Discurso durante a 137ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Registro da audiência pública realizada, por requerimento de autoria de S. Exª, no âmbito da CRE, destinada a debater o possível leilão do satélite geoestacionário brasileiro.

Autor
Jorge Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Jorge Ney Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TELECOMUNICAÇÃO:
  • Registro da audiência pública realizada, por requerimento de autoria de S. Exª, no âmbito da CRE, destinada a debater o possível leilão do satélite geoestacionário brasileiro.
Publicação
Publicação no DSF de 22/09/2017 - Página 41
Assunto
Outros > TELECOMUNICAÇÃO
Indexação
  • ANALISE, POSIÇÃO, ORADOR, RELAÇÃO, POSSIBILIDADE, GOVERNO FEDERAL, PRIVATIZAÇÃO, SATELITE, PRODUTO NACIONAL, TELECOMUNICAÇÃO.

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, como é próprio do Parlamento, ainda bem que temos tribuna e cada um tem sua opinião, que pode externá-la da maneira que queira. Mas, como autor deste requerimento para debater o leilão que está sendo feito de parte do único satélite nacional, eu não posso deixar de tratar deste assunto, para pôr a minha posição, respeitando os que divergem, mas pondo claramente a minha posição, e que a população, a opinião pública faça o seu julgamento e juízo.

    Quando apresentei o requerimento, foi com um único propósito: dar transparência, cumprir o nosso papel constitucional de fiscalizar as ações do Governo, defender o interesse nacional, defender o interesse do cidadão brasileiro.

    Lamentavelmente, os colegas que, inclusive, têm posição divergente não estão aqui, e eu não vou poder fazer um debate mais direto, mas eu quero passar aqui minha posição sobre isso.

    Tivemos uma audiência hoje no plenário da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, onde se atendeu um requerimento de minha autoria, juntando duas Comissões – a Comissão de Ciência e Tecnologia e a própria Comissão de Relação Exteriores e Defesa Nacional –, para ouvirmos o Presidente da Telebras, também um representante do Clube de Engenharia e o Comandante da Aeronáutica sobre o leilão – é fato – que vai ocorrer de parte do satélite 100% nacional que o Brasil lançou agora, no mês de maio, e que foi tão festejado.

    Esse é o único satélite 100% nacional, e acho que as versões podem vir, mas S. Exª, o fato, fala por si só. Eu vou ler aqui, primeiro, o programa.

    O satélite é um Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas. Ele tem esse propósito. É o SGDC. O programa está na guarda da Telebras, estatal. O Presidente da Telebras foi convidado, esteve conosco e fez a sua exposição. E eu pego aqui os três objetivos do programa.

    Primeiro, prover cobertura de 100% do território brasileiro para massificar o acesso à internet no âmbito do Programa Nacional de Banda Larga. Eu sou o responsável por fazer a avaliação desse programa, um programa que visa universalizar, no Brasil, a internet de qualidade. O segundo objetivo do satélite é prover meio seguro e soberano para as comunicações estratégicas do Governo e de defesa. Esse é o segundo objetivo do programa. E o terceiro: obter tecnologias críticas para a cadeia nacional por meio de programas de absorção e transferência de tecnologia. Esses são os três aspectos do programa.

    Por que é estranho o Brasil, o Governo atual, não o Brasil... Aliás, esse Governo tem 3,4% de apoio do povo brasileiro, e ninguém fala nada disso aqui. Acho que esse Governo não tem autoridade, não tem legitimidade para vender o patrimônio nacional, como tem vendido; não tem. Botaram uma banquinha lá no Palácio do Planalto e todo dia anunciam vender uma parte do Brasil. Eu, particularmente, só não quero ficar do lado errado da história. Quem quiser que fique! A história vai nos julgar a todos. Eu não posso fazer coro com um Governo que está criando ambiente para vender até a Petrobras.

    O único satélite que o Brasil tem é esse. Há 50 satélites fazendo o monitoramento do solo brasileiro – 50, Presidente! O único sobre o qual o Brasil tem controle é esse. E eu vou me calar? Eu vou fazer discurso entre público e privado e ineficiência estatal para colocar à venda? Cada um com seu cada um. Respeito a opinião dos outros, mas não posso concordar com que, pelo menos, a gente torne público aquilo que a gente está vendo de errado acontecer no nosso País.

    Fico triste de ver alguns colegas com posições que vêm com os mais diferentes argumentos para justificar. Imagine! Eu nunca fui estatizante. Eu tenho clareza de que muitos dos serviços têm que ser feitos pela iniciativa privada. O Governo não tem competência para isso. Mas há serviços que, se não tiverem a presença e a ação do Estado, do Governo, a população nunca vai ter. Nunca! Será que teríamos luz para todos no Brasil, com a quase universalização da energia elétrica, se não fosse um programa do governo do Presidente Lula? Disto ninguém fala. Falavam quando o Presidente Lula tinha 90% de apoio. Aí batiam até palmas. Agora jogam pedra no Presidente Lula, que vive uma verdadeira caçada, uma ação dirigida para atingi-lo. E o povo brasileiro, pesquisa atrás de pesquisa, diz: "Não, mas ele foi o único que trabalhou por nós, que trabalhou pelo País".

    Eu ouvi o Brigadeiro Comandante da Aeronáutica, hoje de manhã, dizer que esse satélite não atende às Forças Armadas, que é só uma parte pequena, Sr. Presidente. Ele deixou claro. Sabe como é feito o controle do espaço aéreo brasileiro, dos aviões indo para um lado e para o outro? Um serviço comprado pelo Governo na iniciativa privada, controlado por outros países. Eu ouvi isso do Brigadeiro Rossato hoje de manhã, o Comandante da Aeronáutica.

    Nós estamos atrasados no programa de satélites, nós não temos um balcão de satélites para estar vendendo! Só temos um, que atende uma pequena parte da necessidade das Forças Armadas.

    E sabe o que ele disse? Se nós tivermos conflito com alguém, e alguém quiser dar um clique e fazer um apagão para não termos mais controle de para onde está indo avião ou de onde está vindo avião, isso pode acontecer, porque não temos nenhum controle, nenhum controle de monitoramento do espaço aéreo nacional para aviação. Ouvi isso hoje de manhã, e há gente que acha que tem que vender esse satélite, vender os outros. E ficar na mão de quem?

    Claro que as telecomunicações têm que ter a participação da iniciativa privada, fortemente. Onde está o erro disso? Eu estou falando de um programa que tenta levar internet para Municípios que não têm internet; universalizar o acesso à internet.

    Colegas lá falando do número de analfabetos no Brasil, elevadíssimo! Pena que eu não pude fazer o debate para dizer: sabe onde estão os analfabetos do Brasil? O percentual de pessoas excluídas não está aqui em Brasília, não está no Sul maravilha: está no Norte e no Nordeste; pessoas que sempre foram jogadas de lado, que sofreram. Quando assumi o Governo do Acre, o número de analfabetos no meu Estado, entrava governo, saía governo, era perto de 35% da população. Graças a Deus, trabalhamos nesses anos, e foi reduzido para perto de 14%. É altíssimo ainda. O Governador Tião Viana está lá com um programa tentando trazer para abaixo da média nacional o número de analfabetos.

    Mas vá fazer isso na Amazônia, onde as pessoas moram nos rios; onde uma pessoa sai do Município de Feijó e, para ir até sua casa, demora seis dias de viagem. Outros demoram dez dias para chegar em casa, andando numa pequena embarcação. Vá tentar fazer a universalização disso sem usar a internet! Como é que nós vamos fazer, Sr. Presidente? Como é que nós vamos fazer para acabar com o analfabetismo se estamos entregando um programa que foi criado para isto aqui, universalizar a internet de qualidade nos 5.570 Municípios do Brasil? Botando parte desse satélite na mão da iniciativa privada, esse programa não vai ser cumprido; não há como ser cumprido. É isso que eu ressalto: não está sobrando, não está sobrando espaço do satélite para ser alugado – está faltando. Eu ouvi isso do representante do Clube de Engenharia! Nós temos mais de 2 mil Municípios sem internet de qualidade, Srª Presidente.

    E há esperança. Eu sou a pessoa responsável por avaliar o programa de banda larga. Então, não está sobrando espaço no satélite. O Governo está pondo à venda, alugando por cinco anos, porque está precisando de dinheiro.

    Ontem, eu estava num outro debate na comissão mista, na CPI do BNDES. Ao longo desses anos foram colocados R$500 bilhões no BNDES, o terceiro maior banco do mundo, o terceiro. Agora, o Governo pegou R$100 bilhões de volta no ano passado, está pegando de volta mais R$50 bilhões para tampar o rombo do Governo Temer, que não tem apoio da população, que é ilegítimo! E, no ano que vem, vai pedir de volta mais R$130 bilhões. Eu quero saber: como é que o Banco da Amazônia vai oferecer crédito? Como é que os bancos estatais vão oferecer, se eles eram operadores do dinheiro do BNDES?

    Agora, se havia empresa roubando, se havia alguém fazendo mau uso disso, vamos lá: prendam, rebentem quem estivesse fazendo; mas não vamos acabar com uma política que gerou 20 milhões de empregos e botar outra que tem 13 milhões de desempregados – com culpa parte nossa e parte do atual Governo, porque temos que assumir os problemas.

    Agora, esse programa, essa venda que vai ser dia 17, isso vai custar caro. Não para quem vive aqui no Sul, no Sudeste, em Brasília, mas para quem vive na Amazônia. Nós estamos tirando a possibilidade de ter o programa de banda larga de internet universalizado no Norte e no Nordeste do Brasil, para poder o Governo fazer caixa, ter algum dinheiro para seguir investindo. Em vez de estar, como o Brigadeiro falou para nós, investindo imediatamente num outro satélite, para podermos ter o controle do espaço aéreo, que não temos, para outras enormes atribuições, inclusive constitucionais, que as Forças Armadas têm... O Brasil não tem nem um único satélite, fora esse, que seja seguro.

    E não é para estatizar, não. Eu não caio nessas armadilhas, nesse discurso fácil. Eu estou falando de algo fundamental, estratégico. Ou não é estratégico levar para o Município mais pobre da Amazônia a internet? Como é que nós vamos apresentar um programa com que todos deixem de ser analfabetos? Como é que nós vamos fazer um programa para a saúde e para a educação nos tempos de internet das coisas, se não for investimento como fez, com muita dignidade e senso de brasilidade, o Presidente Lula quando universalizou a energia elétrica para quase todo mundo neste País? E os governos nunca tinham feito. E, agora, nós vamos achar que as companhias de telecomunicações vão universalizar a internet para quem vive na Amazônia ou no Nordeste? Imaginem! Aí, o gasto do dinheiro público nosso, R$1,5 bilhão desse satélite, vai virar um negócio, um comércio.

    Então, eu não tenho nenhum problema com concessão, com privatização de setores em que o Governo é incompetente para atuar – nenhum problema! Eu estou falando de algo que precisa ser dito, como verdade, porque há os fatos: o único satélite 100% nacional, lançado agora em maio, festejado, fruto de um trabalho da Presidente Dilma, o Governo está pondo à venda parcial – durante cinco anos não vai mais ser dono dele o Governo. Ele aluga uma parte desse satélite, que não está folgada, que não tem margem de folga. Por que não tem? Ele mesmo falou, o representante da Telebras: é dez vezes mais caro você ter uma telecomunicação de qualidade de internet feita pela iniciativa privada do que pela Telebras. Eu ouvi isso dele hoje cedo. E os Municípios pobres, pelo menos nesse começo, as escolas paupérrimas, distantes, não vão ter – não vão ter – a internet, não vão ter a conexão com o mundo. Vão ser jogadas, vão ser mantidas no atraso por conta de medidas como essa.

    Eu tenho fé, eu tenho esperança de que o Ministério Público Federal possa suspender essa venda, para que a gente dê transparência, para que a gente possa ouvir, para que a gente possa trazer à luz do dia a verdade sobre isso. Não é uma questão de quem é a favor de privatizar ou de quem é a favor de estatizar. Longe disso! Não entro nessa armadilha.

    O que nós estamos tratando aqui é de algo estratégico para o País. A parte das Forças Armadas está preservada, os 30%. Eu estou falando da outra parte, que era a possibilidade – como alguém que está com a responsabilidade de fazer o relatório sobre a política de banda larga no Brasil, de internet de qualidade do Brasil –, que é a possibilidade de nós termos internet de qualidade, com esse satélite, em todos os Municípios brasileiros. Só isso! Nas escolas, nos postos de saúde vai ficar praticamente impossível ter acesso a uma série de serviços com a internet das coisas vindo agora, em 2020, se nós não tivermos uma internet com qualidade, com velocidade nos Municípios. E na hora em que estamos perto desse sonho, que nós deveríamos estar discutindo como é que colocamos recursos para que a Telebras cumpra antecipadamente o nosso programa de banda larga, de internet, porque ele está atrasado, o que é que se faz? A Telebras vai alugar uma parte daquilo que deveria ser usado pelos Municípios, pelos brasileiros que não podem, que não sabem e que não têm.

    Não estou discutindo o Sul maravilha, o Sudeste maravilha, a Brasília maravilha, porque não são maravilhas, todos temos problemas nessas regiões, mas estou discutindo aqueles que foram deixados para trás sempre, estou discutindo aqui uma infraestrutura de telecomunicação. O Brasil, inclusive nos nossos governos Lula e Dilma, se atrasou na área de satélite – falha nossa, erro nosso, dos Governos. Temos que assumir. Agora que a gente dá um passo para domínio de tecnologia, para produção de um primeiro satélite 100% nacional, qual é o caminho? Qual é a mensagem que pode estar sendo passada? "Não, o Brasil não está precisando, está alugando. Quando alguém aluga é porque não está precisando." E é exatamente o contrário. Esse satélite não dá conta de atender o que a lei estabelece de universalização, de telecomunicação nos Municípios brasileiros, especialmente no Norte e Nordeste; o foco dele seria esse. Se vou alugar é porque não vou usar e, se não vou usar, não vou fazer o serviço de que a população precisa. É isso que está em jogo.

    É por isso que faço essa ressalva. Respeito a opinião de todos os colegas, mas faço um apelo ao bom senso: sair de uma visão que não é a visão verdadeira, porque, na verdade, estamos discutindo isso. Vamos ter quando a possibilidade de telecomunicação com tecnologia nossa, independentemente dos avanços que o setor privado tem que ter nessa área, como já temos no Sul do País, aqui em Brasília? Mas volto a repetir: dos 5.570 Municípios há mais de 2 mil, Srª Presidente, que não têm internet de qualidade, e a única possibilidade é usarmos 100% do que temos fora da área militar desse satélite para esse propósito. Alugar parte dele vai significar atrasar o acesso dessas pessoas a esse serviço que é tão fundamental, especialmente nos tempos atuais.

    Eu agradeço, Presidente, o tempo. Eu acho que agora o Senador Paulo Paim, a quem eu queria agradecer também por ter feito a inversão da minha fala, porque eu precisava trazer a minha visão, a minha versão. E, como membro...

(Soa a campainha.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC) – ... da Comissão de Relações Exteriores e da Comissão de Ciência e Tecnologia e autor do requerimento que tivemos hoje, eu acho que foi tornado público e ficou evidente que o que o Governo está fazendo em relação a esse satélite é um grande equívoco, independentemente de opiniões que venhamos a ter sobre privatização ou estatização. É um grande equívoco. Vai danificar a minha região. Vai danificar o Nordeste. Vai danificar o Brasil. Vai deixar o Brasil, por mais tempo ainda, com alguns brasileiros de primeira classe e os outros brasileiros como se fossem filhos enjeitados, de segunda classe.

    É isso que o Brasil tem feito, há séculos, com os nordestinos e com os amazônidas. E agora, na era digital, o Governo Temer está vendendo, por cinco anos, uma parte daquilo que deveria fazer a conectividade, a integração, via satélite, via internet...

(Interrupção do som.)

    O SR. JORGE VIANA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - AC. Fora do microfone.) – ... dos brasileiros do Nordeste e do Norte, que ainda não têm acesso a esses recursos tão importantes nos dias atuais.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/09/2017 - Página 41