Discurso durante a 18ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da criação de uma CPI para investigação das contas da Previdência Social; e leitura de documento do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz) contrário à reforma previdenciária.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL:
  • Defesa da criação de uma CPI para investigação das contas da Previdência Social; e leitura de documento do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz) contrário à reforma previdenciária.
Publicação
Publicação no DSF de 08/03/2017 - Página 76
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL
Indexação
  • DEFESA, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), OBJETIVO, INVESTIGAÇÃO, CONTAS, PREVIDENCIA SOCIAL, LEITURA, DOCUMENTO, AUTORIA, SINDICATO, PROCURADOR FEDERAL, FAZENDA NACIONAL, OBJETO, OPOSIÇÃO, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO PREVIDENCIARIA.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Senador Cássio Cunha Lima, que preside a sessão, eu queria, primeiro, agradecer muito aos Senadores e Senadoras, porque nós levantamos a tese de que seria preciso investigar a fundo as contas da Previdência para que a gente, de forma muito transparente, pudesse retornar os últimos 20 anos e mostrar se ela tem déficit ou não. Hoje, Sr. Presidente, nós concluímos as 35 assinaturas. Eu preciso só de 27, e alguns Senadores ainda me disseram que provavelmente assinarão ainda nesta semana.

    Eu particularmente acho que essa CPI cumpre um papel fundamental, vai mostrar se houve ou não houve desvio, se houve ou não houve corrupção, se houve ou não houve roubo, quem são os grandes devedores, quem foi beneficiado por anistias mal resolvidas e onde estão os 426 bilhões, conforme os auditores da Receita Federal, de dívida ativa que não entram nos cofres da Previdência. Há quem diga que o número correto vai chegar próximo a um trilhão.

    Vamos investigar. Se for verdadeiro, além de resolver o problema da previdência, nós vamos, também... Por que a previdência está onde? Está na seguridade social, onde estão a saúde e também a assistência. Então, a primeira fala que eu faço, e é bom registrar, é que, dos Senadores a quem tive acesso diretamente, todos dialogaram comigo e mostraram a vontade de que essa investigação aconteça.

    Mas, Sr. Presidente, nesse mesmo rumo – porque assim assumi um compromisso –, estou recebendo documentos da OAB, da CNBB... Agora vamos reunir, em data já pré-agendada, a CNBB, bispos, padres, pastorais de todo o Brasil, da juventude e dos trabalhadores. E me convidaram para discutir com eles a reforma da previdência.

    A gente quer que, em cada espaço – seja um sindicato, seja uma igreja, seja o lugar de um culto, independentemente da religião de cada um –, se fale sobre a Previdência. É bom? É ruim? Onde está o problema? O que podemos fazer, para que a gente não venha, com essa reforma, a acabar com a Previdência pública no Brasil? Isso me preocupa muito – muito, muito, muito!

    Este documento que passo a ler, um dos tantos que já recebi – e a maioria eu trouxe para o plenário –, por exemplo, é dos procuradores da Fazenda Nacional. Já li aqui dos defensores, já li do Ministério Público, já li da Anamatra. Todos têm uma visão muito semelhante. Já li aqui – não todas, claro, porque recebi mais de 200 moções de repúdio a essa reforma – moções por parte das câmaras de vereadores, onde são votadas por unanimidade! Os vereadores e o prefeito fazem questão de assinar também.

    Diga-se de passagem – e faço questão de frisar – que esta não é uma questão partidária, não é uma visão de oposição contra situação. Nós estamos apontando o caminho, porque é possível, sim, melhorar a saúde e a previdência, sem aprovar uma proposta como essa, que vai proibir – vai proibir! – o senhor e a senhora de se aposentar.

    Esse exemplo é muito significativo: você chegou aos 60, e, do lado de fora da porta da sua empresa, há 1 milhão, 2 milhões, 10 milhões de pessoas, a maioria jovens, dispostas a trabalhar. O empregador vive do negócio dele. Você, com 65, 70 anos, não vai render de forma igual, porque assim é a vida.

    Por isso, nós construímos, já na Constituinte, fundos para garantir uma previdência decente. Vão demitir você e, se isso acontecer, você não vai conseguir nunca os 49 anos de contribuição. Você vai pagar 40 anos, 43 anos, 44 anos, e não vai se aposentar. Porque, no momento em que você mais precisava, você foi demitido – nem o emprego e nem a aposentadoria. Por isso que está se criando no País um levante contra essa reforma da previdência.

    Por extensão, não há como não falar da reforma trabalhista, que vai precarizar tudo: vai ser um salário por hora e ponto. No passado se ouvia e me perguntavam muito: "É verdade que vão acabar com o décimo terceiro?" Sim, poderão acabar. "É verdade que poderão acabar com as férias?" Sim, poderão acabar agora. "É verdade que não vai ter mais carga horária limite?" Não, a jornada flexível diz o seguinte: podem ser duas, como podem ser 18, podem ser 20, e você vai ganhar somente as horas que trabalhou.

    Mas enfim, Sr. Presidente, eu me comprometi a ler o documento. Diz o documento:

A Câmara dos Deputados está discutindo a reforma da previdência. Depois vai para o Senado. Muitas entidades da sociedade civil e social estão se manifestando contrárias à proposta apresentada pelo Governo. [Eu diria que é unanimidade.]

    Eu, particularmente, tenho recebido aqui manifestos que vêm de todos os lados. Tenho apresentado na tribuna dos trabalhadores rurais, dos servidores, dos aposentados, sindicatos, federações, confederações, centrais, entidades da área do Judiciário, enfim. E esse manifesto a que me refiro, que apresento neste momento, é do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional. O que eles dizem aqui é muito sério.

    E você, que está em casa, eu sei que está ouvindo. Você, que está em frente à televisão, que está ouvindo a Rádio Senado, sabe que isso toca você, na alma, no coração e no físico, porque você sabe que não vai poder ficar dentro de uma empresa com 70 anos. Porque, como ninguém consegue 49 anos ininterruptos, não vai dar 65, vai dar 70 anos ou mais.

    Vamos lá.

A PEC 287, conforme os procuradores da Fazenda Nacional, representa um profundo e grave ataque ao Estado de bem-estar social, contemplado pela Constituição cidadã, de Ulysses, de Covas e tantos outros, de 1988, que ali escreveram que a seguridade social era um dos pilares da Constituição e que a Previdência Social e a assistência aos desamparados era fundamental.

    Sr. Presidente, está ali escrito:

As exigências estabelecidas pela PEC 287, de 2016, para aquisição futura de direitos, tornarão as aposentadorias e as pensões inatingíveis para a esmagadora maioria do nosso povo, dos trabalhadores e das trabalhadoras, que precisarão contribuir por no mínimo 25 anos para ter direito à aposentadoria por velhice e 49 anos para ter direitos ao provento da aposentadoria, em tese, de 100%.

    Mas é 100% da média das contribuições, desde quando você começou a trabalhar, que vão virar o quê? Vão virar 80%.

    Dizem eles mais:

A igualação dos homens e mulheres com idade mínima de 65 – e mesmo as regras de cálculo de benefícios – trará enorme prejuízo a essa parcela expressiva da população brasileira [que amanhã aqui nós vamos lembrar, dia 8 de março, Dia das Mulheres], parcela essa – das mulheres – que, ainda hoje, enfrenta enorme dificuldade de inserção no mercado de trabalho, discriminada no salário. [Em média, recebem a metade do que recebe o homem.] Ainda terão que contribuir 49 anos, 20 anos praticamente a mais do que contribuem hoje, além da diferença de salários, em face das obrigações familiares e, por exemplo, da própria maternidade.

    Todo mundo sabe que isso acarreta para muitas mulheres, em face da essência e ausência de creches e assistência adequadas, a necessidade de interromperem muitas vezes o emprego. Ficam desempregadas, param de contribuir e aí que não vão se aposentar lá na frente.

    "É inacreditável [dizem os procuradores da Fazenda] a possibilidade de que as pensões sejam de valor inferior ao salário mínimo [está lá na reforma]. Isso compromete e fragiliza a garantia do sustento familiar."

    Dizem mais os procuradores:

A extinção das cotas de pensão, quando os filhos perderem a condição de dependentes, agravará ainda mais a situação de penúria do casal, que não terá condição de complementar a renda.

A equiparação de direitos entre trabalhadores rurais e urbanos [Olhem os trabalhadores rurais, que lá no meu Rio Grande estão indo às ruas aos milhares. Deixam a roça, o campo, os parreirais, as plantações e vão protestar na cidade] terá, também, graves consequências, em contexto de profunda desigualdade social, desestimulando ainda mais a permanência do homem no campo e sua indispensável contribuição para a segurança alimentar do País.

    A gente gosta muito de elogiar os trabalhadores, os empresários da área do campo, que são uma das molas mestras da economia do País. Mas como vão tirar deles o direito à aposentadoria? Não vão tirar. Ah, não vão tirar! A gente fará o bom combate, aqui e lá e nas ruas, se for necessário.

A aplicação de regras de cálculo de benefício baseadas em tempo de contribuição, a partir de um piso de 51%, implicando 49 anos totais de contribuição para o benefício [em tese] integral, [que não será integral] atingirá tanto os trabalhadores da área pública quanto da área privada [enfim, do campo e da cidade], tornando para os servidores [Outro dia, faziam-me essa pergunta, e é nesse documento que fui buscar a resposta] praticamente obrigatória a permanência no cargo até a aposentadoria compulsória [depois dos 70 anos], o que terá efeitos perversos sobre os fluxos de carreira na Administração Pública, impedindo, ademais, a correta renovação dos quadros em áreas críticas, além de comprometer um relevante instrumento de promoção social.

    Na segurança pública, vamos ver então o que diz a PEC, segundo os procuradores da Fazenda:

Na segurança pública, o fim da aposentadoria por atividade de risco é um grave erro, pois compromete a própria eficiência e efetividade das forças policiais, agravando o quadro atual já comprometido pela baixa remuneração, em especial nos Estados da Federação.

    E, se somem com a especial, não afetam só a Polícia Civil, não. Não só os professores. A pessoa que trabalha em área insalubre, penosa e periculosa, o que trabalha numa fundição, numa forjaria, numa metalúrgica, numa área de produtos químicos ou no fundo de uma mina... Vai ter que ficar lá 50 anos, trabalhando?

    A média de vida desse povo é de 45 anos, não ultrapassa 50. Nunca vai se aposentar.

    Enfim, dessa forma, eu ainda falo das regras de transição propostas.

As regras de transição propostas, aplicáveis somente aos segurados e servidores com mais de 45 (mulher) e 50 anos (homem), agridem, de forma vergonhosa, qualquer expectativa legítima de direito. Por exemplo, uma mulher com 44 anos e 11 meses não tem a regra de transição; um homem com 49 anos, 11 meses e 20 dias não terá, porque eles fixaram em 50 anos especificamente. Desconsideraram, então, o tempo de contribuição de cada um, a data de filiação ao Regime Geral da Previdência ou ao Regime Próprio.

Particularmente, no caso dos segurados do INSS, a aplicação imediata da nova regra de cálculo do benefício joga por terra decisões recentes, acordadas entre esta Casa e o Governo, que permitiram a superação do fator previdenciário, quando criamos a fórmula 85/95 e aqui a aprovamos – mulher se aposenta com 55 anos de idade e 30 de contribuição; homem, com 60 anos de idade e 35 de contribuição. Mas também colocamos que, a cada dois anos, aumenta um, para que haja uma escala progressiva, baseada no envelhecimento da população.

    Mas tudo isso o Governo desconheceu. O conjunto de medidas propostas tornará a previdência no Brasil um direito praticamente inalcançável ou difícil – ou quase impossível – para a população.

Comparando-se com o que já aplicam países desenvolvidos, onde a importância da previdência na renda das famílias é menor do que no Brasil, teremos um dos regimes previdenciários mais rigorosos do mundo!

    Ou seja, dizem os procuradores que essa proposta, se for aprovada, será um dos regimes previdenciários mais duros, mais cruéis do mundo.

A reforma atinge, inclusive, benefícios assistenciais para idosos, pessoas com deficiência, carentes, dificultando o acesso a eles e desvinculando-os do salário mínimo, atingindo, assim, uma parcela da sociedade para a qual tais benefícios são essenciais para sua dignidade.

Isso se dá a pretexto de que tais benefícios são elevados em comparação com a renda média da população. Mas esse fato apenas revela o quanto, no Brasil, a renda média do trabalhador é baixa.

    Nós estamos falando aqui de salário mínimo. Acham que o salário mínimo está muito alto – deve ser isso –, que não chega a R$1 mil.

O quadro apontado de déficit da Previdência é, antes de tudo, um reflexo da própria crise econômica atual, e não é verdadeiro.

    Ao longo de sua história, a Previdência foi superavitária. Podem pegar aí décadas e décadas, e vamos ver que ela é superavitária. Os recursos excedentes sempre foram aplicados pelo Estado ao seu bel-prazer, com finalidades estranhas à capitalização.

Apenas no período de 2015 a 2017, as renúncias fiscais no âmbito da Previdência Social [e, vejam, quem diz isso são os procuradores da Fazenda], considerando desonerações, Simples, entidades filantrópicas, MEI e exportadores rurais, entre outros [só aí], nós deixamos de arrecadar R$187,1 bilhões. [São dados, eles dizem aqui, do Tesouro Nacional.]

    Então, você deixa de arrecadar daqueles que têm que pagar, porque você abriu mão de algo em torno de R$200 bi – eu arredondei, mas na verdade, é R$187,1 bilhões –, e depois quer cobrar do trabalhador rural, do trabalhador assalariado do nosso País.

    Na seguridade social, as renúncias fiscais, só para o ano de 2017, já são mais de R$151 bi. Expliquem isso! Expliquem por que tanta renúncia daquilo que eles teriam que pagar, e não pagam, e vocês dão atestado de que não é para pagar mesmo, e depois cobram dos pobres ou da classe média...

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ... porque toda a classe média vai se ferrar toda ela.

    Enquanto isso, a dívida ativa total de União, incluindo contribuições previdenciárias não recolhidas – eu falava em R$1 trilhão, Senador, e o dado é oficial, é dos procuradores da Fazenda –, eu falava que poderia chegar a R$ 1 trilhão. Mas sabe o que eles dizem aqui? Ultrapassa R$1,8 trilhão. Repito, isso surpreendeu até a mim aqui, porque eu tinha o documento, mas não tinha ainda me debruçado sobre os detalhes. Enquanto isso, a dívida ativa total da União, incluindo contribuições previdenciárias não recolhidas ultrapassa R$1,8 trilhão. Desse total, mais de R$400 bi são dívidas específicas da Previdência.

    O quadro de procuradores da Fazenda Nacional, porém, é somente de pouco mais do que 2 mil membros, e sem carreira de apoio. Ainda assim, tramitam no Congresso Nacional proposições para privatizar a execução da dívida ativa, ou a cessão de direitos originários do crédito tributário a pessoas jurídicas de direito privado, sob a perspectiva, também da presente reforma da Previdência, da privatização, transferindo renda pública para o setor privado, em desprestígio do Estado e das suas instituições.

    Por isso, em lugar de defender reformas com caráter totalmente privatista, para entregar para o sistema financeiro, excludente e injusto, o Governo deveria atentar, antes, para as renúncias fiscais, evasão, sonegação, roubalheira e corrupção, e assegurar uma gestão transparente e profissional da Previdência, promovendo reformas ajustadas ao perfil socioeconômico da sociedade...

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – ... com regras de transição, permitindo, sim, que todos possam ter a expectativa e o direito.

    Termino, Sr. Presidente.

    Assim, o Sinprofaz conclama todo o Congresso Nacional a proceder a um exame cauteloso e profundo dessa reforma, de forma que, se vierem a aprová-la, promoverá um desgaste para todos, todos os setores – Executivo, Legislativo e Judiciário.

    Enfim, em nome da justiça social e com respeito à dignidade humana, pedimos que não aprovem essa reforma.

    Obrigado, Senador Cássio Cunha Lima, sempre um diplomata presidindo a Casa, dando a todos a oportunidade de expressarem o seu ponto de vista.

    Peço que considere lido outro pronunciamento que trago à Casa sobre a terceirização, pedindo que a Câmara não aprove aquele projeto. E vamos aprovar aquele que nós, como Relator, já apresentamos na CCJ.

    Obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/03/2017 - Página 76