Discurso durante a 60ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Insatisfação com a designação do Senador Antonio Anastasia para a relatoria na comissão especial que aprecia o processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff, e apelo ao Senado Federal por imparcialidade no julgamento.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO:
  • Insatisfação com a designação do Senador Antonio Anastasia para a relatoria na comissão especial que aprecia o processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff, e apelo ao Senado Federal por imparcialidade no julgamento.
Publicação
Publicação no DSF de 28/04/2016 - Página 40
Assunto
Outros > SENADO
Indexação
  • CRITICA, DESIGNAÇÃO, ANTONIO ANASTASIA, SENADOR, RELATOR, COMISSÃO ESPECIAL, APRECIAÇÃO, PROCESSO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, SOLICITAÇÃO, IMPARCIALIDADE, SENADO, ANALISE, IMPEDIMENTO.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes que nos acompanham pela Rádio Senado, a Comissão que analisa o processo de impeachment aqui no Senado Federal começou seus trabalhos, no meu ponto de vista, de uma forma ruim. É lamentável que um processo que se iniciou de uma maneira torta e viciada na Câmara dos Deputados continue ajuntando, no seu percurso, novas máculas que vão terminar por fulminar, do ponto de vista jurídico, toda a sua validade.

    Em que pese toda a chamada à razão que fizemos, o Plenário da Comissão resolveu referendar o nome do Senador Antonio Anastasia, do PSDB, como Relator do processo de golpe contra a Presidenta Dilma Rousseff. O PSDB, derrotado em quatro eleições presidenciais consecutivas pelo PT; o PSDB, que, desde outubro de 2014, vem tentando, insistentemente, derrubar Dilma do cargo a que chegou por meio do voto; o PSDB, que tem como Presidente Nacional o candidato derrotado de 2014, Aécio Neves; o PSDB, que pretende chegar ao Palácio do Planalto não pelas urnas, mas por meio de um golpe; o PSDB, que é signatário do pedido de impeachment; o PSDB é o Partido que vai ser o responsável pelo relatório sobre o afastamento de Dilma da Presidência da República. Vejam bem: o Partido denunciante é o mesmo Partido que dará um parecer sobre a denúncia. Ele acusa e ele mesmo fará juízo de valor sobre a acusada. No meu ponto de vista, isso é um escândalo, é um erro que rasga todos os princípios básicos do direito. Não houve qualquer pudor ou o mínimo de zelo pela isenção e pela imparcialidade nesse caso.

    Registro aqui que não há qualquer veto pessoal ao nome do Senador Anastasia, cujo saber jurídico é amplamente divulgado. O que há é a inconveniência de termos o ex-Vice-Governador de Aécio Neves conduzindo um relatório do qual seu ex-chefe e seu Partido são partes diretamente interessadas.

    Ora, parece óbvio para qualquer um que quem acusa não pode julgar. Então, como é que Dilma pode ser denunciada pelo PSDB e o mesmo PSDB assumir a posição de dizer se ela é culpada ou não por aquilo por que o próprio Partido a denuncia? Já de hoje, não temos qualquer dúvida sobre o voto do Relator: ele será favorável à admissibilidade da denúncia, com consequente afastamento da Presidenta da República do cargo ao qual ela chegou por meio do voto da maioria dos brasileiros, se o Plenário desta Casa aceitar o relatório que ele vai fazer. O voto do Senador Anastasia, na Comissão do Impeachment, será o mesmo que ele deu nas eleições de 2014: contra Dilma e em favor de Aécio Neves. É mais um grave vício, entre tantos os que tiram a total legitimidade desse processo, uma aberração jurídica desde que foi recepcionado pelo desavergonhado Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha.

    Aliás, quero registrar aqui um trecho da entrevista que a Folha de S.Paulo trouxe com o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, Presidente de Honra do PSDB, em que ele diz que a Presidenta Dilma é uma mulher honesta e que, abre aspas, "não é criminosa", fecha aspas. E o que é que é que estamos fazendo neste momento no Senado Federal? Decidindo se vamos processar a Presidenta da República por crime de responsabilidade, quando um dos maiores líderes da oposição reconhece que ela é honesta e não cometeu crime. Eu reitero: estamos diante de um desatino constitucional, um atentado contra a ordem democrática, um golpe parlamentar que envolve a Chefe de Estado em um processo por um crime que ela não cometeu, simplesmente porque o crime não existe.

    É uma lástima que o Senado Federal comece a trabalhar nesse caso repetindo os erros grosseiros havidos na Casa vizinha, sem levar em conta que aqui somos um tribunal, em que cada Senador será um magistrado e deve agir de maneira condizente com essas funções que assume.

    Então, quero aqui apelar a todos os membros deste Senado que não repitam o espetáculo grotesco a que o Brasil assistiu, bestializado durante a votação da Câmara dos Deputados. Não nos reduzamos em desqualificação e incompetência como naquela sessão dantesca, em que a técnica e o bom direito foram trucidados para dar espaço a um circo de horrores que envergonhou o País e assombrou o mundo.

    O Senado precisa assumir o seu papel constitucional de processar e julgar a Presidenta da República com a serenidade, a imparcialidade e o equilíbrio exigidos dos magistrados. As paixões políticas não podem se sobrepor a esses princípios e, tampouco, a aplicação da técnica e do bom direito. Por essas razões, eu não poderia deixar de expressar aqui o meu repúdio pela forma como esse processo escabroso de impedimento começa a tramitar neste Senado e denunciar mais esse atentado à Constituição e aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório.

    Já disse aqui e repito que estaremos consignando todas essas questões para que, em um momento oportuno, possamos avaliar se acionaremos o Supremo Tribunal Federal para que se posicione sobre todos os atropelos e desrespeitos à legislação havidos.

    Estamos diante de um grave momento da nossa história, em que um golpe constitucional em curso quer apear do poder uma Presidenta da República legitimamente eleita. Não vamos permitir que seja parida por este Senado uma meta-atrocidade, uma atrocidade dentro da atrocidade que, por si só, já representa esse processo.

    Por fim, quero aqui registrar a minha indignação e o meu protesto pela atitude do Sr. Vice-Presidente da República, que, desrespeitando este Senado, que apenas iniciou o debate sobre o processo do impedimento, já está por aí afora a dar entrevistas, a nomear Ministros, a demitir Ministros, como já fez com o da Justiça que tinha nomeado no dia de ontem, demonstrando total desrespeito a esta Casa, como se aqui fôssemos uma Casa homologatória do desejo dele ou que fôssemos não nos debruçar sobre os fatos, mas sobre a decisão escabrosa tomada pela maioria dos integrantes da Câmara dos Deputados.

    Por isso, nós não daremos trégua aos atropelos e aos desrespeitos para beneficiar aqueles que querem calcinar a lei para a satisfação de seus caprichos. Estaremos vigilantes para garantir a ordem constitucional e assegurar que, no final desse processo torpe, vença a democracia.

    Obrigado pela tolerância, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/04/2016 - Página 40