhar ou perder faz parte do jogo democrático, o que não podemos é nos calar, omitir-nos, ser conivente com este golpe. E a palavra é esta: golpe. Foi praticado um golpe contra a democracia brasileira, um golpe contra a nossa Constituição, uma postura própria de ditadores, que não respeitam a minoria, que desrespeitam as instituições, que não sabem dialogar, que não sabem ouvir, e o futuro do Brasil passa a sofrer uma ameaça muito grande com todo este cenário que estamos vendo neste instante.
Agradeço a tolerância e, sobretudo, a postura democrática de V. Exª, que, presidindo a Mesa, não pode fazer, talvez, o embate daquilo que foi dito. E quero deixar claro que não há nenhuma atitude de desrespeito na minha atitude neste instante, apenas a coincidência da sua presença na Presidência.
Agradeço a atenção e o tempo que me foram concedidos. Que o Brasil fique muito atento ao que aconteceu hoje no plenário do Senado Federal e às consequências para o futuro da nossa democracia, que está ameaçada.