Discurso durante a 165ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa de proposta de S. Exª de reforma do sistema político-eleitoral vigente .

Autor
Luiz Henrique (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Luiz Henrique da Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA, LEGISLAÇÃO ELEITORAL.:
  • Defesa de proposta de S. Exª de reforma do sistema político-eleitoral vigente .
Publicação
Publicação no DSF de 14/11/2014 - Página 60
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA, LEGISLAÇÃO ELEITORAL.
Indexação
  • DEFESA, PROPOSTA, REALIZAÇÃO, REFORMA POLITICA, COMENTARIO, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO ELEITORAL, REFERENCIA, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, PROPAGANDA ELEITORAL, CANDIDATO, MELHORIA, MODELO, PARTIDO POLITICO.

            O SR. LUIZ HENRIQUE (Bloco Maioria/PMDB - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma frase atribuída ao sociólogo Karl Marx é de que “quando a história se repete, é uma tragédia; e quando volta a repetir-se, é uma comédia”.

            Vivemos dois momentos muito tristes nesta nossa Pátria: o rumoroso processo do mensalão e, agora, o mais ainda vultoso e rumoroso processo de corrupção na Petrobras.

            Em março do primeiro ano desta Legislatura, em março de 2011, o Presidente José Sarney criou uma comissão integrada por personalidades desta Casa - ex-ministros, ex-governadores, presidentes e líderes de partidos - para elaborar e propor projetos de reforma política. Eu tive a honra de participar daquela comissão, que trabalhou em ritmo veloz, sob a presidência firme, objetiva e decidida do Senador Francisco Dornelles. Os resultados daquela comissão consubstanciaram-se em projetos de emenda à Constituição, ou projetos de lei complementar, ou projetos de lei.

            Um deles, o Projeto de Lei do Senado nº 268, protocolado em 18 de maio de 2001, dispõe sobre o financiamento público exclusivo das campanhas eleitorais e dá outras providências.

            Não obstante seja subscrito por essa comissão que a imprensa rotulou de Comissão de Notáveis, não obstante fosse seu primeiro subscritor o Presidente da Casa, José Sarney, esse projeto ainda dormita nas gavetas desta Casa. E, enquanto se mantém esse nebuloso sistema de financiamento de campanhas eleitorais, permitindo que uma empresa concessionária do Governo para execução de determinada obra, permitindo que as grandes empreiteiras deste País financiem campanhas eleitorais, esse projeto dormita nas gavetas desta Casa.

            Logo, logo, teremos o início de uma nova Legislatura, e eu espero que a eclosão desse tsunami de corrupção na Petrobras nos leve a dizer: “Basta! Chega!” Vamos acabar com o financiamento privado nas campanhas eleitorais! Vamos permitir que pessoas físicas - em limite que não sei se o mais adequado é até dois ou três ou cinco salários mínimos -, que apenas pessoas físicas, num limite mínimo, possam contribuir com os candidatos, possam contribuir com os partidos na campanha de seus candidatos”.

            Evidentemente, essa não é uma reforma a ser feita isolada, mas um conjunto de reformas políticas que deem credibilidade ao Poder Público, que deem credibilidade às instituições democráticas, que nos tirem dessa exaustão depressiva de ver toda noite - no jornal, no noticioso nacional - novas denúncias de corrupção!

            Evidentemente que esses dois casos que eu citei estão associados ao financiamento de campanhas eleitorais - essa montanha de dinheiro que vem sendo noticiada como desviada dos seus objetivos para pessoas ligadas ao Executivo e ao Legislativo -, e esses recursos não foram providos basicamente para suportar as campanhas eleitorais.

            Por isso, aquela Comissão propôs um elenco de projetos reformistas. Eu fui Relator de um projeto de lei que já foi aprovado no Senado, mas está na Câmara dos Deputados. O projeto estabelece que os Senadores só podem ter um suplente, e que esse suplente não pode ser parente até o terceiro grau do titular do mandato; estabelece também que o suplente substitui, mas não sucede o titular; em caso de vacância, terá que ser submetido a uma eleição no pleito subsequente.

            Mas isso não basta. É preciso estabelecer um novo sistema de propaganda eleitoral na TV, que se constitui no item mais caro das campanhas políticas.

            Voltarmos ao sistema inicial, pelo qual fui eleito Deputado Estadual e o meu primeiro de cinco mandatos de Deputado Federal. Propaganda eleitoral ao vivo, sem pré-produção, sem maquiagem, em que a presença do candidato revele as suas ideias, os seus programas, aquilo que ele realmente pense, não aquilo que o marqueteiro mandou-o dizer. Eliminar os comerciais de propaganda política, que transformam, Presidente Cristovam Buarque, os políticos em produtos de consumo. Produtos empacotados, envelopados, produtos coloridos pela habilidade dos profissionais de marketing, produtos enriquecidos com a computação gráfica e com outros recursos “spielberguianos” de que dispõem as agências de propaganda dedicadas às campanhas políticas.

            O primeiro item é o financiamento público. O segundo item é a campanha na TV ao vivo, com a eliminação dos comerciais de propaganda. O terceiro item é restabelecer aquilo que o Congresso já aprovou e que acabou sendo declarado inconstitucional pelo Supremo: a cláusula de barreira, que faça este Congresso se exprimir pelas verdadeiras ondas programáticas do povo brasileiro - e eu acredito que não se necessite mais do que cinco ou seis partidos, ou que se readmitam os 11 que havia antes de 1964 e que foram eliminados pelo regime autoritário. Reduzir o número de partidos.

            Acabar com os partidos de aluguel, que existem apenas para negociar segundos de tempo de televisão. Estabelecer, nesse objetivo, a proibição de coligações nas eleições proporcionais.

            Dar tempo ao País para pensar-se e repensar-se. Dar tempo aos governos para atuarem dentro de programas consistentes de médio e longo prazo. Sairmos dessa emergência de eleições a cada dois anos. Acabaram as eleições para o Executivo nacional, para os Executivos estaduais, para a Câmara dos Deputados e um terço do Senado, e já se estão articulando as eleições municipais. Esta é a meta, é o horizonte da política brasileira: a próxima eleição, que vai ocorrer só daqui a dois anos.

            O que eu proponho é mandato de seis anos, sem reeleição. A reeleição já é algo estranho à história, à tradição e à realidade brasileira. Agora, a reeleição sem desincompatibilização, sem afastamento do titular do mandato do seu cargo para disputar as eleições em igualdade de condições com os seus concorrentes é uma excrescência ainda maior.

            E os nobres Senadores que estão me ouvindo e os telespectadores que estão me vendo devem pensar assim: “E você o que fez quando foi candidato a prefeito na sua reeleição? Ou quando pleiteou a reeleição de governador?”

            Eu dei um exemplo ao País. Eu escrevi artigos e fiz discursos contra a reeleição sem renúncia do cargo pelo prefeito, pelo governador ou pelo Presidente da República. E o que eu fiz quando fui candidato à reeleição em Joinville? Afastei-me do mandato. Quando fui candidato a Governador, eu renunciei ao mandato. Como Prefeito, eu me licenciei, porque o Vice-Prefeito tinha assumido o mandato de Senador, e, por isso, eu não podia renunciar. Como Governador, eu renunciei para que o Vice assumisse. Foram 27 governadores candidatos à reeleição, e eu fui o único que renunciou e o fiz por absoluta coerência com aquilo que sempre preguei.

            Reeleição é nefasta, porque o titular do cargo executivo candidato à reeleição já tem uma superioridade imensa por ter tido uma publicidade em função dos seus atos, das suas obras, da sua presença nas solenidades. Ele já leva uma vantagem imensa. Agora, imaginem um governador que pode reduzir alíquota de ICMS, que pode conceder crédito presumido e é candidato à reeleição?! É um absurdo!

            E eu não quis praticar isso. Entreguei tudo. Saí da casa governamental. Entreguei tudo: entreguei chave, entreguei celular. Ganhei a eleição disputando em igualdade de condições com os meus concorrentes.

            Assim, a reforma política que eu proponho: mandato de seis anos para que os governos tenham condições de efetivamente planejar e executar ações concretas, coordenadas, eficazes e eficientes; e o fim da reeleição.

            Felizmente, ambos as candidatos a Presidente manifestaram-se na direção de eliminar a reeleição.

            Não fica apenas aí a necessidade de reforma política para aprimoramento da democracia. É preciso que nós tenhamos a fidelidade partidária instituída por lei, não por uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral, suprindo a inércia do Legislativo, com uma fidelidade partidária que condene o infiel não apenas a perder o mandato, mas que o proscreva das duas eleições seguintes. Que, além de perder o mandato atual, ele fique inelegível por duas eleições seguintes.

            E não é só a fidelidade partidária. É preciso instituir o sistema político que dê credibilidade aos partidos políticos. Hoje, Senador Cristovam, Senador Fleury, podem fazer qualquer pesquisa, do Acre ao Rio Grande do Sul, e o que responderão os entrevistados? No mínimo, 70% dirão que não votam em partido. Os brasileiros votam em pessoas, em personalidades, umas boas e outras nefastas. E o que pode corrigir isso? É o voto em lista fechada para vereador, deputado estadual e Deputado Federal. As regras atuais, personalíssimas, promovem a autofagia dos partidos. Os candidatos não disputam votos com os adversários; mais das vezes, procuram tirar dos seus companheiros. Então, é um processo autofágico que exalta a personalidade e execra o partido.

            O voto partidário é uma exigência para o aprimoramento da democracia, porque não há democracia possível sem partidos fortes, ideológicos, programáticos, partidos que, como diz a expressão, expressem a vontade de parte da sociedade: a parte que é socialista, a parte que é social-democrata, a parte que é liberal, a parte que é comunista, a parte que é ambientalista, os verdes. Só existe partido, efetivamente, quando ele expressa uma parte do pensamento da sociedade.

            A próxima legislatura vai inaugurar-se sob a algaravia de 28 partidos. Sem construir uma torre, nós construímos uma babel partidária: partidos falando as línguas mais diversas; algumas línguas claras, de pessoas eleitas para servir ao País, e algumas línguas nefastas, de pessoas eleitas para se servirem sem pensarem no País.

            Essa é outra reforma importante que nós temos que fazer.

            Ulysses Guimarães, meu amigo, meu companheiro, que eu acompanhei nos seus últimos dez anos de vida, dava o alerta: nós fomos eleitos para mudar; ou mudamos ou merecemos ser mudados. Nós vamos merecer todos ser mudados, se não entendermos a realidade grave em que vive o País. A democracia é uma planta tenra que tem que ser regada todos os dias.

            E a nossa democracia vive um de seus momentos de maior fragilidade, de maior descrença.

            Quando eu vejo cenas como aquela do Rio de Janeiro em que um pequeno batalhão de narcotraficantes armados ocupa um condomínio residencial do Programa Minha Casa, Minha Vida que ia ser inaugurado daqui a 15 dias e leva famílias que não se inscreveram, que não foram avaliadas no programa para invadirem e tomarem conta das casas, eu vejo que há um grave, gravíssimo hiato de autoridade neste País. Isso me faz lembrar até daquela canção do Chico Buarque, seu parente, seu primo, que apela diferente. Ele não diz chama a polícia; ele diz: chama o ladrão, chama o ladrão. É o refrão de Chico Buarque.

            Há outras realidades gravíssimas, e esse não é um problema só nosso. Em Nova York, já houve o movimento Occupy Wall Street; no México, estão queimando prédios públicos. É um momento dramático.

            Há um rio subterrâneo de esgotamento e de indignação, que não estamos percebendo. Ele aflorou na terra, ano passado, nos movimentos que ocuparam as ruas deste País. E este Congresso não o escutou; colocou uma venda nos olhos e não o viu.

            Aquele era o momento para o Congresso fazer a reforma política, aquele era o momento de uma reação do Congresso, mas esse rio continua correndo debaixo dos nossos pés. Deus nos livre de ele se transformar num tsunami social.

            A reforma política é a tarefa mais urgente a ser feita neste País. Não podemos esperar mais um minuto, mais um segundo. Não podemos retardar essa decisão de mudar.

            Se não o fizermos, Ulysses, estejas onde estiveres, vão ecoar as tuas palavras: nós fomos eleitos para mudar; ou mudamos ou merecemos ser mudados.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/11/2014 - Página 60