Discurso durante a 174ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Criticas a forma de tramitação da PEC 55, que altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para instituir o Novo Regime Fiscal.

Autor
Fátima Bezerra (PT - Partido dos Trabalhadores/RN)
Nome completo: Maria de Fátima Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Criticas a forma de tramitação da PEC 55, que altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para instituir o Novo Regime Fiscal.
Aparteantes
Edison Lobão, Gleisi Hoffmann.
Publicação
Publicação no DSF de 19/11/2016 - Página 7
Assunto
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • CRITICA, FORMA, TRAMITAÇÃO, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), ASSUNTO, ALTERAÇÃO, REGIME FISCAL, LIMITAÇÃO, AUMENTO, GASTOS PUBLICOS, REFERENCIA, INFLAÇÃO, EXERCICIO FINANCEIRO ANTERIOR, MOTIVO, REDUÇÃO, RECURSOS, DESTINAÇÃO, SAUDE, EDUCAÇÃO, EXTINÇÃO, PROGRAMA ASSISTENCIAL, PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, ELOGIO, GOVERNO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), DILMA ROUSSEFF, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRIAÇÃO, FUNDO DE MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO BASICA E DE VALORIZAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO (FUNDEB), DESENVOLVIMENTO, POLITICA PUBLICA, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO BASICA, REESTRUTURAÇÃO, ENSINO SUPERIOR, POSSIBILIDADE, EXPANSÃO, UNIVERSIDADE FEDERAL, REGIÃO NORDESTE, ENFASE, ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), QUALIDADE, INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO CIENCIA E TECNOLOGIA, NECESSIDADE, REJEIÇÃO, PROPOSTA, CONGRESSO NACIONAL.

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, são 20 minutos que eu tenho nesse período.

    Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado, mais uma vez, claro, o motivo que nos traz aqui à tribuna é para falar da antiga PEC 241, a chamada PEC 55, ora objeto de debate, que está tramitando aqui na nossa Casa.

    Nós queremos aqui, mais uma vez, não só lamentar mas protestar pelo fato de a tramitação de uma matéria tão relevante como essa estar se dando de forma tão açodada. Afinal de contas, nós não estamos tratando de uma proposta legislativa qualquer; nós estamos tratando de uma mudança na Lei Maior, que é a Constituição Federal, e seguramente estamos tratando de uma das mudanças mais radicais na nossa Constituição cidadã, de 1988. Por que essa radicalidade? Porque ela mexe no coração da Constituição de 1988, naquilo que ela tem de proteção e de afirmação da cidadania do povo brasileiro, que são exatamente os capítulos destinados aos direitos sociais.

    E o que essa lei pretende, minha Nossa Senhora? Essa lei pretende simplesmente, por longos 20 anos, estabelecer um teto para os chamados gastos nas áreas sociais. E, ao estabelecer esse teto, que seria os investimentos corrigidos pela inflação do ano anterior, o que vai acontecer na prática? Uma redução drástica de recursos. O que vai acontecer na prática? Você vai desidratar cada vez mais o orçamento, que já não é suficiente para áreas fundamentais, como a educação, como saúde, como assistência social, etc.

    Mas a PEC tem muito mais crueldade ainda. A chamada regra Temer-Meirelles é muito mais cruel ainda, porque, repito, além de estabelecer um teto para os gastos nas áreas sociais, não permitindo que os investimentos ultrapassem a correção da inflação do ano anterior, o que é que a PEC também pretende? Pretende anular, por igual período de 20 anos, a vinculação constitucional para as áreas de educação e de saúde. Ou seja, eu me refiro àquele dispositivo constitucional, luta grande da sociedade brasileira, que assegurou pisos mínimos para a área da educação e para a área da saúde. Essa, Senadora Gleisi, sem dúvida nenhuma, foi uma das mais importantes conquistas da democracia brasileira.

    Falar do piso mínimo, por exemplo, para a área de educação significa falar de uma ação de proteção social. Quando os Legisladores, interpretando o sentimento da sociedade, acolheram propostas como essa de assegurar que o orçamento, no mínimo, tinha que destinar tantos porcentos para determinadas áreas, como no caso da educação, o que foi que ele quis dizer com isso? Quis dizer que são áreas essenciais, fundamentais para o processo de desenvolvimento do País, para o processo da conquista plena da cidadania do povo brasileiro e, portanto, teriam que ter toda uma ação de proteção. É assim que se explica o piso, por exemplo, para a educação, para a saúde, etc. E essa conquista foi tão importante, mas tão importante que, a partir da garantia de um piso mínimo para essas áreas essenciais, o que foi que nós conseguimos? Nós conseguimos dar uma previsibilidade, portanto, uma continuidade do ponto de vista dos recursos destinados para essas áreas.

    É claro que, como a própria Constituição coloca, nós estamos aqui falando de piso mínimo. Significa o quê? Significa que o recurso não pode estar abaixo desse piso, mas pode, naturalmente, ir além do piso, como de fato aconteceu nos governos Lula e Dilma, nos governos do Partido dos Trabalhadores, pelo quanto esses governos, com a sensibilidade que tiveram, reconheceram o tamanho do passivo da dívida que o Estado brasileiro tem para com a educação – da creche, passando pelo ensino médio, até a graduação e a pós-graduação.

    Foi com essa visão de estadista, de estadista que sabe que nação nenhuma no mundo atingirá o patamar de nação civilizada, com justiça social, com distribuição de renda, com emprego, com cidadania, se não for pelo caminho de investimentos fortes, perenes em áreas como educação.

    Foi com essa visão que, por exemplo, nós não investimos apenas 18%. O governo da Presidenta Dilma chegou à marca de 23% dos recursos do orçamento destinados à educação.

    Foi com essa visão que nós começamos o primeiro mandato do Presidente Lula e nós investimos apenas 3,2% do Produto Interno Bruto na educação, mas, em 2014, saímos de 3,2% do PIB para 6,2% do PIB.

    Foi isso que permitiu, sim, nós termos construído, nós termos implementado um ciclo extraordinário de avanços e conquistas em prol da educação brasileira, ciclo que se expressa, por exemplo, em leis como a do Fundeb.

    Na época do governo do PSDB, dos tucanos, a educação não era vista por eles como uma prioridade total, não era encarada como um direito para todo cidadão e cidadã brasileiros. Tanto é verdade que, por exemplo, não foram eles que criaram o Fundeb. Eles criaram o Fundef, que nós reconhecemos que foi um passo importante, mas que jamais daria conta do desafio que é garantir o direito à educação não só para os meninos e meninas do ensino fundamental, pois temos que garantir o direito à educação desde a creche, passando pelo ensino fundamental, pela pré-escola, pelo ensino médio e pelas suas mais diversas modalidades.

    Ao chegar ao governo, nós corrigimos essa distorção. Aprovamos, por unanimidade, no Congresso Nacional, o Fundeb. Eu tive a honra e a alegria de ter sido a Relatora do Fundeb, que, digo aqui mais uma vez, se constitui numa das políticas mais ousadas, pelo seu caráter universalizante. Foi com o Fundeb que nós começamos a dar passos concretos neste País para cuidar da creche, até então totalmente relegada, abandonada, até porque...

(Soa a campainha.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Peço mais dez minutos, Sr. Presidente, por favor. Tenho direito a 20 minutos, regimentalmente.

    Até porque, repito, mesmo que desejassem, os Municípios brasileiros não tinham absolutamente nenhuma condição, nenhuma, de desenvolver uma política pública que desse conta da creche até o ensino fundamental, pela insuficiência e pela dificuldade do ponto de vista orçamentário. E o Fundeb veio exatamente para corrigir essa situação, para a gente superar essa lacuna inaceitável.

    Quer dizer, então, que quem tem dinheiro, o andar de cima, coloca seu filho para estudar, desde os primeiros anos, da creche até o ensino médio, depois, na universidade, etc? E os filhos da maioria do povo pobre deste País? A eles o que era dado, de repente, era somente o ensino fundamental. Pois nós corrigimos isso com o Fundeb. Com o Fundeb, nós criamos programas como o Proinfância, para levar creches, e creches de boa qualidade, para as nossas crianças; criamos o programa Caminho da Escola para corrigir e resolver aquela situação vergonhosa, humilhante, de ver nossos alunos transportados até em carroças, correndo, inclusive, risco de vida. Hoje, nós temos os "amarelinhos". Foram programas, repito, tanto o Proinfância como o Caminho da Escola, oriundos exatamente com o Fundeb.

    Com o Fundeb, demos o primeiro passo para criar a Lei nº 11.738, que instituiu o piso salarial do magistério. Com o Fundeb, nós avançamos do ponto de vista de estabelecer uma política de financiamento que não tinha mais só um olhar para o ensino fundamental, mas da creche até o ensino médio.

    Mas quero dizer ainda que, nesse ciclo de avanços e conquistas para a educação brasileira, por que não falar do Reuni, programa de reestruturação do ensino superior brasileiro? Que programa extraordinário! Um programa que simplesmente possibilitou que, pela primeira vez, a expansão do ensino superior público não ficasse somente no eixo Rio-São Paulo; que ela chegasse ao interior, ao coração deste Brasil; que ela chegasse às outras regiões, como, por exemplo, a minha querida Região Nordeste, o meu querido Estado do Rio Grande do Norte.

    O Rio Grande do Norte não tem mais só a Universidade Federal do Rio Grande do Norte, nosso grande patrimônio, mas o Rio Grande do Norte, no governo do Presidente Lula, ganhou uma nova universidade, que é a Universidade Federal Rural do Semi-Árido, que chegou a Caraúbas, que chegou a Pau dos Ferros, que chegou a Angicos. O Rio Grande do Norte ganhou também uma expansão extraordinária do ensino da educação profissional e tecnológica. De duas unidades do IFRN, nós passamos para 21 novas unidades do IFRN, e não estou aqui falando de uma escola qualquer. Estou falando simplesmente daquilo que é considerado hoje, os institutos federais de educação profissional e tecnológica, como o que de melhor existe em matéria de ensino médio, ensino médio integrado.

    A Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica é elogiada e aprovada não só no Brasil, mas inclusive lá fora. Ela é aprovada no Brasil,...

(Soa a campainha.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – ... aprovação essa atestada pelo próprio Ideb – o Ideb, inclusive, que o Governo ilegítimo...

    O Sr. Edison Lobão (PMDB - MA) – Permite V. Exª uma ligeira intervenção no seu discurso?

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Pois não.

    O Sr. Edison Lobão (PMDB - MA) – Senadora Fátima Bezerra, V. Exª disserta, com segurança e conhecimento de causa, sobre um tema fundamental para o desenvolvimento do Brasil, que é a educação. Muitos têm dito que nós aplicamos poucos recursos em educação; isso não é exato. O Brasil aplica tanto quanto países desenvolvidos, como os Estados Unidos, a França, a Inglaterra, a Coreia, o Japão. V. Exª cita o número: 3,2% do PIB, e isso não é pouco – é muito. O Presidente Lula foi realmente fecundo na criação de novos programas, programas que ajudaram muito a melhorar o nível da educação no Brasil. Nós sabemos que os Municípios e os Estados são constitucionalmente obrigados a investir, no mínimo, 25% de suas receitas. A União Federal investe 18%, e há governantes que investem mais – V. Exª mencionou o caso da Presidente Dilma –, mais do que isso. Além do ensino privado, a educação no Brasil é boa? É excelente? Não, não é, ainda. Ainda, realmente, não é. Melhorou muito. Em 1964, nós possuíamos cerca de 100 mil estudantes universitários matriculados nas diversas escolas do Brasil; temos hoje milhões. Ou seja, nós vamos avançando. O que há, a meu ver, e V. Exª sabe mais do que eu, porque é uma especialista no assunto, é a má aplicação, ainda, dos recursos. Se nós conseguíssemos chegar ao aperfeiçoamento na aplicação dos recursos disponíveis, aí, sim, ganharíamos fases e mais fases, adiantando o nível do ensino em nosso País. Cumprimento V. Exª por abordar um tema de essencial importância para o Brasil, para a juventude de hoje e de amanhã. Nós cresceremos muito à medida que crescermos também na educação.

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Senador Edison Lobão, agradeço o aparte, ao tempo em que o incorporo ao meu pronunciamento.

    Essa é uma das razões, Senador Lobão, pelas quais nós somos frontalmente contrários à PEC 55: exatamente pelo impacto que ela terá na educação. É interessante, inclusive, porque os defensores da PEC dizem que saúde e educação estarão preservadas. Como é que saúde e educação estarão preservadas se essas medidas só vieram ao Congresso Nacional via proposta de emenda à Constituição? Eles querem anular por 20 anos, rasgar, acabar com a vinculação constitucional para as áreas da educação e da saúde? Ora, se as áreas da educação e da saúde de fato estivessem preservadas,...

(Soa a campainha.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – ... por que uma emenda à Constituição, repito, para acabar com a vinculação para essas áreas, a educação e a saúde? Então, quero deixar aqui muito claro, mais uma vez.

    Peço ao Presidente Hélio José que me dê mais algum tempo, pois concedi um aparte ao Senador Lobão, o que para mim foi muito importante.

    O SR. PRESIDENTE (Hélio José. PMDB - DF) – Pois não, Senadora Fátima Bezerra.

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Eu quero aqui colocar, chamar a atenção da opinião pública, alertar a sociedade brasileira para que veja que a educação será tão duramente afetada que, por isso mesmo, repito, essas medidas chegam a esta Casa via proposta de emenda à Constituição. Se não quisessem acabar com a vinculação para a educação e para a saúde, as demais medidas poderiam estar tramitando aqui via projetos de lei, etc. Aliás, a maioria dessas medidas faz parte da Lei de Responsabilidade Fiscal.

    Na verdade, a sanha do Governo é grande. O Governo quer restaurar a agenda neoliberal dos anos 90 – e essa agenda tem como ideário máximo o Estado mínimo e o Estado máximo, ou seja, o Estado mínimo de direitos para o povo brasileiro e o Estado máximo de privilégios para os banqueiros, para o andar de cima. É disso que trata o ideário dessa agenda neoliberal. Tanto é verdade que a educação terá um impacto violento que as projeções feitas – não por técnicos do PT, não; por especialistas, estudiosos – apontam o seguinte retrato: com a PEC 55 aprovada, a vinculação cai, ela é revogada; nós não temos mais proteção nenhuma, porque o piso mínimo de 18% que a União é obrigada a investir será simplesmente revogado.

    E o que acontecerá? No prazo de dez anos, o piso mínimo, por exemplo, chegará a um patamar em torno de 14%. O que isso significa? Significa menos dinheiro, significa menos orçamento. E o que vai significar na prática? Vai significar rasgar o Plano Nacional de Educação, vai significar colocar o Plano Nacional na lata do lixo da história, vai significar o Plano Nacional de Educação virar letra morta, pois como é que os prefeitos vão construir mais creches? Como é que nós vamos fazer para, daqui até 2024, assegurar matrículas para 3,8 milhões de crianças de 0 a 3 anos, que precisam, ainda, de acesso à creche neste País? Como é que nós vamos fazer com a questão das escolas técnicas, com as universidades? Como é que nós vamos fazer com a agenda de valorização do magistério brasileiro, o novo piso salarial, a carreira, etc., etc.? Ou seja...

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Permite-me um aparte, Senadora Fátima?

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Pois não, Senadora Gleisi, com o maior prazer.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Estou aqui ouvindo o seu pronunciamento, especificamente falando de educação, que é uma área que V. Exª conhece como poucos nesta Casa – é professora, tem uma atuação muito intensa na Comissão de Educação, fez várias audiências públicas. Eu tive a possibilidade de participar de uma audiência pública que V. Exª organizou na Comissão de Direitos Humanos, e levou lá representantes de todos os setores da educação, tanto das universidades como de ensino médio, sindicatos de professores, de funcionários e de trabalhadores. E foi muito rica aquela audiência, porque mostrou exatamente o efeito da PEC no cotidiano da educação. Ontem houve uma discussão aqui e uma das Senadoras que subiu à tribuna falou e citou várias creches – pelo menos de um Município, e disse que existiria em outros – que não estão sendo utilizadas, foram feitas e não há demanda. Aí, eu fiquei pensando aqui: com certeza esse não foi um planejamento do Governo Federal, com certeza deve ter sido alguma emenda parlamentar que eles tornaram, o Parlamento tornou obrigatório executar e o Governo teve que executar. Foi feita sem planejamento, para que o Parlamentar fosse lá inaugurar.

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Com certeza, Senadora.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Então, esta Casa faz uma crítica, quando, na realidade, ela é uma das responsáveis por fazer obras que não atendem à necessidade da população, porque todas as creches, Senadora Fátima, que foram feitas dentro do planejamento que a Presidenta Dilma fez – e eu posso falar isso porque eu estava na Casa Civil na época –, todas as creches tinham demanda.

(Soa a campainha.)

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – E todas, todas, estão servindo à população. Aliás, nós temos mais demanda ainda, precisaríamos de mais creches. Então, não é verdade que a PEC não vai intervir no ensino fundamental – porque disseram aqui também que não mexe nos recursos de Estado e Municípios, vai mexer só nos recursos da União e, portanto, vai impactar o ensino superior. Vai mexer no ensino fundamental, sim, porque a política de creches não está sendo feita via Fundeb.

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Exatamente.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – A política de creches está sendo feita por fora. Inclusive o equipamento, a ajuda para contratação de professores, para fazer com que a criança de baixa renda possa ficar na creche, tenha um incentivo. Existe toda uma política estruturada para creche. Nós temos também os programas do FNDE para construção de escolas de primeiro e de segundo graus que os Municípios e os Estados não têm condição de construir; quem acaba construindo é o Governo Federal. Isso vai acabar. Quer dizer, a ajuda que Governo Federal...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Vamos pedir ao Senador Hélio José para ser um pouco generoso, não é, Senadora Gleisi?

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Até porque, Senadora Fátima, só estamos nós três aqui no plenário – eu, V. Exª e o Senador Hélio José.

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Exatamente. E com um detalhe: o Senador Hélio José mora aqui em Brasília, também.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – Pois é, e é importante a gente fazer esse debate, porque as pessoas querem saber, de fato, o que vai acontecer. Então, não é verdade dizer que a PEC não vai atingir o ensino básico e fundamental. Vai, sim, porque hoje os Estados e Municípios têm dificuldade de se manterem sozinhos, ou só pelo Fundef, e vêm se socorrer à União para construção de escolas, construção de creches, apoio imobiliário, enfim, são vários aspectos que precisam. E veja, Senadora Fátima, a partir do momento em que a União não tiver mais esses recursos, os Estados e Municípios serão pressionados por sua população para ampliar o número de vagas, para ampliar a infraestrutura das escolas, até porque num período de recessão, como nós estamos vivendo, num período de crise econômica, o que acontece? As pessoas que estavam pagando a educação dos seus filhos, que estavam na rede particular, acabam migrando para a rede pública. Então, a demanda é maior – sem contar, também, com o impacto que vai haver no ensino superior. Imagina os institutos federais de educação! Só no Paraná, Senadora Fátima, são 25 institutos federais; nós os temos espalhados por todas as regiões. Eles cumprem um papel fundamental de formação, de capacitação e de desenvolvimento regional. Nós temos lá a Universidade Tecnológica Federal, que tem nove campi, se eu não me engano; campi em todas as regiões do Estado. Como se vai mantê-los, se reduzirem o recurso? Nós temos a Unila, que é a Universidade Federal da Integração Latino-Americana, nós temos a Universidade Federal da Fronteira Sul. Nós não vamos conseguir manter.

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Com certeza.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PR) – E nós vamos dizer o que para a população e para a sociedade? "Olha, nós abrimos, agora nós vamos fechar." Um País que precisa formar suas pessoas, que precisa capacitar, que precisa de educação. Então, eu queria parabenizar V. Exª e dizer que é muito grave o que nós vamos viver em termos de desmonte de políticas públicas, e nós não podemos deixar de falar, de denunciar isso. E lamento muito: na hora em que eu cheguei aqui, começou a discussão da PEC e ninguém do Governo se inscreveu para discutir. Nós tínhamos quatro ou cinco Parlamentares aqui, entre eles o relator, o Líder do Governo; abriu para discutir a PEC e nenhum se inscreveu para discutir. É absurda a posição do Governo, hoje, de não fazer a discussão dessa matéria; não foi às audiências públicas. Ontem, apenas, que o Líder do Governo subiu a esta tribuna para fazer o debate, e hoje estava em plenário e se negou a fazer a defesa da PEC, porque ela é indefensável, Senadora Fátima.

    A SRª FÁTIMA BEZERRA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN) – Com certeza, Senadora Gleisi. Ela é indefensável pelo conjunto da obra, pelo tanto de maldade, de injustiça e de crueldade ela traz.

    Senadora Gleisi, agradeço o aparte de V. Exª, porque enriquece muito o nosso pronunciamento, a reflexão que nós estamos fazendo, Senador Hélio José, principalmente tratando aqui do impacto dessa regra, desse novo regime fiscal, dessa política fiscal que o Governo Temer-Meirelles quer implementar no Brasil, com a aprovação da PEC 55. Então, nós estamos falando, principalmente, do impacto na educação. E a Senadora Gleisi colocou muito bem o impacto que ela terá. Portanto, não se sustenta de maneira nenhuma a tese dos defensores da PEC de que ela não vai impactar a educação, de que ela não vai impactar a educação básica, que é de responsabilidade dos Estados e dos Municípios.

    Vai impactar, sim, porque é fato que a PEC exclui, por exemplo, o Fundeb, assim como o Fies, o ProUni e o salário-educação. Exclui o Fundeb e o salário-educação por uma razão óbvia, Senadora Gleisi. O Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica), como o próprio nome está dizendo, é uma política de financiamento, um fundo que é composto dos impostos oriundos dos Estados, dos Municípios e da União. Diga-se de passagem, a maioria dos impostos que compõem o Fundeb vem precisamente dos Estados e dos Municípios. Portanto, nós estamos aqui tratando de uma repartição tributária. E isso não pode, de maneira nenhuma, ser incluído na regra fiscal.

    Entretanto, V. Exª tem toda razão quando diz que isso vai impactar os Municípios e os Estados. Por quê? Porque, como a regra Temer-Meirelles vai diminuir drasticamente os recursos na área da educação, a União será afetada. E, sendo afetada, a União não vai mais conseguir implementar o regime de cooperação com os Estados e Municípios que ela implementou ao longo desses últimos anos.

    As creches, aqui muito bem lembradas novamente por V. Exª, só puderam ser construídas graças ao Fundeb, graças ao Governo Federal. Os Municípios entravam apenas com a disponibilidade do terreno, até porque – repito – a grande maioria dos Municípios brasileiros não tinha e nem tem condições orçamentárias de construir as creches do Proinfância. O Caminho da Escola, o transporte escolar, da mesma forma, é um programa do Governo Federal que só foi possível com a questão exatamente do Fundeb. Então, a PEC vai afetar esses programas.

    Digo mais, Senadora Gleisi: os programas, por exemplo, de formação do magistério, formação iniciada, formação continuada, só foram possíveis graças à ação do Governo Federal, porque os Municípios também não têm condições. Esses programas serão duramente afetados.

    E, como se não bastasse tudo isso, o que vai ser afetado ainda mais? Minha Nossa Senhora! O funcionamento da rede de ensino e a expansão da política dos institutos federais de educação profissional e tecnológica serão impossíveis com essa PEC da morte; da morte, inclusive, da educação.

    Está lá no Plano Nacional de Educação: nós temos que, até 2024, triplicar as vagas na educação profissional e chegar a 33% das matrículas ofertadas no ensino superior. Isso vai virar letra morta com a aprovação da PEC 55. Além de isso virar letra morta, reforça o que a Senadora Gleisi colocou aqui: o que está em risco, neste exato momento, é o funcionamento, inclusive, do que já existe. Não é alarmismo aqui em dizer que, com essa PEC 55, que corta dinheiro para a educação, a gente poderá ver, brevemente, Senadora Gleisi, o fechamento de escolas técnicas e o fechamento de universidades pelo País afora. Porque como a universidade vai dar conta, como nós vamos dar conta, como o Governo Federal vai dar conta de programas importantes, como a distribuição de livros e materiais didáticos para a educação básica, como a restruturação e expansão do ensino superior e da educação profissional, como eu já falei?

    Como é que é União vai dar conta da concessão de bolsas de apoio à educação básica, de apoio à formação profissional científica e tecnológica? Como é que nós vamos dar conta, por exemplo, de dar continuidade às escolas para a educação infantil? Como é que o Governo Federal vai dar conta do fomento às ações de graduação, pós-graduação, ensino, pesquisa e extensão? Ou seja, o presente das universidades, das escolas técnicas, o presente da educação brasileira está seriamente ameaçado, que dirá o futuro.

    Então, eu quero aqui concluir, Senadora Gleisi, mais uma vez, me associando a V. Exª, dizendo não só da nossa tristeza, mas da nossa indignação, de repente, de ver esse Congresso avançar de maneira tão açodada para aprovar uma proposta com esse porte, com esse perfil, uma proposta, simplesmente, como disse a Profª Tania Bacelar, de penalizar exatamente os mais pobres.

    Aliás, a Profª Tania Bacelar, a quem me refiro, é economista, professora aposentada da Universidade Federal de Pernambuco, uma das mais importantes economistas e pesquisadoras deste País. Ela, inclusive, recentemente, Senadora Gleisi, fez um debate na Universidade Federal de Pernambuco e classificou a PEC 55 como a máquina brasileira de produzir desigualdades. Foi assim que a economista e professora Tania Bacelar classificou a PEC 55: vai ser a máquina brasileira de produzir desigualdades. E eu acrescento: de injustiças.

    E quem fala aqui não é qualquer pessoa. A Profª Tania Bacelar é respeitada no Brasil e lá fora – repito – pela sua sabedoria, pelo quanto ela conhece deste Brasil, pelo quanto ela discute e pelo preparo que ela tem na questão da economia versus o desenvolvimento regional.

    Eu quero concluir, Senador Hélio, dizendo que a Professora Tania chama, como já tem sido dito aqui, que quem cavou o buraco dessa dívida foram os juros altos e não os chamados gastos sociais. Muito pelo contrário, os gastos sociais que foram feitos no País estão ainda muito distantes de atender as demandas do povo brasileiro. Ela reitera, inclusive, o que já vem sendo aqui colocado, que a crise pela qual o País passa é fruto da queda da arrecadação, em meio a um contexto internacional, que foi a crise do capitalismo internacional, desde 2008, cujos reflexos mais fortes só se fizeram sentir no Brasil a partir de 2013 e 2014.

    Tanto é que, como já foi colocado aqui, até 2013 os governos Lula e Dilma inclusive faziam superávit. Esse problema só começou a partir de 2014. Repito: primeiro, fruto desse contexto em nível internacional – a crise do capitalismo e os seus reflexos do mundo inteiro. A queda da arrecadação que houve, assim como tem dito a Senadora Gleisi, é falácia, é mentira, assim como ficarem aqui dizendo que a dívida pública explodiu.

    A dívida pública do Brasil versus o Produto Interno Bruto é inferior às dívidas públicas dos demais países. A diferença é que os demais países, vários deles, países inclusive do chamado mundo desenvolvido, têm uma dívida pública bem maior. A diferença é que lá, Senadora Gleisi, eles pagam uma taxa de juros bem pequena. E nós, aqui, temos uma dívida pública menor, mas, em compensação, pagamos uma taxa de juros absurda.

    Por isso que a tese da auditoria da dívida pública é urgente, é estruturante. Nós insistimos que, para responder às demandas do Estado brasileiro do ponto de vista da sua cidadania, é fundamental pôr o dedo na ferida, nesse sistema tributário injusto, seletivo, regressivo. Quem paga imposto neste País é o pobre, é o assalariado. O andar de cima fica intocável.

    É vergonhoso que o Congresso brasileiro não discuta a necessidade de corrigir, repito, a seletividade, a injustiça desse sistema tributário no nosso País. Corrigir como? Fazendo o que vários países do mundo afora já fizeram: taxação das grandes fortunas, taxação dos lucros, assim como outras medidas também.

    Mas, infelizmente, o andar de cima é que fala mais alto. Nós temos um Congresso ainda refém desse andar de cima. Portanto, um Congresso, infelizmente, na sua grande maioria, insensível à realidade da maioria do povo brasileiro. Porque, se esse Congresso tivesse o mínimo de sensibilidade, de sensatez, ele diria "não" à PEC 55, pelo quanto ela impactará o presente e o futuro da educação no nosso País.

    Portanto, faço minhas aqui as palavras da Profª Tania Bacelar na esperança de que muito em breve amplos setores da população brasileira possam se somar à luta dos estudantes, dos professores – a esses estudantes que estão dando lições de luta em defesa da cidadania pelo País afora. A nossa esperança a eles que estão resistindo, e resistindo de maneira tão cidadã, de maneira tão corajosa. A nossa esperança sempre, Senadora Gleisi, que amplos setores da população possam, em breve, se juntar aos estudantes para que a gente possa barrar essa agenda de retrocesso.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/11/2016 - Página 7