Discurso durante a 108ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexões acerca da reforma política, em especial no tocante à necessidade de redução dos gastos com campanhas e de fortalecimento dos partidos políticos.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SISTEMA POLITICO:
  • Reflexões acerca da reforma política, em especial no tocante à necessidade de redução dos gastos com campanhas e de fortalecimento dos partidos políticos.
Aparteantes
Ana Amélia, Vanessa Grazziotin.
Publicação
Publicação no DSF de 30/06/2015 - Página 80
Assunto
Outros > SISTEMA POLITICO
Indexação
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO, POLITICA NACIONAL, REGISTRO, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO ELEITORAL, OBJETIVO, REFORMA POLITICA, REFORMULAÇÃO, DOAÇÃO, REDUÇÃO, DESPESA, CAMPANHA ELEITORAL.

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Sr. Presidente.

            Srªs Senadoras, Srs. Senadores, ouvintes que nos ouvem pela Rádio Senado, telespectadores que nos assistem pela TV Senado, o que me traz à tribuna hoje é o tema que foi tratado aqui em grande parte do pronunciamento pelo Senador Jorge Viana, a reforma política. Por isso não fiz a S. Exª nenhum aparte, porque já era o tema a que estou dedicando a fala de hoje.

            E por que esse tema? Exatamente por aquilo que as nossas Senadoras, colegas, que me antecederam no aparte falaram: a importância que ele tem para o momento e a movimentação que o Senado brasileiro está fazendo em relação a esse tema.

            É claro que, nos últimos tempos, a reforma política eleitoral está servindo como a panaceia para todos os males. Ou seja, temos problemas institucionais, temos problemas de representatividade. Então, acha-se que tem que fazer a reforma política o mais rápido possível para poder resolver.

            Também acho que temos que fazer uma reforma política eleitoral, também acho que o nosso sistema precisa de correções, mas o que nós acabamos vendo com a pressa foi o resultado de uma votação na Câmara dos Deputados que acabou decepcionando muito o Parlamento aqui, o Senado, mas também parte da sociedade, porque não tratou dos pontos que são os pontos, sob a minha ótica e também penso que do Senador Jorge Viana, que aqui me antecedeu, mais importantes para que a gente realmente enfrente a crise de representatividade.

            E nós, sem dúvida alguma, estamos numa crise política. Eu queria resgatar, só para situar essa crise política, uma fala do ex-Presidente desta Casa Senador José Sarney, em que ele fez uma discussão sobre a reforma política e eleitoral e fez um discurso muito interessante desta tribuna, falando de algumas questões importantes que fazem uma reflexão e que antecedem a definição de como temos de mudar as coisas. Dizia ele:

[...] [A crise política] atinge [...] as instituições democráticas, há muito vítimas do problema da representatividade, quando a Tecnologia da Informação, em tempo real, gera um desgaste da vontade eleitoral, que tem que competir com as cobranças da mídia e com o senso de urgência das soluções que não são compatíveis com o que podem fazer os Poderes da República. Espera-se do Executivo [por exemplo] que faça obras em tempo recorde, quando as rotinas de licenciamento e as intervenções de órgãos reguladores as prolongam por anos; do Legislativo, que, com as leis, mude da noite para o dia a natureza das coisas, sem lembrar que as leis levam tempo para fazer efeito; do Judiciário, que condene e prenda, ignorando os ritos que prolongam a prestação jurídica. [...]

Nas várias esferas de poder, reagimos com senso de urgência na tentativa de responder a essas vozes. Os Parlamentares [nós] somos considerados como os primeiros repudiados - representamos o político por excelência - na dicotomia entre a vontade do eleitor e a solução dos problemas cotidianos, fora do alcance da ação legislativa. Este fenômeno, que se repete em escala mundial, torna-se muito mais agudo entre nós pela peculiaridade do voto proporcional uninominal, que leva o eleitor a desconhecer quem elegeu.

            Ou seja, o Senador faz aqui uma análise do que gera a crise política e do porquê de ela ser gerada e também do que distancia o Parlamento - segundo ele, é o Parlamento que fortalece a democracia - do eleitor. Ele continua, falando que o Congresso Nacional precisa ser fortalecido: "[...] não há democracia forte, e uma democracia frágil é um prenúncio de decomposição [sem um Congresso forte]. Sem ela, perde-se a liberdade, e surgem as fórmulas salvadoras".

            Por que eu quis fazer essa reflexão, relembrando esse pronunciamento do Senador Sarney? Para que a gente não tenha fórmulas salvadoras, não ache que votações apressadas ou avaliações superficiais possam, de fato, nos trazer respostas para problemas profundos, para problemas críticos, para problemas mais graves.

            Por isso, eu queria enaltecer muito aqui a atitude do Presidente desta Casa, o Senador Renan Calheiros, que formou uma comissão ampla, representada por diversos Senadores e por diversos partidos políticos, para discutir essa reforma eleitoral, tanto a proposta que vem para a Câmara, como também a que já tramita no Senado, e para fazer uma reflexão sobre a nossa capacidade de dar respostas ao que a sociedade cobra, de melhorar a representatividade política e as respostas que temos de dar à sociedade.

            Quero parabenizar o Senador Jorge Viana, que preside essa comissão, e também o Senador Romero Jucá, que vai ser o relator. Quero dizer que tenho certeza de que o aprofundamento do debate poderá nos levar a uma saída que efetivamente dê respostas à população.

            Não vamos conseguir resolver todos os problemas. Senadora Vanessa, não vamos conseguir fazer, talvez, as mudanças mais profundas que poderíamos fazer, porque não temos o tempo necessário e porque não há consenso estabelecido, formatado entre nós. Mas acho que temos de ver aquilo que é de maior consenso, para que comecemos a mexer e comecemos a dar respostas à sociedade, não uma resposta superficial, mas uma resposta que, efetivamente, mude a relação de poder e que fortaleça a democracia.

            Como disse aqui o Senador Jorge Viana, também penso que há dois pontos importantes em que temos de ter foco nessa reforma: o primeiro é o fortalecimento dos partidos; o segundo, o custo das campanhas eleitorais. O fortalecimento dos partidos é fundamental para o fortalecimento da democracia e da representatividade parlamentar. Partidos fracos implicam dificuldade maior de se construir base de apoio. Partidos fracos dificultam a possibilidade de uma reforma administrativa para a redução do número de Ministérios. Acordos com lideranças não são suficientes, pois os liderados podem não acatá-los, o que leva o Governo a necessitar de acordos individuais, que, em geral, envolvem nomeações para cargos e liberação de emendas ao Orçamento. Com partidos fracos, o eleitor corre o risco de votar em um candidato majoritário por um partido e de ver esse político mudar de partido, perdendo o significado do voto.

            Portanto, precisamos fortalecer os partidos, e aí é importante tratar do sistema eleitoral. A Câmara aprovou ou discutiu o chamado "distritão" e, por pouco, não o aprovou.

            Tenho críticas também ao nosso sistema de voto proporcional com lista aberta, em que você vota no indivíduo e não fortalece o partido, em que o eleitor, muitas vezes, nem lembra em quem votou e em que o partido fica refém do voto do indivíduo. Sou favorável às listas fechadas, mas sei da dificuldade de passarmos esse sistema por esta Casa, porque nem todos pensam dessa forma.

            Então, nós teríamos de caminhar para algo no sentido misto. E, talvez, seja importante, se não quisermos votar o distrital misto para todas as eleições, aproveitarmos um projeto do Senador José Serra que foi votado pela Comissão de Constituição e Justiça e que estabelece o voto distrital para as cidades com mais de 200 mil habitantes, com mais de 200 mil eleitores, para a eleição de Vereadores. Se pudéssemos adequar esse projeto ao distrital misto e se a Câmara entendesse isso como importante, acho que teríamos condições de verificar a forma como esse sistema eleitoral poderia fortalecer tanto os eleitos como os partidos. Não tenho dúvidas de que é isso de que precisamos no nosso sistema eleitoral.

            Outro aspecto que é importante é a cláusula de barreira, o desempenho. Não é possível que haja tantos partidos criados no afogadilho do interesse deste ou daquele líder político e que, depois, esses partidos passem a fazer parte de negociações no processo eleitoral. Não quero referir-me aqui a partidos menores históricos. Sei da importância que tem o Partido Comunista do Brasil, o Partido de V. Exª, Senadora Grazziotin, mas não podemos permitir, para proteger partidos históricos, que outros partidos proliferem. Nós temos de encontrar um meio para impedir isso. Se não é pela representatividade apenas, o que podemos fazer para que o nosso sistema eleitoral não seja um sistema pródigo na criação de legendas que não representam, como representa o Partido Comunista do Brasil, uma ideologia, que não representam ideias, que não representam programas, a não ser interesses próprios de algumas lideranças? Acho que isso é urgente, e, com certeza, nós fortaleceríamos os partidos políticos.

            A Câmara já fez uma cláusula de barreira, ou seja, os partidos que não tiverem um representante não terão direito ao Fundo Partidário. Eu iria além disso, pois acho que temos de aumentar essa representatividade na Câmara, para barrar o acesso ao Fundo Partidário e também ao tempo de rádio e de televisão, o que, na maioria das vezes, é aquilo que é utilizado para se fazerem as negociações em composições e em acordos político-eleitorais.

            Quanto ao fim das coligações proporcionais, quero dizer que coligação é feita em torno de programa, coligação é feita em torno de objetivos, de metas, daquilo que defendo de desenvolvimento para o meu País, para o meu Governo, para o meu Município, e não para uma eleição proporcional, em que o que vale é a soma matemática dos votos que recebem os candidatos com os partidos que participam da coligação. Não há justificativa para isso.

            Então, vamos migrar diretamente para uma Federação partidária, em que há, inclusive depois da eleição, o compromisso de continuidade dessa frente. Então, acho que temos de pensar nisso também.

            E, é claro, a questão da fidelidade partidária é muito importante. Não dá para mudarmos de partido como mudamos de roupa, não dá para mudarmos de partido como fazemos uma mudança de clube. Partido é algo que o identifica, que o identifica com uma história, com uma visão de mundo, com aspectos sobre o desenvolvimento, sobre como a sociedade se organiza. Por isso, a importância da fidelidade partidária. Obviamente, não queremos uma camisa de força. De tempo em tempo, pode ser dado aos Parlamentares, até porque os partidos também podem mudar, a opção de fazer a transferência partidária, mas o que não pode acontecer é essa permissão, essa permissividade de se fazerem as mudanças. É claro que, agora, é proibido isso. Enfaticamente, há decisões judiciais. Proibimos isso por lei, mas havia a situação de criação de um novo partido, o que também já foi dificultado pela Câmara dos Deputados.

            Quero entrar no segundo ponto, que acho fundamental, que é o financiamento de campanha. Acho que, dificilmente, vamos conseguir reverter o que a Câmara fez. Eu sinto muito que a Câmara tenha mantido o financiamento privado de campanha. Sinto muito, porque empresa não vota, empresa não manifesta sua vontade política, e é em razão exatamente desses financiamentos que estamos vendo tantos problemas. Aí há o questionamento se o financiamento legal proveio de verba ilegal, se ele atendeu a um partido, se ele atendeu a dois. Hoje, as empresas doam para todos os partidos. Então, acho que temos de mudar isso.

            A Câmara aprovou que só partidos políticos podem receber recursos empresariais. Eu preferiria, sinceramente, que recebêssemos apenas o financiamento público, no máximo com a garantia de que o eleitor, a pessoa física, pudesse também contribuir, mas penso que não é isso que vai prevalecer nesta Casa. Então, pelo menos que consigamos aqui determinar um limite. Uma empresa não pode doar ilimitadamente, não pode doar para todos os partidos! Vamos dizer: uma grande empresa pode doar, em toda a eleição, para todos os partidos, por exemplo, R$500 mil ou R$1 milhão; mais do que isso, não pode doar. Temos de ter limite de despesas. Não é possível uma campanha custar caro, como disse o Senador Jorge Viana! Para termos competitividade, temos de ter muito dinheiro: é dinheiro para fazer programa de tevê, é dinheiro para fazer material de campanha, é dinheiro para viajar, é dinheiro para pagar cabo eleitoral.

            Isso não é possível, não é possível! Programa de TV não pode ser do jeito que é! Parece uma produção cinematográfica. Você vira um artista, em vez de ser um debatedor da política. Nós temos de mudar isso.

            Tenho a certeza de que essa comissão, em que estamos discutindo isso, Sr. Presidente, vai ser muito útil para fazer esse debate.

            Concedo um aparte à Senadora Ana Amélia.

            A Srª Ana Amélia (Bloco Apoio Governo/PP - RS) - Senadora Gleisi Hoffmann, penso que o tema não se esgota. Como dizemos, "água mole em pedra dura tanto bate até que fura". Então, quanto mais falarmos sobre isso, quanto mais informação dermos, nós vamos ter o apoio da sociedade. Como disse V. Exª, Senadora, são 32 partidos, 29 partidos na Câmara dos Deputados. Como é que isso vai se acomodar? E aí como fica a tal governabilidade também para você fazer concessões a torto e a direito, como eu digo? Isso é muito difícil. Então, a cláusula de barreira é uma necessidade até para a consolidação de um sistema mais democrático do ponto de vista de partidos fortes. Nessa questão de se mudar de Partido, também concordo com V. Exª: é preciso haver um pouco de estabilidade. Não é por conta de que, em um partido, existem pessoas assim ou assado que você vai sair do partido. Você tem de fazer o seu papel, trabalhar corretamente e mostrar que é possível, sim. Não adianta: onde existem pessoas, existem problemas, em qualquer setor, não só na área política. É que, na nossa área, no Senado, na Câmara, em uma Assembleia, nós somos vulneráveis. Nós somos casa da Geni, em que todo mundo bate. Então, não se dá o mesmo tratamento a outros Poderes da República em relação ao que existe aqui. Falo isso com muita tranquilidade, com a consciência tranquila de quem aqui está trabalhando. Mas, como fui jornalista por muito tempo, vejo que às vezes se pinta uma coisa e que se dá um lado só, uma única versão. Não se dá a completa informação. Essa é uma carência que temos na forma de dizer o que está acontecendo de real. Então, reduzir o custo de campanha é fundamental. Como disse V. Exª e como falei, há pouco, no aparte ao Senador Jorge Viana, é produção cinematográfica, produção digital, digitalizada. São coisas absolutamente caras, com efeitos especiais. É preciso fazer algo muito mais natural e muito mais barato, é preciso fazer uma produção mais barata. Vemos que produtores de televisão se formam para trabalhar exclusivamente em campanhas eleitorais. Isso é cinema, é produção de cinema! E não deve ser isso. Tem de ser real, não pode ser ficção. Cinema é ficção. Nós temos de fazer uma campanha real. E ela, para ser real, tem de ser muito barata, porque o País não suporta mais o que estamos vivendo em relação a isso. Essa comissão já está trabalhando com muito afinco. O Senador Jorge Viana fez um relatório aqui. Tem feito um relatório periódico, e a abordagem de V. Exª chega no momento de insistirmos na questão do excesso de partidos, na necessidade de uma cláusula de barreira. Não somos, como disse V. Exª, contrários a partidos que tenham presença aqui no Senado, na Câmara. O PCdoB não é um dos maiores partidos, mas tem representação, tem Parlamentares eleitos. Agora, existem alguns que não têm e que têm representação também no Parlamento. Essa é a questão que precisamos rediscutir, mantendo a democracia, mantendo as instituições fortes, mas com moralização de procedimentos e de conduta, especialmente numa campanha eleitoral. Hoje, uma campanha até para vereador, Senadora, está custando muito caro! Até uma campanha para vereador, que seria na base de um Município pequeno ou médio. Então, temos que fazer um arranjo geral, uma faxina geral para melhorar e para que a população olhe para a política como uma necessidade essencial num regime democrático. Parabéns, Senadora Gleisi, pela abordagem do tema!

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigada, Senadora Ana Amélia. Agradeço o aparte de V. Exª.

            Acho que uma coisa positiva que estamos tendo é convergência, pelo menos aqui, no Senado. Participei de duas reuniões da comissão. Faço parte dela. Amanhã, nós vamos ter reunião às 14 horas.

            Parece-me que há uma vontade muito grande dos Senadores em acertar isso, em realmente dar uma solução, um resultado para a sociedade, e não apenas defender seu ponto de vista, tanto que os partidos, as Lideranças estão até abrindo mão de questões que eram muito firmes em relação a essa discussão no passado. O próprio PT, por exemplo, com o financiamento puro público, com a questão do voto em lista fechada. Quer dizer, nós temos que ter uma certa maleabilidade para que possamos avançar. Acho que, se nós conseguirmos resolver esses dois problemas principais, que são custo de campanha, financiamento de campanha e fortalecimento dos partidos políticos, nós vamos dar um passo muito grande para melhorar o nosso sistema eleitoral e, por consequência, a democracia brasileira, porque é disso que nós estamos falando. Não podemos ter uma democracia fortalecida se aquilo que leva a essa democracia tem vícios, tem problemas, tem desvios. Acho que nós temos essa responsabilidade. Espero que o Senado consiga, realmente, fazer esse equilíbrio.

            Eu gosto muito de uma história que o Senador José Sarney conta. Estou falando isso porque li no discurso dele: "Nós temos um sistema bicameral". Eu já aproveito para falar a respeito, porque a Câmara aprovou mandato de cinco anos para todo mundo, para Senadores, para Deputados. Creio que seria mais lógico, então, acabar com o sistema bicameral e fazer somente unicameral: cinco anos, só Câmara, um grande Parlamento.

            Mas o Senador Sarney conta uma historinha. Ele diz o seguinte: "Os Estados Unidos, quando estavam para definir o regime de representação deles, queriam algo próximo à Inglaterra, mas não poderia ser como o regime inglês, a Câmara dos Lordes e a Câmara do Povo, porque estavam se contrapondo, inclusive, àquele modelo de realeza. Eles eram um Estado federado." E discutiram por muito tempo. Diz o Senador Sarney que até orações fizeram, para que Deus iluminasse que tipo de sistema eles teriam de representatividade parlamentar. Depois de muito pensar, uns três dias em reunião, tiveram uma ideia, um dos assessores do Presidente teve uma ideia e disse: "Podemos fazer, sim, um sistema bicameral. Podemos ter a representação do povo, que é proporcional ao número de pessoas de cada Estado, de cada distrito, mas ter também a representação do Estado federado. Não vai ser a Câmara dos Lordes, mas vai ser a representação daqueles que vão defender o seu Estado como território." Aí, nasceu o Senado americano, enfim, e a Câmara. E o nosso sistema é parecido também. Foi copiado de lá, porque é um sistema bicameral.

            Então, dizia o ex-Presidente Sarney: "A Câmara é onde as coisas chegam quentes, e o Senado é onde colocamos um pouco de equilíbrio. É como a xícara: se o chá está muito quente, tento tomar na xícara; se encontrar dificuldade, derramo um pouco no pires, e ele esfria."

            Penso que essa comparação é importante para se ter a noção do quanto é relevante termos um espaço de discussão que traga um pouco o equilíbrio e uma visão mais sistêmica do País, das relações e das instituições. Às vezes, no afã de querer mudar, acabamos destruindo aquilo que já construímos. Então, acho que temos que construir em cima das experiências boas, descartando as ruins, mas ir avançando.

            Faço essa referência também por conta do instituto da reeleição. A Câmara mudou o instituto da reeleição, ou seja, acabou com a reeleição. Temos, no Partido dos Trabalhadores, sempre tivemos, uma posição contrária ao instituto da reeleição. Votamos contra. Perdemos. Agora, temos a reeleição. Nós não temos 30 anos de experiência do instituto da reeleição, aí vamos jogar agora fora esse instituto, porque há uma crítica conjuntural a uma situação da reeleição da Presidenta Dilma.

            Para se ter uma ideia, Senadora Ana Amélia, tenho, aqui, um artigo que foi feito pelo Alberto Carlos Almeida sobre a questão da reeleição. Ele diz o seguinte: "Desde 98, cerca de 69% dos Governadores e 61% dos Prefeitos foram reeleitos. Em 2012, menos de 55% dos que disputaram a reeleição venceram. Em 2014, somente 11 Governadores foram reconduzidos ao cargo, mostrando que o instituto da reeleição não traz, por consequência automática, a reeleição de quem está." Isso porque ele nem computou aqui quem deixou de ser candidato, porque já achava que não tinha condições de se reeleger. Ele vai além e diz: "Claro, nós sabemos que a pessoa que disputa no cargo acaba tendo mais benefícios, mas, então, vamos botar regras para que a pessoa não dispute no cargo. Ela se licencia, sai do cargo e não disputa."

            Não dá para tentarmos promover uma mudança, uma vez que, nem do ponto de vista da história, tivemos tempo de analisar o seu mérito. E, como diz ele, "nós jogamos a água da bacia com o bebê junto", sem, na realidade, salvar os aspectos positivos que nós tivemos, inclusive de continuidade de mandatos que melhoraram situações importantes. Vejam que falo isso, e disputei num Estado a eleição contra um governador que estava no mandato, mas acho que temos que ter mais cautela quando apresentamos soluções.

            Por último, queria aqui falar também de um tema que é importante na reforma política: a participação das mulheres. Nós fizemos uma verdadeira articulação das mulheres Senadoras e Deputadas aqui, no Senado, sob a coordenação da Senadora Vanessa Grazziotin, nossa Procuradora da Mulher, e conseguimos chegar a um acordo numa proposta para que as mulheres tenham representatividade no assento do Parlamento, da Câmara dos Deputados, das assembleias, das câmaras, para que os partidos invistam nas mulheres para participar. Hoje, só como candidatas, o que acontece? Os partidos muitas vezes preenchem essas vagas com candidaturas laranjas, e não com mulheres que efetivamente têm condições de disputar. A mulher não se sente estimulada, porque o partido não investe, não ajuda, não faz algo de forma diferenciada para que ela se prepare para a disputa política.

            Então, chegamos a um acordo, no meu entender, muito importante, que começava com 10% das cadeiras do Parlamento definidas para as mulheres; depois, 12%; e, depois, 15% na terceira eleição. Parecia que essa era uma fórmula justa e equilibrada, mas, infelizmente, perdemos por muito pouco.

            Senadora Vanessa Grazziotin, acho que não podemos desistir. Sei que V. Exª já está rearticulando.

            Eu queria lembrar V. Exª que nós aprovamos, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado - e está aguardando para incluir na Ordem do Dia -, um projeto que apresentei, de lei complementar. Não é uma PEC. É o Projeto nº 78. Esse projeto de lei complementar define 50% das vagas para as mulheres na Câmara dos Deputados, nas assembleias e nas Câmaras de Vereadores.

            Claro que isso não passa, até porque nós já tivemos um acordo feito com um número menor, mas, como esse projeto já está votado na CCJ, basta incluí-lo no plenário, nós poderíamos, num esforço com as ex-Senadoras, fazer uma emenda e resgatar a proposta que nós votamos, que foi apresentada à Câmara dos Vereadores. Em vez de PEC, nós faríamos através de uma lei complementar, que exige menor número de Senadores para aprovar. Já poderíamos aprovar essa medida como uma das primeiras da Comissão da Reforma Política, criada pelo Presidente Renan Calheiros.

            Penso que temos temas, temos bastantes desafios, mas quero dizer que estou muito esperançosa, pelo comportamento que vi dos Senadores, pela atitude que vi dos Senadores de todos os Partidos de querer acertar, de querer responder à sociedade com algo concreto, que efetivamente faça diferença. Estou muito esperançosa de que tenhamos um avanço significativo.

            Concedo um aparte à Senadora Vanessa.

            A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Eu agradeço, Senadora Gleisi. Estava me preparando para iniciar a minha fala, enquanto V. Exª conclui a sua, quando entendi que deveria fazer o aparte. V. Exª tem razão. Apesar de o resultado não ter sido positivo, de não termos conseguido aprovar a emenda constitucional na Câmara, tivemos 293 votos favoráveis.

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Muito expressivo.

            A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - E há muita dúvida ainda por parte dos Srs. Deputados, sobretudo em relação ao conteúdo da emenda apresentada. V. Exª tem um projeto, várias outras Senadoras têm projetos, e amanhã nós faremos o nosso primeiro encontro no Senado Federal. Posteriormente, nós nos reuniremos com as Deputadas para ver o caminho que devemos trilhar. Agora, não tenho dúvida nenhuma de que o caminho passa a ser o Senado Federal. Tenho certeza, convicção absoluta, de que, se tivermos a capacidade de colocar esse tema no centro do debate da Comissão Especial e, posteriormente, no plenário, nós temos condições, sim, Senadora Gleisi, de mudar essa cota em favor das mulheres brasileiras, afinal de contas seremos um dos últimos países a promover essa mudança. A Argentina, numa única eleição, depois de uma reforma política, passou a ter maior representatividade de mulheres. Passou dos 13% para 37%. Quiçá conquistemos essa mesma vitória aqui! Eu tenho ficado muito feliz nesses últimos dias. Não sei se V. Exª tem prestado atenção, mas cada vez mais aumenta o número de matérias jornalísticas e de artigos publicados nos grandes jornais, na grande imprensa brasileira, com referência ao aumento da presença de mulheres na política brasileira. Não tenho dúvida de que isso é fruto do trabalho de V. Exª e de tantas outras mulheres bravas e guerreiras que aqui estão. Parabéns, Senadora Gleisi!

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigada, Senadora Vanessa. Eu que a parabenizo, porque V. Exª tem sido uma guerreira neste tema. Tem-nos coordenado, tem insistido. E graças a essa organização proporcionada pela Procuradoria aqui do Senado, Procuradoria da Mulher, nós conseguimos colocar esse assunto como um assunto importante no debate da reforma política, o que mostra a votação na Câmara.

            Só queria fazer uma correção. O meu projeto é de nº 287. Ele altera, na realidade, a Lei Complementar nº 78.

            Para finalizar aqui, Sr. Presidente, eu queria apenas fazer um agradecimento muito grande ao nosso Ministro de Relações Exteriores, Mauro Vieira, ao nosso Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, ao nosso Secretário da Receita, Jorge Rachid, e também ao Secretário Executivo do Ministério da Fazenda, Dr. Tarcísio, pela publicação no dia de hoje da Portaria 415, a portaria que prorroga por um ano a entrada em vigor da determinação para reduzir a cota de compra nas fronteiras de US$300 para US$150. Esse é um tema em que lutávamos bastante. A Senadora Ana Amélia, inclusive, também já diversas vezes fez essa cobrança da tribuna. E hoje nós estamos comemorando que conseguimos o prazo de um ano para que essa nova cota reduzida entre em vigor, até porque a gente sabe o impacto que tem isso. Reduzir de US$300 para US$150 a compra nas fronteiras brasileiras afeta o turismo, afeta o comércio não só do país estrangeiro, do país vizinho, mas do nosso também.

            Foz do Iguaçu, por exemplo, com a cota de US$300, qualificou muito o seu turismo de compra. Nós não temos mais um turismo de sacoleiros, um turismo de repasse ou de contrabando. Melhorou e melhorou para os hotéis, para os serviços, para os restaurantes, para as lanchonetes que ficam do lado brasileiro.

            Então, isto é importante: a gente não fazer uma mudança bruta. A Fazenda entendeu, o Ministério de Relações Exteriores também entendeu. Nós temos um ano. E agora a gente pode discutir com muita responsabilidade a implementação dos free shoppings nas fronteiras brasileiras.

            Então, eu queria agradecer muito ao Itamaraty, ao Ministério da Fazenda e também a compreensão da Presidenta Dilma por podermos ter alterada a data de entrada em vigor. Era também uma reivindicação muito grande do Paraguai. Refiro-me ao Paraguai porque é o país com que o meu Estado, o Estado do Paraná, tem a maior fronteira, a fronteira mais populosa.

            Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/06/2015 - Página 80