Comunicação inadiável durante a 98ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com os impactos da nova política agrícola aprovada pelos Estados Unidos e pela União Europeia sobre o mercado agrícola brasileiro.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Comunicação inadiável
Resumo por assunto
ECONOMIA INTERNACIONAL, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL). ECONOMIA INTERNACIONAL, COMERCIO EXTERIOR, POLITICA AGRICOLA.:
  • Preocupação com os impactos da nova política agrícola aprovada pelos Estados Unidos e pela União Europeia sobre o mercado agrícola brasileiro.
Publicação
Publicação no DSF de 03/07/2014 - Página 209
Assunto
Outros > ECONOMIA INTERNACIONAL, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL). ECONOMIA INTERNACIONAL, COMERCIO EXTERIOR, POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • COMENTARIO, DECISÃO, INSTANCIA MAXIMA, JUDICIARIO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), PAGAMENTO, DIVIDA, ARGENTINA, PREJUIZO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), BRASIL, ENFASE, IMPORTANCIA, MERCADO EXTERNO, AUTOMOVEL, PAIS, VIZINHO, AMERICA DO SUL.
  • REGISTRO, ATUALIZAÇÃO, LEGISLAÇÃO, AGRICULTURA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), UNIÃO EUROPEIA, PREJUIZO, AGRICULTOR, BRASIL, PAIS EM DESENVOLVIMENTO, MERCADO EXTERNO.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, brasileiros que nos acompanham pela TV Senado, o Senador Roberto Requião fez aqui uma erudita e detalhada explicação sobre as origens, os efeitos e as consequências da decisão da suprema Corte norte-americana em relação a essa conjuntura vivida e enfrentada pela Argentina. Uma decisão que não traz apenas consequências para a Argentina. Uma decisão que traz consequências para o Brasil, traz consequências para o Mercosul. E, na verdade, estamos no limiar de uma decisão que poderá traduzir-se, efetivamente, em prejuízos para o nosso País, sobretudo pela dependência que tem a indústria manufatureira brasileira, sobretudo a indústria automotiva, visto que a Argentina é hoje destino de aproximadamente 90% das exportações dos veículos brasileiros.

            Mas quero chamar atenção para uma outra decisão, que não vem da alta Corte, da suprema Corte norte-americana, mas que vem, na verdade, do Governo dos Estados Unidos, do Congresso americano, em relação à nova lei agrícola dos Estados Unidos da América e suas consequências sobre a agricultura brasileira e sobre a agricultura dos países emergentes.

            O Brasil, Sr. Presidente, como é sabido, é o terceiro maior exportador de produtos agropecuários do mundo, ficando atrás apenas dos Estados Unidos da América e da União Europeia, lembrando, evidentemente, que a União Europeia é um bloco constituído por 28 países, por 28 nações.

            Apenas no ano passado, o Brasil exportou mais de US$100 bilhões em produtos agropecuários. Além de ser o terceiro maior exportador, esse segmento é o mais dinâmico nas exportações, tendo crescido 16% no último ano. A União Europeia e os Estados Unidos cresceram 10% e 9% ao ano, respectivamente, nesse mesmo período, o que atesta, o que finaliza a competitividade da agricultura brasileira, sobretudo as características de apropriação, de elevada capacidade tecnológica da nossa agricultura. A nossa agricultura é produto e resultado, sim, de um esforço extraordinário de vários e vários anos, um esforço que incorpora e agrega tecnologia de ponta e que dá ao nosso País condição de disputar qualquer mercado no mundo.

            Com efeito, Sr. Presidente, dessa performance do agronegócio brasileiro, o saldo do comércio exterior do agronegócio foi positivo no último ano em US$83 bilhões. Essa cifra compensou, por assim dizer, a necessidade de termos um resultado na balança comercial brasileira em 2013, que deixou a desejar e que não é compatível com a economia brasileira.

            Foi, por assim dizer, o segmento brasileiro que produziu e permitiu que a nossa balança comercial pudesse ter esse resultado. É verdade, um resultado íntimo, um resultado ínfimo, tímido, mas, não fosse a agricultura brasileira e a capacidade e a competência da produção brasileira, a nossa balança comercial estaria amargando um déficit, o que traria extraordinárias complicações para a conjuntura brasileira.

            O Brasil também ganhou protagonismo mundial, Sr. Presidente, não apenas por sua competitividade, não apenas pela capacidade dos nossos produtores, não apenas pela capacidade de empreendedorismo de órgãos e instituições, como a Empresa Brasileira de Agropecuária, a Embrapa. O Brasil ficou conhecido mundialmente, globalmente, como o cão de guarda das políticas agrícolas dos países desenvolvidos. Tendo liderado os contenciosos do algodão e do açúcar, ambos com ganhos favoráveis aos argumentos defendidos pelo Brasil, o País criou, nesse período, jurisprudência ao comprovar que políticas agrícolas de nações desenvolvidas geram distorções no mercado mundial e prejudicam os exportadores competitivos, não apenas do Brasil.

            Os Estados Unidos e a União Europeia gastam bilhões de dólares subsidiando os seus agricultores. Como ambos são também grandes exportadores, os agricultores brasileiros, na prática, são obrigados a competir não com os seus concorrentes. A concorrência é, naturalmente, uma competição saudável e necessária para que nós possamos aperfeiçoar a nossa capacidade de produção. Mas, na verdade, os produtores brasileiros competem com os orçamentos dos países que compõem a União Europeia e dos Estados Unidos da América.

            A União Europeia, por exemplo, é recordista em subsidiar o setor agrícola. Quase cinco vezes mais do que o Brasil em relação à renda da agricultura. Em relação à produção por hectare, essa diferença chega a vinte cinco vezes mais do que o Brasil subsidia aos nossos agricultores.

            Já os Estados Unidos são recordistas em usar subsídios disfarçados que estimulam o aumento da produção e de exportação, derrubando preços internacionais, favorecendo a especulação, que traz enormes prejuízos, não apenas à agricultura brasileira, mas à agricultura de um conjunto de países, como os que vão se reunir, daqui a poucos dias, para uma nova rodada dos Brics - Brasil, Índia, Rússia, África do Sul e a China -, que representam aproximadamente 15% das exportações mundiais.

            É uma combinação arriscada. Por um lado, o subsídio estimula artificialmente o aumento da produção. Por outro lado, coloca esses produtores numa situação e numa conjuntura em que eles vão produzir sem qualquer tipo de risco. Considerando o risco uma característica, uma natureza do sistema capitalista, é uma contradição, portanto, com esses países que ou desenvolvem políticas liberais ou políticas sociais democratas.

            O cão de guarda brasileiro, Sr. Presidente, precisa voltar às suas funções o mais rápido possível. Os Estados Unidos e a União Europeia, de novo, aprovaram novas políticas agrícolas, e os estudos desenvolvidos por especialistas brasileiros mostram que há grandes riscos para a produção agrícola dos nossos países, grandes riscos de esses subsídios serem altamente distorcidos, produzirem, enfim, consequências no mercado, já na produção nas safras de 2014/2015.

            Antecipando as consequências das novas políticas para a nossa agricultura, coube à Comissão de Relações Exteriores fazer um amplo debate, que contou com a presença de especialistas, que contou com a presença da Confederação Nacional da Agricultura, presidida pela Senadora Kátia Abreu, o Senador Moka e tantos outros Senadores, uma audiência pública em que nós discutimos as origens, as consequências e os efeitos dessas novas políticas agrícolas. E ficou evidente, à luz de tudo o que foi detalhado, das informações que foram apresentadas, que as evidências são as mais consistentes e de que o nosso País não pode e não deve perder tempo diante dessa possibilidade real.

            As novas leis agrícolas dos Estados Unidos e da União Europeia poderão produzir e gerar bilhões de dólares de prejuízos para a agricultura brasileira, não apenas para o agronegócio brasileiro, mas também para a pequena propriedade de base familiar, que é competitiva e, cada vez mais, alcança posições no mercado, inclusive posições de exportação.

            Eu me refiro aqui, Sr. Presidente, à agricultura de base familiar do seu Estado, do Rio Grande do Sul, como é o caso da agricultura de base familiar do meu Estado, o Espírito Santo, que é um Estado liderado e dominado pela pequena propriedade de base familiar, mas que, ainda assim, é o segundo produtor de café do País. Produz duas variedades de café: o café arábica, nas regiões frias, e o café robusta, nas regiões mais quentes, por ser o robusta uma variedade, uma espécie de café mais selvagem que suporta as variações da temperatura e as oscilações climáticas.

            É esse o quadro, Sr. Presidente, em razão do discurso que estamos fazendo. Não podemos apenas monitorar os efeitos dessa iniciativa. Não podemos apenas ficar no debate ou no discurso, ainda que isso possa ser importante, mas é insuficiente. É necessário que haja uma boa mobilização do Congresso Nacional. É necessário que o Congresso brasileiro, que o Senado brasileiro possa ser protagonista desse debate, chamando a atenção do Governo Federal, do Ministérios das Relações Exteriores, do Ministério da Agricultura, da Presidência da República, para que nós possamos agir antes que o leite seja derramado. Não são políticas que vão impactar neste momento, mas são políticas que já impactarão no ano seguinte, em 2015. E da mesma forma que agimos no contencioso do algodão, liderados e coordenados pelo Embaixador Roberto Azevedo, hoje Coordenador e Presidente da Organização Mundial do Comércio, é momento de nós afiarmos, no bom sentido da palavra, as nossas armas, as nossas ferramentas, porque as evidências são as mais consistentes.

            Até porque, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, nós estamos na antevéspera de uma importante rodada dos Brics. O nosso País estará recepcionando os mandatários da Índia, da China, da Rússia e da África do Sul, no mês de fevereiro. São países que têm larga relação com o agronegócio e com a agricultura, ou com a produção ou com o consumo. Faz-se absolutamente necessário que esta pauta possa e deva fazer parte da reunião desses mandatários, em Fortaleza, oportunidade que em que nós brasileiros estaremos recebendo todos esses mandatários.

            É essa, Sr. Presidente, a manifestação que fazemos na tarde desta quarta-feira, na expectativa e na confiança de que esse tema possa fazer parte da pauta da Presidenta Dilma, assim como dos demais presidentes que estarão presentes em Fortaleza para mais uma rodada dos Brics.

            A nossa agricultura, de novo, está sendo violada, violentada e ameaçada por subsídios disfarçados gerando e produzindo angústia e perspectivas de prejuízos em vários dos nossos Estados brasileiros.

            E quero crer, Sr. Presidente, com a maior segurança, convicção e sinceridade, que defender a agricultura brasileira e os nossos produtores é defender uma bandeira que é do absoluto interesse da Nação brasileira por tudo que representa não apenas economicamente a agricultura brasileira, mas por tudo que representa socialmente, pelas oportunidades que gera para centenas de milhares de brasileiros, de capixabas, de mineiros e de tantos outros brasileiros que dão a sua vida, que lutam de sol a sol e que não querem favores e não querem privilégios, mas querem competir em igualdade de condições com os outros mercados pela capacidade, pela competitividade e pela competência que tem a nossa agricultura.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/07/2014 - Página 209