Discurso durante a 54ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Relato da participação de S. Exa. em diligência da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) em Boa Vista-RR, para avaliar a situação da comunidade indígena dos ianomâmis e a questão do garimpo ilegal no Estado de Roraima.

Autor
Leila Barros (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Leila Gomes de Barros Rêgo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
População Indígena:
  • Relato da participação de S. Exa. em diligência da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) em Boa Vista-RR, para avaliar a situação da comunidade indígena dos ianomâmis e a questão do garimpo ilegal no Estado de Roraima.
Publicação
Publicação no DSF de 19/05/2022 - Página 63
Assunto
Política Social > Proteção Social > População Indígena
Indexação
  • COMENTARIO, PARTICIPAÇÃO, DILIGENCIA, COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS E LEGISLAÇÃO PARTICIPATIVA, BOA VISTA (RR), AVALIAÇÃO, SITUAÇÃO, COMUNIDADE INDIGENA, TRIBO YANOMAMI, GARIMPAGEM, ILEGALIDADE, ESTADO DE RORAIMA (RR), EXPLORAÇÃO, Amazônia Legal.

    A SRA. LEILA BARROS (PDT/CIDADANIA/REDE/PDT - DF. Para discursar. Por videoconferência.) – Obrigada, Sr. Presidente.

    Cumprimento o senhor e todas as Senadoras e Senadores.

    Sr. Presidente, na semana passada, eu integrei, juntamente com a Senadora Eliziane Gama e os Senadores Humberto Costa, Telmário e Chico Rodrigues, a diligência da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal, que esteve em Boa Vista, para avaliar a situação da comunidade indígena dos ianomâmis, no Estado de Roraima. Também nos acompanharam a Deputada roraimense Joenia Wapichana, representando a CDH da Câmara dos Deputados, e o Deputado José Ricardo, representando a Comissão de Integração Nacional, Desenvolvimento Regional e da Amazônia.

    Foram dois dias de agenda intensa, dialogando, ouvindo e debatendo com representantes de comunidades indígenas, autoridades locais e federais, órgãos do Poder Executivo, Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública e sociedade civil organizada, em busca de esclarecimentos e respostas para a situação complexa e dramática que envolve o garimpo ilegal em terras indígenas e o impacto dessa prática nas populações tradicionais envolvidas.

    Também tivemos a oportunidade de conhecer mais sobre a história e o desenvolvimento social e econômico do Estado de Roraima, o que certamente colabora para a maior compreensão dos desafios existentes. É inegável a presença do garimpo na formação e no povoamento do Estado de Roraima. Porém, muito mais antiga, Sr. Presidente, Sras. Senadoras e Srs. Senadores, é a presença indígena naquela região que, evidentemente, deve ser respeitada.

    Roraima é o estado da Federação que possui as maiores reservas indígenas em relação ao tamanho do seu território e, além disso, vem sofrendo, nos últimos anos, as pressões sociais e econômicas de um movimento migratório significativo vindo da Venezuela. Porém, também é verdade que, ainda assim, trata-se do estado menos populoso e com menor densidade demográfica do país.

    O fato é que estamos diante de uma polêmica complexa que opõe oposições na sociedade brasileira em relação a como promover a exploração da Amazônia, com todas as suas peculiaridades que envolvem o respeito aos povos tradicionais e ao meio ambiente e o potencial de recursos naturais, inclusive minerais, lá presentes. De qualquer forma, independentemente de quaisquer posições, o que é certo e incontestável atualmente é a proibição em lei de qualquer tipo de exploração mineral em terras indígenas em todo o país.

    Portanto, a meu juízo, é absolutamente inadmissível para um país que se pretende sério, que assume, através de tratados e acordos internacionais dos quais é signatário, compromissos humanitários e ambientais, que busca respeito e reconhecimento mundial, conviver tranquilamente com a existência de mais de vinte mil garimpeiros ilegais apenas nas terras indígenas Yanomamis.

    Se não bastasse o absurdo de estarmos diante de uma ação criminosa e continuada que descumpre a lei a olhos nus, temos ainda impactos absolutamente nefastos na população ianomâmi, legítima dona das terras, que passa pela violência, inclusive sexual contra mulheres e adolescentes, pela fome, pela crise sanitária e pela destruição de sua cultura.

    Tivemos a oportunidade, Sr. Presidente, de ouvir todos os principais atores envolvidos na confirmação das denúncias que já haviam sido apresentadas à CDH, em audiência pública realizada, há poucas semanas, nesta Casa. E não foram poucos os relatos recebidos em audiências realizadas nos dois dias, na sede do Ministério Público Federal em Boa Vista.

    No primeiro dia, ouvimos lideranças indígenas e indigenistas, dentre eles o Conselho Indígena de Roraima (CIR), o Conselho Indigenista Missionário, além de pesquisadores e representantes dos movimentos sociais. Ainda no primeiro dia, a diligência se reuniu com a Defensoria Pública da União, a Defensoria Pública do Estado de Roraima, a OAB de Roraima, o Ministério Público Estadual e o Ministério Público Federal.

    Ao final dos trabalhos, foi basicamente confirmada por todos que lá se pronunciaram a situação dramática do garimpo ilegal nas terras Yanomamis e a repercussão, por vezes trágica, dessa presença junto à população indígena. Houve um clamor unânime por uma solução que assegure o cumprimento da lei e, sobretudo, os direitos dos povos indígenas.

    E no segundo dia estivemos com representantes das instituições federais em Roraima, como a Funai, o Ibama, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), a Universidade Federal de Roraima e o Exército Brasileiro.

    Chamou a atenção de todos nós a falta de estrutura e de condições para que a maioria desses órgãos faça seu trabalho com o mínimo de eficácia em defesa das comunidades indígenas e do meio ambiente, especialmente no enfrentamento do garimpo no estado. Funai e Ibama parecem sofrer um desmonte por parte do Governo Federal, perceptível na logística, de que não dispõem, e na falta de recursos humanos. Só para se ter uma ideia, por exemplo, segundo o Superintendente do Ibama, no momento, o órgão dispõe, Sr. Presidente, de apenas dois fiscais para todo o estado. Na Sesai, lamentavelmente, a situação não é diferente. E todos eles se ressentem completamente da falta de segurança para atuarem na Terra Indígena Yanomami. Há bases da Sesai abandonadas por falta de pessoal e segurança, num claro prejuízo à população indígena local.

    O Exército, por sua vez, declarou ter as condições de fazer mais, porém ressaltou sempre depender de demandas e decisões superiores para atuar, o que evidencia a total falta de vontade política do Governo Federal para enfrentar a situação.

    Nesse último dia, ainda fizemos duas visitas, uma à Assembleia Legislativa do estado, quando nos reunimos com Deputados, entre eles o Presidente da Casa, e pudemos ouvir dos presentes suas posições e impressões sobre o assunto, que, naturalmente, divide opiniões, sobretudo por se tratar de uma Casa política.

    A última visita ocorreu na sede da Polícia Federal em Roraima, oportunidade em que tivemos uma excelente reunião com os delegados da PF, liderados pelo Superintendente José Roberto Peres, a quem agradeço a recepção e parabenizo pelo trabalho de toda a sua equipe.

    Fiquei impressionada, e acredito que todos os demais Senadores, de forma positiva, com o comprometimento e a competência de toda a equipe da PF que esteve conosco. Porém, lamentavelmente, mais uma vez, senti a ausência de condições adequadas por parte da instituição para fazer o enfrentamento do garimpo no estado.

    Para se ter uma ideia, Sr. Presidente, a PF de Roraima não dispõe – escutem bem! – de nenhum tipo de aeronave, helicóptero ou avião para realizar operações no local, em que a única forma de atuar é pela via aérea. Sempre tem que solicitar auxílio externo, da própria PF nacional ou das demais instituições, como o Exército, para operar, o que, seguramente, atrasa suas ações.

    Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, é fundamental buscar soluções para Roraima, que, inclusive, apresentem alternativas econômicas para a população que hoje depende do garimpo ilegal. Há muita gente séria no estado disposta a enfrentar essa questão. O que está faltando é vontade política de quem pode, efetivamente, apresentar e promover mudanças: o Governo Federal.

    O assunto é grave e urgente e simplesmente não pode ficar esperando até a próxima tragédia, que, acreditem, tenho certeza de que, lamentavelmente, virá. É preciso fazer algo em defesa dos povos indígenas e seus direitos, sem esquecer as necessidades de toda a população do Estado de Roraima; sem esquecer o movimento migratório da Venezuela, que dificulta as condições de ação do Governo local. A saída passa, inevitavelmente, pela ação de um Governo Federal que seja verdadeiramente comprometido com o bem-estar de Roraima e do Brasil. Como está hoje, temos alguns poucos lucrando muito com a exploração ilegal de riquezas de toda a população brasileira, explorando, por vezes, em regime de semiescravidão, milhares de garimpeiros, muitos deles venezuelanos; provocando desastres sociais e ambientais na vida dos povos indígenas, que, constitucionalmente, são donos da terra; e causando danos ao meio ambiente e à imagem do país, e, pasmem, sem pagar nada por isso, nenhum imposto ou royalty que pudesse dar algum retorno à população brasileira e ao Estado de Roraima.

    Sr. Presidente, como podemos aceitar isso? Como o Governo Federal pode aceitar isso? Afinal, a quem interessa essa situação? Eu tenho certeza de que ao povo do Brasil e de Roraima é que não é.

    Então, esta é a minha fala, Sr. Presidente, agradecendo não só a oportunidade dessa diligência da CDH ao estado, mas, acima de tudo, a oportunidade de estarmos ali vivenciando bem de perto a situação daquele estado que merece realmente uma atenção especial desta Casa.

    Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/05/2022 - Página 63