Discurso durante a 62ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Sessão de debates temáticos destinada a discutir o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 38/2017, que trata da reforma trabalhista.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRABALHO:
  • Sessão de debates temáticos destinada a discutir o Projeto de Lei da Câmara dos Deputados nº 38/2017, que trata da reforma trabalhista.
Publicação
Publicação no DSF de 12/05/2017 - Página 58
Assunto
Outros > TRABALHO
Indexação
  • SESSÃO DE DEBATES TEMATICOS, INICIATIVA, COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS (CAS), COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, OBJETIVO, DISCUSSÃO, PROJETO DE LEI DA CAMARA (PLC), AUTORIA, GOVERNO, MICHEL TEMER, PRESIDENTE DA REPUBLICA, OBJETO, REFORMULAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, DEFESA, REJEIÇÃO, PROJETO DE LEI.

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, quero lembrar que são dez minutos para cada um.

    Sr. Presidente, começo cumprimentando V. Exª e todos os que estão na Mesa. Na minha avaliação, de fato, o projeto é muito ruim. O projeto é perverso, o projeto desumaniza a relação entre o empregado e o empregador.

    Ontem, eu fiz um pronunciamento forte lá na Comissão de Assuntos Sociais, mas, quanto mais material eu recebo, mais eu me assusto. Eu me assusto! Vou dar um dado aqui. Tivemos um debate numa convenção nacional do PTB, e eu falei de forma dura quanto a esse contrato intermitente. Falou depois de mim o Ministro do Trabalho. Sabem quando ele foi mais aplaudido? Quando ele disse: "Olha, Paim, não bota na conta do Governo esse contrato intermitente. O Governo não tem nada a ver com isso. Isso é coisa lá daquela Câmara dos Deputados".

    E daí? Como se faz agora? Palavras do Ministro do Trabalho, que é gaúcho e eu conheço muito bem. E eu tive de ficar... Bati palmas para ele. Se nem o Governo defende isso que os senhores formularam... Olhando mais para o juiz, porque ele sabe o que eu estou dizendo. Nem o Governo defende. O senhor sabe muito bem o que eu estou dizendo: quem formulou e quem ajudou a construir. Nem o Governo defende.

    Aqui, pelo que ouvi de todos os painelistas, a não ser uma exceção cujo nome não vou citar, todos mostraram algumas preocupações.

    Mas, então, para não ficar só no discurso...

    Não, mas eu tenho que dizer isso também: sabem o que eu acho que é covardia? Covardia não é você pegar o nome no painel ali de voto por voto de Deputado e Senador, porque isso é democracia, e a base de cada um tem que saber como votou! Você acha que é covardia dizer isso? Não é covardia! Nós estamos numa democracia, de transparência absoluta. Você foi à tribuna, e é covardia dizer o nome de quem votou a favor da reforma trabalhista na Câmara! Tem mais é que dizer! Essa é a lista número um que tem que circular! E cada um assume a sua responsabilidade.

    Eu tive um debate com um Senador e ele me disse: "Eu voto dessa forma, Paim, e assumo a minha responsabilidade". É assim que o Parlamento tem que agir, e não com o voto secreto, escondido, para que ele fique bem com quem financia sua campanha, e nós sabemos quem financia. Quem financia a campanha está negociando inclusive emenda, cargos e sei lá o quê, financiamento de campanha para o futuro. Então, esse, além de ser malandro, ainda não quer que o nome dele saia, mostrando como ele votou nas reformas. Aí não dá, né?

    Era só essa preliminar.

    Mas vamos! Eu vou me debruçar aqui, porque dizem: "mas diga onde, Paim, que tem mesmo problema nessa reforma!" Então, vamos lá!

    Primeiro, isso tem que ser dito. Eu vou repetir, Hélio José. O PL que veio do Governo tinha sete artigos. Esse substitutivo tem mais de cem, duzentas mudanças. Vão me dizer que o Deputado leu isso? Eu fui Deputado por quatro mandatos. Nem no meu tempo, nem agora! Vocês acham que eles leram isso que votaram? Não leram! E esta Casa não é uma Casa carimbadora, não! Aqui todos são homens experientes: ex-governadores, ex-Deputados Federais, ex-prefeitos, Senadores... Homens que têm experiência na vida! Eles não podem pegar esse projeto agora, como alguns estão propondo, e votar em 10 ou 15 dias. Mas vão votar conhecendo o quê? Será que vão ter coragem de chegar a seus Estados, a seus Municípios e dizer: "eu votei"; aí o cara pergunta: "mas o que você votou?"; "Ah, eu não sei. Não me pergunta, porque eu não sei!" Pergunte para 90% dos Deputados se eles conhecem o que votaram. Vocês sabem que eles não conhecem. Eu não preciso dizer aqui. O Brasil sabe.

    Mas vamos lá! Só alguns pontos desse bendito projeto.

    Primeiro, da forma que está, subverte a lógica e a realidade da força do Direito do Trabalho, porque acaba com a proteção do trabalhador, razão de ser da própria CLT.

    A CLT veio para quê? Eu acho que Getúlio deve estar chorando lá em cima. Deve estar dizendo lá para Covas, para Ulysses, para Tancredo e tantos lá: "olha o que estão fazendo lá embaixo!" "Estão rasgando a Constituição cidadã", vai dizer o Ulysses. O Getúlio vai perguntar: "E a nossa CLT?" E o Jango diz: "Não acredito!" Parece que eu estou ouvindo o diálogo que está acontecendo lá em cima. Como não reduz? Aí falam: "Diga onde tem um direito!" Eu vou começar a ler então, porque aí vocês poderão contestar, dizendo se é verdade ou não.

    Reduzir ou retirar direitos reconhecidos pela lei e pela jurisprudência.

    Enfraquece, sim, os sindicatos. Aqui tem uma meia reforma sindical escondida. E nem estou falando dessa história de imposto sindical. Eu não vou entrar nesse debate porque, senão, vou ter que entrar no debate do Sistema S, e eu quero ver alguns aí concordarem, porque todo mundo sabe os bilhões, ultrapassando os R$15 bilhões, que são arrecadados, e sabemos para onde vão, inclusive para confederações e federações. Nem quero entrar nesse debate.

    Permite que a negociação coletiva reduza direitos assegurados em lei. Agride a Convenção nº 98 da OIT.

     Ontem aqui foi confirmado, estava aqui no debate: fornece instrumentos para o calote de maus empregadores, quitação anual, acordos extrajudiciais com eficácia liberatória, negociação de verbas rescisórias. Está tudo escrito lá.

    Redução de direitos. Retira direitos de forma direta no próprio projeto e indireta via a tal de negociação. Eu vou entrar também na negociação. Eu conheço bem o que é negociação. Fui sindicalista muitos anos. Não venham com a farsa da livre negociação, onde todos os obstáculos são criados para que não haja livre negociação, e, sim, a imposição do grande empregador sobre o frágil trabalhador.

    Acaba com as horas intermitentes – já foi dito. Ninguém contestou porque sabe que acaba mesmo.

    Dispensa em massa, sem um mínimo de negociação coletiva.

    Rescisão por acordo com a metade do aviso prévio e multa do FGTS.

    Empregado passa a ser responsável até para lavar o uniforme que ele usa. Eu trabalhava em fundição. Mas a empresa me dava dois macacões por semana, limpinhos, me dava bota e me dava capacete. Eu pergunto: como é que vai ser isso agora? Eu vou ter que levar pra casa para lavar tudo direitinho para não me acidentar?

    Essas perguntas são o mundo real.

    Horas extras se tornam raras. E não pense que o trabalhador gosta de fazer hora extra. Vocês pensam que ele gosta? Eu não gostava. Eu queria ir pra casa, poder abraçar meus filhos, ficar em casa, mas era obrigado, pelo salário vil que é pago neste País. Ou o salário não é vil? Ontem foi mostrado aqui que o salário/hora no Brasil é pior que o da Índia. Está aí no documento, Senador Hélio José, na sua mão, e foram comparados os países.

    Então, ninguém faz hora extra porque gosta; faz porque é obrigado. E não faça, para ver se o empregador precisar: "Olha, vou precisar de você ficar aqui mais três, quatro horas hoje". Não fique, pra ver. Está no olho da rua no outro dia: "Está no olho da rua no outro dia se não ficar quando eu mandar". 

    Retirada de direitos, de forma indireta de direitos. Tudo que for objeto da negociação individual ou coletiva.

    Pessoal, vocês vão ver que em muitos artigos aqui que são negociação individual. Na negociação individual, quem tem força? Digamos que eu tenha dez empregados. Eu digo para o cara: "Meu amigo, você tem que abrir mão aqui no mínimo de 15 direitos seus – eu vou citar depois os 15, inclusive. Desses 15 direitos, você vai ter que abrir mão. Você quer trabalhar ou você quer ir pra rua?" Ele vai dizer: "Eu quero trabalhar". Eu faria isso também. O que eu vou fazer? Eu tenho pão, tenho leite, tenho aluguel para pagar.

    Mas é tanta coisa!

    Vamos para a terceirização. Todo mundo sabe, e eu vou dar o exemplo desta Casa aqui. Vou olhar para cima aqui – por favor, Zezinho, pede para os dois seus parceiros aí que estão na sua frente, desculpa a expressão, para que olhem para cá. Estão vendo esta Casa aqui? Só aqui dentro, num ano, tiveram oito empresas terceirizadas que não pagaram seus trabalhadores. E não pagaram e foram embora. E eles estão aqui dentro a ver navios!

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Vão à Comissão de Direitos Humanos, vão para cá, vão para lá: "Paim, mas não nos pagaram nada. O que eu faço?" Vão para a Justiça. Vão procurar o Ministério Público do Trabalho e não recebem. Aqui dentro! A última foi a Qualitec, uma vergonha! Quatrocentos trabalhadores sem receber nada.

    É isso que vocês querem para 45 milhões de trabalhadores? Porque agora se permite, pela lei, terceirizar tudo. Ou não permite? E há ainda uma decisão, se eu não me engano do Supremo Tribunal Federal, que diz o seguinte: quando for prestar serviços para o Estado, se a terceirizada não pagar, o Estado também não paga. Mas que País é este? E decisão, se não me engano, do Supremo. Foi do Supremo. O Estado não é responsável.

    Então, o malandro do picareta, o gato – como diz o trabalhador – presta serviço para este Congresso ou mesmo para o Executivo ou para o Judiciário, não paga ninguém e some. O Judiciário não tem a responsabilidade solidária? Não, diz que agora não tem.

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Sr. Presidente, eu vou acelerar porque, de fato, é muita coisa, mas eu espero que V. Exª seja um pouco tolerante comigo porque esse tema merece um carinho especial de todos nós.

    Sobre contrato intermitente, eu já falei rapidamente. Negociado sobre o legislado, pessoal, num País como o nosso? Nós tratamos de trabalho escravo ainda. Eu sou o Relator de um projeto aqui que vai regulamentar ou não o trabalho escravo. Como é que a gente pensa? São Bernardo é uma coisa, o meu sindicato até de Canoas é outra coisa, o bancário de São Paulo é outra coisa, mas eu quero saber o sindicato lá de Capão do Leão, de Capão do Tigre, lá de Cachoeirinha – estou dando alguns exemplos. Que poder tem esse sindicato numa negociação com o empregador, quando o cara chega e diz: "Tua empresa de calçado está aqui [um exemplo muito comum no Nordeste], estamos propondo isso, vocês concordam? Se não, eu vou para outro Estado." E vocês sabem que fazem assim porque fizeram inclusive no Rio Grande do Sul.

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Sem uma reforma sindical, aí sim antes, que discuta tudo isso – Sistema S e contribuição sindical –, discuta tudo isso, não temos condição de aplicar o negociado sobre o legislado. É que nem entregar, como a gente fala no Rio Grande, para que a raposa vá cuidar do galinheiro. É isso. Quem é que vai ter força nessa negociação?

    Negociação individual. Esse é o absurdo do absurdo do absurdo. Chama o peãozinho na mesa, inclusive na rescisão de contrato, e diz: "Ó, assina aqui. Tu queres receber isso aqui ou queres brigar na Justiça durante 10, 20 anos?". Ele vai dizer o seguinte: "Vou pegar o que eu posso". Eu acho que, isso, sim, é covardia. Te confesso que acho que é covardia.

    Estou terminando, Presidente, porque aqui são só citações. Rapidamente, aqui são frases somente e acho que, em um minuto, eu termino.

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Regulamenta o teletrabalho e sem definição de jornadas e horas extras; estabelece prescrição intercorrente no processo trabalhista; acaba com a ultratividade das normas coletivas – e aqui tem dedo também do Supremo Tribunal Federal –, que eu acho um absurdo. Se eu não fechei o acordo porque não houve condições entre empregado e empregador por que não pode prevalecer pelo menos o acordo anterior? Pelo menos isso? Não, agora é não. Então, tudo o que tudo o que você tinha até agora morre e, daqui para frente, é zero.

    Dificulta a gratuidade da justiça tanto para as custas processuais quanto para os honorários periciais; alteração das regras de equiparação de trabalho, de remuneração de empregados; elimina a homologação – esse é o último, e eu termino, Presidente – com a participação dos sindicatos.

    Eu só peço uma coisa, e eu nem quero que vocês respondam nada se não quiserem.

(Soa a campainha.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Todos aqui, de uma forma ou de outra, claro que ilustram para nós o nosso ponto de vista pela decisão que vamos tomar. Eu acredito muito neste Senado, este Senado tem história. Todos os projetos mais reacionários que a Câmara aprovou, aqui não passaram. Nenhum deles passou. Nenhum! Isso aqui é pior do que tudo que a Câmara aprovou até hoje. Aqui nós não vamos só carimbar.

    Quero me dirigir com muito carinho ao Relator Ferraço: sei da tua sensibilidade, Ferraço, sei das tuas preocupações. Não é que eu vou dizer aqui: "Olha, aqui nada presta, não quero nada, e tudo o que o Ferraço pensar eu sou contra". Não, mas eu sei que nós vamos discutir profundamente sobre o teu acompanhamento, com os nossos Líderes de todas as comissões deste Plenário, para construir o que for possível. E não querer, e vir com uma história de que vai haver uma medida provisória, aprovar como está, e esperar a medida provisória? Ah, isso é conto da carochinha, não é? Eu estou com quase 70, Senador Tasso Jereissati.

(Interrupção do som.)

    O SR. PAULO PAIM (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RS) – Estou com 67 e vou com orgulho, se Deus quiser, para 68.

    Agora, vir com uma história de que vai haver uma medida provisória, para aprovarmos como está, porque daí, na medida provisória, a gente ajusta? Ah, aí é achar que eu não tenho dente na boca! Estou meio velhinho, mas os dentes ainda estão aqui. Aí não dá!

    Eu respeito a todos. Eu acho que eu fui um pouquinho mais duro com o nosso Juiz, mas sei um pouco também, talvez, da tua juventude e da minha velhice. Eu disse que eu, quanto mais velho, fico mais bravo. E talvez, na rebeldia da juventude, tu tens o teu ponto de vista, que eu tenho que respeitar.

    Enfim, cumprimento a todos, mas eu tenho certeza de que o Senado não vai carimbar isto aqui. Vai discutir, vai aprofundar e vai construir uma reforma possível e humana, porque esse projeto é desumano.

    Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/05/2017 - Página 58