Discurso durante a 117ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Insatisfação com o fechamento da agência da Receita Federal de Santana do Ipanema/AL.

Preocupação com os números registrados de violência obstétrica no País, com destaque para a notícia que o Ministério da Saúde pretendia suprimir a expressão “violência obstétrica” dos textos e comunicações oficiais.

Autor
Renilde Bulhões (PROS - Partido Republicano da Ordem Social/AL)
Nome completo: Renilde Silva Bulhões Barros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA:
  • Insatisfação com o fechamento da agência da Receita Federal de Santana do Ipanema/AL.
SAUDE:
  • Preocupação com os números registrados de violência obstétrica no País, com destaque para a notícia que o Ministério da Saúde pretendia suprimir a expressão “violência obstétrica” dos textos e comunicações oficiais.
Publicação
Publicação no DSF de 11/07/2019 - Página 30
Assuntos
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA
Outros > SAUDE
Indexação
  • CRITICA, FECHAMENTO, AGENCIA, RECEITA FEDERAL, LOCAL, SANTANA DO IPANEMA (AL).
  • APREENSÃO, QUANTIDADE, VIOLENCIA, PAIS, VINCULAÇÃO, MEDICINA, OBSTETRICIA.

    A SRA. RENILDE BULHÕES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - AL. Para discursar.) – Sr. Presidente, Senador Anastasia, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, inicialmente, gostaria de registrar minha preocupação a respeito de uma medida do Governo Federal que prejudicará diretamente a população de aproximadamente 30 Municípios de Alagoas, Sergipe e Pernambuco. Trata-se do fechamento da agência da Receita Federal de Santana do Ipanema, em Alagoas, sob o argumento de que é necessário cortar despesas. Esse é um típico caso em que a pequena economia a ser obtida pelo Governo se transformará em um grande problema e excessiva despesa para a população atingida.

    A partir do fechamento da agência, os contribuintes terão que se deslocar mais de 100km para chegar a Palmeira dos Índios ou Arapiraca, que não terão suas agências desativadas. Fechar a agência da Receita Federal em Santana do Ipanema é uma prova de desconhecimento da realidade local e das necessidades do povo sertanejo.

    Nesse sentido, eu gostaria, Sr. Presidente, em nome da população que será prejudicada, de fazer um apelo ao Governo Federal para reconsiderar a medida e manter a agência da Receita em Santana do Ipanema.

    Mas o tema que me traz hoje à tribuna do Senado Federal é outro, diz respeito à saúde da mulher.

    Sr. Presidente, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, a imprensa noticiou recentemente que o Ministério da Saúde pretendia suprimir a expressão "violência obstétrica" dos textos de políticas públicas e mesmo de comunicações do Governo, como se a proibição do uso de um nome fizesse desaparecer a prática que ele representa, sob a alegação de que a expressão indica uma intencionalidade no ato lesivo, e, certamente, nenhum médico, enfermeiro ou outro profissional de saúde exporia, de propósito, uma gestante a qualquer situação sequer desconfortável.

    Contudo, milhares de mães vêm sendo vítimas das mais variadas ofensas, não só no momento do parto, mas também nos períodos pré e pós-parto, em hospitais e maternidades de todo o Brasil.

    A pesquisa Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado, realizada em 2010 pela Fundação Perseu Abramo e pelo Serviço Social do Comércio (Sesc), detectou que 25% das entrevistadas sofreram algum tipo de violência antes, durante ou depois de dar à luz.

    Essa é uma preocupação que ganha importância e visibilidade à medida que avançam demandas pela humanização do parto. Atualmente, busca-se a retomada da visão do parto como um processo eminentemente fisiológico e normal, em que a mãe e o bebê devem ser os protagonistas, a exemplo do importante programa do Governo Federal, Rede Cegonha. Na esteira desse movimento, práticas até recentemente vistas como adequadas pela comunidade médica passam a ser consideradas como violência obstétrica, que ocorre justamente em um momento de grande significado emocional e também de maior vulnerabilidade para a mulher.

    A violência obstétrica envolve, nesse contexto, ofensas físicas, verbais ou psicológicas contra a gestante, inclusive intervenções consideradas desnecessárias ou invasivas. Algumas medidas são evidentemente abusivas e violentas. Mulheres relatam ter sofrido agressões verbais, ter sido amarradas à mesa de parto, ou mesmo estapeadas por gritarem de dor durante o parto. A muitas delas é negado inclusive o direito a um acompanhante, em flagrante desrespeito à lei. Nada justifica tais condutas.

    Por outro lado, intervenções médicas, antes corriqueiras, passaram a ser, no paradigma do parto humanizado, objeto de sérias controvérsias, tanto entre profissionais da saúde, quanto na sociedade como um todo, como já citamos. A pesquisa Nascer no Brasil, publicada em 2014, que ouviu quase 24 mil mulheres entre 2011 e 2012, revelou que a manobra de Kristeller foi aplicada em 37% dos partos, mesmo tendo sido condenada pela Organização Mundial da Saúde. A episiotomia, técnica hoje também não recomendada, foi utilizada em 56% deles. Em 40% dos casos, a parturiente recebeu ocitocina ou teve a bolsa rompida pela equipe médica para acelerar o parto.

    Embora algumas situações justifiquem medidas extremas, a frequência com que são aplicadas no Brasil parece exagerada, o que sugere que são desnecessárias em muitos casos. Mais grave ainda é o fato de que muitas dessas medidas são adotadas sem o consentimento da gestante, mesmo que as circunstâncias permitam uma consulta prévia.

    Sr. Presidente, Srs. Senadores, talvez o indicador mais alarmante seja o número de operações cesarianas realizadas no País. A cirurgia geralmente é indicada em gestações de alto risco, como quando o bebê não está na posição adequada ou é prematuro, se são gêmeos, quando há descolamento da placenta ou sofrimento fetal. Ela implica diversos perigos para a mãe, além de ser traumática para o bebê, que muitas vezes vem ao mundo prematuramente, ou seja, sem que se respeite o tempo fisiológico do nascimento.

    A Organização Mundial da Saúde recomenda que, idealmente, somente 15% dos nascimentos ocorram por essa via. Mas, no Brasil, 56% dos partos são cesarianos. Tomando como referência apenas os hospitais da rede privada, o percentual de partos cirúrgicos se eleva para 80%.

    Aproveito essa oportunidade para parabenizar a equipe da Clínica Obstétrica do Hospital Regional de Santana do Ipanema, especialmente a coordenação da "Rede Cegonha", que já está conseguindo reverter esse número, tendo o número de partos normais ultrapassado o número de partos cesarianos há alguns meses.

(Soa a campainha.)

    A SRA. RENILDE BULHÕES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - AL) – Não é razoável supor que todas essas intervenções se devam a complicações que impeçam o nascimento normal. Na Holanda, por exemplo, 86% dos partos são normais; na França, mais de 75%.

    Do ponto de vista psicológico, a violência obstétrica vem em forma de comentários ofensivos à dignidade da mulher ou constrangedores, especialmente quanto à raça, idade ou condição econômica. Provocam sentimentos de inferioridade e até medo numa situação de extrema vulnerabilidade.

    Para denunciar a violência obstétrica, as vítimas enfrentam muitas barreiras. É preciso juntar provas nem sempre acessíveis, formalizar um boletim de ocorrência ou apresentar denúncia por escrito ao Conselho Regional de Medicina, onde ocorrerem os fatos.

    Não há ainda normas federais que definam a violência obstétrica e que possam embasar as demandas das vítimas!

(Soa a campainha.)

    A SRA. RENILDE BULHÕES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - AL) – Estou concluindo, Sr. Presidente.

    Desde que se cunhou a expressão violência obstétrica e o tema passou a ser discutido, muitas mulheres que não tinham consciência do problema se deram conta de que haviam sido vítimas. O debate público sobre esse tema é fundamental não apenas para a prevenção dessas práticas, mas também para que as mulheres possam superar traumas e, até mesmo, buscar reparação.

    Um dos objetivos primordiais do sistema de saúde, do topo à base, deve assegurar que gestante e criança sejam os personagens principais no processo de gestação, parto e puerpério. É preciso garantir que encontrem ambiente de acolhimento e respeito, seja na rede pública, seja na rede privada de atendimento. Banir a expressão "violência obstétrica" dos textos de políticas públicas ou de comunicações do Governo é desconsiderar fatos que prejudicam a saúde e a qualidade de vida de milhares e milhares de mães e bebês em todo o País.

    Precisamos enfrentar essa realidade!

    Eficaz será debater o problema às claras, com envolvimento dos profissionais de saúde e de toda a sociedade, de forma técnica, transparente e inclusiva.

    Para muito além de debates inócuos, todos os esforços devem voltar-se para que o sublime prelúdio da vida transcorra em paz, com dignidade e segurança.

    Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/07/2019 - Página 30