Pela Liderança durante a 155ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com as consequências internacionais da atual política do País sobre o meio-ambiente e considerações sobre as contribuições de S. Exa. na construção da política ambiental brasileira.

Apelo ao bom senso e à ponderação a fim de que não haja retrocessos na proteção do bioma amazônico.

Autor
Fernando Collor (PROS - Partido Republicano da Ordem Social/AL)
Nome completo: Fernando Affonso Collor de Mello
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
MEIO AMBIENTE:
  • Preocupação com as consequências internacionais da atual política do País sobre o meio-ambiente e considerações sobre as contribuições de S. Exa. na construção da política ambiental brasileira.
MEIO AMBIENTE:
  • Apelo ao bom senso e à ponderação a fim de que não haja retrocessos na proteção do bioma amazônico.
Publicação
Publicação no DSF de 05/09/2019 - Página 12
Assunto
Outros > MEIO AMBIENTE
Indexação
  • APREENSÃO, MOTIVO, RESULTADO, DECISÃO, POLITICA INTERNACIONAL, REFERENCIA, MEIO AMBIENTE, COMENTARIO, ASSUNTO, TRABALHO, REALIZAÇÃO, POLITICA DO MEIO AMBIENTE, ORADOR, PERIODO, CARGO EFETIVO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PAIS, BRASIL.
  • COMENTARIO, ASSUNTO, NECESSIDADE, RESPONSABILIDADE, OBJETIVO, AUSENCIA, RETROCESSÃO, PROTEÇÃO, BIOMA, REGIÃO AMAZONICA.

    O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - AL. Pela Liderança.) – Muito obrigado a V. Exas., Senador Paulo Paim e Senador Antonio Anastasia, pelas deferências feitas.

    Sr. Presidente Antonio Anastasia, Sras. e Srs. Senadores, o Brasil enfrenta um dos momentos mais preocupantes em toda sua história na área ambiental. Imensas extensões da Floresta Amazônica estão sendo consumidas há semanas por queimadas em território brasileiro e em países vizinhos.

    Os impactos humanos, ambientais, sociais, econômicos e políticos desse desastre merecem deste Congresso e de todo o Poder Público atenção prioritária para adoção das medidas necessárias ao seu combate, à mitigação dos seus efeitos e à prevenção de futuras situações de semelhante gravidade.

    Igualmente alarmantes e lamentáveis são os efeitos sobre a imagem internacional do País. Enfrentamos hoje uma verdadeira crise diplomática, inédita na história recente do Brasil, que põe em risco a posição de prestígio que arduamente construímos no debate internacional sobre meio ambiente.

    Tive o privilégio de estar à frente da Presidência da República quando o Brasil sediou, em 1992, a maior e mais importante convenção já realizada para debater o uso sustentável dos recursos naturais do nosso Planeta, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, também conhecida como ECO 92. Realizada no Rio de Janeiro, reuniu representantes de 183 países, dos quais 61 presidentes ou monarcas e 40 primeiros-ministros.

    Entre aquelas autoridades, destaco a participação do Presidente dos Estados Unidos da América, George Bush, que, mesmo enfrentando enorme pressão em seu país para não comparecer à Conferência, fez questão de estar presente ao evento, aqui passando, inclusive, o dia de seu aniversário.

    A reunião contou, ressalte-se, com ampla participação de organizações não governamentais e representantes da sociedade civil mundial, que contribuíram, de maneira importante, para os resultados e documentos finais do encontro. A realização da ECO 92 refletiu a importância central acordada à preservação do meio ambiente, que permeou o meu Governo desde o seu início.

    Já em meu discurso de posse, apresentei o que, àquela época, denominava-se preocupação ecológica – termo utilizado corriqueiramente naquele momento – como um dos temas prioritários da minha gestão. Em 15 de março de 1990, quando de minha posse, afirmei – abro aspas:

[...] diviso, como um dos limites fundamentais ao livre desenvolvimento das forças produtivas, à pujança e à expansão do mercado: o imperativo ecológico. O cuidado com o meio ambiente, o alarme ante o drama ecológico do Planeta, não é para nós uma celeuma artificial. Pertenço à geração que lançou um grito de alerta contra um modelo de [...] [desenvolvimento] que caminhava às cegas para o extermínio da vida sobre a Terra. A urgência que meu Governo dará a essa questão reflete um sentimento cada vez mais vivo na sociedade, e particularmente na juventude brasileira, que, por isso mesmo, converti numa das pedras angulares de minha campanha presidencial [– fecho aspas].

    Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, a minha preocupação e cuidado com o tema ambiental permanecem hoje os mesmos. Ciente de que a ECO 92 representava uma oportunidade de imensa relevância para o Brasil e o Planeta, instruí expressamente a diplomacia brasileira a empreender os melhores esforços no sentido de assegurar à conferência resultados efetivos e estruturantes. Na qualidade de país anfitrião, tínhamos o desafio de desempenhar papel construtivo exemplar na moderação de contrastes, aproximação de diferenças, construção de consensos. Na qualidade de país em desenvolvimento, de retorno recente ao regime democrático, o nosso desafio era o de modernizar a imagem internacional do Brasil e atualizar a nossa presença no mundo.

    Com a contribuição central da diplomacia brasileira, consagrou-se, no encontro, o conceito inovador de desenvolvimento sustentável, que incorporou, nos debates sobre meio ambiente, de maneira inextrincável, as dimensões humana e econômica. Da mesma forma, lançaram-se as bases de regimes ambientais internacionais que perduram na atualidade. Duas das principais convenções já celebradas sobre o tema foram assinadas durante a conferência: a Convenção das Nações Unidas sobre Mudança Climática e a Convenção das Nações Unidas sobre Biodiversidade.

    Naquele primeiro grande evento global pós-Guerra Fria, o Brasil logrou consolidar componente fundamental de credibilidade, de previsibilidade, de sentido de direção, rumo virtuoso no plano internacional e interno. Não hesito em afirmar que a ECO 92 foi o maior e mais duradouro êxito da política exterior brasileira no período após a redemocratização.

    Novo encontro global para realizar-se em 2012 foi acordado em 2007, por minha iniciativa, com o objetivo de fazer um balanço dos resultados alcançados desde a ECO 92, realizada 20 anos antes.

    À época, membro titular da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional deste Senado da República, apresentei moção específica em favor da realização do evento no Rio de Janeiro. A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, conhecida como Rio+20, reuniu representantes de 188 nações, que reiteraram o compromisso político com a busca de um desenvolvimento econômico fundamentado no uso sustentável dos recursos naturais e se comprometeram a não retroceder nas metas ambientais traçadas para o futuro. O princípio do não-retrocesso foi uma das grandes conquistas da Rio+20. Com o evento, o Brasil, merecidamente, se consolidou como interlocutor incontornável, protagonista ponderado, construtivo e confiável nas negociações relevantes sobre meio ambiente.

    Tamanha projeção se deveu não apenas à atuação habilidosa da nossa diplomacia, mas também aos avanços consideráveis na área ambiental no plano interno. Ressalto o amplo mérito deste Congresso Nacional na construção de uma das legislações ambientais mais modernas e preservacionistas do mundo.

    As áreas protegidas no Brasil superam hoje 2,6 milhões quilômetros quadrados. Mais de 60% do território brasileiro mantém sua cobertura vegetal original. Nossa legislação determina que, na Amazônia, 80% da superfície da propriedade rural permaneça intocada. Estabelecemos unidades de conservação ambiental e reservas indígenas que cobrem metade de toda a Floresta Amazônica.

    Neste ponto, recordo o Artigo 231 da Constituição Federal, segundo o qual, abro aspas, "são reconhecidos aos índios [...] os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens" – fecho aspas. Em cumprimento estrito da prescrição constitucional, fui o Presidente da República que homologou a maior reserva indígena da História do Brasil, a Reserva Yanomami.

    Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, pouquíssimos países no mundo fizeram tanto quanto o nosso País na área ambiental. E tais avanços em nada impediram que o País se tornasse um dos maiores e mais eficientes produtores mundiais de alimentos, baseado em conhecimento, tecnologia e inovação. É preciso deixar muito claro que a vasta maioria do agronegócio brasileiro é sustentável, respeita o meio ambiente e não representa qualquer ameaça à Amazônia.

    Não cabemos, portanto, nas acusações imerecidas de que fomos alvo nos últimos dias. E não admitimos, nem minimamente, declarações descabidas sobre hipótese irreal e impossível de internacionalização da Amazônia. Trinta anos atrás, ouvi manifestação semelhante do ex-Presidente francês François Mitterrand, que afirmou, abro aspas: "O Brasil precisa aceitar uma soberania relativa sobre a Amazônia" – fecho aspas. A declaração recebeu, da minha parte, a mais firme e veemente reação, recheada de bom senso e à época ela não mais se repetiu. Quem cuida da Amazônia brasileira, a serviço da humanidade e de si mesmo, é o Brasil. Somos plenamente conscientes da nossa enorme responsabilidade. Nossa soberania não é e não será em nenhuma hipótese passível de relativização.

    Isso não implica que devamos prescindir de ajuda internacional cabível, ajustada aos nossos esforços e políticas de desenvolvimento daquela região. Vinte milhões de pessoas vivem na Amazônia. São enormes os desafios de preservação de um patrimônio natural incomensurável, que se estende por mais de 5 milhões de quilômetros quadrados. Estou convencido de que parte do interesse e apoio externos pode ser positivo e bem-vindo, porque respeitam nossa soberania e nosso direito ao uso racional e sustentável daqueles recursos naturais.

    Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, a preservação do meio ambiente é hoje um valor estruturante do mundo contemporâneo. Não pertence a orientações ideológicas específicas; tornou-se um eixo do nosso processo civilizatório, Sr. Presidente Antonio Anastasia. Os avanços que o Brasil alcançou nessa área, nos planos tanto externo quanto interno, são um patrimônio valioso da sociedade brasileira, a ser não apenas preservado, mas ampliado.

    Posturas ambíguas, declarações imoderadas, enfrentamentos despropositados em nada contribuem para a reafirmação do interesse brasileiro em assunto tão relevante e sensível quanto a Amazônia.

    Faço, portanto, um chamamento ao bom senso e à ponderação. É o momento de recuperar o espírito da ECO 92, da Rio+20, e reiterar, com discurso claro e medidas efetivas, o compromisso brasileiro histórico na proteção do bioma amazônico e dos seus povos. A sociedade brasileira e, por extensão, este Congresso Nacional não tolerarão retrocessos. Estamos e permaneceremos vigilantes, porque a busca por um desenvolvimento sustentável é, hoje, pilar da democracia brasileira!

    Muito obrigado a V. Exa., Senador Antonio Anastasia, que preside esta sessão. Muito obrigado, Sras. e Srs. Senadores.

    Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/09/2019 - Página 12