29/03/2023 - 7ª - Comissão Temporária Externa para acompanhar a situação dos Yanomami e a saída dos garimpeiros

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR. Fala da Presidência.) - Bom dia a todos e a todas.
Havendo número regimental, declaro aberta a 7ª Reunião da Comissão Temporária Externa criada pelo Requerimento do Senado Federal nº 34, de 2023, com a finalidade de, no prazo de 120 dias, acompanhar in loco a situação dos ianomâmis e a saída dos garimpeiros das suas terras.
A audiência pública de hoje é em atendimento ao item 3.3 do plano de trabalho, com o objetivo de debater a visão do Poder Executivo Federal sobre a crise da Terra Indígena Yanomami, causas e possíveis soluções, de curto, médio e longo prazos.
A presente reunião será interativa, transmitida ao vivo e aberta à participação dos interessados por meio do portal e-Cidadania na internet, em: www.senado.leg.br/ecidadania, ou pelo telefone da Ouvidoria: 0800 0612211.
Participarão da audiência de hoje: Joenia Wapichana, Presidente da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas); Marcos Kaingang, Diretor do Departamento de Mediação e Conciliação de Conflitos Fundiários Indígenas; Ricardo Weibe Nascimento Costa, Secretário Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde; Jorge Luiz Rocha Reghini Ramos, Diretor de Programas da Secretaria Executiva do Ministério da Saúde; Paulo Cesar Basta, Pesquisador Titular da Escola Nacional de Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Para facilitarmos os trabalhos desta Comissão, inclusive com a participação dos convidados nesta audiência pública realizada hoje, nesta 7ª sessão, estávamos aguardando a presença de quem seria a primeira palestrante...
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Pela ordem, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - ... desta reunião, a Sra. Joenia Wapichana, Presidente da Funai. Já chegou?
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA. Pela ordem.) - Presidente, sobre a Joenia, a informação que eu tenho é que ela não está conseguindo, na verdade, ter acesso ao Senado. Ela está lá na Chapelaria. Eu pediria que o senhor pudesse falar com o sistema de segurança, para agilizar. É uma ex-Deputada Federal, Presidente da Funai. Um critério tão rigoroso! E tem tanta gente, às vezes, que entra aqui neste Senado e não tem esse critério.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Foge ao controle...
Senadora, isso aí diz respeito à Segurança do Senado, não à Mesa.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Com toda a certeza. Estou fazendo um apelo a V. Exa.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - V. Exa. tem razão.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Estou fazendo um apelo a V. Exa. para que fale com a segurança, porque tem um critério que não...
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - O.k.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Esse é inexistente.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Está O.k.
Então, a informação que eu acabo de receber aqui da assessoria é que já foi resolvido o problema lá sobre, infelizmente, esse contraponto.
Nós gostaríamos de convidar...
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Nós vamos fazer dois blocos. Como se trata da questão, especificamente, da Funai e também da mediação de conciliação e conflitos fundiários, nós vamos fazer esses dois blocos com a Dra. Joenia Wapichana e o Marcos Kaingang.
Então, eu convidaria para fazer parte da mesa o Sr. Marcos Kaingang, Diretor do Departamento de Mediação e Conciliação de Conflitos Fundiários Indígenas. (Pausa.)
O Marcos Kaingang terá o tempo de 20 minutos para fazer a sua apresentação; depois, ao chegar a Dra. Joenia Wapichana, nós daremos também o tempo de 20 minutos para ela. E aí os Srs. Senadores farão as suas perguntas, suas indagações e, logicamente, com precisão cirúrgica, eu tenho certeza, farão as suas justificativas para esclarecer aqui para a nossa Comissão Externa.
Então, com a palavra, Marcos Kaingang, Diretor do Departamento de Mediação e Conciliação de Conflitos Fundiários Indígenas.
O SR. MARCOS VESOLOSQUZKI - KAINGANG (Para expor.) - Bom, testando aqui o microfone rapidamente. Obrigado.
Primeiramente, bom dia a todos, a todas e a "todes".
Quero cumprimentar os nossos Senadores e Senadoras aqui desta Casa, cumprimentar os demais participantes, também as delegações indígenas que comparecem nesta manhã aqui conosco, para nos prestigiar, mas também para, em alguma medida, acompanhar um pouco o que a gente vai estar apresentando aqui de cenário de três meses aí de gestão do Governo Federal - nós, enquanto Ministério, e também as demais instituições.
Bom, como já foi apresentado pelo Senador, sou Marcos Kaingang, sou Diretor de Mediação de Conflitos do Ministério dos Povos Indígenas, um ministério inédito, criado dentro desses 520 anos de história do nosso país.
Eu vou ser bem objetivo e rápido, dentro da proposta colocada do plano da Comissão, Senador, e, desde já, agradeço o convite.
A nossa Ministra está em agenda externa neste momento também, mas eu acho o plano importante, assim como o responsável para vir fazer a fala, que é quem realmente acompanha todo o processo pelo Ministério dos Povos Indígenas desde as primeiras ações lá identificadas no território ianomâmi, as construções das ações, dos planejamentos, das execuções futuras também de que eu tenho participado.
Então, desde já, em nome do Ministério e da Ministra Sonia, quero colocar já esse ponto de vista. E, enfim, ela reitera que está sempre à disposição para vir, em outros momentos e oportunidades, para estar participando também.
Bom, no que se refere à proposta da Comissão, Senadores, e Senadoras também, nós, enquanto Ministério dos Povos Indígenas, como já antecipei, somos um ministério novo, temos existência aí a partir do dia 1º de janeiro com o Decreto, mais especificamente, nº 11.355, que instituiu o Ministério dos Povos Indígenas.
Aí eu vou me ater, rapidamente, à leitura, brevemente. Eu vou tentar não... (Pausa.)
Vamos aguardar... A própria Joenia chegou, Senador. (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Convido a Dra. Joenia Wapichana, Presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), para fazer parte da mesa. (Pausa.)
Com a palavra o Marcos Kaingang.
O SR. MARCOS VESOLOSQUZKI - KAINGANG - Dando continuidade, então, nós, o Ministério, após nossa criação pelo Decreto nº 11.355, de 1º de janeiro, temos uma atribuição bem específica, entre elas, instituída como atribuição e principais funções do Ministério dos Povos Indígenas, tanto a condução como também a gestão, o planejamento, a execução e o acompanhamento das políticas indigenistas no país. Ainda: reconhecimento, garantia e promoção dos direitos dos povos indígenas; reconhecimento, demarcação, defesa, usufruto exclusivo e gestão das terras indígenas e dos territórios indígenas; cuidar do bem viver dos povos indígenas; proteção dos povos indígenas isolados e de recente contato; e demais implementações dos tratados internacionais, com ênfase na Convenção n° 169 também.
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Então, nossas atribuições são muito específicas no Decreto Presidencial n° 11.355. E, entre essas atribuições da nossa instituição, veio também, a partir do entendimento do GT de transição, que a Funai passaria, então, a compor o Ministério dos Povos Indígenas a partir do 1° de janeiro. Então, Funai e Ministério dos Povos Indígenas, hoje, dentro da estrutura administrativa do Governo Federal, compõem uma única instituição como um todo. Ou seja, nós, Ministério dos Povos Indígenas, passamos a ter a atribuição referente à política indigenista, que era, anteriormente, do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Então, constituído, de fato, o Ministério dos Povos Indígenas, a partir de 1° de janeiro, nós, logo nos primeiros dias, já nos deparamos com a situação da terra indígena ianomâmi. Mas eu gosto de frisar e destacar que ela não é uma situação já evidenciada agora no momento; ela já vem há muito tempo sendo noticiada, denunciada por várias organizações indígenas, organizações indigenistas, ONGs e diversos outros setores da sociedade civil. As próprias organizações da terra indígena ianomâmi também, como a Hutukara, por exemplo, e outras têm denunciado já uma situação grave dos ianomâmis há cerca de quatro anos, com intensidade maior nos últimos dois anos, como a gente identificou. E isso é o que nos mostram os relatórios que têm chegado para nós agora, com o compilado das informações que a gente está buscando fazer.
Assim que chegaram essas denúncias no Ministério dos Povos Indígenas, fomos um dos primeiros ministérios a ser procurado devido à competência e atribuição referente aos povos indígenas. Tivemos as primeiras incursões, as primeiras ações conduzidas pelo Ministério da Saúde, especificamente pela Secretária Especial de Saúde Indígena, que identificou essas ações, articulou com o Ministério dos Povos Indígenas, notificou também sobre a gravidade da situação na localidade. De pronto e imediatamente, a Ministra Sonia Guajajara organizou uma comissão e uma comitiva, no dia 4 de janeiro, para se deslocar até o território. Com ela foram diversas outras secretarias e outros Ministros também, como o de Direitos Humanos, o MDS, enfim, outros ministérios. A própria Presidente da Funai, Joenia Wapichana, se deslocou para lá para fazer, in loco, essa visita imediata e identificar a real gravidade da situação na terra indígena ianomâmi.
Identificado isso, o nosso papel enquanto Ministério, a partir daí... Cabe frisar e destacar que nós somos um ministério novo. Estamos, inclusive, ainda nomeando nossas pessoas, porque é um desafio para todos e todas nós, mas a gente já assumiu uma responsabilidade muito grande dentro das nossas limitações enquanto ministério, diante do orçamento também, que não temos ainda e no âmbito dos recursos humanos também, porque a gente sequer tinha pessoal nomeado efetivamente para acompanhar as ações. Mas a gente fez um mutirão, dentro das nossas limitações, como eu já falei, e a gente conseguiu fazer esse acompanhamento das ações, do início até o momento presente, Senadores e Senadoras.
Então, a partir desse momento, a Ministra Sonia Guajajara notificou outros ministérios que têm atribuição em relação à pauta ianomâmi, entre eles, Ministério da Defesa, Ministério da Saúde, com quem buscamos articular as ações que já vinham sendo implementadas pela própria Sesai na região, que instituiu o COE (Comitê de Operações Emergenciais) - e a Sesai pode falar melhor sobre isso. Buscamos nós, enquanto Funai também e Ministério dos Povos Indígenas, nos somarmos a essas ações que já vinham ocorrendo e propor novas ações, entre elas, reuniões também com o Ministério da Defesa, que tem uma atribuição por ser faixa de fronteira na região, mas que tem uma atribuição muito específica na região de proteção, na região vinculada aos povos indígenas, e também por ser território brasileiro.
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Fizemos contatos e reuniões de urgência e emergência com o Ministério da Justiça (SP), com o Ministério do Desenvolvimento Social, com o Ministério do Desenvolvimento Agrário e com outros vários ministérios, com a Casa Civil, trouxemos esse cenário que se encontrava na Terra Indígena Yanomami e, de pronto e imediato, fizemos uma reunião com a Casa Civil, trazendo a gravidade para o Presidente Lula também.
O Presidente Lula, num primeiro momento, ficou bem abismado, mas era o mesmo fato que já havia ocorrido anteriormente em algumas situações já noticiadas, inclusive, por outros canais de comunicação, como o Fantástico, por exemplo, e outros meios de comunicação. Especificamente, no ano de 2021 e 2020 também.
A partir desse momento, nós, enquanto Ministério dos Povos Indígenas, dialogamos com a Casa Civil, que tem o papel de articular também as ações conjuntas entre os ministérios. Trouxemos a real situação grave da Terra Indígena Yanomami para o Presidente da República, e aí, cabe destacar, também, o papel do Ministério dos Povos Indígenas e da Funai nesse processo. Cabe destacar porque, se você não tem um peso de um Ministério dos Povos Indígenas, você não tem o real direcionamento da importância da pauta e de como ela deveria ser conduzida. Então, com o status de ministério, a gente também ganhou importância e relevância nesse debate, e, a partir desta situação, nós, enquanto atribuição de ministério, também passamos a ter uma maior incidência nas ações, tanto no aspecto de articular, mas também de cobrar, de dizer: "Olha, os outros ministérios também têm suas atribuições, não é só competência do Ministério dos Povos Indígenas, visto que a gente tem como competência tanto a promoção, garantia e efetivação dos direitos dos povos indígenas, mas compartilhadas entre os outros ministérios todas essas responsabilidades". É importante destacar.
É com um pouco dessa lógica que, nós, do Ministério dos Povos Indígenas, estamos iniciando um trabalho para realmente atentar e chamar os outros ministérios e pastas para suas atribuições vinculadas aos povos indígenas.
A gente costuma ver que muitas das pautas vinculadas aos povos indígenas são atribuídas somente à União e a gente sabe que as responsabilidades são da União, grande parte delas, mas também são compartilhadas em diferentes espaços, também temos atribuições, sim, dos municípios e dos estados nessas situações. Então, se a gente chegou à situação em que estamos, é uma responsabilidade compartilhada também, não somente da União, do estado e do município, nesse sentido, da grave situação da Terra Indígena Yanomami.
A partir disso, as nossas ações se intensificaram, enquanto ministério, para conduzir, junto à Casa Civil, para que se fizesse um trabalho mais articulado de fato com os outros ministérios para, realmente, a gente fazer um amplo debate sobre a real situação da Terra Indígena Yanomami.
Nessas reuniões, a gente também convidou, assim que surgiram os primeiros relatos, a Ministra Sônia, que veio com a Presidente da Funai, Joenia Wapichana, outros Senadores, também Parlamentares e outros ministros, e a gente levou a situação para o Presidente Lula. Ele, de imediato, instituiu também, por decreto, um comitê de desassistência ao território ianomâmi, no qual elencou uma série de ministérios que deveriam fazer parte desse comitê, atentando para cada um suas atribuições e responsabilidades referentes ao território indígena ianomâmi em questão. E aí nós temos esse decreto que foi construído para criar um comitê para pensar todas as ações, planejamento e execuções das ações a curto, médio e longo prazo. A partir disso, depois, atentamente às comissões que vêm ocorrendo, vi que esse documento ainda não está disponível, Senadores e Senadoras, que foi resultado desse comitê, Comitê de Coordenação Nacional para Enfrentamento da Desassistência Sanitária das Populações em Território Yanomami.
Então, a gente, enquanto Ministério e Casa Civil, buscou articular com os outros ministérios e construir diversas ações para o território ianomâmi. E, nesse sentido, a gente teve o resultado desse plano. Ele vai ser público, porque ele precisa ser público antes de tudo, mas ainda estamos finalizando os ajustes também.
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Nesse plano, que foi constituído e pensado, os diversos ministérios trouxeram suas atribuições, entre eles, o Ministério da Defesa, o MDS, a Funai também e o Ibama, enfim. E, nesse sentido, a gente compilou todas as ações e a gente identificou que não havia orçamento e recurso para as ações. É importante destacar que os orçamentos tanto da Funai quanto do Ministério dos Povos Indígenas, como eu já falei, são limitados, foram constituídos por um decreto em 1º de janeiro, então, o orçamento não foi previsto nos anos anteriores para nós na discussão no âmbito do Congresso, mesmo que tenha sido enviado. Então, nós temos essa limitação.
A própria Funai, que tem o seu orçamento limitado, também não tem capacidade e condições para executar todas as ações previstas. Então, a gente solicitou e construiu, junto aos diversos ministérios, um plano de atuação conjunta para a Terra Indígena Yanomami, conduzido, num primeiro momento, pela Casa Civil e, a partir desse momento - ele tinha um período de 90 dias -, encerrado esse período de 90 dias, vai passar a ser atribuição do Ministério dos Povos Indígenas na condução e implementação desse plano.
Nesse plano foram pedidos créditos extraordinários para as ações e cada ministério elencou quais são as reais necessidades e orçamentos que precisam para executar suas ações no território indígena ianomâmi. Nós, do Ministério dos Povos Indígenas, também solicitamos nesse sentido.
O plano envolve uma série de situações, entre elas, o aumento do efetivo e a presença do estado na região com servidores e servidoras da Funai, também na região. O Ministério da Saúde elencou suas prioridades tanto para a equipe de saúde como para medicamentos, enfim, transporte aéreo de pacientes e profissionais. O Ministério da Defesa colocou suas situações também de preocupação em relação a não ter orçamento para essas ações na região, mas foram priorizadas as ações também de transporte, deslocamento, fiscalização e proteção do território. O Ministério da Justiça a mesma coisa, para desintrusão, por exemplo.
Então, tem uma série de conjuntos de ações que foram pensados aqui, ações mais imediatas, ações urgentes que o território e a população precisam, mas também pensando na execução e planejamento a médio e longo prazo.
Nesse aspecto, Senador - e eu vou me atentar ao meu tempo também, mas são muitas coisas -, cabe destacar que o Ministério dos Povos Indígenas, com essa atribuição nova que nos foi designada agora pelo decreto, tem esse papel de articular de fato as diferentes instituições nesse processo. É importante destacar que em nossas atribuições, como a Joenia falou, a gente vai precisar de uma atuação em conjunto, dentro das nossas limitações orçamentárias para esse ano também e aí a gente vai contar muito também com esta Casa, tanto o Senado e a Câmara dos Deputados, para poder desenvolver essas ações nesse sentido. E aí vem um fenômeno também de que a gente assume as nossas responsabilidades aqui enquanto Governo Federal, dentro das nossas limitações orçamentárias para esse ano, que ainda são graves, cabe destacar.
O problema dos ianomâmis é uma situação específica, mas é um pouco de realidade compartilhada com diversos outros territórios no Brasil. A partir dos nossos primeiros levantamentos, enquanto Ministério dos Povos Indígenas, a partir dos elementos que a Funai já traz com muita propriedade ao longo do tempo também, a gente tem, no âmbito da própria ADPF 709, para quem conhece ou não conhece, Senadores e Senadoras, que também prevê a desintrusão da região e a proteção, o próprio Supremo já transitou em julgado a situação e reiterou decisões nesse sentido. Então, a gente está com um compromisso e um dever muito sério nesse sentido para garantir a proteção, a vida e a assistência desses serviços públicos para os povos indígenas na Terra Indígena Yanomami nesse sentido.
Cabe destacar também que, dentro do aspecto de desassistência, a gente identificou, Senadores e Senadoras, algumas situações que poderiam ter sido adotadas e não foram adotados ao longo do tempo. Eu acho que a atribuição do Ministério dos Povos Indígenas agora é dar seguimento a essas ações com que a gente tem se comprometido, a partir da nossa atribuição legal, enquanto ministério também, mas a gente entende que precisa de um esforço conjunto. A pauta indígena ainda é invisibilizada, não se dá a real importância que se deve para essa pauta. Talvez por isso, chegamos a este cenário, mas é importante destacar que este cenário da Terra Indígena Yanomami pode se repetir e ser visibilizado em outras situações também.
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Nós, enquanto Estado brasileiro, nos colocamos em situação meio vexatória também na medida em que a gente não consegue dar as respostas mais contundentes possíveis para essa realidade. Então, a criação do Ministério dos Povos Indígenas também é urgente nesse sentido devido à negligência histórica do Estado brasileiro nesta proposta de dar assistência aos povos indígenas no Brasil, entre eles, os povos ianomâmis. Vivem lá na região cerca de 30 mil indígenas, mais de 350 aldeias na região. Há diversos povos na região também. Então, a gente tem uma desassistência muito grave lá. A gente tem limitações e dificuldades para... Como eu falei, a Funai também está no âmbito, no escopo do Ministério dos Povos Indígenas. A gente tem muitas dificuldades de manter servidores na região, a gente tem limitações de concurso público, a gente tem dificuldades de dar condições de trabalho para os servidores e servidoras também. Então, é um conjunto de fatores que levou a essa situação com que nós, enquanto Ministério dos Povos Indígenas, estamos de fato muito preocupados. Estamos comprometidos também para transformar, mudar essa realidade, pois isso vai justificar a existência do Ministério dos Povos Indígenas, na medida em que a gente consiga dar respostas contundentes a essas situações gravíssimas que a gente enfrenta no país.
Agora, a gente vê que só com as ações do Governo Federal até o momento a gente vai ter muitas dificuldades, mas a gente tem construído boas relações, boas articulações com os outros ministérios e com Parlamentares também, destinando emendas parlamentares, preocupados com a situação também do Ministério dos Povos Indígenas, preocupados com a situação ianomâmi. A Ministra Sônia também fez todo um conjunto de articulações não só no âmbito do Poder Executivo, mas do Poder Legislativo também, preocupada em trazer ao âmbito do Legislativo essa preocupação em relação aos territórios indígenas.
A gente tem uma preocupação muito séria, pois uma das atribuições Ministério dos Povos Indígenas também é a proteção territorial. Nesse aspecto, a gente se envolveu em um diálogo muito forte... E aí chamo novamente a ADPF 709, em que cabe a desintrusão dos territórios indígenas, ianomâmis também, mas outras seis terras indígenas pelo Brasil que têm a presença de garimpo ilegal na região. Nesse sentido, a gente tem dialogado e feito toda a articulação... Como eu falei, a partir deste momento, a condução passa a ser do Ministério dos Povos Indígenas, e toda desintrusão dessa região vai ser conduzida por nós Ministério dos Povos Indígenas. A gente tem feito um diálogo muito aproximado com o Ministério da Justiça, com o Ministério da Defesa também e com as forças de segurança pública locais da região de Roraima, para que a gente possa conduzir, de fato, a desintrusão da terra indígena. O próprio Ministério da Justiça pode falar com mais propriedade nesse sentido. O próprio Ministro Barroso autorizou o uso de créditos extraordinários para desintrusão desses territórios. E a gente está finalizando um planejamento também para a desintrusão da Terra Indígena Yanomami, mas em um escopo maior, no âmbito da ADPF 709, para desintrusão de outros territórios também, o que está com determinação do Supremo Tribunal Federal para ser executado. Então, a gente está conduzindo essas ações, mas a gente vê uma dificuldade na Terra Indígena Yanomami de essas ações se concretizarem por todo um contexto que está ali.
Quem pôde visitar... E acho que a visita que os Senadores farão à região, in loco, vai ser crucial e importantíssima no sentido de evidenciar, porque algumas coisas a gente vê pela TV e pensa "nossa, que grave a situação de desnutrição", mas quem está na região e vai à localidade vê a gravidade que é uma criança em situação de subnutrição. Em muitas situações, você vê a criança passando e, dali a duas horas, já vê que a criança foi a óbito. É um pouco da realidade da região. Só de 2021 a 2022, houve 570 mortes de crianças indígenas, fora as subnotificadas. Esse processo ainda vem ocorrendo na medida em que... As nossas ações também têm sido intensificadas neste momento, mas há uma redução nesse sentido, Senador... A gente precisa ter uma dimensão mais real da situação para a gente, de fato, conseguir intensificar as nossas ações de maneira mais articulada.
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E o Ministério dos Povos Indígenas tem esse papel também, além da implementação do planejamento das ações das políticas indigenistas, mas o crucial é o diálogo com as lideranças, com as comunidades indígenas lá do território. A gente não consegue articular as ações e os planejamentos das nossas ações de políticas públicas sem o devido diálogo. Nós, enquanto Ministério dos Povos Indígenas, temos, no âmbito do ministério, o Conselho Nacional de Política Indigenista, que é esse diálogo com os territórios; com a sociedade civil; nesse aspecto, com os povos indígenas; e com o Governo.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS VESOLOSQUZKI-KAINGANG - Então, Senadores e Senadoras, encerrado o meu tempo, coloco o nosso ministério à disposição a partir das nossas atribuições e limitações, que são gigantes no aspecto histórico, mas a gente está aí comprometido, de fato, com essa responsabilidade histórica com os povos indígenas, a quem nós devemos a nossa criação também nesse sentido.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Muito obrigado ao Marcos Kaingang, Diretor do Departamento de Mediação e Conciliação de Conflitos, pela sua apresentação de uma forma extremamente didática.
Como ele bem falou, está começando exatamente a existência desse ministério. O Ministério dos Povos foi criado agora, em boa hora, e, obviamente, num processo de sucção natural, vai trazer todos os problemas para que sejam discutidos em todos os níveis de governo, e não em áreas isoladas. Então, essa autonomia, na verdade, já solidifica mais ainda a importância que o Governo está dando exatamente para os povos indígenas, e já são quase 900 mil indígenas no nosso país.
Continuando a nossa audiência pública, eu passo a palavra...
Antes de continuar a nossa audiência pública, eu gostaria de ler uma nota da assessoria desta Comissão para esclarecimento, inclusive, à grande imprensa, aos presentes e à Senadora Eliziane Gama, que, de uma forma muito pontual, se manifestou em relação ao incidente que, eventualmente, teria existido, e não existiu.
Esta Presidência esclarece que a Polícia do Senado Federal informou que a entrada da Presidente da Funai foi autorizada e que a demora na liberação ocorreu apenas para a devida identificação dos assessores que a acompanhavam.
Este Presidente, Senador Chico Rodrigues, Presidente desta Comissão Externa, aproveita para solicitar aos convidados das audiências públicas que, sempre que vierem acompanhados de assessores, informem previamente à Secretaria da Comissão o nome desses assessores, para que providenciemos a liberação junto à Polícia do Senado, pela burocracia natural e a necessidade de segurança que tem na entrada a este recinto, principalmente nas dependências do Senado Federal, de uma forma mais rápida e mais expedita.
Continuando a nossa audiência, eu vou passar a palavra à Dra. Joenia Wapichana, Presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas.
V. Exa. dispõe de 20 minutos.
A SRA. JOENIA WAPICHANA (Para expor.) - Bom dia. Kaimen pukudaanaa.
Primeiramente, eu quero agradecer o convite desta Comissão e agradecer a preocupação da querida Senadora Eliziane, que é tão amiga dos povos indígenas.
Assim, cumprimento, na presença da nossa Senadora, o nosso Presidente da Comissão, Senador Chico Rodrigues; a Senadora Damares, que está presente; os demais Parlamentares; o Deputado Federal Stélio Dener; a imprensa, que está presente; as nossas lideranças indígenas, que estão acompanhando esta audiência.
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É muito importante a gente poder discutir uma situação que não é surpresa, é uma tragédia anunciada. Essa tragédia inclusive foi debatida na Câmara Federal, em uma comissão externa, da qual eu também fiz parte, que se debruçou em analisar denúncias de abusos sexuais de meninas e, com isso, também a situação do povo indígena na Região Waiká. Estive presente em diligência. Inclusive o Senador Chico esteve em algum momento.
Como atividade parlamentar, sendo Deputada Federal na última legislatura, pude acompanhar, investigar, ouvir depoimentos e também propor recomendações. Então, não é uma surpresa que veio à tona a toda a sociedade brasileira essa tragédia humanitária. Crianças morrendo de fome.
E hoje o que nós vamos passar aqui é que é necessário resgatar alguns apontamentos.
Pode passar? Tem um controle para eu passar? (Pausa.)
Essa, para quem não conhece, é uma comunidade ianomâmi. A comunidade ianomâmi fica lá no meu Estado de Roraima. Então eu sou do Estado de Roraima, eu sou uapixana, mas sou de uma outra região. Ali é uma região de floresta fechada.
Pode passar. Tem o controle? (Pausa.)
E a Terra Indígena Yanomami, para quem não conhece, é a maior terra indígena do Brasil. Ela foi homologada em 1991.
Nós vimos que toda a preocupação em relação àquele povo é causada pelo fato de aquele ser o povo de mais recente contato que nós temos aqui no Brasil. Tem grupos de indígenas isolados e também tem aproximadamente 9 milhões de hectares. Então a terra indígena tem toda a sua especificidade e seus desafios também.
É necessário a gente falar também sobre a origem dessa crise. Alguns apontamentos que... Cumprimento aqui o nosso Diretor Marcos Kaingang, do Ministério dos Povos Indígenas. A importância... Ele veio também fazer uma análise sobre o ponto de vista do novo Ministério dos Povos Indígenas, que veio nesse desafio também não só articular, mas apoiar o trabalho da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, que é uma autarquia hoje vinculada ao Ministério dos Povos Indígenas. Assim, se fortalecendo pelo Ministério dos Povos Indígenas.
A origem dessa crise é pública e notória. Todo o Estado brasileiro presenciou e viu os ataques de invasores e a ausência efetiva do Estado, de uma forma permanente.
Você pode retornar ali para a minha apresentação? (Pausa.)
Caiu? (Pausa.)
Então enquanto eu não retorno com a minha apresentação... O que nós vimos nesses últimos tempos foram ataques de garimpeiros ali, a presença de algumas operações da Polícia Federal, que constataram o aumento de invasões à terra indígena e também o aumento da área de garimpo. Consequentemente, esse aumento da invasão e aumento exploração dos recursos naturais, justamente somados à ausência efetiva de uma presença mais rápida, que pudesse dar resposta, chegou-se a essa crise de que nós hoje estamos tratando aqui.
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Então foi agravada ao longo dos últimos quatro anos, em razão da desestruturação da assistência à saúde indígena e do abandono das políticas de proteção territorial das terras indígenas que causaram - somado a isso - o aumento de invasão garimpeira, origem de inúmeros impactos sanitários também, ambientais, socioculturais e econômicos à comunidade indígena. E aí é necessário fazer algum apontamento quando a gente fala da origem dessa crise.
Então, deixo bastante claro aqui que não é verdade que a origem da situação seja uma suposta incapacidade produtiva dos povos ianomâmi, dos povos indígenas. Muito foi colocado de matérias tentando criminalizar, inclusive ianomâmis, responsabilizá-los por essa crise, dizendo uma série de ataques racistas. Ao contrário, com as suas serras e seus recursos naturais preservados e acesso à saúde, os ianomâmis sempre conservaram boas condições de vida. Inclusive, a demarcação da terra foi o que assegurou a vida do povo ianomâmi. Se não tivessem demarcado na época de 1991, talvez a gente não tivesse a presença de indígenas ianomâmis, que estavam fadados a um ataque maior.
Essa tragédia também sanitária não é provocada pela imigração de indígenas em situação de vulnerabilidade da Venezuela. Então, é importante deixar registrado aqui nesta Comissão que muitas se deram... colocaram essa questão da imigração de indígena de outro país como se fosse a origem da crise ianomâmi. Na verdade, nenhum órgão oficial registrou a existência de refugiados ianomâmis deste país entre as pessoas desassistidas. Para deixar claro isso. Então, a origem disso é justamente o garimpo ilegal, a disseminação das doenças e a desnutrição, ocasionada muitas vezes de uma relação direta entre a exploração do garimpo e o aumento de casos de doenças infecciosas, gripe, pneumonia e outras infecções respiratórias que poderiam, sim, ser evitadas se houvesse uma tomada de ação e de providências quando foram inicialmente denunciadas. Inclusive, no relatório apontado que a nossa comissão - e eu creio que também a Comissão daqui do Senado -, quando esteve em Roraima, junto com o Senador Humberto Costa, também a Senadora Eliziane, a Senadora Leila, o Senador Chico e o Senador Telmário Mota, puderam ouvir depoimentos de lideranças que estavam falando que eram necessárias providências imediatas, naquela época. Se eu não me engano, foram, inclusive, apresentar essa situação para o Governador, para os órgãos federais, para a assembleia legislativa, para os próprios órgãos que tratam diretamente - Funai, Ibama - e denunciaram.
Então, uma das questões que poderiam ter sido evitadas se houvesse providência... Porque eram doenças que estão relacionadas à questão de malária, desnutrição e poderiam ser tratadas. Mas, pelo contrário, depois que houve essa visita, o que nós vimos acontecer? O anúncio de desvios de recursos da própria saúde indígena, desvios que estão sendo investigados pela Polícia Federal, que deve dar resposta dessas investigações para toda a sociedade. Os desvios de medicamentos e de recursos que eram para tratar da saúde indígena colaboraram - essa corrupção - também para o não atendimento dessas questões de doenças que poderiam ser previamente tratadas, se tivessem mais atenção.
Então, eu estou colocando isso porque muitas vezes é colocada culpa nos próprios ianomâmis por essa crise que está sendo vivida.
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E também, somada a isso, há a questão da insegurança imposta por esses invasores. Também a gente tem que colocar que isso dificulta a presença da equipe médica até hoje. A situação de distribuição de cestas básicas, como o Governo está realizando, através de uma força-tarefa; está-se impedindo que ela chegue a muitos lugares.
Eu vou voltar à apresentação, porque meu tempo está acabando. Eu vou pedir até a reconsideração do tempo.
Nós falamos desse aumento desenfreado da violência e da vulnerabilidade social, cultural. Isso interfere também no modo de vida, como eu falei. Há essa questão da insegurança alimentar, com a presença de conflitos, com a violência, com o aliciamento também - e a falta de respostas -, com a presença inclusive de narcotraficantes. Muitos jovens estão sendo aliciados por conta da entrada de drogas, da entrada da bebida alcoólica. Isso leva também ao caos social.
Além disso, há o enfraquecimento da fiscalização ambiental. A Fundação Nacional do Índio passou por isso. Muitas vezes foi orientada a não ir e, até mesmo, a não ter possibilidade de se movimentar, com o orçamento precário, com o desencorajamento de atender. Inclusive, estão sendo investigadas algumas omissões e negligências das gestões passadas para que se adotem providências também.
Pode passar.
E um ponto de partida, inclusive, que o Marcos Kaingang mencionou é que muitas vezes tem sido... No passado, foi necessário que as organizações indígenas, junto com os partidos políticos inclusive - com alguns de vocês também -, entrassem com essa ADPF 709, uma ação que foi proposta junto ao Supremo Tribunal Federal e que teve resultados que hoje nós estamos cumprindo. Então, por que é que hoje ianomâmi também está como prioridade número um do próprio Governo? Justamente porque já tinha sido levantada essa questão da urgência de se proceder à desintrusão em todos os garimpos ilegais, não só em área ianomâmi, mas em algumas outras áreas também do Brasil - karipuna, uru-eu-wau-wau, kayapó, arariboia, mundurucu -, áreas que estão com presença de garimpo, e que haja um plano de enfrentamento a esses garimpos. E está certo, isso tem que ser adotado, para justamente fazer com que retorne a situação normalizada das terras indígenas. Isso está em andamento, e a Funai, juntamente com os demais órgãos interministeriais, já está adotando essas providências.
Como o Marcos já falou - eu não vou repetir -, devido à ADPF nós conseguimos avançar um pouco nesse planejamento e nas condições logísticas para que isso ocorresse.
Pode passar, por favor.
Isso aqui é a Terra Indígena Yanomami. Ela fica em dois estados, tanto no Amazonas como em Roraima. São 9.664.975 hectares, com uma população estimada em 30 mil pessoas. Inclusive, nestes últimos dias, estava presente na área o IBGE, porque, pela primeira vez agora, com o novo Governo, com a nova gestão nos ministérios, se está possibilitando censo indígena. Então, isso é novidade. A partir desse censo é possível fazer o desenvolvimento de políticas públicas, porque todas as ações humanitárias, de imediato, vão precisar também de ações de médio e longo prazo. Essa crise tem que ser pensada dessa forma, principalmente no que está relacionado à questão da segurança alimentar, para desenvolvimento de políticas públicas.
Pode passar, por favor.
R
Aqui é a presença do Presidente visitando a Casa de Assistência Indígena (Casai) em janeiro.
Então, a partir de uma visibilidade, mas também de um quadro de emergência, no dia 20 de janeiro, foi decretado estado de emergência em saúde pública no interior do território ianomâmi.
A partir desse decreto de emergência, foram criados o Comitê de Coordenação Nacional para Enfrentamento à Desassistência Sanitária; o Centro de Operações Emergenciais em saúde pública, que é o COE-Yanomami; e uma sala de situação.
Por isso, Senadores, a partir do decreto de emergência, foram colocadas questões específicas para entrada em Terra Indígena Yanomami. Só estou chamando atenção, porque, muitas vezes, a gente não se prepara, ou, muitas vezes, acha que, por ser território nacional, pode-se ir a qualquer lugar, mas essa é uma situação de vulnerabilidade. Para entrar em terra indígena, tem procedimentos que a lei orienta, por conta da vacina, do covid, por conta de doenças infecciosas, por conta de todo um procedimento por que hoje a Funai é responsável. E não é simplesmente assim: "Olha, vou entrar e vou de qualquer jeito". Tem todas essas precauções, principalmente nesse estado em que se encontram os ianomâmis hoje, porque há uma questão de saúde, uma questão sanitária. Então, já adianto que tem esses procedimentos a serem tomados a partir do decreto presidencial. E o COI é que avalia os procedimentos, e, depois, a Funai autoriza.
Pode passar.
Pode passar, por favor.
Então, o problema é que chegamos a ver isto: a desnutrição decorrente do histórico...
Pode passar.
Isso aqui é um pouco do quadro da insegurança alimentar. Em todas as semanas, há um boletim informativo que pode ser acessado no site tanto da Funai quanto no do Ministério da Saúde, sobre a questão dos pacientes que são atendidos, da mortalidade também, dos casos de indígenas internados, dos que tiveram alta, dos que estão retornando para casa, das cestas básicas distribuídas, dos vacinados. Então, são informações públicas que também podem ser encontradas no site.
Pode passar.
Esse é um pouco do quadro, porque a gente relaciona essa questão da insegurança alimentar com a prática do garimpo ilegal.
Algumas das medidas interministeriais que a gente vê que são extremamente necessárias e que estão em andamento são: a questão da extrusão para que haja proteção do território - e a proteção dos territórios vai desde o planejamento plano de ações, mas, com o retorno de funcionamento das bases da Funai, as frentes ianomâmis -; as questões dos servidores, para que sejam capacitados para lá; a assistência à saúde adequada e diferenciada; a proteção social adequada e diferenciada; e políticas públicas de segurança alimentar, nutricional adequadas; e inserção ao fomento e produção.
Por que essas palavras "diferenciada e adequada"? Isso é um trabalho que a Funai vem fazendo, justamente orientando os órgãos ministeriais, porque pode até ter a distribuição da cesta básica como urgente, mas, como é para um povo indígena que tem as suas especificidades, não é toda alimentação que chega lá na área. Tem a questão dos alimentos perecíveis, dos não perecíveis.
No caso de alguns alimentos, os ianomâmis não têm acesso, não é da cultura, não é normal. Então, tem uma lista de alimentos que a Funai orienta que se leve por conta da questão cultural. Então, quando a gente fala adequada e diferenciada, é para aproximar o máximo possível. E, hoje, com a nova orientação, estão retornando alguns programas de Governo, como o PAA, como Pnae, que é justamente importante esse acesso a uma alimentação mais próxima à realidade do povo ianomâmi.
R
Pode passar um pouquinho?
E aqui também são as bases de proteção da Funai. É por isso que a Funai sempre tem falado que é importante o investimento do seu orçamento. E aí vocês vão ter a oportunidade de considerar isso nesse novo PAA que vai vir aí. É importante considerar a importância da Funai, porque ela é o único órgão hoje que é responsável para executar a política de proteção territorial. É a Funai que envia seu servidor ali para estar presente, para colocar a situação que está ocorrendo. E hoje as bases da Funai estão muito sucateadas, foram desmontadas durante esses anos todos. Ela teve que fechar suas bases, e, agora, com o novo Governo, a gente está reativando, mas precisamos de estrutura. E, para isso, precisamos de investimento no orçamento. Mesmo com essa crise ainda está difícil.
A base da Funai, que é responsável por vidas, justamente dá essa proteção etnoambiental. Ela tem o objetivo de realizar esse controle de acesso fluvial, mas também, em parceria com a Força Nacional, tem feito, nos últimos dias pelo menos, a segurança dos serviços públicos que são realizados. Existe uma necessidade de ampliar a estrutura física e a manutenção dos agentes de segurança pública também, como a gente tem sempre solicitado ao Ministério da Justiça, às forças de segurança, para que haja nesse momento essa proteção, não é?
Também é uma base, que vocês estão vendo ali, da fronteira, como se diz, muito distante. Então, hoje todos os atendimentos estão concentrados ali em Surucucu. Vocês devem ter ouvido falar muito em Surucucu, Surucucu... É um local lá em que é instalado o Pelotão Especial de Fronteira, mas ali é só um ponto dentro da terra indígena. Ainda tem muito mais pontos a serem acessados; inclusive, na distribuição de cestas, há uma necessidade de se chegar até à ponta, que é a ponta de outras bases que existem dentro da Terra Yanomami, mas é difícil chegar por conta do acesso.
Pode passar, por favor?
Aqui, o acesso é justamente para que se atenda a essa diversidade e o número de comunidades, não é? A gente hoje está discutindo um plano de gestão territorial ambiental que os próprios ianomâmis já fizeram...
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - Vou pedir mais uma prorrogação de tempo.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Em função da complexidade do tema, V. Exa. dispõe de mais dez minutos.
A SRA. JOENIA WAPICHANA - Obrigada, Presidente.
Então, nós temos um plano de gestão que foi elaborado pelos próprios ianomâmis, não é? Antes de chegar às políticas públicas, é necessário que se considere o plano de gestão territorial, ambiental desenvolvido pelas comunidades ianomâmis. A Funai está realizando uma série de reuniões, um fórum ianomâmi, seguindo o protocolo de consulta que os próprios ianomâmis já falaram para as autoridades públicas, a forma como eles querem que aconteçam os projetos de desenvolvimento em suas próprias casas.
Às vezes, é comum pensar pelo outro e dizer assim: "Olha, por que ianomâmi não cria uma vaca leiteira? Por que os ianomâmis não criam galinha?". Então, às vezes a gente tem solução para nós, mas não para eles, porque têm um modo diferente de pensar. Às vezes, não é todo mundo que come macarrão, não é todo mundo que gosta de peixe, não é? Tem gente que não come peixe, mas eu adoro peixe. Tem gente que não comeria uma damorida feita de jia. Não sei nem se vocês sabem o que é jia... Mas tem suas especificidades, não é? Então, os ianomâmis também têm a sua cultura.
E a gente tem que olhar com esse olhar diferenciado para essa questão, quando vai desenvolver política pública, principalmente questão de desenvolvimento sustentável. Às vezes, vai levar um projeto para atender a questão da insegurança alimentar, mas ele pode ser abandonado no meio do caminho, porque não é aquilo que eles querem desenvolver. Então, é por isso que a gente está pedindo atenção justamente para esse protocolo de consulta e o plano de gestão.
R
Pode passar, por favor.
Esse é o PGTA. Quem quiser pode ter acesso a ele também. Eu acho que a Associação Hutukara e outras associações ianomâmis já apresentaram isso; no ano passado, se não me engano, eles vieram aqui ao Senado. Foi lançado, inclusive, esse PGTA aqui no Senado também, numa audiência pública. E, lá na Câmara Federal, eles deixaram para nós, falando de forma bem clara: "É isso que a gente quer para a nossa terra".
Pode passar.
A Funai, hoje, tem atuado em duas principais frentes de que falei. A emergencial é justamente correndo para o fogo não se alastrar, quer dizer, atendendo a ações de urgências, como as ações emergenciais de enfrentamento à insegurança alimentar, por meio de distribuição de alimentos perecíveis e não perecíveis. Quanto a isso, nós temos dificuldade, temos desafios principalmente relacionados ao acesso às pistas de pouso. Inclusive, recebemos um ofício aqui do Senado; não lembro qual Senadora pediu informações sobre as pistas, mas nós vamos encaminhar. Mas, sobre a situação das pistas de pouso que, hoje, estão dentro da terra indígena, elas não são só utilizadas pela Funai, mas pelos serviços públicos; são utilizadas pela Sesai; são utilizadas pelos nossos Parlamentares, quando vão visitar; são utilizadas pela Polícia Federal, pelo Exército, por pessoas que vão fazer algum serviço público. Então, elas são utilizadas pelo Estado brasileiro, mas a responsabilidade, às vezes, só cai sobre a Funai para fazer a manutenção, que não tem o recurso apropriado para fazer isso. E essas pistas estão numa situação bastante precária. Agora que a gente precisa fazer a distribuição de cestas, é necessária justamente a manutenção urgente, para que essas cestas cheguem.
Então, só para eu contar um caso, a Funai esteve averiguando a situação, e, quando não chega a cesta, cria-se uma expectativa muito grande, porque está chegando só em Surucucu, mas é necessário chegar em outras linhas, em outros lugares a que, somente através de transporte aéreo, é possível chegar. Então, essas ações têm seus desafios.
Ações de proteção... Só voltando à insegurança alimentar, nós estamos discutindo com outros ministérios também o desenvolvimento de políticas públicas em relação a essas atividades produtivas, junto com o Ministério do Desenvolvimento Social, junto com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, junto com o próprio MPI. E, também no âmbito da ADPF 709, nós estamos conseguindo esse crédito extraordinário para justamente algumas ações na Terra Indígena Yanomami. Essa reforma é prioritária para mais uma questão: para poderem chegar até as políticas públicas também, para chegarem até mesmo operações da Polícia Federal, é necessário que haja urgentemente uma atenção para a reforma dessas pistas.
Pode passar.
Então, essa é mais do que emergente.
Pode passar.
A outra principal ação também é estruturante. Existe esse processo de consulta de que eu não falei. Já estão sendo realizadas reuniões das organizações indígenas. Vai vir aí, todo mundo sabe - não é? -, a extrusão do território. Fala-se em extrusão, mas muita gente conhece como a operação de desintrusão. Então, é o controle do espaço aéreo, é o controle do espaço fluvial, é o controle do espaço terrestre, que ser feito de forma permanente, mas o Governo deu a possibilidade de as pessoas que estão no território ilegalmente saírem. Esse tempo todinho aí é justamente para possibilitar a retirada voluntária, a saída voluntária, mas está em andamento o planejamento para a extrusão do território.
R
Existe também o fortalecimento das atividades produtivas, a promoção dos direitos sociais, os planos de recuperação ambiental, que têm que haver, porque, por esses longos anos de contaminação da água por mercúrio, inclusive, é urgente se pensar em uma política de recuperação ambiental tanto das áreas desmatadas como das áreas contaminadas, das áreas que são extremamente necessárias para que haja recuperação também nas atividades produtivas do povo ianomâmi.
A questão da construção e ampliação das bases da Funai. Como eu falei, é importante que haja a presença do Estado brasileiro ali. A base da Funai não somente é utilizada pelos servidores da Funai, mas também pelo Ibama, pelos servidores da saúde que vão em deslocamento e para outros que vão fazer atendimento em algum serviço público. E também o monitoramento mais presente, justamente para que haja uma atenção à situação dos povos indígenas isolados, porque, além de ter os de recente contato, tem grupos de indígenas isolados, que requerem uma política mais diferenciada ainda das que a gente conhece.
Então, algumas ações já realizadas nessa vigência da emergência, que foi a elaboração da portaria da Funai/Sesai para autorização de entrada em terra indígena. Então, quem tiver interesse pode acessar essa portaria. Já foram distribuídas 12.908 cestas alimentares, buscando atender a essa questão da segurança alimentar. Também no Estado do Amazonas, foram, se eu não me engano, quase três mil cestas - aqui está só Roraima; no total, são 15 mil. E também foram entregues 1.129 no contexto da ADPF 709 - está ali embaixo, 3.356.
A distribuição de alimentos da agricultura familiar, que é a questão mais próxima à realidade do povo ianomâmi, que é a questão de batata doce, milho, questões mais específicas à alimentação indígena. Também teve o apoio à abertura e manutenção das roças tradicionais, a distribuição de cestas, aliás, de ferramentas para a questão do uso mesmo lá nas roças. Muitas vezes essas roças foram paradas porque há uma carência muito grande dessas ferramentas. Quem for lá na área ianomâmi vai ver que é muito importante quando você tem um terçado para cortar a roça mesmo. Coisas simples, mas que não há.
Acesso dos agricultores indígenas ao programa de compras - justamente o que eu falei sobre a possibilidade de se comprar alimentação diferenciada - e doações de 1.500 cestas que vieram de outras fontes, inclusive não governamentais.
O que está em andamento é esse processo...
Extrusão, isso aí já passou, pode passar.
Aqui é uma tranquilidade normal, digamos assim, para a questão dos ianomâmis. Hoje nós temos...
Pode passar.
Pode passar, por favor?
Então, nós temos alguns desafios que são justamente superar esse quadro do desmatamento, da destruição dos ecossistemas, da contaminação do solo, da água e do assoreamento dos rios, a diminuição da população de peixes, a contaminação de peixe por mercúrio, a diminuição da roça, mas também dar atenção aos impactos sociais. Eu falei dos impactos ambientais. E dos impactos sociais que são justamente: o aumento de casos de doença infectocontagiosas; a contaminação metilmercúrio; a desestruturação social e econômica das comunidades; o aumento de casos de violência, inclusive contra indígenas isolados; entrada de drogas e bebidas alcoólicas, inclusive distribuição de armas de fogo, pois o garimpo fez isso aumentar, principalmente relacionando o aliciamento dos jovens, a exploração ilegal do trabalho indígena, o abuso e a exploração sexual de mulheres e crianças indígenas. Então, nós temos um desafio muito grande aqui, inclusive para o Congresso Nacional. O desafio é justamente como, digamos, responder...
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(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - ... a esses impactos. Eu diria que nós temos uma série de projetos de lei que combatem a questão do mercúrio. Eu mesma propus um projeto, juntamente com outros Deputados, para não autorizar mais o uso de mercúrio em terras públicas - inclusive, a comercialização do mercúrio deve ser mais controlada.
A questão do rastro do ouro também, pois eu ouvi uma matéria dizendo que o Governo vai criar uma medida provisória, mas também está em andamento, em trâmite aqui o projeto para a rastreabilidade do ouro, que é acabar com a boa-fé. Hoje, você vai a uma joalheria e compra ouro sem qualquer certificação de origem. Isso é sério, Parlamentares, Senadores, porque é necessário que haja uma eficiência tanto nessa questão de fiscalização do comércio de ouro - pode ser ilegal -, mas também na compra, na venda e no transporte. Quem está lucrando com o garimpo? Quem está lucrando com a vida das crianças que está se indo? Quem realmente está por trás de toda essa crise humanitária que os povos ianomâmis e outros povos no Brasil estão passando?
Então, são necessárias providências imediatas contra o garimpo ilegal. Vamos deixar bastante claro: garimpo em terra indígena é crime. Vamos deixar bastante claro que o nosso art. 231 dispõe de uma clareza muito grande. A autoridade tem que pensar: quem são as vítimas aqui? São as crianças, são os jovens, é o povo ianomâmi, que já está sofrendo e já denunciou. Não é culpa deles se não foi feito. Nós temos a obrigação de fazer, o Estado brasileiro tem. A Funai, junto com o Ministério dos Povos Indígenas, está atuando nisso, fazendo... Mas é necessária uma ação de Estado, a partir do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. É uma responsabilidade do Estado brasileiro dar segurança: segurança física, segurança cultural, segurança alimentar, segurança à vida.
É por isso que eu me somo ao apelo dos ianomâmis, porque a nossa competência - aí eu me junto à vocês, Senado, pois já fui Parlamentar também -, pois muitas coisas nós podemos solucionar a partir do Congresso Nacional, aprovando leis mais rígidas, de mais controle, aprovando um orçamento mais condizente com a obrigação dos órgãos que executam políticas públicas, fazer com que os crimes não fiquem impunes.
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - É preciso uma resposta à sociedade brasileira de tudo o que foi cometido contra a vida dos ianomâmis. Nós precisamos dar uma resposta à altura, investigar e responsabilizar pela omissão, pela negligência e por toda essa atrocidade que nós estamos vendo aqui e discutindo.
O momento é agora. A gente está correndo para salvar mais vidas, mas é também necessário estabelecer um Estado democrático e de direito, para que a gente também recupere a imagem do nosso Brasil, que não é o Estado brasileiro aquele violador de direitos, mas aquele que dá a resposta e que sabe solucionar seus problemas.
Muito obrigada. Espero que a Comissão Yanomâmi possa considerar também o nosso relatório, que foi feito com uma série de recomendações tanto para o Legislativo quando para o Executivo. Eu fico até brincando que eu conduzi, coordenei uma Comissão e agora eu tenho que cumprir a minha própria recomendação. Então, a gente está aqui, deste lado, mas, depois, em outro tempo, a gente pode estar do outro.
Muito obrigada e parabéns pela iniciativa! (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Eu quero agradecer a apresentação também extremamente didática da Deputada - chamo ainda de Deputada - do meu Estado de Roraima, que desempenhou as atividades parlamentares defendendo a causa, que é a causa que hoje ele representa com muito mais vigor à frente da Presidência da Funai.
É lógico que esse material que foi apresentado, com certeza, poderá ser recolhido para servir ao Relator, Senador Dr. Hiran, como subsídio, para fortalecer, na verdade, o relatório.
Eu gostaria de agradecer aqui a presença do Deputado Federal Stélio Dener, como convidado também do nosso Estado de Roraima. Ele é Defensor Público e conhece também essas causas. Até como uma ação para prestigiar esta Comissão, ele se faz presente, e nós queremos aqui aplaudir a sua iniciativa.
Quero também registrar aqui a presença no plenário do Sr. Kaorewyei Reginaldo Tapirapé, Vereador da Câmara Municipal de Confresa, Mato Grosso. Fica aqui o registro do Vereador, que se preocupa com essa causa que é de todo o povo brasileiro.
Dando continuidade à nossa sessão, eu vou passar a palavra aos Senadores.
Pela inscrição, a nobre Senadora Eliziane Gama está inscrita como primeira a apresentar suas perguntas aos oradores e, posteriormente, o Senador Astronauta Marcos Pontes.
V. Exa. dispõe de cinco minutos.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA. Para interpelar.) - Presidente, eu vou tentar aqui...
Como a gente tem uma audiência pública, a gente já direciona as perguntas para os dois, não é isso?
Então, eu queria iniciar aqui primeiramente cumprimentando o Marcos Kaingang.
Marcos, eu queria cumprimentá-lo. Na verdade, quero deixar aqui o meu reconhecimento à sua exposição, aliás uma grande exposição. Você fez, na verdade, um levantamento muito preciso da preocupação atual do Governo, especificamente do Ministério dos Povos Indígenas, em relação a essa crise, eu diria, sem precedentes na história do Brasil, porque nós tivemos um impacto muito grande tanto no país como fora do Brasil. Então, está sob nós uma responsabilidade, de fato, muito grande de encontrar alternativas.
E o relatório... Eu acho que você fez referência a esse relatório que nós recebemos ontem já um pouco tarde, e não deu ainda para ler todo, que é esse aqui, o Relatório Missão Yanomami, que vem na verdade fazendo um diagnóstico da situação que foi detectada pelo Governo atual e, ao mesmo tempo, apresentando medidas e alternativas para solucionar essa crise - eu diria que é uma crise brasileira, não apenas em Roraima. Nesse sentido, eu queria lhe fazer poucas perguntas, Marcos.
A primeira... Aliás, eu acabei de ver aqui na imprensa um destaque de que a Ministra Guajajara... Não sei se você pode me dar, porque a sua área específica é mais a área de conflitos, mas naturalmente aqui você tem, pelo que já percebi, uma visão mais ampla do Governo e do Ministério. A Ministra anunciou a construção de dois hospitais em terras ianomâmis. Eu queria que você nos trouxesse mais informações sobre isso, o que nós temos do ponto de vista mais específico, do ponto de vista de prazos, de projetos, para a execução desses dois hospitais, que, não há dúvida nenhuma, são uma grande iniciativa, porque se estará dando o atendimento específico em relação às terras ianomâmis.
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Um outro ponto que eu queria colocar para você, e você inclusive lembrou aí: nós tivemos uma quantidade muito grande de crianças que morreram no período de 2019 a 2023, ao todo 570 crianças. Apenas no ano de 2022 nós teríamos 99 crianças que morreram, de um a quatro anos de idade, ou seja, uma concentração de mortes muito grande nesse período específico de 2019 a 2022. É claro que nós temos problemas históricos em relação aos povos ianomâmis, e a Joenia lembra muito bem, por uma falta de atenção do poder público em relação a esses povos, mas eu perguntaria a você especificamente para este período: você designa a que essa concentração tão grande de mortes de crianças neste período de 2019 a 2023? Nós temos vários elementos que nós estamos aqui colocando, mas se você pudesse eleger um que você acha que é mais grave e que pode ter tido uma influência direta em relação a essa quantidade de crianças que vieram a óbito...
Um outro fato também, e essa pergunta eu já direciono também à Joenia, é referente, por exemplo, à denúncia - a Joenia lembra, falou agora muito bem - em relação a desvio de recurso público da saúde indígena, em relação a desvio de medicamentos, e nós tivemos agora uma denúncia mais recente também destacando o desvio de vacinas no período mais intenso da covid, e esse desvio de vacina seria inclusive a venda de vacina por ouro.
(Soa a campainha.)
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Já deram os cinco minutos, Presidente? Esse relógio está errado. (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Os questionamentos de V. Exa. são muito ricos, eu vou dar mais cinco minutos para V. Exa.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Ô, Presidente, você está hoje muito complacente conosco em relação ao tempo.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Hoje, não. Sempre. (Risos.)
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Então... Eu até perdi o raciocínio aqui, eu estava... Certo, em relação às vacinas.
Então, nós recebemos uma denúncia de desvio de vacinas e venda de vacinas, Joenia, por ouro, ou seja, trocando de fato a vacina que seria direcionada aos povos ianomâmis; garimpeiros estariam ali interceptando e fazendo essa troca por ouro. Eu queria saber se você recebeu essa notícia.
Um fato que é muito importante, que eu perguntaria aos dois, é a informação do volume de recurso que foi direcionado aos povos indígenas, especificamente aos povos ianomâmis. A Senadora Damares, que deu uma saída, eu acredito que vá retornar, coloca que foi algo em torno de R$1 bilhão nos últimos quatro anos. Eu tenho uma informação de que foram R$2 bilhões, nos últimos anos, para esses povos. O que é que vocês têm de informação para o povo ianomâmi, que é o nosso recorte nesta Comissão, quer dizer, qual o volume que foi para essa terra? Tudo bem, mandamos recurso, mas para onde esse recurso foi? Por que tanta desnutrição? Por que tanto desamparo dessas crianças e dessas pessoas idosas, dessa comunidade, que foi totalmente desassistida e desamparada. Para onde foi esse dinheiro?
É uma informação que nós já solicitamos aqui para o ministério, para o Governo Federal, porque a gente precisa ter esse dado, até para subsidiar a nossa Comissão e também remeter tanto à Polícia Federal quanto ao Ministério Público Federal.
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E, Joenia, eu queria finalizar com você, querida. Primeiro, queria parabenizá-la e dizer-lhe que uma das nossas grandes alegrias é ver você nessa Presidência da Funai, na verdade. Você é uma referência para o Brasil. Aliás, eu lamento muito você acabar não tendo tido a recondução do seu mandato, mas o Presidente Lula, com a visão ampla que ele tem dos povos indígenas, lhe deu uma função muito nobre que é a condução da Funai.
Eu me lembro de que, quando nós estivemos em Roraima - e eu citei isto aqui recentemente, Joenia -, por 40cm ou 50cm, você não foi barbaramente agredida fisicamente, porque havia ali uma concentração de pessoas ligadas a garimpeiros ilegais e criminosos, portanto, que quase invadiram o carro em que você estava, juntamente conosco, para agredi-la fisicamente. Eu cheguei a falar para você, inclusive: "Joenia, solicite um apoio de proteção policial, porque você precisa, você pode ser, infelizmente, aqui assassinada ou agredida. É um fato". E você, na verdade, colocou ali que tinha uma segurança pessoal do ponto de vista da fé e da convicção e que você acreditava nas pessoas de bem, mas eu sempre destaquei realmente essa minha preocupação com você.
E aí você dizia: "A gente precisa ver quem está por trás de tudo isso". Quando nós estivemos na Polícia Federal - e você estava lá conosco -, ela apresentou um volume milionário de desvio por conta da falta de rastreamento do ouro e, portanto, dessa comercialização do ouro. Eu fiquei estarrecida com a quantidade de dinheiro que é movimentada, ou seja, não é qualquer pessoa. Há a quantidade de aeronaves que estão no pátio da Polícia Federal, aeronaves totalmente, eu diria, danificadas, porque eles fazem uma adulteração da aeronave para poder sobrevoar. A gente nem tem a quantidade de pessoas que morrem ali, porque as aeronaves caem e caem dentro da floresta, por exemplo, e a gente não tem o dado, pois elas estão em situação de ilegalidade. E acabam sendo subnotificadas, em qual a razão, na verdade, dessas mortes, porque elas estavam... Os pilotos, que às vezes vêm totalmente... Ou, às vezes, nem são pilotos que acabam utilizando de fato essas aeronaves. Então, a pergunta é: quem está por trás de tudo isso? Essa pergunta que você fez é a pergunta que também fica para nós.
E queria saber de você, Joenia, o que você elege como uma prioridade que nós precisamos focar, para que nós possamos retomar a proteção dos nossos povos indígenas. Eu acho que esse é o ponto principal aqui do debate. E você traz todos os pontos que a gente vem discutindo. Você traz, por exemplo, a informação que já tentaram colocar aqui várias vezes: "Olhem, a situação dos ianomâmis é a vinda dos venezuelanos, é a invasão dos venezuelanos na região". Eu cheguei a perguntar isto aqui, inclusive para um dos representantes do Cimi que estava aqui: "É essa a razão? O que isso influencia?". E você coloca que nós não temos dado real de nenhuma entidade ou instituição que venha trabalhando, se tem realmente essa presença ou não... Então, onde é que está o ponto principal?
(Soa a campainha.)
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - É o desvio de recurso público? Nós temos informações de que apenas uma entidade pode ter recebido R$1 bilhão durante quatro anos, significando R$500 milhões por ano, ou seja, é um volume milionário. Para onde foi esse dinheiro? Onde foi aplicado esse dinheiro? Quer dizer, o resultado, a fotografia que nós temos hoje de crianças desnutridas, da situação dos ianomâmis em total vulnerabilidade é fruto de desvio de recurso público? Onde está esse dinheiro? Para onde foi esse dinheiro? Qual o investimento desse dinheiro? Então, eu queria que você, na verdade, destacasse mais um pouco sobre isso, em relação a esse volume direcionado... Faltou dinheiro ou faltou aplicação do dinheiro? O que faltou de fato para que nós tivéssemos este cenário que nós estamos acompanhado hoje?
Muito obrigada, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Passo a palavra para o Marcos Kaingang para responder às perguntas formuladas pela Senadora Eliziane Gama.
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V.Sa. tem cinco minutos.
O SR. MARCOS VESOLOSQUZKI-KAINGANG (Para expor.) - Agradeço as perguntas da nossa Senadora Eliziane, sempre combativa e atenta ao tema.
Em relação aos hospitais anunciados pela Ministra Sonia, ela fez um anúncio que vem sendo construído, na verdade, com a própria Sesai e com o Ministério da Saúde. Como nós somos um órgão, um ministério criado para articular e promover as políticas públicas para os povos indígenas e garantir e efetivação desses direitos, é uma ação mais específica. O próprio nosso Secretário Weibe, que vai falar daqui a alguns instantes, pode nos responder melhor também, mas é uma ação mais especificamente do Ministério da Saúde a partir de um diálogo também que teve com o Ministério dos Povos Indígenas nesse sentido. A Ministra Sonia fez um anúncio do que está sendo previsto pelo Ministério da Saúde, e a gente não quer sobrepor um anúncio de uma outra pasta, de um outro ministério nesse sentido, mas é uma articulação conjunta nesse sentido, Senadora, que foi construída em diálogos com o Ministério da Saúde, e a Ministra Sonia publicizou talvez uma ação nesse sentido. Mas, enfim, eu não vou responder, porque o nosso Secretário Weibe pode nos dar mais informações em relação a isso também, mas a gente tem construído esse diálogo junto ali.
Em relação às mortes de crianças indígenas e, principalmente, a essa alta taxa de óbito, a gente vê um cenário, de fato, que é uma realidade ainda lá, Senadora, para todos e todas: é um cenário de desassistência ainda muito aprofundada. Na região, a gente tem as ações da própria Sesai dentro das suas limitações e da Funai com seus operativos lá, mas ainda as ações são todas emergenciais nesse sentido. Como eu falei, as nossas ações são pensadas no curto, médio e longo prazos. Este é um objetivo nosso, enquanto servidores e servidoras públicas hoje nesses espaços: promover políticas públicas no longo prazo também - esse é um compromisso do Ministério dos Povos Indígenas. Mas a alta taxa de óbitos que a gente identificou lá foi pela desassistência aprofundada que se deu, mais, especificamente, nos últimos dois anos, nesse sentido, conforme nossos dados e levantamentos do próprio Ministério da Saúde, com que nós fizemos um diálogo e temos compartilhado dados e informações nesse sentido.
Então, a partir desse momento, a gente tem um aprofundamento desses óbitos, Senadora, por uma negligência, de fato, de todo um serviço público que não chegou até o território; o Estado brasileiro não conseguiu prestar serviço público, nos últimos anos, até esses povos, até essa localidade. Então, a gente vê uma redução bem nítida, já nesses primeiros três meses, devido a toda a operação que se tem do Governo Federal na região e dos outros ministérios também: do Ministério da Defesa, mas, principalmente, do Ministério da Saúde nesse sentido.
Com relação ao desvio de recurso, Senadora, eu acho que aí, de fato - ontem, inclusive, a gente esteve numa reunião no Tribunal de Contas da União -, não cabe a nós fazer um jugo de valor em relação a isso. Eu acho que quem vai dizer são os órgãos competentes em relação à execução desses valores, mas, de fato, a gente tem recursos bilionários repassados para organizações executarem políticas de assistência à saúde e de proteção do território também, e esses valores a gente vê que, de fato, não foram executados de forma mais qualificada, como poderia ser. Mas eu me atenho a não fazer qualquer julgamento prévio, porque quem vai nos dar essas respostas é o próprio Tribunal de Contas da União (TCU), que está fazendo essa auditoria em relação aos recursos implementados na Terra Indígena Yanomami, inclusive pelo Dsei Yanomami.
Então, é um pouco dessa resposta, mas a gente evidencia, sim, de fato, uma negligência muito grave. Se a gente tem um aporte de recursos nesse montante, a gente não consegue ter uma boa execução. Se a gente vê crianças naquela situação, é porque, de fato, a implementação e a execução dessas políticas públicas desses recursos estão sendo mal gestionadas. E aí há uma responsabilidade do Estado e dos servidores e servidoras nesse sentido também. É algo que a gente vem tentando aprimorar a partir desses próximos anos também, mas eu me atenho, nesse sentido, a deixar para o TCU (Tribunal de Contas da União) também fazer essa análise e o julgamento que ele bem entender em relação à execução desses recursos, que, a nosso ver, poderiam ser melhor implementados e executados na Terra Indígena Yanomami, que tanto precisava desses valores e recursos, que são impostos do poder e da sociedade brasileira também para essa região.
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(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Agradeço as indagações e respostas aqui apresentadas.
Gostaria também, apenas para esclarecimento público aos que estão aqui presencialmente e aos que nos assistem através da TV Senado, de dizer que o Marcos Kaingang é advogado também, como é a Dra. Joenia Wapichana. Isso é para vocês verem que eles têm uma bela formação e, portanto, no exercício do cargo que hoje ocupam, estão preparados para exercê-los com absoluta competência.
Então, parabéns aí pela formação e, obviamente, pela facilidade que têm de, de forma didática, apresentar todas essas perguntas que foram aqui formuladas.
E quero registrar aqui a presença do Deputado Duda Ramos, do Estado de Roraima, que também nos dá o prazer da sua presença, assim como o Deputado Stélio.
Passo a palavra à Presidente da Funai, Joenia Wapichana, que dispõe de cinco minutos prorrogáveis.
A SRA. JOENIA WAPICHANA (Para expor.) - Obrigada, Senador - já antecipando a minha prorrogação, né?
Primeiro, Eliziane, obrigada tanto pelo reconhecimento como também pela atuação. Você esteve presente nessa diligência que nós fizemos em 2021 - foi em 2021, não foi?
A Eliziane esteve lá na área ianomâmi, com a Assembleia Yanomami também, e ela constatou... Não foi só uma visita de sobrevoo. Tomou banho lá no rio - não sei se ela se carregou um pouquinho de mercúrio, pois ali é perigoso.
Essa questão, Eliziane... Primeiro, a questão da denúncia dos recursos, isso é público. Inclusive, o Tribunal de Contas está investigando não somente o recurso que veio do próprio Executivo, mas também de emendas parlamentares, em que foi colocada como possibilidade uma suspeita também de desvio de aplicação. Então, esse caso está sendo investigado, e eu creio que, mais dia, menos dia, vai vir à tona o resultado dessa investigação. E nós temos que fazer o acompanhamento, inclusive aqui, o Senado, para ver onde realmente foi aplicado esse dinheiro, que não prestou o seu devido cumprimento de atender a saúde ianomâmi, tanto de responsabilidade do gestor público, que foi várias vezes alterado, principalmente no Dsei Yanomami, que chegou ao escândalo lá de mudanças; é preciso ver a responsabilidade do gestor, mas também das empresas que estavam envolvidas. Se estiverem envolvidas no meio de corrupção, têm que responder.
Então, é preciso que o nosso Congresso venha a acompanhar essa auditoria que o Tribunal de Contas da União está realizando para analisar essa execução dos recursos. É uma dica, inclusive quanto aos medicamentos, em que foi investigado o volume desses recursos. Eu creio que também está previsto - deixem-me só informar aqui para vocês... Em 2022, a despesa prevista do orçamento era de 618 milhões, e as executadas foram 512, valor equivalente a 0,01% do gasto público. E equivale a ver que o orçamento da Funai - esse aqui é da Funai, tá - foi aprovado em janeiro deste ano também. Deixe-me ver aqui... Esse é da Funai, tá? Não é da saúde, não, porque o da saúde é maior. Então, assim, é pouco recurso, inclusive, para fazer a proteção territorial.
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Eu sempre tenho falado que foram R$618 milhões. Desses, quatrocentos e poucos milhões são só para manter a Funai viva, digamos assim, funcionando; de duzentos e poucos milhões que restariam, R$110 milhões são para cumprir contratos. O que nos resta são R$90 milhões e, desses R$90 milhões, R$70 milhões são para demarcar, delimitar, fiscalizar, desintrusar, indenizar, fazer proteção, ações de desenvolvimento social, cidadania e todos os direitos de proteção. Então, R$70 milhões para o ano todo.
Então, assim, é totalmente incoerente a obrigação que a Funai tem hoje para cumprir. Eu não estou dizendo que é culpa do orçamento, não, porque deveria ter sido investido mais. O desmonte hoje que a Funai enfrenta para tentar resgatar tem sido de vários anos consecutivos. A falta de investimento em servidores hoje... É necessária a realização de concurso público urgente.
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - É necessário repensar um planejamento de cargos e salários desses servidores, que doam a vida para fazer proteção de vida e chegam lá na ponta. São servidores que vão lá no local, onde enfrentam garimpeiro, madeireiro, grileiro, e doam a sua vida e se dedicam. Então, assim, é importante realmente pensar nessas questões dos recursos disponíveis.
Essa questão das ameaças de proteção, eu realmente, Eliziane, eu sempre... Na minha própria campanha a minha equipe era ameaçada. Dizia-se que se eu fosse, estivesse presente, eu ia levar um tiro na cabeça. Para você que ver ao que chegou essa discussão do garimpo, como se os indígenas - e não importa se era ianomâmi, uapixana, macuxi - fossem os responsáveis por terem ouro em suas terras. Ouro que é cobiça, e quem tem cobiça aí são os que têm recurso para bancar alimentação, voo, com abastecimento de garimpo, aquele que vende o ouro para fora e que se acha imune a qualquer aplicação da lei. Então, as responsabilidades estão em pessoas muito mais altas do que aquele simples garimpeiro, que vai mais com o encorajamento. A impunidade parece que aumenta mais esse risco, não somente de indígena, mas daqueles que os defendem também.
O fato que aconteceu lá em frente da Assembleia Legislativa, em que eu não recebi nenhuma solidariedade depois, só de pessoas depois de fora que viram o absurdo a que chegou, as pessoas estarem me constrangendo e se colocando numa situação minha, uma exposição de uma autoridade, querendo ou não querendo. Hoje... Naquela época, eu era uma autoridade, não é? Eu sou autoridade, mas teriam que dar respeito, do jeito que respeitam o Senador Chico, tinham que estar respeitando, mas, pelo fato de ser indígena, a gente carrega essa responsabilidade muito presente, em qualquer meio em que a gente está.
Então, assim, é preciso realmente pensar nessa insegurança, inclusive de líderes indígenas que hoje estão ameaçados - Davi Kopenawa, Dário -, inclusive lideranças que apoiam essa questão de combate ao garimpo.
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - E é necessário realmente retornar essa proteção. A prioridade hoje nossa é retornar essa proteção territorial. A Funai está pedindo isso. Por que que a Funai está pedindo para reformar as pistas de pouso? Para justamente possibilitar chegar essa proteção territorial lá na base, para possibilitar a atuação dos serviços públicos, para a distribuição de cesta básica, para a segurança chegar ali até a área.
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Então, assim, é necessário realmente essa proteção territorial. É urgente a questão da desintrusão - é de extrusão que nós chamamos -, e novamente para que se repense nessa questão desse dinheiro todo que foi desviado e que fosse na mesma altura para reverter esse dever institucional da Funai que é essa proteção territorial. Nós estamos trabalhando para que o nosso orçamento seja adequado este ano. Vai chegar aqui na mão de vocês esse orçamento para ser aprovado por vocês, e, quando ele chegar, vocês pensem aí no que a Joenia falou...
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - ... da necessidade de ser a obrigação condizente também com o orçamento de que a Funai precisa.
O nosso Presidente Lula nos deu a oportunidade de colocar essa realidade, mas também está apoiando. Hoje, o Presidente Lula foi a Roraima e disse assim: "Joenia, não tenha vergonha de pedir [eu estou pedindo]. Não tenha vergonha de falar qual é o problema [estamos falando]". E hoje o ministério é uma responsabilidade não só da Funai; nós estamos agindo numa atuação interministerial: Ministério do Meio Ambiente, Ministério do Desenvolvimento Social e Ministério da Saúde.
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - Cumprimento o nosso Weibe, nosso Secretário. Eu sei que ele tem muita informação.
Então, quando a gente fala de ações conjuntas, nós também estamos nos auxiliando. Quando a Funai não tiver recurso, vou bater na porta do Weibe, ali no Ministério dos Povos Indígenas, para que a gente não fique parado. A Funai não está parada, a Funai voltou, a Funai está propondo e a Funai está mudando para uma gestão não somente comprometida, mas de execução. Nós queremos justamente avançar nessa proteção.
Eu creio que já está muito antiga essa questão da regularização das terras indígenas. É importante que o Brasil reconheça que está parado e que a gente precisa solucionar o mais rápido possível e dar proteção e desenvolvimento sustentável. Não é só homologar, é demarcar, mas a gente precisa levar esse desenvolvimento para que não haja mais insegurança alimentar.
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - Não vai ser resolvido de um dia para o outro. As soluções vão vir a curto, médio e longo prazos, mas a gente não pode fechar os olhos e não considerar as especificidades que os povos ianomâmis têm ou outro povo do Brasil tem.
Muito obrigada.
Eu vou deixar, assim, aqui a versão do nosso relatório para que conste como também subsídio a esta Comissão Externa.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Muito obrigado, Dra. Joenia Wapichana, Presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas.
Apenas para uma ação complementar, antes das perguntas do Senador Astronauta Marcos Pontes, eu vou passar a palavra ao Marcos Kaingang, que a havia solicitado para uma complementação à nobre Senadora Eliziane Gama.
V. Sa. dispõe de cinco minutos.
O SR. MARCOS VESOLOSQUZKI-KAINGANG (Para expor.) - Senadora, eu não poderia me esquecer de citar um ponto. O nosso tempo é rápido, e a gente tem que compilar as respostas.
Eu acho que um dos fatores que agravou esse número de óbitos - e também é importante destacá-lo aqui e foge da alçada política nossa - é uma determinação do Supremo Tribunal Federal, lá em 2021, determinando que o Governo Federal instalasse barreiras sanitárias durante o período da pandemia de covid-19 em diversas terras indígenas e que o Poder Executivo, a União fizesse a desintrusão do território, inclusive ianomâmi, nesse cenário.
Então, a ADPF 709 vem sendo descumprida desde 2021, cenário que diversas ações do Ministério Público Federal, das organizações indígenas e das comunidades que lá residem denunciaram no âmbito do Supremo Tribunal Federal, que teve que determinar essa ação, mas ela vem sendo descumprida ao longo do tempo também. E aí é uma decisão política nesse sentido também de não tomar ou adotar as medidas que cabem nesse sentido.
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Então, é importante salientar que isso agravou ainda mais a gravidade da situação da Terra Indígena Yanomami. Por isso que até agora, nesse primeiro momento, nós estamos correndo contra o tempo para tentar cumprir uma decisão judicial. E nós temos um compromisso muito sério aqui de realizar essa desintrusão e de que as políticas públicas cheguem até a terra indígena, porque isso é preciso para a redução também dessa taxa de mortalidade infantil e de mulheres, jovens e anciões na terra indígena.
Então, é um ponto crucial nessa nossa conversa, como a própria Presidenta Joenia trouxe ali, destacar o que é a ADPF 709, que compõe no âmbito de um conjunto de diversos ministérios uma ação conjunta para desintrusão, mas também proteção. E essa decisão já era para ter sido cumprida há cerca de dois anos, e ela tem sido negligenciada. E aí uma decisão nesse sentido também arca com as suas responsabilidades nesse sentido. Na medida em que a gente toma uma decisão de não cumprir uma decisão judicial que é importante e necessária para aquele território devido à gravidade constatada, a gente também passa a assumir as responsabilidades desses atos a partir desse momento.
Mas só complementando um pouco para a Senadora o que pode ter agravado, um dos fatores que mais identificamos como agravamento da situação dos óbitos identificados naquele momento, no período de pandemia e em 2022 também, das ações que não foram tomadas e precisavam ter sido tomadas por um dever condicional do Estado brasileiro nesse sentido, não uma mera convencionalidade nossa enquanto aqui servidores, servidoras do Governo Federal, em não adotar essas medidas. É um dever, é uma obrigação do Estado brasileiro fazer a proteção daquele território, e essa medida, essa ação não foi cumprida. Então, complementando, Senadora...
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Passo a palavra ao Senador Astronauta Marcos Pontes.
V. Exa. dispõe de cinco minutos para fazer suas indagações.
O SR. ASTRONAUTA MARCOS PONTES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - SP) - São... É possível estender esse tempo?
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Senador, a mesma flexibilidade dada à Senadora Eliziane Gama será dada a V. Exa.: cinco minutos prorrogáveis.
O SR. ASTRONAUTA MARCOS PONTES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - SP. Para interpelar.) - Obrigado, Presidente.
Bom dia a todos.
Eu gostaria, antes de mais nada, de parabenizar as apresentações e dizer que nós estamos aqui todos com um objetivo muito claro, que é a melhoria das condições dos nossos povos indígenas e que os problemas que foram observados e que nós estamos observando agora sejam solucionados e que a gente chegue a um resultado positivo para todos os nossos povos indígenas daqui para frente. Esse é o objetivo principal que eu vejo aqui.
E sempre é bom lembrar que nós estamos olhando um fato, nós estamos olhando um cenário agora, e, obviamente, esse cenário se desenvolve ao longo de anos. A gente tem visto aqui nos depoimentos que se desenvolve ao longo de anos. E é preciso que, ao longo desse trabalho aqui, nós tenhamos a definição dos fatores contribuintes para que esse fato tenha acontecido e, com isso, a gente possa mitigar esses fatores contribuintes e reduzir os riscos no futuro. Essa é a ideia básica. Então, eu vou com esse pensamento aqui para que a gente possa ter o melhor resultado para todos.
Então, pensando dessa forma, eu gostaria de perguntar ao Marcos, que é o meu xará.
Durante a sua apresentação, uma coisa que me chamou atenção, porque sempre foi uma luta muito grande, foi quando falou a respeito das dificuldades do ministério recém-criado com relação a ter nomeações e orçamento. Eu queria que depois você explicitasse um pouco mais como acontece essa dificuldade. Obviamente, o orçamento a gente entende aqui, pelo fato de não estar previsto no ano passado, mas, com relação às nomeações, que depois explicitasse um pouco mais a respeito disso e o que está sendo feito para resolver esse problema.
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Outra coisa me chamou a atenção. Você falou: "Tem um problema ali, mas tem problemas em outros locais também". Isso chama atenção porque obviamente a gente está focado agora na questão ianomâmi, mas temos que levar em conta todos os povos indígenas que estão no nosso país, no nosso território. E, do seu ponto de vista, acompanhando isso, como você vê esses outros problemas? E quais ou qual deles se apresenta no horizonte próximo aí como crítico? Para que a gente já comece a tomar providências, porque às vezes fica tampando um problema, mas tem outros acontecendo e que depois vão surgir. Então, quais são esses problemas que estão no horizonte aí?
Essa questão, como a gente vê, não começou agora, tem denúncias aí bastante anteriores. Eu tenho aqui um boletim de 2007, até falando sobre questão de malária e de outras questões importantes. É o Boletim Pró-Yanomami aqui de 2007. Então, sobre esse desenvolvimento ao longo do tempo aí, o que foi feito? Porque é importante não só a gente falar: "Olha, tem o problema; a gente precisa resolver o problema", e aí muita coisa é falada, muita coisa é planejada, muitas recomendações são feitas, mas só a recomendação não resolve; tem que ter ação prática. O que foi feito de lá para cá? Quais essas ações práticas para se resolver esse problema? E quais resultados que tiveram ou não tiveram? Porque isso também é importante para que a gente possa pensar aí no futuro, para não repetir ações que são ineficientes e trabalhar com ações mais eficientes.
Tem tanta coisa que eu anotei que é duro achar os pontos aqui, mas com relação ainda... Agora seria mais com a nossa ex-Deputada Joenia.
Uma coisa que é importante a gente ter em mente quando a gente sempre começa qualquer tipo de estudo de longa duração... E uma das suas frases me chamou muito a atenção, que foi a seguinte: "Não adianta nós aqui de fora...
(Soa a campainha.)
O SR. ASTRONAUTA MARCOS PONTES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - SP) - ... querermos falar: 'Olha tem que ser assim ou tem que ser assado' sem ouvirmos as pessoas que estão lá, que são afinal de contas os mais interessados em tudo isso".
E, nesse contexto - e é importante para se registrar aqui, já que nós temos aí toda a publicidade, nós temos o registro aqui na Casa, para ficar permanente -, qual é a visão especificamente dos ianomâmis para o futuro deles daqui a 20 anos, daqui a 30 anos? Como eles querem estar? Esse é um ponto importante para a gente levar em conta aqui. Como a gente vê... Imagine que tudo seja possível; que seja completamente possível realizar qualquer coisa. Como eles querem estar em termos de inserção ou não, de ficarem isolados? A gente sabe que tem comunidades que são isoladas, comunidades com semicontato, comunidade com contato. E como eles querem estar? Como eles pensam a respeito do próprio futuro? E como isso é levado em conta, obviamente pela Funai e pelos órgãos, para que sejam tomadas as providências de acordo com isso?
A senhora falou com relação a uma investigação anterior com crianças, de que a senhora participou também. Quais foram as recomendações para aquilo e como foram cumpridas essas recomendações? Ou não foram cumpridas? Como é a interação entre os povos ianomâmis que estão mais isolados e aqueles que estão menos isolados, que estão já em contato? Como é que eles interagem entre eles ali?
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Um ponto muito importante também, com tudo isso, é que a gente fala dos garimpeiros em terras indígenas. Pela lei, ilegal; isso é crime. É bom deixar bem claro isso aí logo de começo. Nós conversamos aqui com associações, com pessoal que trata de ouro, e isso é ilegal e isso tem que acabar; está contra a lei. Então, não é garimpeiro; é criminoso nessa situação. Mas, para que a gente tenha clareza - e para que isso fique também registrado aqui -, a gente está fazendo uma ligação entre o garimpo ilegal e o problema da desnutrição nas terras ianomâmis. É importante se ter claramente e sucintamente essa ligação direta: qual a ligação prática entre a atividade do garimpo e a desnutrição nos povos ianomâmis ali? Isso é importante para deixar muito clara essa ligação.
Outra coisa com relação a isso...
Desculpa a quantidade de perguntas aqui, mas é importante.
A senhora falou sobre orçamento, e quem estava aqui antes me viu falar muito sobre o orçamento da área de ciência e tecnologia. Eu sinto esse drama, acompanho sem dúvida nenhuma.
Eu tenho aqui alguns dados do Sesai ao longo do tempo, de 2011 até 2022, com relação a esses valores: começou lá com R$9 milhões, aproximadamente, no total -; depois R$58 milhões; R$74 milhões; R$73 ao longo dos anos; R$83; R$92; R$91; R$91; R$80; R$77; R$98; R$98 - nos últimos dois anos. E é importante que a gente... Aquela última linha que tinha ali na ADPF 709 trata a respeito da abertura de crédito extraordinário para isso, e aí senhora citou então: de R$160 milhões, R$80 milhões, para aplicação.
(Soa a campainha.)
O SR. ASTRONAUTA MARCOS PONTES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - SP) - E como tem sido feito? O que tem sido feito com o Governo Federal para que esse crédito seja especificamente...
(Soa a campainha.)
O SR. ASTRONAUTA MARCOS PONTES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - SP) - ... colocado lá como extracrédito? Quais são as ações que foram feitas para isso? É importante que a gente tenha isso para poder também ajudar por aqui, mas é importante que o Governo perceba isso e coloque esse recurso. O que tem sido feito?
Eu entendi que, em janeiro, foi estabelecido pelo decreto - estou procurando o número do decreto aqui... - um grupo de trabalho, um GT, com duração de 60 dias, como é normal para esses GTs, que eu também já fiz muito lá no ministério. Eu gostaria de saber quais foram... O que foi o resultado desse trabalho do GT, que começou lá em janeiro - portanto, em dois meses, já se encerrou? E o que tem sido feito em cima desses resultados do GT, ou seja, o que o Governo realmente está fazendo para cumprir essas recomendações do grupo de trabalho?
Por enquanto é isso. Talvez surjam algumas outras perguntas, porque eu anotei bastante coisa aqui, mas só para não me alongar demais também. Para não extrapolar o meu direito de flexibilização de tempo aqui, gostaria de deixar essas perguntas - e também para não aumentar muito a resposta.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Com a palavra, Marcos Kaingang, para responder as indagações do Senador Astronauta Marcos Pontes.
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O SR. MARCOS VESOLOSQUZKI-KAINGANG (Para expor.) - Vou tentar ser bem objetivo, Senador Marcos.
Em relação aos aspectos das dificuldades em nomeações, tem o aspecto de que o ministério também é novo no âmbito da própria administração pública - um primeiro fator. Também tem um pouco do aspecto realmente de dar credibilidade, em alguns aspectos, à real capacidade de nós povos indígenas estarmos ocupando os espaços. Paira sobre a sociedade ainda uma dúvida sobre as reais condições e qualificações que nós temos. E nós estamos mostrando que somos capazes, qualificados e capacitados para ocupar esses espaços e gerir, planejar e executar política pública. Um exemplo sou eu, a Ministra Sonia, a Joenia Wapichana e outros tantos indígenas.
A própria demora tem a ver com a própria dificuldade administrativa interna do Governo Federal, da Casa Civil, em agilizar essas nomeações também. Nesse aspecto, tem demorado também. Nesse sentido, como eu falei, a situação ianomâmi veio, e nós tínhamos, eu diria, oito nomeados - entre eles, estava eu -, mas a gente não mediu esforços para designar o pessoal, dois ou três no ministério, com alguns terceirizados. Então, o aspecto, quando se situa a situação das dificuldades de recursos humanos nomeados naquele momento, tem a ver com essa dificuldade nossa, mas, mesmo com as nossas limitações, sem nomeação, muitas pessoas se disponibilizaram a trabalhar para atender e assistencializar a situação ianomâmi. O nosso aspecto é administrativo, mas também tem um aspecto que eu entendo que, às vezes, é do processo histórico, de compreender que nós estamos capacitados para ocupar esses espaços também e construir coletivamente, com indígenas e não indígenas, todas as políticas públicas para as diversas áreas também nesse sentido. Então, é um pouco nessa perspectiva que eu coloco.
Quanto aos outros territórios em situação crítica, Senador, acho que eu não elencaria como prioridade, mas, principalmente, regionalizando isso, eu colocaria na Região Norte, sem dúvida. A gente tem outras situações graves também. Por exemplo, se a gente pegar, no Mato Grosso do Sul, a situação do povo indígena guarani-kaiowá lá, é uma situação dramática também, a gente vem acompanhando. É isto que eu digo: nós pegamos a situação ianomâmi num princípio de limitações de recursos humanos e orçamentários também, enquanto MPI, até articular e conseguir fazer a máquina pública andar. Do nosso ministério, a que me atenho, dizendo propriamente, foram vindo várias demandas que estão, ao longo dos anos, há muito tempo, acumuladas. Eu costumo dizer que há 520 anos. Então, a gente foi se debruçando sobre várias realidades.
Se eu pudesse elencar alguma para o Senador, eu colocaria guarani-kaiowá nessa região. Mas, num aspecto similar ao dos ianomâmis, que também tenha garimpo e que tenha invasão, a gente coloca a Terra Indígena Mundurucu, também no Pará, em que está prevista a desintrusão também no âmbito da ADPF 709, pela gravidade que se encontra lá na região; a Terra Indígena Alto Rio Guamá, também na região lá próxima, que tem uma presença até então não codificada muito concretamente, porque a invasão do território se alastrou de maneira gravíssima, e a gente tem despendido esforços nessa região. Então, elas estão mais localizadas na Região Norte do país, sem dúvida, pela semelhança com a Terra Indígena Yanomami, porque boa parte dos... Eu costumo usar os termos trabalhadores e trabalhadoras. A gente tem garimpeiros lá também, mas eles têm se deslocado.
As desintrusões - eu não comentei com o Senador e não as apresentei também - vêm ocorrendo, as operações estão acontecendo. Só que, no âmbito da ADPF 709, a gente quer fazer uma ação mais robusta nesse sentido. Mas as desintrusões vêm ocorrendo, tem uma redução bem acentuada do número de invasores na região. E aí pensar políticas públicas para eles também é um desafio para nós. Eu coloco MPI e Funai, todos nós, nesse conjunto, como os senhores já vêm colocando em outras audiências também. E, nesse sentido, eu colocaria... Essas pessoas que estão saindo do território estão migrando para outros territórios indígenas.
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Então, elas ultrapassam os nossos desafios e condições. Muitas vezes, a gente tem pensado muito mais amplamente, porque eles se deslocam de uma região para outra. E aí, ao pensar políticas públicas para esses grupos também, é importante pensar em como atuar.
Uma identificação nossa, enquanto ministério, com a Defesa, com o Ministério da Justiça e Segurança Pública e também com a Funai e a Sesai, é um pouco desse nosso diagnóstico. Mas eu elencaria a Terra Indígena Mundurucu e a Terra Indígena Alto Rio Guamá, próximo ao Xingu, em que também já estão ocorrendo essas mesmas situações.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS VESOLOSQUZKI-KAINGANG - Posso complementar, Senador?
Com relação às ações de 2007 para melhorar a situação desse período para cá, eu acredito que tivemos bons avanços ao longo do tempo, mas a gente parou no tempo, sendo bem sincero. A política indigenista não teve, ao longo do tempo, a prioridade que precisaria ter. A gente teve avanços em orçamentos para a política indigenista, como o próprio orçamento da Funai e da Sesai, que avançaram de 2007 para cá, mas, ao longo do tempo, estagnaram também. E aí a gente precisa avançar, porque o orçamento da própria Funai é o mesmo há cinco anos, vem reduzindo gradativamente. Então, isso demonstra que políticas públicas a gente quer direcionar para esses grupos.
Então, o que a gente precisa, Senador e demais Senadores, é, de fato, de um compromisso do Estado brasileiro e, principalmente, desta Casa, do âmbito do Legislativo também, para a gente conseguir construir conjuntamente, dentro das nossas condições, com o Executivo e o Legislativo, propostas e ações, como a Presidente Joenia já colocou, para a gente também trazer propostas para o Congresso Nacional que possam contemplar a real necessidade da política indigenista. Então, a gente parou no tempo se eu pudesse responder, assim, em termos de orçamento e ações para os povos indígenas.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS VESOLOSQUZKI-KAINGANG - E, na última pergunta, que são as ações para aprovarmos o crédito extraordinário, a Joenia pode compartilhar comigo essa resposta, mas é uma ação a partir do MPI e da Funai, diagnosticando uma necessidade de profissionais para a região. Mas, para executar as ações, como ela bem apresentou, das BAPEs de proteção territorial, é importante ter recursos humanos, ter condições de trabalho, ter segurança. E a Funai sozinha não consegue fazer essa expressão de trabalho. Você precisa de segurança para a região. Como é que você vai mandar uma equipe para lá sem suporte de segurança nenhum? Na medida em que... Eu costumo dizer que quem for à região vai ver que o Estado brasileiro perdeu a soberania sobre aquela região em dado momento, na medida em que a gente não conseguiu destinar as ações que, minimamente, assegurassem aquela área de fato, com serviços públicos chegando àquela região, o que caracterizaria como área de fato do Estado brasileiro. Então, os povos ianomâmis lá na região também sofreram todo esse processo de violência e negligência histórica. Mas, nesse sentido, os créditos extraordinários vêm por uma insuficiência de recurso da própria Funai e de nós do MPI também, por não termos, como o Senador já bem adiantou, orçamento para essas ações ainda previsto neste ano, conforme aprovado pelo Congresso no ano passado.
Então, é um pouco do dilema em que a gente pediu esses créditos extraordinários, mas, para a Terra Indígena Yanomami, há uma determinação do Supremo para autorização desses créditos extraordinários no âmbito da ADPF também.
O SR. ASTRONAUTA MARCOS PONTES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - SP) - Sr. Presidente, só para um complemento com relação a isso.
Mais especificamente, o que eu lembro... Eu estou falando desse negócio de orçamento, porque eu passei muito aperto. Quando a gente fala no Ministério da Fazenda agora - antes era Ministério da Economia -, ele logicamente cumpre a função dele de distribuição, mas é importante que o ministério e o Governo pensem num PLN, alguma coisa do Ministério da Fazenda, rapidamente, para colocar, porque é urgente. Não se pode ficar esperando as coisas acontecerem lá. É necessário que seja feita uma ação pelo Governo, mais especificamente por Fazenda e Planejamento, para que esse PLN chegue o mais rápido possível, porque aí a gente pode trabalhar nele aqui. Mas, sem ter a ação lá primeiro, é difícil, não é? A gente precisa ter crédito extraordinário. Então, isso é importante que se tenha.
É a mesma coisa em relação às nomeações, é prioridade. Digamos assim, o fato está acontecendo, é um fato sério, é um fato que está prejudicando uma população inteira. Então, precisa ter as nomeações rapidamente.
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Aí vem a possibilidade de a Casa Civil fazer esse trabalho o mais rápido possível para que tenha as pessoas trabalhando. Eu tenho certeza de que existem pessoas competentes para assumir os cargos lá, mas isso precisa ser feito.
Então, é só um comentário sobre isso.
Pode contar com a ajuda da gente para, no que puder, ajudar a fazer funcionar isso.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Passo a palavra à Presidente da Funai, Joenia Wapichana, que agora vai fazer a sua apresentação, dar essas respostas às perguntas, que são relativamente longas, do nosso Senador Marcos Pontes.
V. Exa. tem a palavra por cinco minutos prorrogáveis.
A SRA. JOENIA WAPICHANA (Para expor.) - Obrigada, Presidente.
Obrigada, Senador Marcos. São perguntas importantes. Muitos não conhecem o que os ianomâmis pensam para si mesmos. Por isso que, na minha apresentação, não sei se você estava presente, mas eu falei do PGTA ianomâmi. O que é o PGTA? É o Plano de Gestão Territorial e Ambiental em terras indígenas. Isso foi feito pelos próprios povos ianomâmis não este ano, mas alguns anos atrás, e eles estão cobrando da gente implementar agora. E é justamente nessa fase que a Funai, os órgãos ministeriais estão envolvidos para dar resposta. Então, isso responde à pergunta: "O que eles querem ver acontecer daqui a dez, vinte, cinquenta anos no território?".
Tem uma parte, eu até separei, em que ele fala o seguinte, uma apresentação do PGTA:
O PGTA é para manter a todos nós Yanomami e Ye’kwana vivendo bem em nossa terra. Os não indígenas dão este nome de PGTA ao que nós chamamos de Urihi, nossa terra-floresta. Para nós é muito bonito olhar para uma floresta como esta porque sabemos que Omama, nosso antepassado, a criou. Por isso, nós todos, brasileiros habitantes da floresta, queremos defender nossas terras com determinação para que os não indígenas não as destruam.
Nós queremos viver bem e felizes em nossa terra-floresta. Vocês, não indígenas, olhem para estes desenhos [que eu apresentei aí e não estavam disponíveis] de nossas palavras e aprendam. Este PGTA é para manter a todos nós em pé, pois a floresta segura a Terra toda com força.
Na floresta tem todos os alimentos que comemos, como antas, queixadas, mutum, castanha, buriti, cacau. Tem também as águas dos rios. É dessa riqueza que todos nós nos alimentamos. A floresta nos sustenta e cuida de nós.
A imagem essencial da nossa terra-floresta defende todos nós Yanomami e Yek'wana. O PGTA é para nós como um documento de identidade da nossa terra-floresta, pois traz consigo a sua imagem essencial.
Essa é uma resposta dada pelo próprio povo ianomâmi. Ele quer viver em paz dentro do seu próprio território, livre da invasão e da destruição que está sofrendo agora.
Então, é importante esse documento que já existe, porque eles já responderam a todos o que eles querem ver acontecendo.
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E, de uma forma bem clara, eles pedem providência a nós autoridades para que se solucione essa questão do garimpo ilegal e leve saúde, leve educação, leve direitos sociais básicos e fundamentais, como qualquer brasileiro tem direito.
Para quem não o conhece também, esse é o documento que eles lançaram e em que denunciaram, há dois anos, fizeram denúncias, com mapas, apontando todas as violações de direitos que eles sofreram.
E aqui me perguntaram também qual foi a recomendação dessa Comissão. É bem interessante, porque, naquela época, eu estava aí do outro lado, sendo Parlamentar. A gente se debruçou nessas pesquisas, nas oitivas. E pedimos alguns encaminhamentos, identificamos alguns encaminhamentos que era possível fazer.
Primeiro, reiterar...
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - ... porque era uma questão que já tinha sido feita, às autoridades competentes o pedido de retirada dos garimpeiros da Terra Indígena Yanomami.
Segundo, reiterar às autoridades competentes pedido para investigar todos os crimes cometidos contra o povo ianomâmi e para responsabilizar penal e civilmente os responsáveis pelas invasões dos garimpeiros.
Terceiro, solicitar às autoridades que informe à sociedade quem são os financiadores do garimpo, quem está fornecendo os equipamentos para manter o garimpo.
Ver de perto a situação que está vivendo, vivenciando a comunidade ianomâmi.
Ações para retirar a logística de garimpo. Hoje vocês sabem que existe uma alta tecnologia. Enquanto nós, Estado brasileiro, ou Poder Executivo, que está ali com a obrigação, não temos sequer a tecnologia que hoje o garimpo tem, mas somente... É limitada a questão de comunicação. Por exemplo, tem internet no garimpo, mas não tem internet na base da Funai. Destruir as pistas de pouso que eram clandestinas. Hoje a gente está pedindo para reformar, digamos assim, algumas pistas essenciais, mas tem pistas ali que são clandestinas e servem só para abastecer garimpo.
Cobrar das autoridades ações para reprimir a logística de apoio na cidade de Boa Vista. Infelizmente, nós vemos uma série de empresas envolvidas com o garimpo ilegal e pessoas que têm sido já investigadas pela Polícia Federal e são responsáveis, sim, por financiamento de garimpo. É preciso dar seriedade a esses casos de investigação.
Solicitar relatórios detalhados sobre a base de proteção da Funai, inclusive, isso foi para nós mesmos agora. Agora juntou-se a esse relatório, inclusive, a apresentação das bases, que estão fechadas e estão nesse planejamento de estrutura.
Solicitar da Sesai relatório específico, porque está sendo afetada a questão da saúde, o atendimento. Eu creio que, sobre essa questão da saúde, o nosso secretário vai falar. É justamente essa possibilidade de a gente tornar públicos e transparentes os dados que a Funai tem em Sesai.
Desenvolvimento de ações de devido respeito à vida ianomâmi...
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - ... é o que nós estamos fazendo agora com essa discussão.
E aí você fala do Protocolo de Consulta dos Povos Yanomami e Ye'kwana. Nós estamos fazendo justamente agora. É uma resposta já do que a Funai está fazendo para melhorar a questão da segurança alimentar e para ouvir os ianomâmis da forma como eles querem. Isso foi feito este mês, o encontro. Vai ser feito um fórum ianomâmi agora, no mês de abril, e, a partir dessas ações, o planejamento de ações para atender direito a políticas públicas, acesso adequado, inclusive acesso aos benefícios sociais.
Agora, por este mês, nós conseguimos conversar com a Caixa Econômica e com o INSS para ter o acesso a esses benefícios sociais, inclusive, levando a Caixa Econômica para mais próximo, o acesso e benefício. Estive lá em Roraima este mês para ver o atendimento da Caixa, criando unidades móveis, porque os benefícios eram muito distantes da realidade das comunidades indígenas.
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Então isso é só um exemplo do que a gente já está fazendo a partir dos órgãos públicos.
E também quero solicitar o relatório detalhado...
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - ... da Funai, do Ibama, da universidade, inclusive sobre pesquisas sobre esse impacto do mercúrio, e incluir no Orçamento da União recurso para ações permanentes de fiscalização e combate aos crimes dentro das terras indígenas, especialmente a Yanomami. Isso foi para nós aqui, naquela época, justamente repensarmos em melhorar o orçamento da Funai, inclusive colocar a questão dos servidores públicos, como o plano de cargos de carreira, e não apenas colocar questões de atividade. É preciso pensar em quem vai fazer - não é? -, se a gente tem um quadro insuficiente. É preciso reconhecer essa deficiência que nós temos e cobrar do Ministério da Justiça plano permanente de fiscalização. E hoje nós vemos o quanto é importante a gente estar trabalhando junto com o Ministério dos Povos Indígenas, o Ministério da Justiça, o Ministério do Desenvolvimento Social e o Ministério da Saúde para essas ações que não são somente de responsabilidade de um órgão, mas que envolvem muito mais.
Então eu vou deixar... Tem outras recomendações aqui para que acompanhem. Essas recomendações vão no sentido de não deixar o crime impune, de verificar quem realmente financia o garimpo. E algumas ações eu também já apresentei logo na minha apresentação, do que a gente já fez depois do ato que declarou o estado de emergência.
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - Eu acredito que o Weibe vai falar mais também relacionado à saúde. Há a distribuição de cestas básicas - já somam quase 15 mil cestas distribuídas -, mas também deve haver uma série de reuniões para tratar o planejamento da exclusão...
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - ... a questão também de inserir políticas públicas mais adequadas, também rever um pouco dessas políticas que são específicas aos povos indígenas; o retorno do PAA e do Pnae para o acesso de agricultores indígenas a esses programas de compra e venda; a discussão de políticas públicas para resgatar essa questão da segurança alimentar e os casos de investigações relacionados à prática de crime. Isso é um pouco das medidas.
Eu agradeço novamente essas perguntas. Eu acho que deixei... Eu acho que, na última vez em que vim aqui numa audiência pública, eu já deixei isso aqui também, mas eu posso deixar. É dos ianomâmis, não é da Funai, mas a gente usa como subsídio à situação do povo ianomâmi.
Muito obrigada.
O SR. ASTRONAUTA MARCOS PONTES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - SP) - Presidente, só um adendo, se possível.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Com a palavra.
O SR. ASTRONAUTA MARCOS PONTES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - SP) - É que um ponto... Eu entendi, é importante a gente ter essas recomendações que foram feitas anteriormente para que a gente possa acompanhar, ao longo do tempo também, como isso vai sendo implementado agora. A gente teve o problema, agora vamos fazer funcionar realmente. Isso é muito importante. Mas um ponto que para mim era muito importante para ficar registrado - um deles - era a questão da visão dos ianomâmis, que eu achei inclusive muito bonita, com relação ao futuro deles, o que eles querem para o futuro. A gente precisa respeitar muito isso aí.
Um segundo ponto que é muito importante é a relação prática, vamos dizer assim, de engenharia - eu sou engenheiro -, a relação prática entre a presença dos garimpeiros e a desnutrição, para deixar registrado como isso acontece, como é essa relação e também, logicamente, como é a relação entre os próprios ianomâmis e os garimpeiros: eles estão sempre em conflito? Não estão? Um ajuda o outro? Não sei. É exatamente como que acontece isso.
A SRA. JOENIA WAPICHANA - Um minuto, só para...
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - O.k. Eu vou lhe dar dois minutos.
A SRA. JOENIA WAPICHANA (Para expor.) - Eu esqueci de responder uma questão sobre o recurso extraordinário. Eu acabei esquecendo, porque estava correndo com o tempo. Mas a Funai já solicitou essa questão do recurso extraordinário. O orçamento atual da Funai é insuficiente e a gente já solicitou para que venha. Estamos aguardando a resposta. Então, no caso, ainda não o acessamos. Sobre a questão da interação que se fala dos índios isolados e não isolados, os isolados estão isolados, não é? Os ianomâmis que estão com recente contato têm uma área protegida onde vivem as comunidades, então lhes chegam vestígios, sabem que existe, sabem onde moram, mas tem toda uma política interna de eles viverem isolados. Então, às vezes, é difícil, para quem não tem essa convivência com os povos indígenas, entender. Às vezes, até outro indígena que tem mais contato com o contexto urbano não conhece essa realidade, porque é outra realidade, é outro mundo.
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Justamente essa questão do garimpo ilegal prejudica toda a questão cultural, a organização social, e tem relação direta, sim, com essa crise que há hoje (sanitária, ambiental, social, de insegurança alimentar), porque, a partir do momento de um conflito levar à violência, de fazer uma disputa sobre recursos naturais, de promover um impacto externo, há efeito direto também sobre a saúde: além da situação de doenças, a insegurança por que as pessoas passam, principalmente relacionada a mulheres, crianças. Há todo um contexto que os ianomâmis não viviam e agora eles praticamente foram impactados por essa invasão ali no seu território. Então, tem relação direta, sim, com a crise hoje humanitária que o povo sofre.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Presidente...
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Quero registrar antes a presença do Senador Mecias de Jesus, que é membro desta Comissão.
Passo a palavra a V. Exa.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA. Pela ordem.) - Na verdade, Presidente, eu queria só somar com a colocação do Astronauta e que a Joenia respondeu muito bem, mas, para reforçar ainda mais, até porque nós estivemos lá - eu estive muito presente na própria comunidade ali, visitando com a Joenia -, e a gente percebe muito claramente que, por exemplo, houve um aumento de suicídio, sobretudo de adolescentes.
Há, Astronauta, a presença muito forte, por exemplo, de doenças advindas do mercúrio. Quando você tem, na verdade, com a presença do garimpo, as máquinas funcionam 24 horas. A Joenia está aqui e conhece isso muito bem. Então, isso afugenta as caças no entorno, por exemplo, da área do garimpo, e eles acabam não conseguindo chegar às caças, porque elas ficam afugentadas, elas saem. O mercúrio está presente no rio.
Outra coisa: não é só o desmatamento ali no entorno do garimpo, porque há um desmatamento que não é nem tão grande; o grande problema é o impacto ao longo do rio. Então, há um impacto gigante, porque o mercúrio vai contaminando toda a região. E o que resulta disso? Várias doenças. Inclusive, os dados sobre a quantidade de crianças que morreram apontam que há uma relação ligada muito diretamente com a questão do mercúrio. Há impacto realmente em várias vertentes - eu posso dizer assim - pela presença, de fato, do garimpo na região.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Exatamente, perfeito.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - O.k.
O Senador Marcos Pontes gostaria de complementar?
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O SR. ASTRONAUTA MARCOS PONTES (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - SP. Pela ordem.) - Não é bem um complemento. Eu só gostaria de aproveitar o gancho, já que a gente está falando de mercúrio aqui, para relembrar do requerimento que eu coloquei. É um requerimento para... São dois requerimentos, na verdade, Presidente: o primeiro é com relação a que nós tenhamos aqui uma audiência pública com cientistas para levar à área da ciência a mitigação dos impactos do garimpo nas regiões indígenas como um todo, para que a ciência entre em campo definitivamente com isso.
2ª PARTE
EXTRAPAUTA
ITEM 5
REQUERIMENTO Nº 17, DE 2023
Propõe a realização de audiência pública, com o objetivo de discutir com os especialistas da área da ciência, a mitigação dos impactos do garimpo ilegal na Reserva Yanomami.
Autoria: Senador Astronauta Marcos Pontes
Então, eu solicitei a presença de alguns convidados:
- Dr. João Valsecchi do Amaral, que é o Diretor do Instituto Mamirauá, em Tefé, que é uma organização social do próprio Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, para falar a respeito da proposta da ciência quanto à mitigação de impactos do garimpo, pensando para frente, para resolver o problema e não voltar esse problema. Então, a mitigação dos impactos do garimpo ilegal;
- Prof. Jailson Bittencourt de Andrade, que é Vice-Presidente da Academia Brasileira de Ciências, para falar a respeito de aspectos técnicos e científicos quanto à contaminação de mercúrio nas áreas de garimpo e meio ambiente e como a ciência brasileira pode colaborar;
- Dr. José Roque, que é diretor do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais, onde fica o Sirius, o acelerador de partículas, para falar sobre os potenciais usos do síncrotron, o Sirius, para a rastreabilidade da assinatura do ouro. Lembro de que se falou sobre isso. A gente tem que saber de onde vem o ouro. Eu sei que é uma questão que o pessoal tem tentado, a gente tem tecnologia para trabalhar com isso, e o Sirius pode ajudar muito para fazer um traçador estratégico para saber de onde vem esse ouro e acabar com essa ideia de que o ouro vem de qualquer lugar, e se aceita isso. Não, entendeu?
- Dr. Fábio Salvador, perito criminal federal e ex-Diretor Técnico-Científico da Polícia Federal, para falar sobre os aspectos técnicos e científicos e investigativos para combater as ilicitudes associadas à extração ilegal de ouro no Brasil.
Esse é um requerimento, Presidente.
2ª PARTE
EXTRAPAUTA
ITEM 6
REQUERIMENTO Nº 18, DE 2023
Requer nos termos do art. 58, § 2°, V, da Constituição Federal, que seja convidado representante da Empresa, Voare Táxi Aéreo, a comparecer a esta Comissão, a fim de prestar informações sobre transporte nas ações de saúde pública na Terra Indígena Yanomami.
Autoria: Senador Astronauta Marcos Pontes
No segundo, eu requeiro, nos termos do art. 58, §2º, que convidemos o senhor representante da empresa Voare Táxi Aéreo a comparecer a esta Comissão, a fim de prestar informações sobre os transportes nas ações de saúde pública nas terras indígenas. Essa empresa é a principal empresa de lá, e é importante a gente ouvir também o que tem sido feito com relação a isso.
São esses dois requerimentos, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Todos esses requerimentos serão apresentados extrapauta, ao final da reunião, mas V. Exa. já se antecipou com propriedade, e eles serão incluídos como extrapauta para que sejam realmente convidados.
Eu quero consultar o Senador Mecias de Jesus se ele gostaria de fazer alguma pergunta. Não gostando... Não querendo, perdão, fazer essa pergunta... São tantas perguntas que nos embaralhamos aqui;
Eu queria informar a todos os presentes e à Comissão que o Relator, Senador Dr. Hiran, por motivos pessoais, só retornará ao Senado na próxima semana. Portanto, a sua assessoria está acompanhando pari passu essas audiências públicas, que serão incorporadas ao seu relatório finalístico, com a aprovação, obviamente, de todos os Srs. Senadores.
Gostaria, de fazer uma breve manifestação...
Aliás, perdoe-me, Senadora Damares, V. Exa. está à esquerda do Plenário e à minha direita... (Risos.)
V. Exa. apesar de estar à esquerda do Plenário, mas está à minha direita, aqui também...
Eu gostaria de passar a palavra a V. Exa. para fazer indagações por cinco minutos aos dois convidados.
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A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar PP/REPUBLICANOS/REPUBLICANOS - DF. Para interpelar.) - Sr. Presidente, obrigada. Deixe-me cumprimentar todos os indígenas que estão no auditório. Obrigada por estarem com a gente nesta Comissão, é uma alegria recebê-los. E tem gente que não conseguiu entrar também.
Deputada Joenia, que bom vê-la na Presidência da Funai. Que bom! Esta Casa tem um respeito muito grande pela senhora. E estamos torcendo muito, muito pela sua gestão. Não vai ser fácil. A senhora está presidindo uma fundação em que, ao longo dos anos, muita gente se aposentou, sem concurso público, recurso humano cada vez mais escasso, a questão financeira também, mas nós estamos aqui para apoiá-la.
Estou muito preocupada, Deputada - eu não assisti a toda a apresentação, vou assistir em casa com muita calma -, agora sobre a questão das atribuições, Marcos. E aqui eu quero chamar a atenção de vocês dois sobre as atribuições do novo ministério. Nós vamos acompanhar a MP, nós estamos acompanhando essa discussão, mas, na hora de dividir as atribuições, Deputada Joenia, nós temos um Ministério de Povos Indígenas, um Ministério de Direitos Humanos e uma Funai, e temos uma Sesai, e temos a educação indígena lá no MEC. Como vocês vão cuidar de tudo isso para que, daqui a pouco, um de vocês não se sente aí na mesa sendo acusado da omissão que era uma atribuição do outro? Nós vivemos isso nos últimos anos, Marcos. Eu quero chamar a atenção, porque a gente quer ajudá-los nessa condução do novo ministério e nas atribuições da Funai.
Você vai encontrar o seguinte Marcos: vocês têm muito boas intenções, mas quem tem o dinheiro é a Sesai, o dinheiro está lá. Então, como é que vocês vão lidar com tudo isso? E nós aqui no Congresso queremos ajudá-los nessa discussão para que a gente não tenha depois cobrança do ministério que era uma atribuição do outro, e a gente quer acompanhar.
A minha preocupação, Marcos, também é a seguinte: você falou muito da ADPF. Você, quando estava na Apib, que é autora da ação...
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Senadora Damares, V. Exa. me dá apenas um minuto?
A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar PP/REPUBLICANOS/REPUBLICANOS - DF) - Sim.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - É para convidar a Senadora Eliziane Gama para presidir a sessão como Vice-Presidente por dez minutos.
A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar PP/REPUBLICANOS/REPUBLICANOS - DF) - O.k.
Marcos, a nossa preocupação é que Judiciário não constrói políticas públicas, tá? Então, muita atenção com a ADPF. Até onde vocês vão conseguir executar as determinações daquela ADPF? Eu sei que muitas determinações para o Governo anterior foram cumpridas, mas chega o momento em que não tem condições. E, a partir de agora, Marcos, vocês serão Estado, vocês serão o órgão da execução. Então, acompanhar a ADPF, mas a construção da política pública cabe a vocês. E a gente vai estar aqui acompanhando, monitorando, ajudando e lutando por recurso. Essa é a nossa função aqui no Legislativo. Mas estou muito preocupada com as decisões do Judiciário, que não venha impor a vocês aquilo que é impossível de executar.
E uma atenção também às ONGs, tá? Vocês vieram - principalmente o Marcos e a nossa Ministra - de uma militância muito grande de ONGs. A gente agradece o trabalho que as ONGs têm feito no Brasil para os povos indígenas, mas existem recomendações que o Estado não vai ter condições de executar. E aí eu acho, Senadora Eliziane, que a gente pode ajudar nesse equilíbrio entre o que as ONGs estão recomendando, o Judiciário, e o que vai ser possível os senhores executarem.
Por exemplo, a minha preocupação: quantas pessoas entraram a partir de janeiro na área ianomâmi? Eu busquei oficialmente e...
(Soa a campainha.)
A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar PP/REPUBLICANOS/REPUBLICANOS - DF) - ... só tem um autorizado, mas a gente vê reportagem com muita gente lá dentro. Essas pessoas entraram de forma ilegal? Como está acontecendo a entrada?
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Aqui, eu termino entregando para a Deputada Joenia um relatório da Sesai, o relatório da Missão Guapo'y. Esse relatório traz, inclusive, coordenadas geográficas de indígenas da Venezuela que tinham migrado. Eles já podem ter voltado, mas eu queria deixar esse relatório aqui registrado.
Por fim, Deputada Eliziane, quando a gente fala de desassistência, houve assistência nos últimos quatro anos. Nós tivemos, Deputada, um episódio de pandemia. Quando eu falo de desassistência, eu me preocupo muito com aquele agente de saúde indígena que está em área ianomâmi - porque 50% são indígenas -, e eles se esforçaram muito nesse período. A gente precisa fazer esse registro de quem está lá na ponta. Talvez, Marcos, não tenha havido uma coordenação, mas esse agente de saúde se esforçou, ele foi lá, ele se colocou em risco, especialmente no período de pandemia. Então, a gente precisa fazer justiça também, às vezes, nas nossas falas. Essas pessoas lá da ponta trabalharam, e eu preciso fazer esse registro, porque estão muito tristes. Cada vez em que a gente chega aqui e fala "genocida", alcança aquele servidor que está lá na ponta se esforçando, que, às vezes, faz uma quarentena de 14 dias, para entrar numa área - são 14 dias para entrar, longe da família, longe dos seus. Então, a gente tem que fazer essa justiça.
Eu desejo, Deputada, que, desta vez - tenho um relatório de 1997, aqui, apontando os mesmos problemas -, juntos, a gente encontre as respostas para o povo ianomâmi.
Que Deus lhe dê muita sabedoria, Deputada! Com você, que é da região, nós estamos apostando muito na condução da Funai agora!
Ao novo ministério, Marcos, toda a atenção! Vocês serão o Estado e poderão contar muito com o Parlamento aqui, na condução da política.
Eu tenho muitas perguntas, mas vou fazer o seguinte: vou encaminhá-las via ofício. Pode ser? Porque, aí, a gente ganha tempo aqui na audiência. O.k.?
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Muito obrigada, Senadora Damares.
Vou passar, então, à Joenia e ao Marcos.
Querem fazer alguma... (Pausa.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA (Para expor.) - Muito obrigada pelas boas-vindas à Funai.
Eu acredito que a Funai é responsabilidade do Estado brasileiro, até porque é o único órgão que é responsável por demarcar terra, proteger, identificar. A Funai tem um estatuto, por lei, específico para justamente chamar a atenção de que a Funai é uma autarquia criada já há mais de 50 anos e tem toda uma estrutura legal e deveres institucionais. Não se misturam atribuições; as atribuições que a Funai detém são estabelecidas por lei. Então, nós estamos cumprindo deveres institucionais que nos são estabelecidos por legislação. Só para não dizer que recurso de Sesai é de Sesai; recurso de Funai... Quando a Funai tiver que pedir colaboração no sentido de grupos de trabalhos interministeriais, nós estaremos atuando em forças-tarefas interministeriais, como se faz nas operações, ações emergenciais para atender a essa ação que está havendo, hoje, na questão ianomâmi. Então, é só para deixar bastante claro que a atribuição da Funai é definida por lei; há mais de 50 anos, nós já temos a nossa definição e, muitas vezes, específica.
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O Ministério dos Povos Indígenas, recém-criado também, veio justamente para fortalecer as atribuições da Funai no sentido de que muitas políticas públicas não estavam previstas em ministério nenhum. Inclusive, é até uma complementação que lembramos agora: a questão da educação escolar indígena não tem um departamento no Ministério da Educação, e poderia ter - você falou que tinha, não é? -, mas os povos indígenas, inclusive, estão solicitando que haja uma questão específica dentro do Ministério da Educação sobre educação escolar indígena. Nós muito gostaremos. E eu estou falando como indígena que vem acompanhando também a discussão de uma educação escolar indígena, inclusive com recursos específicos para tanto, não é?
Agora, sobre a questão... Eu não entendi muito quando você quis relacionar ONGs, organizações não governamentais... Eu já solicitei aqui o dado. A questão... Hoje, para entrada na terra indígena ianomâmi, quem tem uma prévia autorização é o COE. Esse é um decreto do nosso Presidente. O Presidente declarou a questão do estado de emergência a partir da solicitação, e aí a mudança de procedimento em relação a essa crise é outra, específica. Então, não foram muitos, porque a autorização, em princípio, só está liberada para quem é prestador de serviço. Então, a terra ianomâmi tem um procedimento... Agora, para os prestadores de serviço que estão indo lá é outro procedimento, porque eles têm que fazer o serviço de atendimento à saúde. São a equipe médica, a equipe de saúde, os da segurança, que estão dando segurança às equipes, e algumas questões. É por isso que a gente reforça que, quando há visita que não seja de prestador de serviços públicos, que se atentem a esses procedimentos
Hoje tem uma portaria em que a Funai regula essa questão das entradas em terras indígenas, seja ianomâmi, seja outra, mas é preciso apresentar uma série de documentos, inclusive essa questão do certificado de vacinação de covid. E os testes... Eu me submeti ao teste de covid; eu, como Presidente da Funai, quando fui à área ianomâmi... Aliás, eu iria, mas deu problema de tempo, e eu fiz o teste, o exame para saber se não tinha covid naquele momento. Então, por isso é necessário se atentar a esses procedimentos.
Hoje a Funai, que é uma autarquia - só para referendar isso de que eu estava falando -, tem um vínculo, ela não é subordinada, mas ela tem um vínculo por estatuto, e está ligada, da mesma forma que era ligada ao Ministério da Justiça, hoje nós temos um vínculo com o Ministério dos Povos Indígenas. E as nossas funções são bem definidas para desenvolver essas ações, principalmente relacionadas à regularização fundiária.
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - Hoje a Funai é o único órgão federal que faz a regularização fundiária, proteção territorial, proteção social e da cidadania, como eu já tinha falado antes.
Enfim, nós temos essa missão, e é importante se falar da importância dos agentes de saúde, porque nós temos um projeto aqui, gente, tramitando na Câmara, e que virá aqui para o Senado. Eu peço a atenção do nosso Parlamentar, já que a gente quer valorizar os profissionais indígenas, para que aprovem esse projeto também, que é o 3.514, de 2019. Foi o primeiro projeto que eu fiz como indígena justamente para reconhecer o que a Senadora Damares falou: a importância dos profissionais que estão lá na base. O agente de saúde hoje não tem um plano de carreira, não é uma categoria reconhecida, e eu estou justamente pedindo para que os reconheçam em lei. É o Projeto 3.514, de 2019. Da mesma forma, o projeto do rastro do ouro, complementando aqui, que...
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - ... é o 2.159, de 2022. Foi um projeto que foi feito e inclusive está sendo referência na medida provisória de que o Governo está tratando do rastro do ouro. Também, quem tem interesse em aprovar...
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Bem que podia no Abril Indígena vocês aprovarem um dos dois para dar resposta ao movimento indígena. Se tiver uma atenção, a gente podia sair aqui com uma ação concreta de atenção à prioridade dos povos indígenas. Uma é para proibir o mercúrio em áreas públicas. Outra é para ter uma definição na questão da certificação da origem do ouro - vai acabar com a boa-fé, vai colocar políticas de monitoramento, fiscalização e exigir uma certificação na compra, na venda e no transporte do ouro. Eu acho que isso vai ajudar a Polícia Federal a fazer uma cobrança efetiva sobre essa questão da ilegalidade.
É isso. Eu quero agradecer, desde já, essa questão.
A gente precisa também aprovar o plano de carreira dos servidores da Funai - reforço. Essa questão do concurso público a gente está planejando para este ano também, como uma forma de responder a toda essa demanda. A Funai está contando com o apoio aqui do Congresso Nacional, do Legislativo para fazer valer a nossa Constituição Federal. Essa é a nossa missão institucional, e não é responsabilidade apenas como pessoa, mas é responsabilidade de Estado também com os povos indígenas.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Muito obrigada, Joenia.
Eu vou passar a palavra para o Senador Humberto, e, na sequência, o Marcos já responde junto com a pergunta do Humberto, porque nós ainda temos uma outra rodada da área de saúde aqui nesta manhã ainda - já quase tarde, não é?
O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Para interpelar.) - Sra. Presidenta, Srs. Senadores, Sras. Senadoras, ilustres convidados que aqui representam o Ministério dos Povos Indígenas e também a Fundação Nacional do Índio (Funai), eu quero primeiro me desculpar por estar chegando só agora ao final - e vou ter que sair daqui para ir para a Comissão de Direitos Humanos. Eu estava presidindo a Comissão de Assuntos Sociais, onde nós vamos também debater essa temática especificamente no que diz respeito à questão da saúde indígena, porque a saúde é um dos temas da nossa Comissão.
Portanto, não pude acompanhar todo o debate, mas queria principalmente aqui reforçar, primeiro, o nosso compromisso com o encontro de uma solução definitiva para que nós possamos ter o devido respeito, o integral respeito aos direitos dos povos originários: do direito à terra, do direito à saúde, do direito à educação; tudo isso respeitando os valores, os costumes, a cultura dessa população. E eu entendo que, neste Governo, nós estamos tendo uma preocupação absolutamente genuína, que não é apenas uma preocupação em termos das palavras, mas em termos das ações. O que já foi feito até agora, a começar da criação de um Ministério dos Povos Indígenas, representa um avanço importante; e, segundo, as ações que foram feitas diante daquela tragédia identificada em relação aos povos ianomâmis, que têm tido uma continuidade, apesar de ser um problema para uma solução definitiva de médio e longo prazo. Não se pega uma população que passou por aquele processo todo e se consegue um pleno restabelecimento das suas condições de saúde, a promoção de saúde - eu estou me referindo especialmente a isso. E esta Comissão, no seu plano de trabalho, na sua definição inicial, tem por objetivo, entre outras coisas, acompanhar, fiscalizar o trabalho do Governo em relação a isso.
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Nós vamos ter oportunidade de ir até a Terra Yanomami, para acompanhar como isso está acontecendo. E temos aí a confiança de que, com a condução e a participação direta dos próprios representantes dos povos originários, nós vamos ter uma solução que não seja, inclusive, só para os ianomâmis, mas para todas as comunidades, todas as etnias Brasil afora. Tenho aí uma esperança.
E a minha pergunta, já que o tema saúde também é objeto desta discussão, é no sentido de que, se esse novo desenho que foi apresentado para o Mais Médicos, que tem a participação de médicos brasileiros prioritariamente, enfim, pelo menos em princípio, garante a possibilidade de acontecer aquilo que aconteceu anteriormente no Mais Médicos, que tinha a presença dos profissionais cubanos, que é garantir que as aldeias indígenas, as comunidades indígenas possam ter acesso permanente aos profissionais médicos. O que é que, dentro desse novo Mais Médicos, pode nos alentar com a possibilidade de que isso se concretize?
Obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Eliziane Gama. Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Muito obrigada.
Vamos passar, então, aqui para o Marcos.
Eu vou fazer o seguinte, para a gente poder ganhar tempo, Marcos, com a sua permissão: eu vou fazer só uma intervenção e encaminho para você e para a Joenia falarem já as suas considerações finais, para a gente seguir para a próxima rodada.
Eu vou deixar uma pergunta para o Senador Rodrigues, para o Senador Presidente da Comissão responder daqui a pouquinho, que é referente ao Marcelo Xavier, que deveria estar hoje aqui, nesta Comissão. Então, eu não sei se é real, mas a informação que eu tenho é de que ele não foi localizado. Até onde eu sei, ele é delegado da Polícia Federal. Então, eu queria saber por que ele não veio, onde é que ele está e por que ele não foi encontrado. Inclusive... (Pausa.)
Sim? (Pausa.)
Ele respondeu? Mas, mesmo licenciado, não poderia participar da Comissão? (Pausa.)
Ah, ele está com licença médica. Tudo bem, então. Muito obrigada.
Eu vou passar aqui ao Marcos para fazer suas intervenções, suas considerações finais, e também à Joenia, já para a gente finalizar esta primeira rodada da audiência pública.
O SR. MARCOS VESOLOSQUZKI-KAINGANG (Para expor.) - Com a sua permissão, Senadora, agradeço as contribuições e as indagações da Senadora Damares.
Em relação às atribuições, já complementando um pouco as respostas da Joenia, nossa Presidente da Funai, nós, como ministério e Funai, temos muito bem definido por lei, como a Joenia já trouxe, o estatuto próprio da Funai. O Ministério dos Povos Indígenas também, no Decreto 11.335, já regula quais são as atribuições específicas do Ministério dos Povos Indígenas. Como eu já trouxe lá no início da minha fala: promover e acompanhar a política indigenista; reconhecimento e garantia de promoção dos direitos dos povos indígenas; demarcação de territórios indígenas; promover o bem viver; e, principalmente, a promoção de escuta e diálogo com os povos indígenas, a partir da Convenção 69. Então, as nossas atribuições são mais de planejamento das ações para as populações indígenas. A execução, em específico, fica estritamente restrita à Funai nesse aspecto, como a Joenia bem trouxe sobre esse aspecto. Então, é bem tranquilo. Nesse aspecto, já temos vários pareceres jurídicos, tanto da AGU quanto da nossa Conjur interna do Ministério dos Povos Indígenas, da Procuradoria Especializada da Funai. Quanto a isso, tranquilo.
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Em relação a ter indígenas em outros ministérios, a como a gente vai coordenar a política indigenista, nós somos daquela visão de que tem que ter povos indígenas em todos os ministérios. A criação do Ministério dos Povos Indígenas não centraliza automaticamente todas as demandas, as ações, as execuções, as políticas públicas no Ministério dos Povos Indígenas. Como eu falei lá no início da minha fala, as atribuições são compartilhadas. A gente entende que tem que ter indígena no Ministério da Educação, no Ministério da Defesa, no Ministério da Saúde, no Ministério do Desenvolvimento Agrário, no Ministério de Desenvolvimento Social. Só assim a gente vai ter a execução da política pública voltada para os povos indígenas de maneira qualificada e adequada de fato. Não adianta achar que só o Ministério dos Povos Indígenas vai resolver. "Ah, tem um problema lá no Ministério da Educação, vamos falar com o Ministério dos Povos Indígenas, e lá eles resolvem". Não, tem que ter indígena no Ministério da Educação também. Só assim, de fato, a gente vai conseguir avançar. E vai ter, de fato, indígenas planejando, pensando políticas públicas para os indígenas, de acordo com a necessidade daqueles povos.
Historicamente no Brasil a gente tem... E aí, com a criação inédita do Ministério dos Povos Indígenas pelo Presidente Lula, que teve essa sensibilidade, de fato agora nós temos indígenas qualificados e preparados para pensar as políticas públicas para nós, povos indígenas. É histórico - e vemos isso - que todas políticas públicas pensadas para os povos indígenas foram pensadas e planejadas por não indígena para povos indígenas. Então, a gente pela primeira vez na história está inaugurando esse processo, que é histórico, no Estado brasileiro de reconhecimento, de fato, de que nós povos indígenas somos detentores e qualificados para pensarmos políticas públicas para os nossos territórios e comunidades indígenas. Havia uma dissonância nesse sentido: muitas vezes nós tínhamos políticas públicas pensadas lá em cima sem participação indígena e executadas lá na ponta, daí não tinham a eficiência que a gente pensa em promover.
Em relação à responsabilidade de cada indígena também... Eu venho desse processo de militância e de luta por direitos, de empoderamento nosso e de ocupação de espaço. É um processo, como eu já falei, importantíssimo. É importante pensar que o Ministério dos Povos Indígenas veio para ficar. A gente jamais vai poder pensar um Brasil sem os povos indígenas participando dessa construção social. É inadmissível a gente pensar que, em 523 de história do Brasil, a gente sequer tenha tido uma instituição que, de fato, respeitasse e promovesse os direitos dos povos indígenas da forma... Hierarquicamente falando, nesse sentido a gente sempre teve a Funai nesse aspecto, mas em grandes períodos a própria Funai foi conduzida por não indígenas, e, neste momento, nós temos tanto Joenia Wapichana na Funai conduzindo a execução da política indigenista no Brasil como temos a Ministra Sonia também no ministério. E são duas mulheres também a se reconhecer nesse processo. A gente tem que fazer um recorte de gênero nesse aspecto antes de tudo também; de não achar que só homens são qualificados para os espaços.
Então nesse aspecto, é crucial que a gente possa pensar nessas ações. E a gente tem muita consciência, de fato, Senador - e aí é bom lembrar -, de quais são as nossas atribuições e responsabilidades. Como eu falei, a gente está preparado e qualificado para ocupar todos os espaços, os diferentes espaços. E estar no Parlamento também é uma luta nossa, por ter representação, e esta Casa já diz a desigualdade que há no país. Isso é triste na medida em que a gente não consegue avançar de maneira mais incisiva, mas é um processo em que a Joenia já tem se colocado, assim como a Ministro Sonia, e outros vão vir ocupar esses espaços nesse processo de renovação também.
(Soa a campainha.)
O SR. MARCOS VESOLOSQUZKI-KAINGANG - E outro aspecto, Senador, se me permite, em relação ao cumprimento da ADPF 709, Senadora, a gente identificou que, de fato, pode ter havido uma tentativa de cumprimento, mas ela não foi cumprida. Tanto o é que nós do Ministério dos Povos Indígenas estamos tendo que organizar todo o trabalho de execução dessa ADPF 709. Estamos respondendo aos prazos judiciais de uma maneira alucinante de fato para conseguir dar as respostas que não foram dadas anteriormente.
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E aí eu reitero o que eu falei, novamente: é um compromisso e um dever do Estado; não é uma convenção minha, sua ou de qualquer um não aderir ou cumprir uma determinação judicial. Foi transitada em julgado. O Ministro Barroso novamente, dias atrás, teve que soltar um novo despacho reiterando: "Cumpra a decisão da ADPF 709". Eu respondi até à Senadora Eliziane anteriormente que um dos fatores que agravou a situação ianomâmi na região foi o não cumprimento da ADPF 709. Isso são dados que nos trazem todos os estudos que chegam até nós do Ministério dos Povos Indígenas, da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, do Ministério da Saúde, em específico da Secretaria Especial de Saúde Indígena. Então, é um pouco do cenário que a gente traz da nossa preocupação, porque, de fato, ela deveria ter sido cumprida, e não foi, dentro da sua integralidade. E aí a gente precisa de várias decisões judiciais mandando o Estado brasileiro cumprir.
Então, nesse momento, eu acho que o nosso papel aqui é fazer nosso dever enquanto servidores e servidoras: fazer o cumprimento sem fazer avaliação alguma de situação nesse sentido, porque é um dever a partir da situação que se encontra lá. Mesmo que não se encontrasse em situação de calamidade, território indígena deve ser protegido e preservado, como o Senador bem trouxe na sua fala, para a proteção e preservação dos modos de vida desses povos que lá estão na região, que não têm opção a não ser ter que lidar com a criminalidade no dia a dia. Em algumas situações dos relatos, como a Joenia trouxe aqui, o pessoal ali - trabalhador, trabalhadora ou garimpeiro; para mim, não faz muita diferença - aliciando, colocando condições para indígenas que não têm o que comer, que têm que se submeter a condições sexuais lá devido à vulnerabilidade em que se encontra o território pela ausência do Estado brasileiro. Então, acho que o nosso papel, nesse sentido, é o cumprimento.
Mas, só complementando, Senador, esse aspecto, é importantíssimo a gente ter mais ações de fato e menos fala. O que a gente tem visto historicamente no Estado brasileiro é mais discurso do que ações. E aí a gente precisa também ter ações contundentes para dar resultado, e o que a gente tem visto é que os ianomâmis não conseguiram ter essas respostas de fato. Ficou mais no discurso político.
E aí quero destacar também que a gente poderia ter tido essas ações de maneira mais contundente também nos últimos quatro anos. Nos últimos anos, a gente não conseguiu visualizar isso, mas é uma preocupação que a gente tem agora, a partir de uma própria determinação do Presidente Lula, da Ministra Sonia e do nosso ministério também.
Isso é um pouco do desafio que a gente tem como um todo, assim, enquanto indígenas nesses espaços também, mas a gente está muito ciente, capacitado, qualificado e preparado para executar a política pública. Não à toa os povos indígenas vêm ocupando esses espaços. A gente veio para ficar de fato, e a gente vai mostrar que é capaz. Eu acho que um exemplo disso é a conquista do nosso Ministério dos Povos Indígenas, que veio aí mostrando que é uma necessidade importante, Senadora.
Então, a gente quer agradecer a todos os povos indígenas. Nós também acabamos sendo um exemplo para eles de que é possível estudar, ter acesso à universidade, mesmo com as nossas limitações e condições; de que é possível a gente gerir e tocar o Ministério dos Povos Indígenas. Acho que é o nosso recado aqui, Senador, também, que o Ministério dos Povos Indígenas é qualificado dentro das nossas atribuições, mas, como eu falei, a gente precisa expandir e ampliar ainda mais a participação dos povos indígenas em todos os ministérios.
É isso. Quero já me despedir e agradecer. Deixo aqui o nosso agradecimento por todas as indagações também ao Senador, à Senadora e aos demais que participaram aqui. Quero agradecer aos povos indígenas. E estamos sempre à disposição, Senador Chico, para responder e comparecer a esta Casa - a Ministra também em outras oportunidades.
Eu acho que, bem na linha que o Senador colocou, estamos aqui para pensar situações conjuntas, não só reclamar da situação, mas ser propositivo. Eu acho também que a gente tem um bom cenário pela frente, sim, Senador, e a gente não pode só vir reclamar também. Eu acho que a gente traz as situações gravíssimas que não podem mais ser admitidas no Estado brasileiro, com toda a diversidade que tem. O mundo lá fora respeita, e a gente não consegue ter essa mesma visão aqui internamente no país.
Então, é isso. Desculpe por me alongar.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Muito bem.
Eu já tinha elogiado a participação dos dois, tanto da Presidente da Funai, Joenia Wapichana, quanto do Marcos Kaingang, pela forma didática, inclusive com precisão - eu chamaria até de precisão cirúrgica - nas apresentações e nas respostas, o que vai enriquecer o relatório do nosso Senador Dr. Hiran Gonçalves.
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Eu apenas queria fazer só uma rápida abordagem, antes de passar para... Ele já se despediu, mas a Deputada - continuo chamando-a sempre Deputada Joenia Wapichana porque ela na verdade representa bem, representa os povos indígenas de todo o Brasil, enfim...
Hoje, duas normas são fundamentais para a questão dos povos indígenas e também para o futuro da cidadania brasileira: a Constituição Federal, que busca preservar a integridade das culturas e do modo de vida dos diversos povos indígenas; e o Estatuto do Índio, que procura a mesma preservação da integridade, mas que concebe simultaneamente a integração dos povos indígenas, o que chamamos de comunhão nacional.
Pois bem, é uma pergunta de um sentido mais amplo para as autoridades presentes, sobre o que pensam especificamente essas duas autoridades, na presidência e também na mediação de conciliação de conflitos. Os dois poderiam realmente dizer como eles interpretariam. Os povos indígenas, a sociedade indígena, estão já definidos pelo Estatuto do Índio. Como eles definem? E em que termos deve haver a integração? Em que termos deve haver essa integração? Há interesse dos povos indígenas em participar da sociedade brasileira de uma forma mais abrangente ou esperam realmente que o Brasil os isole e, por meio disso, proteja a sua condição originária, que é o seu bem mais valioso? É claro que não é uma pergunta... Ela é num sentido lato sensu, é muito extensa e muito abrangente, mas nós sabemos da necessidade dessa integração. Partindo de uma abordagem dos dois, que são indígenas, isso aí nos fortalece muito e esclarece a opinião pública brasileira, para que esse sentimento - que espero abordarem - seja na verdade de conhecimento de toda a população brasileira.
A TV Senado, Deputada Joenia, tem uma abrangência nacional, e esses eventos como o de hoje são muito assistidos pela população, tanto que sempre nos mandam muitas perguntas pelo e-Cidadania - e nós as passaremos, após essas audiências, para que vocês possam responder às dezenas, centenas de brasileiros que se preocupam com essa causa.
Então fica aqui essa pergunta. Rapidamente, cada um tem... Acho que um minuto.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Pode ser.
Então, a Deputada Joenia vai responder, e ela pede até cinco minutos. Concedidos cinco minutos.
A SRA. JOENIA WAPICHANA (Para expor.) - Obrigada, Presidente.
Eu ficaria aqui o dia todinho falando sobre essa questão, que é uma questão em que nós indígenas muitas vezes consideramos um retrocesso pensar em uma forma de tutela para os povos indígenas.
A nossa Constituição rompeu com essa questão do estereótipo que muitas vezes se tem, a começar pelo termo índio. Nós temos avançado em reconhecer a coletividade, os direitos coletivos, e principalmente reconhecendo que não é um povo, são vários povos, não é? É por isso que nós chamamos: povos indígenas. A própria ONU já reconheceu essa terminologia mais apropriada. E hoje o Estatuto do Índio, de 1973, traz questões já superadas pela nossa Constituição, que reconhece os povos indígenas, sua organização social, usos e costumes, crenças e tradições. Isso quer dizer que não rompe com esse pensamento assimilacionista, integracionista. Isso não quer dizer que eu estando aqui ou o Marcos, que assume um cargo... Eu sou formada em Direito, sou advogada, inclusive sou a primeira mulher advogada indígena do Brasil. E isso não tirou a minha identidade. Então, a gente tem educado as pessoas que não conhecem a realidade indígena, se rompe com esse pensamento assimilacionista e tutelar de muitos que pensam que indígena ainda está em estágios...
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É lógico que nós temos diferentes situações hoje dos povos indígenas. Isolados, que estão sem contato, existem muitos, são quase 50 grupos, se não me engano - não é, Janete? -, aqui, no Brasil. Então, nessa proteção, tem direitos específicos. Temos indígena de recente contato, temos indígenas que estão mais em contato. Isso significa que eles têm o conhecimento do português, sim. E acesso aos direitos básicos a cada um brasileiro para a forma que nós indígenas... Isso não significa que a gente não tenha direito à saúde, à educação, a trabalho, a ter uma profissão, não! Isso é direito de todo cidadão brasileiro, inclusive dos povos indígenas. É lógico que nós temos políticas específicas quando se está lidando com acesso a direitos - o seu território, a sua forma de pensar, a sua forma de se organizar, os seus costumes... Hoje, 305 povos, 264 línguas diferentes, povos que eram nações aqui neste Estado.
Uma questão que a gente vê muito quando querem, digamos assim, menosprezar a cultura indígena, o povo indígena é nos colocarem numa situação de inferioridade. A gente precisa romper com esse pensamento racista, muitas vezes, que nos leva a menorizar a falta de acesso aos direitos políticos e, inclusive, civis básicos. Então, eu trago esta questão: não é querer ou não integrar, é questão de acesso aos direitos, principalmente.
Os indígenas têm o direito de escolher como querem viver, inclusive os ianomâmis. Se querem viver no seu território, então, pensando como obrigação do Estado... Os indígenas isolados estão ali isolados por quererem viver... Então, a gente, como Estado, precisa levar proteção de direitos, precisa levar as questões de educação e de saúde específicas.
Hoje, nós temos bastante indígenas já formados, que passaram pela universidade e que têm colocado sua capacidade... O fato de nós sermos indígenas não limita a nossa capacidade, mas todos em diferentes contextos. Então, é importante conhecer que a realidade hoje dos povos indígenas está em diferentes contextos. Inclusive, há indígenas que vivem nas cidades, em centros urbanos, que não estão em territórios indígenas, mas que também merecem uma política específica, porque ali tem uma diversa situação. Indígenas que estão morando em estradas...
(Soa a campainha.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA - Indígenas que estão reivindicando os seus territórios. Então, tem todo uma forma de diferentes situações dos nossos povos indígenas.
E, quando perguntam se há interesse de participar da sociedade nacional, se não tivesse interesse, a gente não estava aqui defendendo os nossos direitos; se não tivesse, a gente não tinha o Ministério dos Povos Indígenas; se não tivesse interesse, a gente não estaria nas universidades requerendo vagas, cotas, ações afirmativas, justamente para contribuir a partir da nossa cosmovisão, dos nossos direitos específicos e diferenciados, inclusive para dizer o que quer ver acontecer dentro dos próprios territórios indígenas, como os ianomâmis estão fazendo. Sem falar português, eles, na sua própria língua ianomâmi, estão dizendo que querem respeito, que querem sua floresta em pé e livre de garimpeiros e de invasões.
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Eu creio que, sim, isso é exercer a cidadania brasileira, isso é cobrar do Estado brasileiro o seu respeito como cidadão, como qualquer brasileiro tem respeito. Eu acho importante deixar isso bastante claro, porque é uma forma também de divulgar o que pensam os povos indígenas, o que pensam as mulheres, o que pensam as crianças. É importante que a gente se veja como coletividade, avançando. Cada um tem a sua identidade e, mesmo a gente exercendo um cargo público, tanto eu, o Marcos, a Sônia e outros indígenas que estão aí, a gente pode até mudar de lugar, fazer um mestrado fora do Brasil ou mudar de estado, mas isso não vai tirar a nossa identidade, a nossa origem indígena.
É isso.
Muito obrigada pela pergunta.
Eu creio que o Senado tem tudo para também avançar nessa perspectiva, para romper com esse olhar de discriminação e, muitas vezes, intolerância, que não contribui em nada, só aumenta o ódio contra os povos indígenas e, muitas vezes, a prática de discriminar e aumentar a disputa pelos direitos tanto à terra como aos recursos naturais. Vai chegar o Abril Indígena aí...
Senador, quero já cumprimentar - o Senador fez parte lá da comissão de diligência, esteve no meu Estado, Roraima - por essa iniciativa o Senado e por poder também chamar a atenção para essas discussões sobre direitos indígenas.
O Estatuto dos Povos Indígenas merece uma atualização, mas a gente tem o nosso principal artigo da Constituição, que nos garante esse olhar específico e diferenciado, inclusive em direitos e políticas públicas.
É isso.
Muito obrigada pelo convite.
A Fundação Nacional dos Povos Indígenas, que mudou agora o termo, está à disposição.
Só respondendo à nossa Senadora Damares, nós estamos mudando, sim, a gestão. Se as questões não foram feitas no Governo anterior, na gestão passada... O que a gente sempre alertou, Senador, é que a gente tem uma legislação que já obriga o Estado brasileiro a fazer a proteção territorial. Nós temos decisões judiciais, e não é só uma, não. Nós temos uma vasta, uma lista enorme de decisões judiciais para cumprir uma obrigação o Estado brasileiro. Se estava faltando vontade política, nós estamos numa nova era, em que os gestores estão com toda vontade política de fazer cumprir tanto a legislação como as decisões judiciais. E agora cabe a nós - Executivo, Legislativo e Judiciário - ter ferramentas para implementar tanto a legislação como as decisões judiciais.
Era isso.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Para encerrar esse bloco, eu gostaria de passar a palavra ao Deputado Defensor Stélio Dener, que é do nosso Estado, Roraima, um Parlamentar extremamente ativo e atuante.
V. Exa. dispõe de cinco minutos.
O SR. DEFENSOR STÉLIO DENER (REPUBLICANOS - RR) - Obrigado, Presidente, Senador Chico Rodrigues. Minha palavra, Senador, é apenas para parabenizar o Senado Federal, para parabenizar os três Senadores de Roraima - V. Exa., que está presidindo esta Comissão, o Senador Messias de Jesus, o Senador Dr. Hiran Gonçalves - por estarem conduzindo, juntamente com outros Senadores, esta Comissão tão importante para o Brasil, para Roraima e para o povo ianomâmi.
Gostaria apenas de dizer da minha contribuição, que quero dar, tanto ao Ministério dos Povos Indígenas, aqui representado pelo Marcos Kaingang e também pela minha amiga e contemporânea de faculdade - formamos juntos na faculdade, na Universidade Federal de Roraima, eu e Joenia... Amiga, quero dizer para você que me coloco à disposição tanto do ministério como da Funai para que a gente possa também, juntos, trabalhar em defesa das terras indígenas, em defesa dos direitos indígenas, em defesa também do que vocês têm de concreto para mostrar enquanto Governo.
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Quero cumprimentar os Senadores e também agradecer aos que passaram por aqui e deram sua contribuição a todos nós, ao Brasil e ao povo ianomâmi: Senadora Eliziane Gama, Senadora Damares, Senador Humberto Costa e o Senador que estava aqui, nosso Astronauta Marcos Pontes. Quero agradecer a eles e dizer que eu tenho uma grande responsabilidade com o Ministério dos Povos Indígenas, com a minha própria amiga Joenia Wapichana, com o meu povo de Roraima.
Eu não tenho identidade indígena, mas carrego também, no sangue, o sangue indígena. Minha família chegou ao meu estado há mais de 150 anos, tanto a família paterna como a família materna, e lá nós nos misturamos também com os macuxi e com os wapichana. Então, minha responsabilidade é muito grande em relação a este mandato que estou carregando hoje.
Infelizmente a Joenia não se elegeu juntamente comigo, mas, Joenia, eu digo sempre aos colegas e digo a você hoje que talvez Deus reservou a você esse posto hoje de ser Presidente de uma fundação tão importante no Brasil para os nossos povos indígenas. Você é nossa grande representante hoje, juntamente com a nossa Ministra, para carregar a responsabilidade, juntamente com todos nós, de fazer com que os direitos dos povos indígenas sejam respeitados no Brasil. Eu trago apenas a minha contribuição como Parlamentar, Deputado Federal, para que a gente possa somar com o trabalho de vocês. Eu me coloco à disposição.
E tem muitas coisas, Marcos, que a gente pode melhorar em todos os outros ministérios, porque hoje os ministérios, tanto o da Saúde, como o da Educação, o da Integração e do Desenvolvimento Social, todos eles, fazem políticas públicas para os povos indígenas, mas não fazem políticas públicas justamente com um olhar diferenciado de dentro para fora, somente de fora para dentro.
Veja só, nós temos dificuldades como Parlamentares Federais...
(Soa a campainha.)
O SR. DEFENSOR STÉLIO DENER (Bloco/REPUBLICANOS - RR) - ... Senadores e Deputados Federais, de colocar recursos para as comunidades indígenas em todo o Brasil.
(Soa a campainha.)
O SR. DEFENSOR STÉLIO DENER (Bloco/REPUBLICANOS - RR) - Quando há uma pequena ação em relação à construção de uma escola, nos limita, no Ministério da Educação, por exemplo, ou no do Desenvolvimento Social, o fato de que a escola só pode ser construída com 12 salas. Não, tem comunidades em que apenas duas salas dão, tem comunidades em que apenas uma sala dá, quatro salas dão. E a mesma coisa acontece em relação ao Ministério da Saúde. Ninguém precisa de um grande hospital, de uma UBS ou de um posto médico grande para uma comunidade que só tem 150 habitantes. Nós precisamos de um posto médico, mas menor...
(Soa a campainha.)
O SR. DEFENSOR STÉLIO DENER (Bloco/REPUBLICANOS - RR) - ... do que a ação que está contemplada no Ministério da Saúde. Então, eu trago isso.
Eu me coloco à disposição. Já estive no Ministério dos Povos Indígenas, dos povos tradicionais, e me coloco à disposição de todos vocês.
Obrigado.
Obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Eu quero agradecer a manifestação do Deputado Federal Stélio Dener, pela sua presença e sua permanência aqui nesta Comissão. Isso enriquece, inclusive, a presença tanto em nível de Comissão quanto em nível estadual e nacional.
V. Exa. falou com relação ao recurso, às emendas. Deputada Joenia, eu me orgulho de ser um dos Parlamentares, entre tantos, que tem colocado recursos para atender as comunidades indígenas. São quase 4 milhões de emendas e recursos aplicados para as comunidades indígenas, com tratores, arados, grades, carretas, insumos, uma série de equipamentos. Inclusive, estou fazendo, a partir dessa semana já... No início do ano, já fizemos a entrega de caminhões para atender comunidades indígenas - cinco comunidades indígenas.
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E agora temos mais 20 comunidades indígenas a serem atendidas com recursos dessas emendas, no valor de R$2,844 milhões mais R$955 mil, totalizando quase R$4 milhões em emendas efetivamente realizadas, que estão sendo entregues - não são apenas emendas que passam e que não são aprovadas, que não são, enfim, atendidas - para atender várias comunidades. Nós sabemos principalmente das comunidades da área Raposa Serra do Sol, da comunidade dos uaiuais, que estão recebendo esses investimentos, e isso é positivo, é minha obrigação, é meu dever.
Inclusive conclamo os colegas Senadores da Comissão para que coloquem um pouco de recurso também para atender as comunidades dos seus estados, porque nós não podemos só fazer a crítica, que não produz, mas nós temos que dar um estímulo também através das nossas emendas.
Então, minha gente, eu tenho alegria... Eu estou com 45 microtratores para entregar às hortas comunitárias indígenas, que já estão adquiridos, já estão no pátio do Governo do Estado lá na nossa capital. São 45 microtratores que começam, já a partir da próxima semana, a serem entregues também. Tratores de grande porte (60, 80 e 90CV) também já estão sendo entregues.
Eu acho que essa integração, essa interação, esse compromisso que nós assumimos é fundamental para atender, claro, na medida das nossas limitações, parte das comunidades indígenas. Então, você falou em investimentos, e me veio aqui à memória, e foi até bom porque refrescou aqui a minha memória, e eu estava aqui com a minha planilha de emendas e realmente não poderia deixar, Marcos e Deputada Joenia, de me referir a elas.
Então eu quero agradecer a presença da Dra. Joenia Wapichana, Presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), do Dr. Marcos Kaingang, advogado - fiquei sabendo por ele que era advogado também -, Diretor do Departamento de Mediação e Conciliação de Conflitos Fundiários Indígenas, agradecer pela apresentação feita, e volto a dizer, já pela terceira vez, a repetir que realmente de uma forma didática, de uma forma precisa, com conhecimento de causa, o que vai, claro, enriquecer o relatório desta Comissão. Então, a visita que faremos à área, para aqueles Senadores que não conhecem, é importante - a Comissão é Comissão Externa - a forma presencial, que nós nos desloquemos à área para ver.
Obviamente precisamos... Inclusive já foi encaminhada a documentação para a Presidente da Funai para ela se certificar e o convite também. É importante a sua participação, a sua presença. Afinal de contas o ponto focal de toda esta Comissão é exatamente a Funai, são as comunidades indígenas ianomâmis especialmente, mas através da Funai, que tem essa responsabilidade com o manto de abrigar e proteger as comunidades indígenas ianomâmis. Então nós aguardamos esse retorno à Secretaria da Comissão, para que nós possamos receber essa orientação, e com a nossa presença nós melhorarmos mais ainda e qualificarmos, qualificarmos esta Comissão, que é tão importante neste momento em que nós vivemos.
Portanto, eu vou desfazer a mesa. Eu sei que a D. Joenia Wapichana tem muitos compromissos lá na Funai, e o Marcos também, o Marcos Kaingang.
Para o segundo bloco vou convidar o Márcio Chaves de Castro, Coordenador-Geral do Contencioso Estratégico e Extrajudicial da Consultoria Jurídica do Ministério da Saúde; o Ricardo Weibe Nascimento Costa, Secretário Especial de Saúde Indígena; e o Paulo Cesar Basta, Pesquisador Titular da Escola Nacional de Saúde da Fundação Oswaldo Cruz.
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Eu vou dar cinco minutos para nós reiniciarmos o nosso trabalho.
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(Suspensa às 11 horas e 41 minutos, a reunião é reaberta às 11 horas e 45 minutos.)
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Retornando a reunião, a 7ª Reunião da Comissão Externa do Senado para tratar da questão dos indígenas ianomâmis, convido Ricardo Weibe Nascimento Costa, Secretário Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde; Jorge Luiz Rocha Reghini Ramos, Diretor de Programa da Secretaria Executiva do Ministério da Saúde; Paulo Cesar Basta, Pesquisador Titular da Escola Nacional de Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Nós iniciaremos a nossa sessão, e eu vou conceder o tempo de 15 minutos para cada apresentador. Se tiver que reduzir, não tem problema; se tiver que ampliar, nós também faremos a ampliação desse tempo.
Então, vou passar a palavra ao Ricardo Weibe Nascimento Costa, Secretário Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde. V. Sa. dispõe de 15 minutos.
O SR. RICARDO WEIBE NASCIMENTO COSTA (Para expor.) - Bom, muito bom dia a todos e todas presentes nesta importante audiência pública. Primeiro, quero dizer do contentamento aqui da nossa Secretaria Especial de Saúde Indígena, que é na realidade a única secretaria do Ministério da Saúde que planeja, coordena e, ao mesmo tempo, também implementa, executa uma política de Estado nos territórios indígenas. E nós avaliamos que é, na realidade, a principal política de Estado que acontece nos territórios indígenas de todo o país.
Então, queria agradecer ao Senado da República por estar propiciando esse debate, um debate público sobre um tema importante, na pessoa do Presidente desta Comissão, Senador Chico Rodrigues, e, na sua pessoa, também estender aqui as nossas saudações aos demais Senadores e Senadoras que passaram por esta audiência pública, aos servidores da Sesai que estão nos acompanhando, Ministério da Saúde, técnicos aqui da Casa, também as lideranças indígenas do Estado do Mato Grosso do Sul que passaram por esta audiência, representante do Ministério da Saúde, dos povos indígenas e a Presidente da Funai, que acabaram também de fazer as suas exposições.
Queria iniciar informando que nós tomamos conta dessa política de Estado. E eu realmente fiquei bem espantado quando estive num território indígena do povo ianomâmi no Estado de Roraima. Nós temos uma apresentação para fazer, mas, antes disso, eu queria reforçar um dado que eu considero importante neste momento. Primeiro, nós temos uma informação da Hutukara Associação Yanomami, associação que é do povo ianomâmi, que informa que o garimpo ilegal teria crescido 54% em 2022, devastando milhares de hectares, conforme o levantamento feito por imagem de satélite. Os ianomâmis, através dessa associação, têm feito esse monitoramento territorial, inclusive com ajuda de imagens de satélite.
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Esse dado aponta para um crescimento acumulado da ordem de 309% do desmatamento associado ao garimpo ilegal entre outubro de 2018 e dezembro de 2022.
Estou iniciando a nossa apresentação com esse dado, porque nós consideramos que a maior parte dos óbitos que foram notificados no território ianomâmi tem uma relação direta com a presença dos mais de 20 mil garimpeiros naquele território que contribuíram com a contaminação das águas, afastando animais, contaminando peixes e levando a um cenário de caos, de insegurança alimentar, uma crise que é humanitária, uma crise também que é sanitária naquele território. E a maior concentração dessa devastação ambiental, das contaminações dos rios é ligada diretamente aos rios Uraricoera, ao norte da terra indígena, Mucajaí, na região central, e Couto Magalhães. Essa atuação dos garimpeiros no território fomentou a disseminação de doenças, conflitos, contaminação da água, espalhando novas cepas de malária em todo o território ianomâmi.
Então, essa informação é importante porque, embora tenha sido colocado, inclusive nesta audiência, na mesa anterior, que, de fato, há um cenário crítico de assistência naquele território que já se estende há bastante tempo, mas, nos últimos quatro anos, nós tivemos, de fato, uma incidência muito grande da presença do número de garimpeiros, de devastação ambiental, de contaminação das águas dos rios sem nenhum tipo de ação, de proteção, de vigilância territorial. Digo mais, a atuação garimpeira naquela região também está associada ao crime organizado, a grupos armados no território que estavam dificultando a atuação inclusive das nossas equipes de saúde no território. Nós tivemos unidade de saúde queimada, nós temos algumas unidades de saúde que foram desativadas pela ameaça, pela coação dos nossos servidores que não se sentiram com condições de atuar naquele território.
Senador Chico Rodrigues, que preside esta audiência, eu tive a oportunidade de estar no território ianomâmi. Eu fiz um sobrevoo num helicóptero das Forças Armadas e desci em duas comunidades, ajudando a equipe da Funai a fazer a distribuição de cestas de alimentos em comunidades que estavam tomadas pelo garimpo ilegal e pelo crime organizado, porque eram pessoas armadas. Eu não posso tratar aqui, como foi colocado, simplesmente de um trabalhador do garimpo. Quando as pessoas estão armadas, coagindo, ameaçando, é uma situação realmente bem delicada, e nós só conseguimos chegar lá porque nós descemos com um helicóptero da Aeronáutica brasileira. Nós fizemos a entrega de cestas de alimentos em comunidades que estavam reféns desse cenário, que é de crise, de desassistência e, ao mesmo tempo, de temor, de risco, de ameaça. Eu estou falando aqui porque estive no local e participei dessas operações, que também são humanitárias.
Nós trouxemos uma breve apresentação. A Secretaria Especial de Saúde Indígena é responsável por atuar na atenção primária nos territórios e também realizar as tratativas com as unidades hospitalares, com o sistema de saúde na média e na alta complexidade, na atenção especializada. Nós estamos avançando, evidentemente a partir de um diagnóstico feito com o nosso planejamento, na implementação de ações que tem como foco, tem como objetivo principal tirar o povo ianomâmi dessa crise humanitária, dessa crise sanitária.
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E eu queria reforçar aqui, na minha leitura, como uma pessoa que esteve lá, que, de fato, era um projeto de genocídio que estava em curso. Queria reforçar isso na condição também de gestor público responsável por uma das áreas mais importantes da política indigenista brasileira.
Vou pedir o apoio então da nossa equipe para ir passando.
Primeiro, eu queria falar que nós temos uma linha do tempo, não sei se na minha apresentação é a mesma que está aí na frente. Aqui nós temos uma linha do tempo. Eu vou falar dos precedentes, inicialmente.
Pode voltar à tela anterior.
Esse precedente é muito daquilo que a Joenia já tratou e também o Marcos. Nós temos aqui uma ação movida pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil no âmbito do Supremo Tribunal Federal, que é a ADPF 709, que apontou um cenário de desassistência numa série de territórios indígenas, incluindo o povo ianomâmi, que, numa das decisões do Ministro Barroso, determinou a realização de medidas sanitárias e também a desintrusão daquele território; eu queria reforçar isso.
Os Ministérios Públicos Federais do Estado do Amazonas e de Roraima também estabeleceram algumas medidas e recomendações para que o Governo Federal pudesse adotar ações efetivas para mitigar o cenário de caos e desassistência no território ianomâmi, inclusive recomendando a intervenção do Ministério da Saúde no Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami.
Pode ir passando.
Há também uma recomendação do Conselho Nacional de Saúde, e isso nós consideramos como alerta. Eu estou falando aqui de Ministério Público Federal, estou falando aqui do ministro do Supremo Tribunal Federal, do Conselho Nacional de Saúde, mas uma série de instituições chegaram a soltar notas apontando para agravos e também alertas para que o Governo brasileiro pudesse adotar de medidas.
Nós temos uma linha do tempo a partir do cenário que nós estivemos acessando no âmbito do Ministério da Saúde, da Secretaria Especial de Saúde Indígena. Nós tivemos um rumor, e esse rumor foi a partir de notícias veiculadas em jornais, em televisões, de fotos de indígenas no estágio de desnutrição aguda, grave, que foram imagens circuladas no mundo todo. A partir dessa detecção, fizemos uma avaliação de dados. Nós reunimos a nossa equipe técnica no dia 12 de janeiro para avaliar esse cenário e nós decidimos enviar uma missão exploratória ao território para apurar essas informações e realizar um diagnóstico.
No dia 20 de janeiro, a Ministra da Saúde, Nísia Trindade, declarou a emergência sanitária pública de interesse nacional, uma portaria do Ministério da Saúde. No dia 25 de janeiro, nós tivemos o retorno dessa missão exploratória; no dia 27 de janeiro, nós mobilizamos já a implantação do Centro de Operações Emergenciais, um COE nacional que é composto por 53 integrantes, e no dia 30 de janeiro, nós instituímos o COE, que é local e composto por 32 integrantes.
É importante colocar que o COE é composto por instituições, por agentes públicos, mas também houve algumas entidades que têm atuação no território e lideranças indígenas. Nesse aspecto, eu queria inclusive reforçar que, nesse período também nós tivemos a edição do Decreto 11.384, que é de 20 de janeiro de 2023, que instituiu o Comitê de Coordenação Nacional para Enfrentamento à Desassistência Sanitária das Populações em Território Yanomami, entendendo que, para sair daquela crise sanitária, a Sesai e o Ministério da Saúde sozinhos não conseguiriam, realmente, tirar o povo ianomâmi dessa situação, porque envolve segurança pública, envolve ações de assistência social, envolve inclusive tecnologia, infraestrutura, logística e o território não permitiria que a Sesai sozinha, junto com o Ministério da Saúde, conseguissem tirar o povo ianomâmi daquela situação.
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Pode passar.
Bom, aqui nós temos o mapa que a Joenia já repassou. Aqui é a dispersão das nossas unidades de saúde. Nós temos polo base e unidade básica de saúde indígena de espécie em todo o território ianomâmi, no Estado do Amazonas e no Estado de Roraima.
Pode ir passando.
Nós temos os dados demográficos, eles são importantes para a gente entender a complexidade dessa operação naquela região. É uma região, como foi reiterado pela nossa Presidente da Funai, de quase 10 milhões de hectares, é a maior terra indígena do Brasil, e nós temos uma presença de mais de 31 mil indígenas ianomâmis. E, em nossa atuação na condição de Sesai e de Política Nacional de Atenção à Saúde Indígena, nós temos 37 polos base, que são uma espécie de equipamento que realiza a ação finalística de assistência à saúde indígena, mas também faz a gestão do serviço regional. E nós temos 376 comunidades que são dispersas nesses territórios, são 34 estruturas físicas de polo base e 31 unidades básicas de saúde indígena.
O diagnóstico inicial que foi feito nessa exploração, nessa missão exploratória. Nós identificamos, de fato, que o território é de difícil acesso, e o modal aéreo é o principal acesso ao território, 98% de acesso é pelo modal aéreo. Nós temos um déficit de recursos humanos na Casai, que é uma casa de apoio à saúde indígena. E, também no território, identificamos sete polos bases fechados devido à insegurança gerada pela presença dos garimpeiros do garimpo ilegal; estrutura precária nos polos base de saúde indígena, na Casai, inclusive identificando uma falta de estrutura mínima de acesso à energia, à internet, à água potável e ao saneamento; e falta de insumos nas unidades básicas de saúde indígena (UBSI).
Pode ir passando.
Nesse diagnóstico, nós também identificamos o perfil da mortalidade na região. Entre 2018 e 2022, nós identificamos 505 mortes - a maioria, de crianças menores de um ano. Em 2022, nós notificamos 209 óbitos de janeiro a setembro, sendo 99 mortes de menores de cinco anos por causas evitáveis, e 67 de menores de um ano. Então, os casos, a motivação, a causa dessas mortes em sua grande maioria está relacionada diretamente a desnutrição, malária, problemas renais, doenças diarreicas agudas. Portanto são doenças consideradas evitáveis se nós tivéssemos um sistema de saúde funcionando na sua integralidade e evidentemente não tivéssemos a presença dos garimpeiros e a contaminação das águas dos rios por mercúrio.
Esse diagnóstico aponta para uma morbidade, em 2021, de 56,5% das crianças com baixo ou muito baixo peso; 46,9% das gestantes com baixo peso; 20.393 casos de malária, e a maioria em crianças de zero a nove anos, que foram mais afetadas; uma baixa capacidade de execução das atividades de atenção primária; quanto à cobertura vacinal, nós estivemos identificando o cenário de uma cobertura de apenas 53%, em 2022; uma superlotação de pacientes na Casai; fragilidade da rede hospitalar de Boa Vista e Roraima.
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E aí eu queria trazer um destaque nesse cenário. Boa Vista, no Estado de Roraima, tem um sistema de saúde realmente bem limitado, não é? Nós temos um hospital de média e de alta complexidade do estado, e um hospital pediátrico...
(Soa a campainha.)
O SR. RICARDO WEIBE NASCIMENTO COSTA - ... que também, inclusive, tem um setor específico para atuar junto às comunidades indígenas.
Senador Presidente Chico Rodrigues, eu vou pedir a complacência de V. Exa. para, de fato, me conceder um pouco mais de tempo, porque aqui a saúde indígena talvez seja...
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Mais cinco minutos.
O SR. RICARDO WEIBE NASCIMENTO COSTA - ... a área mais atuante na região.
Bom, vamos passando rapidamente, então.
Na Casai, nós temos um cenário que estava funcionando até como uma espécie de campo de concentração. A Casai não foi pensada para atuar como um hospital e, por conta desse colapso no sistema de saúde, nós, infelizmente, tivemos um cenário de superlotação naquela região, mas nós temos uma atuação já complementar, resultado dessa nossa força-tarefa, com a presença de 14 voluntários da Força Nacional do SUS, 18 profissionais dos Médicos sem Fronteiras, 18 trabalhadores da Unicef, 12 gestores de saúde coletiva indígena, que foram formados pela Universidade Federal de Roraima, que nós contratamos; uma antropóloga especialista em segurança alimentar.
Vamos passando.
Temos mais algumas ações na Casai que a gente conseguiu implantar: o Hospital de Campanha pela FAB; uma solicitação na Sesai para a permanência do hospital até maio; a inclusão de uma sala de estabilização; busca ativa diária nos alojamentos para identificação de problemas de saúde; reabertura do segundo posto de enfermagem. Nós temos uma parceria com a prefeitura municipal, temos algumas ações de infraestrutura, mas eu vou tentar dar uma acelerada na nossa apresentação, por conta do tempo; depois a gente pode também revisitar essas informações.
No cenário atual dos atendimentos realizados, nós temos 755 atendimentos, uma média ali, até o dia 24 de março, de 465 altas que foram identificadas. A maioria dos problemas, nessa região, na Casai, ainda é por conta da desnutrição, pneumonia, malária e doenças diarreicas agudas.
No cenário geral de atendimentos, a Força Nacional do SUS realizou 3.866 atendimentos até o dia 22 de março - portanto, é um dado bem atual. Atendimentos nas demais unidades de saúde: 151 no Hospital Geral, que fica em Boa Vista; 1.773 no Hospital de Campanha que nós temos também ao lado da Casai, que nós implantamos com o apoio da Força Aérea Brasileira; 3.866 nos polos base; e 3.778 no Hospital da Criança, que é ligado à Prefeitura Municipal de Boa Vista.
Bom, dados sobre óbitos.
Pode passar.
Nós temos aqui a ocorrência de 57 óbitos em 2023. Os óbitos são, na maioria, ainda relacionados àquelas causas evitáveis a que eu fiz menção agora há pouco; o Centro de Operações de Emergências é essencial para o fortalecimento da melhoria do fluxo de comunicação para a qualificação. E aqui eu rendo as minhas homenagens a todos os integrantes do Centro de Operações de Emergências e rendo as minhas homenagens também a todos os indígenas que, infelizmente, perderam as suas vidas por conta da omissão e da negligência do Estado brasileiro.
Bom, algumas informações sobre resgate nutricional na Casai. Nós tivemos 35 profissionais capacitados para fazer essa triagem nutricional; 14 médicos do Programa Mais Médicos, capacitados para a triagem nutricional, já estão atuando naquela região; quatro nutricionistas. Nós estamos fazendo adaptação de suplementação nutricional, inclusive considerando incluir alguns hábitos que são regionais. Nós tivemos a entrega de alimentos, que foi passada aqui pela nossa Presidenta da Funai - não vou me ater a essa informação -; temos dados sobre mercúrio.
Pode ir passando.
Nós fizemos a implantação do Laboratório de Análises de Mercúrio com ajuda de algumas instituições que são parceiras da Sesai, do Ministério da Saúde. Realizamos reunião com lideranças indígenas para pactuar estratégias de vigilância da exposição ao mercúrio, especialmente considerando questões culturais do povo ianomâmi.
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Então, tem que ter muita informação com ele, muita sensibilização, muita educação e saúde para mostrar que é para o bem da própria sociedade de ianomâmi fazer esse tipo de intervenção.
(Soa a campainha.)
O SR. RICARDO WEIBE NASCIMENTO COSTA - Então, vou finalizando dizendo que nós realizamos vídeos explicativos. Estamos fazendo, então, a identificação dessas amostras de cabelo, reforçando a vacinação no território. Nós levamos a Ministra Nísia Trindade para o território.
Temos um cenário... Vou pular essa parte da malária, mas eu queria finalizar, Presidente, Senador Chico Rodrigues, dizendo que essa medida da implantação dos dois hospitais permanentes, um na região de Surucucu e outro na região de Boa Vista, foi uma decisão acertadíssima da Ministra Nísia Trindade, a partir de uma provocação nossa da Sesai, de que, nesse caso ianomâmi, nós precisaríamos ultrapassar, furar a barreira da atenção primária, no caso do território indígena, e levar atenção de média e de alta complexidades também para dentro do território ianomâmi. Não é possível em um território com essa complexidade, com quase dez milhões de hectares, com quase 380 comunidades e com uma população de mais de 30 mil indígenas, a gente ter que ficar levando a toda hora para Boa Vista. Isso onera os cofres públicos, e a gente precisa facilitar, levar mais dignidade para o povo ianomâmi.
(Soa a campainha.)
O SR. RICARDO WEIBE NASCIMENTO COSTA - E nós já estamos na fase de implantação do hospital de campanha naquela região. A inauguração, o início de funcionamento desse hospital será no próximo dia 14, do mês de abril. É uma informação importante, porque nós vamos desafogar a Casai e evitar que os pacientes sejam levados para Boa Vista.
Como meu prazo aqui se esgotou, eu queria agradecer por essa oportunidade e reforçar aqui a parceria com o Ministério da Defesa no caso da logística, que é muito complexa, reforçar a parceria também com o Ministério de Minas e Energia - estamos inclusive ampliando essa ideia do acesso à energia para as unidades de saúde e também para perfuração e funcionamento dos poços subterrâneos que nós estamos realizando naquela região - e com outros ministérios.
Senador, permita-me só mais uma informação, porque foi falado inclusive na rodada anterior da questão do crédito extraordinário. A coordenação nacional foi coordenada, na realidade, pelo Ministério da Casa Civil e tem uma previsão, na realidade, de R$925 milhões para serem aportados para a gente realmente superar essa crise ianomâmi, a partir de uma ligação direta com 198 ações, que foram organizadas em nove eixos, envolvendo uma série de ministérios. Então, a ação é interministerial para a gente superar essa crise sanitária e humanitária no território ianomâmi.
Queria agradecer pela oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Eu quero agradecer a apresentação inicial Dr. Ricardo Weibe, Secretário Especial de Saúde Indígena.
Entendo que a sua abordagem é ampla, geral e irrestrita, no sentido amplo, até porque você mostra com muita transparência, com muita clareza o que está sendo feito, de uma forma positiva, as fragilidades, as demandas... Então, é importante aqui, nesta Comissão, que nós possamos ter de forma fidedigna, assim como os demais participantes têm vindo a esta Comissão e explanado de uma forma muito aberta, muito franca, mostrando, vou repetir, o que está sendo feito positivamente, mas o que deixou de ser feito, porque há todo um contexto de décadas que vem se arrastando em relação especificamente à questão indígena.
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Eu já acompanho isso há aproximadamente 35 anos, desde o início dos meus primeiros mandatos lá pelos idos de 1988 - e já estou no nono mandato -, lá no Estado de Roraima, vendo, com meus próprios olhos, essa senoidal de atendimento, de assistência e também deficiência no sistema para os ianomâmis, que é o povo mais, eu tenho que dizer assim, antigo - vou usar a palavra antiga, porque outro dia eu usei na imprensa o termo "primitivo" e foi uma hecatombe, mas, enfim... Eles precisam, sim, de ação do Estado brasileiro, seja em que governo for, para que possam manter seus usos, costumes, sua cultura, enfim, a sua história, que, na verdade, é o espelho da história brasileira. Nós, na verdade, somos essa sequência do que encontramos aqui em 1500. Então, eles têm que ser preservados.
E alguns, na verdade, mais açodados se manifestam de uma forma inadequada em relação a esse ou àquele tema que diz respeito às comunidades indígenas, que têm que ser respeitadas. São mais de 800 mil indígenas que hoje estão registrados nos dados estatísticos do país, e cada comunidade com as suas especificidades. E os ianomâmis, obviamente, pela sua fragilidade, têm que ser realmente cuidados com mais empenho, com mais presença e com mais eficiência pelo Estado brasileiro.
Eu vou chamar o próximo convidado, Jorge Luiz Rocha Reghini Ramos, Diretor de Programa da Secretaria Executiva do Ministério da Saúde; depois, o Paulo Cesar Basta, da Fiocruz. E, posteriormente, as perguntas que venham a ser realizadas serão respondidas em bloco, concedendo-se cinco minutos a cada um.
Vou passar ao Jorge Luiz Rocha Reghini Ramos, que dispõe de 15 minutos para a sua apresentação.
O SR. JORGE LUIZ ROCHA REGHINI RAMOS (Para expor.) - Bom dia a todos e a todas.
Agradeço, na pessoa do Senador Chico Rodrigues, a oportunidade de estar aqui hoje nesse fórum...
(Soa a campainha.)
O SR. JORGE LUIZ ROCHA REGHINI RAMOS - ... para prestar alguns esclarecimentos adicionais sobre o esforço que tem sido empreendido pelo Governo Federal para o enfrentamento da emergência de saúde pública ianomâmi.
Cabe-me um papel difícil depois de três falas bastante completas - do Marcos, da Presidenta Joenia e do Secretário Weibe - sobre o diagnóstico da situação existente e sobre o conjunto de medidas que já estão em andamento. Então, eu apenas vou complementar e sublinhar algumas questões que já foram abordadas aqui nesta Casa hoje.
O primeiro comentário que eu faço é para salientar a questão transversalidade desse problema. O Secretário Weibe citou aqui um volume de recursos em discussão de R$900 milhões, que abrange não apenas ações do Ministério da Saúde, mas também de diversas outras pastas ministeriais - Defesa, Desenvolvimento Agrário, Desenvolvimento Social, Justiça e Povos Indígenas, dentre outras -, o que expressa que essa não é uma questão estritamente de saúde.
Usando uma metáfora da área de saúde, a gente pode dizer que a emergência por desassistência é o sintoma da doença, que tem causas estruturantes por trás dela. E o enfrentamento dessa situação tem que envolver desde ações que enfrentem esses sintomas, que são as ações mais imediatas de assistência à saúde da população, mas também um conjunto amplo de medidas estruturantes que permitam que, ao longo do tempo, sejam mantidas as devidas condições de vida da população ianomâmi, em específico, mas de todas as populações indígenas de uma maneira mais ampla.
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Os palestrantes anteriores já discorreram bastante também sobre as causas dessa situação. O ponto central, entendo eu, é uma desorganização dos modos de vida dos povos indígenas, que ocorreu com mais intensidade nos últimos anos, comprometendo as condições de alimentação e acesso aos serviços de saúde, o que acabou gerando essa situação inexplicável, inaceitável que a gente vive hoje. Esse é o problema de fundo.
O enfrentamento desse problema precisa abordar um conjunto grande de especificidades da saúde indígena e da oferta de serviço de saúde do território ianomâmi. O Secretário Weibe apresentou aqui que 98% do modal de transporte é aéreo. É muito comum o Ministério da Saúde ser questionado sobre o volume de horas-voo, por exemplo, no atendimento da saúde indígena, e é preciso ter isto em conta: não há como prestar serviços de saúde num território em que 98% do acesso se dá pelo modal aéreo sem o financiamento adequado de meio de transporte que permita a devida prestação desse serviço.
Então temos uma especificidade logística, temos uma especificidade do cuidado do acesso aos próprios médicos, profissionais da saúde que prestam serviços de saúde naquelas localidades, de maneira a se respeitarem os modos de vida, o pensamento, manter o diálogo constante com os povos indígenas que são atendidos e também evitar a proliferação de novas doenças no território. Tudo isso dá um caráter bastante especial a essa missão de enfrentamento que está em curso no território ianomâmi, mais especial ainda do que a situação da saúde indígena, que por si só já exige todo um cuidado diferenciado.
Eu gostaria de, pela Secretaria Executiva do Ministério da Saúde, registrar com toda a ênfase a absoluta prioridade que tem sido dada a essa questão no Governo Federal, no Ministério da Saúde e na Secretaria Executiva do Ministério da Saúde, inclusive. Eu chamo a atenção para a linha do tempo que o Secretário Weibe apresentou, a extrema rapidez com que as providências foram tomadas. Essa atual gestão tomou posse em 1º de janeiro. No dia 4 de janeiro, chegaram ao Ministério da Saúde rumores sobre situações que explicitavam desassistência à população ianomâmi. No dia 15 de janeiro, uma missão exploratória já estava em campo, tanto fazendo diagnóstico da situação sanitária como prestando serviços de saúde emergenciais. Essa missão tinha duração prevista de dez dias, do dia 15 ao dia 25 de janeiro. No dia 20 de janeiro, portanto antes de encerrada a missão exploratória, dada a gravidade da situação, dado o reconhecimento da necessidade de ações emergenciais, foi declarada a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin), por desassistência ao povo ianomâmi, que está em curso hoje, que é o objeto da nossa conversa aqui hoje. Então, eu gostaria de salientar a extrema rapidez e a extrema prioridade que têm sido dadas ao tema.
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Na qualidade de representante da Secretaria Executiva, não me cabe detalhar mais ainda do que o Secretário Weibe já detalhou sobre as ações que estão sendo executadas, que estão em andamento. Cabe registrar o papel que a Secretaria Executiva tem se proposto e tem realizado desde o início da emergência, de coordenação das ações no âmbito do Ministério da Saúde. A Sesai, do Secretário Weibe, coordena o COE, que é um comitê operacional de enfrentamento à emergência; a Secretaria Executiva atua como um facilitador na interlocução com outras unidades do próprio Ministério da Saúde e, muitas vezes, como um facilitador da interlocução com outras unidades do próprio Governo, Ministérios da Defesa, da Justiça, do Desenvolvimento Social, do Desenvolvimento Agrário, dos Povos Indígenas e tantos outros que, como já foi abordado aqui, são essenciais para o enfrentamento dessa emergência.
Nosso papel é garantir os meios necessários ao enfrentamento da emergência de saúde pública. Como meios, a gente se refere a recursos orçamentários, financeiros, organizacionais e humanos. Então, a gente tem atuado no sentido de que a disponibilidade de recursos não seja, de forma alguma, um entrave, um impedimento ou um dificultador do enfrentamento da situação ianomâmi. De fato, como já foi citado aqui, está em discussão um crédito extraordinário. A parcela do Ministério da Saúde seria da ordem de R$190 milhões nesse crédito, mas, independentemente do crédito extraordinário, todo recurso necessário para o enfrentamento da emergência está sendo disponibilizado. Temos a vantagem de estarmos no início do ano, então, temos o orçamento do ano todo a ser executado, e tem sido dada prioridade absoluta à execução das despesas necessárias ao enfrentamento da emergência.
Aproveito aqui para fazer um registro e um agradecimento também a esta Casa. Acho que todos nós acompanhamos a proposta orçamentária para 2023, que, a princípio, encaminhada ao Congresso Nacional, previa apenas cerca de 40% do recurso necessário para o funcionamento da saúde indígena ao longo de 2023. Graças à sensibilidade dos Parlamentares, graças ao esforço da equipe de transição, a aprovação do que foi chamado de PEC da transição foi possível, recompondo esse orçamento para o patamar histórico que ele tem apresentando ao longo dos últimos anos, na casa de R$1 bilhão, de R$1,6 bilhão, o que garante que todas as medidas necessárias neste momento possam ter continuidade. E, ao longo do exercício, vamos discutir as eventuais suplementações orçamentárias necessárias para compensar a despesa adicional gerada.
Por fim, só dialogando um pouco com o tema desta audiência, o tema eram as causas e as ações de curto, médio e longo prazos que estão sendo empreendidas.
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Com relação às causas, isto já foi muito explorado aqui: a questão da relação com os garimpos ilegais, a invasão das terras indígenas e todo o impacto socioambiental que essa situação gera no modo de vida das populações indígenas.
E, sobre as ações que estão em andamento, se me permitem, quero resumir, sempre com o risco de deixar de fora ações que são importantes. Eu destacaria que a ação mais imediata, de curto, curtíssimo prazo, que já está em andamento e já temos indicadores de sucesso, é a prestação de assistência à saúde à população que estava desnutrida e precisando de atenção à saúde. A Ministra Nísia ontem, numa audiência no Tribunal de Contas, citou o número bastante alentador de que, nas últimas duas semanas, não foi registrado nenhum óbito na Casai em Boa Vista e, na última semana, nenhuma remoção de pacientes da Casai para unidades hospitalares, o que mostra que a situação mais aguda, a situação primeira a ser enfrentada tem sido equacionada, o que não diminui em nada o tamanho dos desafios que a gente tem pela frente para a adequação da atenção à saúde indígena no território ianomâmi.
No médio prazo, a gente vai ter que enfrentar a busca de soluções mais estruturantes para a provisão de pessoal, para a prestação de serviços de saúde e também de estruturas. Já foi citada aqui a questão das unidades hospitalares, centros de referência e equipamentos que devem ser adaptados à realidade, às necessidades daquela região e da população a ser atendida. Também medidas no campo do saneamento, eu gostaria de ressaltar, para a melhoria da qualidade da água e controle da qualidade da água consumida também são essenciais para a manutenção dos níveis de saúde da população. E, no longo prazo - que não pode ser o longo prazo dos economistas, quando todos vamos estar mortos, tem que ser um longo prazo mais breve -, é esperado que o conjunto de ações não só executadas pelo Ministério da Saúde, mas pelo conjunto do Poder Executivo Federal venham surtir efeitos, desmontando o conjunto de causas que geraram essa situação aguda que implicou a emergência de saúde pública de importância nacional que estamos enfrentando.
Então, são essas as minhas palavras, apenas recuperando um pouco do que já havia sido dito antes.
Fico à disposição, depois, para as perguntas.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Quero agradecer aqui a apresentação do Jorge Luiz Rocha Reghini Ramos, Diretor de Programa da Secretaria-Executiva do Ministério da Saúde, que demonstra exatamente essa ação coordenada que vem sendo realizada.
Uma observação apenas que eu farei é exatamente para que haja solução de continuidade após esse momento crítico que se viveu nesses últimos 90 dias, porque, como já disse quando falava sobre a apresentação do Ricardo Weibe, o grande problema dos ianomâmis, que eu acompanho há 35 anos aproximadamente, é exatamente a solução de continuidade. Faz-se uma operação, uma ação, uma assistência em bloco, e depois vai realmente diminuindo a presença do Estado, o controle, o acompanhamento, a fiscalização, etc., e aí volta tudo como era antes. Então, nós esperamos que hoje, nessa nova formatação, inclusive com a criação do ministério dos povos originários, este venha realmente a ser um ministério que vá ter igualdade de discussão com os demais ministérios e possa, sim, cobrar para que todas essas ações sejam permanentes.
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Eu quero aqui fazer o registro, com muita alegria, da presença da Deputada Célia Xakriabá, que tem participado dessas sessões, de algumas sessões aqui da Comissão Externa. Posteriormente à apresentação do Paulo Cesar Basta, eu passarei a palavra para ela também, para suas manifestações. Ela conhece, tem essa sensibilidade crítica sobre esse problema e este momento especificamente. E aí nós estamos falando dos povos ianomâmis, não das demais etnias. Isso será muito importante para o Relator na formatação final desse relatório.
Eu passo a palavra ao Paulo Cesar Basta, Pesquisador Titular da Escola Nacional de Saúde da Fundação Oswaldo Cruz, a nossa querida e honrada Fiocruz, que tem trabalhos brilhantes e relevantes prestados à sociedade brasileira.
V. Sa. dispõe de 15 minutos para sua apresentação.
O SR. PAULO CESAR BASTA (Para expor.) - Boa tarde a todas e a todos os presentes.
Quero agradecer o convite para participar desta audiência pública, cumprimentar todos os Parlamentares na pessoa do Senador Chico Rodrigues, cumprimentar o Secretário Ricardo Weibe, a Deputada Célia Xakriabá, todos os povos indígenas do Brasil, o colega do Ministério da Saúde e todos os demais participantes.
Bem, eu sou médico de formação, sou pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública e trabalho com povos indígenas há 25 anos. Comecei minha trajetória no Estado de Roraima, trabalhando com o povo ianomâmi, e depois trabalhei, no Dsei-Leste de Roraima, também com os povos macuxi e wapichana, enfim. De lá, eu posteriormente migrei para o Rio de Janeiro para fazer carreira acadêmica e, desde então, eu me dedico à temática da saúde indígena.
Hoje eu vim aqui compartilhar com vocês um pouco dessa experiência de trabalho acumulada ao longo dos anos e pensei em fazer um preâmbulo - pode passar os eslaides lentamente -, uma introdução falando sobre o garimpo efetivamente, fazer uma análise preliminar sobre essa questão do garimpo e, em seguida, falar sobre alguns indicadores decorrentes da presença ostensiva de garimpos ilegais em territórios indígenas, do uso indiscriminado do mercúrio e dos efeitos nefastos à saúde da população local. Por fim, vou tentar finalizar com algumas recomendações, se o tempo permitir.
Bem, eu começo dizendo que a atividade garimpeira no Brasil é uma atividade legal. Isto é importante ficar claro para todos: é uma atividade regulamentada pela legislação nacional, pela Lei 7.805, de 1989. É uma lei antiga, mas que ainda está em vigor e que faz menção a um órgão que já foi extinto, o Departamento Nacional de Produção Mineral, que virou Agência Nacional de Mineração. Basicamente, essa legislação é pautada na outorga de permissão de lavra garimpeira e dispõe sobre o licenciamento ambiental. Então, eu trago essa legislação só para lembrar isto: que o garimpo é uma atividade legalizada desde que cumpra todo esse escopo da legislação e trate também de licenciamento ambiental.
Próximo, por favor.
Mais um.
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Tem uma série de artigos, dentro dessa legislação, que fala sobre a importância do licenciamento ambiental, mas eu destaco esse art. 23, que diz que a permissão da lavra garimpeira de que trata essa lei não se aplica a terras indígenas. Então esse grifo é importante para dizer que qualquer atividade hoje existente em territórios indígenas ou em outras terras da União é considerada um ilícito ambiental. Enquanto a Constituição Federal não... melhor dizendo, enquanto o Parlamento, tanto a Câmara quanto o Senado, não fizer uma regulamentação dessa atividade, ela fere o dispositivo do art. 231 da Constituição e é considerada um crime.
Próximo, por favor.
Então, para ilustrar essa temática, eu trago aqui um levantamento feito pelo Instituto Igarapé, que fala do ecossistema do crime ambiental na Amazônia. Esse documento aponta alguns ilícitos sobre toda a Amazônia Legal, no qual se incluem desmatamento, grilagem de terras, extração ilegal de madeira, agropecuária com passivo ambiental e, especificamente, a mineração.
Próximo.
Aqui se faz uma abordagem por estados, por unidades federativas, e eu vou focar o Estado de Roraima: aponta-se que praticamente 90% dos crimes ambientais que incidem sobre o Estado de Roraima são decorrentes do garimpo.
Próximo.
Esse gráfico mostra uma evolução dos crimes ambientais sobre a Amazônia Legal, de 2010 a 2022, mostrando claramente uma expansão nos últimos anos de todos os ilícitos; e, na linha marrom, em cima do gráfico, vê-se que a maior expansão dos crimes ambientais sobre a Amazônia é decorrente do garimpo.
Próximo.
Essa árvore, vamos dizer assim, mostra que, associado ao crime... O garimpo por si só já é um crime, um ilícito ambiental, mas traz junto com ele uma série de outras ilicitudes, que incluem lavagem de dinheiro, tráfico de armas, de drogas, de pessoas, corrupção. Há uma sequência de atividades ilegais vinculadas ao garimpo.
Próximo.
Quanto ao mercúrio, eu costumo dizer que o mercúrio está na ponta do iceberg. Ele é só a ponta do problema. Está na mão do garimpeiro, está na mídia, está na boca das pessoas, mas, embaixo do mercúrio, tem uma série de outros problemas que já foi muito bem pontuada aqui tanto pelo Weibe quanto pela Joenia.
O mercúrio é um elemento químico natural, presente na crosta terrestre, no planeta terra. Ele está descrito na tabela periódica dos elementos nessa posição rosa do meio da tabela, que se chama metais em transição. Isso significa que ele pode se apresentar de diferentes formas na natureza. E, à esquerda do gráfico, a gente mostra o mercúrio metálico, que são as bolinhas cinzas, também chamado de azougue, ou prata líquida, que é o mercúrio utilizado pelo garimpeiro; as bolinhas azuis são o mercúrio iônico, que ganha cargas elétricas e se desloca por diferentes compartimentos ambientais na natureza; e as bolinhas vermelhas são mercúrio orgânico, também chamado de metilmercúrio, que já foi citado pela Deputada Joenia.
O próximo, por favor.
Esse infográfico traz a seguinte pergunta: por que o mercúrio do garimpo representa um risco para as pessoas que não praticam essa atividade e que, muitas vezes, são contrárias a ela? Então, a gente começa ilustrando esse gráfico com a figura do garimpeiro na bateia. O garimpeiro utiliza o mercúrio, a prata líquida, porque o mercúrio forma ligas metálicas com diferentes metais. Ele gruda, forma um amálgama com diferentes metais, sobretudo com o ouro e com a prata, então facilita a vida do garimpeiro na hora de identificar o ouro num sedimento, num pedaço de rocha, no fundo do leito do rio. É por isso que é utilizado amplamente o mercúrio.
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Então o mercúrio gruda no ouro, facilita a identificação, só que, na hora de vender o ouro, o garimpeiro não pode vender o ouro amalgamado, porque ele perde o valor de mercado. Então ele precisa queimar esse ouro. E, nesse processo de queima, ele esquenta na boca do fogão, no maçarico, de qualquer modo, e isso vira vapor, esse mercúrio vira uma fumaça. Essa fumaça pode ser inalada pelo garimpeiro ou por quem estiver do lado assistindo ao procedimento - se fizer em casa, pela esposa, pelos filhos -, e essa fumaça pode provocar lesões químicas dentro do pulmão ou pode ser absorvida pela corrente sanguínea, distribuir-se pelo corpo e causar danos, em particular, para o próprio trabalhador do garimpo.
E o que não é inalado sobe para a atmosfera e vai se juntar às nuvens, vai virar mercúrio iônico e pode navegar, se precipitado em formato de chuva, em diferentes regiões da Amazônia, do Brasil ou pode entrar nos rios voadores e circular pelo planeta.
Voltando à figura do garimpeiro, como essa atividade é ilegal, não cumpre legislação ambiental, trabalhista, de seguridade social, de saúde, nada, então é uma atividade rudimentar. Há estimativas de que, para cada quilo de ouro que o garimpeiro encontra, ele utiliza de dois a oito quilos de mercúrio excedentes. Então o que grudou no ouro facilitou a vida dele, e o que é excedente é liberado no leito do rio.
Esse mercúrio metálico liberado no leito do rio desce ao fundo do leito do rio, vai lá, se mistura com sedimento, junta-se com micro-organismos, e algumas bactérias transformam esse mercúrio metálico, o azougue, no mercúrio orgânico. Esse mercúrio ganha radicais, moléculas de carbono e se transforma no mercúrio orgânico, e o mais conhecido, o agente mais tóxico para as populações tradicionais é o metilmercúrio. Ele é tóxico por quê? Porque ele vai ingressar na cadeia trófica alimentar. Então ele vai afetar todos os seres vivos que moram no rio, desde algas, larvas de insetos, pequenos crustáceos, jacaré, tracajá, diferentes espécies de peixes, e vai se fixar no tecido muscular do pescado, exatamente na carne do peixe, naquela parte que a gente usa para a nossa alimentação.
E o povo tradicional, que tem o hábito de comer peixes com muita frequência, vai se alimentar de um pescado contaminado. Então, à medida que a pessoa ingere o pescado, vão ser absorvidos os nutrientes desse alimento, mas junto com os nutrientes vai ingressar o metilmercúrio. O metilmercúrio cai na corrente sanguínea, vai ser distribuído pelo corpo todo e vai se fixar em diferentes órgãos e sistemas, e, à medida que vai se acumulando nesses órgãos e sistemas, ele vai provocando lesões, e essas lesões vão ser manifestadas por intermédios de sinais e sintomas.
O principal órgão afetado é o sistema nervoso central. Então, em adultos, vai provocar lesões cognitivas, lesões motoras e lesões sensitivas, tanto em adultos quanto em crianças. Os adultos vão ter tremores nas mãos, vão ter fraqueza nos pés, dificuldade de segurar um copo, de segurar um talher, vão ter problemas relacionados ao equilíbrio, podem ter problemas de visão, de audição, ter um gosto metálico na boca, ter problemas de dor de cabeça, labilidade de humor, insônia. Então são vários sintomas que podem se confundir com outras doenças, e isso dificulta a identificação do processo de contaminação. Além disso, pode causar também problemas relacionados à hipertensão, aumenta as chances de ter infarto, pode afetar os rins. Enfim, o mercúrio tem uma série de desdobramentos no corpo humano. E ele é particularmente nocivo para mulheres e gestantes, porque, se a mulher está gestante e come o peixe, à medida que o mercúrio é absorvido pela corrente sanguínea ele passa, por intermédio da placenta, para o feto e vai afetar esse bebê que está em formação no ventre da mãe. E há estudos que informam que a concentração de mercúrio no cérebro da criança chega a ser de cinco a sete vezes maior do que no cérebro da mãe adulta.
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O próximo, por favor.
Bem, esse outro eslaide mostra um estudo recente que mapeia as principais áreas da Amazônia, as terras indígenas da Amazônia afetadas pelo garimpo, não é? Então, a gente tem ali, à esquerda do mapa, a cor de areia, que seriam as terras indígenas da Amazônia Legal. Em vermelho, a terra mais afetada, que é a Terra Indígena Kayapó; em segundo lugar, a Terra Indígena Munduruku, que está em amarelo, as duas no Pará. E, no extremo norte do país, lá em Roraima, a Terra Indígena Yanomami.
A direita nos gráficos mostra notificações do avanço do garimpo sobre a Amazônia no período de 1985 a 2020. O gráfico de cima mostra a Amazônia como um todo; e os gráficos de baixo, o "a", Terra Kayapó; o "b", Munduruku; e o "c" é a Yanomami. Então, além do fenômeno, do fato de todas as três terras estarem impactadas pelo garimpo, o que chama atenção da gente é que, a partir de 2016, há um incremento vertiginoso nessas atividades que vão ter o pico lá em 2019 e 2020, não é? E nós sabemos as razões desse incremento.
O próximo, por favor.
Focando no caso ianomâmi, não é? Então, aqui trago também, mais uma vez, um mapa da Terra Indígena Yanomami para mostrar duas coisas basicamente: primeiro, que o povo indígena ianomâmi também não é único, não é? A gente falou aqui que existem mais de 300 etnias indígenas diferentes no Brasil, 300 povos. E ainda, dentro de um mesmo povo, existem subgrupos. Então, dentro da Terra Indígena Yanomami existem seis subgrupos que falam línguas mutuamente inteligíveis, mas que têm origens particulares, que se distribuem ao longo desse território.
Além desses seis grupos já identificados, existe um grupo, o moxihatëtëa, que é isolado, como foi mencionado. E tem também o povo indígena iecuana, que divide o espaço territorial com eles, não é? Então, isso mostra a complexidade desse território, a riqueza desse tecido social e cultural que está presente na região.
E no mapa...
Volte ali, por favor. Isso.
No mapa ali, olhando especificamente o Estado de Roraima, a gente vê uns quadradinhos, uns quadriculados, não é? Esses quadradinhos, esses polígonos no mapa representam requerimentos de permissão de lavra garimpeira protocolados na Agência Nacional de Mineração. Então, isso significa que todas as pessoas que fizeram esses requerimentos estão aguardando a regulamentação por parte do Congresso Nacional para transformar uma atividade ilegal numa atividade legal, tá?
Mas, independentemente disso, também queria destacar no mapa em amarelo esses pontos, essas linhas em amarelo. Elas mostram as áreas que hoje - melhor dizendo, esse mapa é de 2020 -, as áreas que em 2020 já estavam impactadas pelo garimpo. Então, a calha do Rio Uraricoera, principalmente lá no extremo norte do Estado de Roraima, e a calha do Rio Mucajaí, do Couto Magalhães, do Rio Apiaú, mais no centro do estado, ali perto da divisa com o Amazonas.
O próximo, por favor.
Bom, eu trago aqui alguns, agora, documentos históricos, não é? Esse documento foi publicado em 1991 e avaliou 162 indígenas ianomâmis que estavam internados na Casai de Boa Vista, no final dos anos 80, quando houve a primeira corrida do ouro. E, naquele momento, esses autores já identificavam a presença de contaminação nas amostras de cabelo que foram avaliadas. Tá?
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO CESAR BASTA - Então, destacando ali...
Senador Chico Rodrigues, o senhor me concede um tempinho adicional?
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Concedo mais cinco minutos.
O SR. PAULO CESAR BASTA - Obrigado.
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Bom, então, ali mostrando as áreas, à esquerda na tabela, de que as pessoas que estavam na Casai eram provenientes, chama atenção da gente que a área do Surucucu, a área do Papiú, áreas que estão hoje invadidas, já vinham sendo invadidas há pelo menos 30 anos. Esse problema está se "cronificando" dentro do território.
O próximo, por favor.
Esse estudo é um pouco mais recente, foi publicado em 2003, mas trata de dados na região do Catrimani, um pouco ao sul da Terra Indígena Yanomami. Foram avaliadas ali oito aldeias, cinco no ano de 1994 e mais três no ano de 1995. Dessa vez, os autores utilizaram como biomarcador de exposição ao mercúrio amostras de sangue em vez de cabelo, mas, na coluna da direita, em que está o destaque do eslaide, também já se apontam ali os altos níveis de mercúrio nas amostras de sangue, naquele momento nos anos 90.
O próximo, por favor.
Davi Kopenawa, como um grande xamã, um grande líder, um visionário, já percebia que a crise sanitária se agravaria à medida que o garimpo se expandisse no seu território. E, em 2013, ele escreveu essa carta para mim lá na Fiocruz, pedindo ajuda da nossa instituição para estudar três áreas específicas.
Pode passar para o próximo.
Baseados nesse pedido do Davi Kopenawa, nós nos organizamos internamente. A partir daí, foi criado um grupo de pesquisa chamado Ambiente, Diversidade e Saúde, do qual sou coordenador, junto com a colega Sandra Hacon, do departamento. Em dezembro de 2014, fomos às três áreas indicadas pelo Davi; na época, visitamos 19 aldeias, avaliamos 239 pessoas, principalmente mulheres e crianças, e já identificamos, por intermédio das amostras de cabelo, que os níveis de contaminação eram bastante elevados.
Na área do Rio Uraricoera, em que, naquela época, estava voltando o garimpo, estava começando o afluxo de garimpeiros, mais de 90% das pessoas avaliadas apresentaram níveis elevados de contaminação. Por outro lado...
Pode passar para o próximo eslaide.
Ali, a gente tem, lá em cima, no extremo norte, na calha do Rio Uraricoera, a comunidade de Aracaçá, que foi mencionada aqui pela Deputada Joenia. Naquela época, já estava sofrendo os impactos do garimpo. E, no ano passado, houve toda essa comoção, denúncias, foi criada essa Comissão Externa na Câmara, para investigar, mas esse problema começou lá atrás. Não é?
Logo abaixo, a comunidade de Ye'kwana, também com quase 30% das pessoas com altos níveis de contaminação, e, no centro da terra indígena, há o destaque para a região de Papiú, que foi muito afetada na primeira corrida do ouro, na década de 80. Em 2014, não havia atividade garimpeira. Ainda assim, após 20 anos da interrupção da atividade garimpeira naquela região, quase 7% das pessoas tinham níveis elevados de mercúrio, mostrando a permanência desse metal no ambiente, contaminando os peixes e contaminando as pessoas. Esse é o dado mais importante.
O próximo, por favor.
As mulheres iecuanas foram avaliadas. Aqui, a gente tem amostra de oito cabelos de mulheres, cabelos longos, com 20cm, 30cm de extensão, e a gente fez uma análise sequencial. Estima-se que o cabelo cresce a uma velocidade de 1,5cm, 2cm por mês. Então, pegando um cabelo longo, você faz uma análise sequencial e pode entender o que aconteceu retrospectivamente. Esse gráfico mostra que, no período anterior de 12 meses às coletas de dados, os níveis de mercúrio se mantêm elevados ao longo do ano inteiro e ficam mais altos ainda na época da estação seca, em que o rio diminuiu o nível e fica mais fácil a captura do pescado. Portanto, as pessoas consomem mais peixes contaminados e os níveis de contaminação aumentam ainda mais.
(Soa a campainha.)
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Concluindo. Todo esse trabalho mais recente compôs um relatório técnico que foi amplamente divulgado aqui em Brasília em 2016. Representantes da Hutukara, do Instituto Socioambiental e da Fiocruz montaram uma caravana e entregaram esse documento na Sesai - na época, o Secretário era o Antônio Alves -, na Presidência da Funai, na Presidência do Ibama, na 6ª Câmara da Procuradoria-Geral da República. E, lá em cima, a foto de cima ilustra o Davi Kopenawa entregando esse documento à Dra. Victoria Tauli-Corpuz, que, na época era representante dos povos indígenas na ONU. Então, desde esse tempo, em 2016, a gente vem alertando a sociedade, a gente vem fazendo reuniões com as autoridades públicas, com as lideranças indígenas, com o movimento indígena, apontando para a necessidade de interrupção dessa atividade nas terras indígenas, sobretudo na Terra Yanomami; a necessidade de interromper o uso do mercúrio. Então, a gente vem acumulando evidências científicas desse problema.
O próximo.
Eu trouxe aqui alguns dados complementares, mas eu acho que o tempo não vai permitir que eu fale. Recentemente, nós fizemos um estudo no Estado de Roraima, no qual nós coletamos 75 amostras de pescados diretamente das mãos dos pescadores, pescados que seriam vendidos em feiras livres, nos mercados da capital de Boa Vista, dos Municípios de Mucajaí, de Amajari, enfim do Estado de Roraima como um todo. Então, essa imagem é para ilustrar que todos os seres vivos que se alimentam de peixes - não só os seres humanos, mas qualquer outro animal que se alimente de pescado contaminado - também estão sujeitos a ter problemas de saúde, a desenvolver uma série de doenças e agravos e a poder evoluir à morte.
E, rapidamente, pode passar o próximo.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO CESAR BASTA - Só para mostrar então os pontos que foram mostrados aí no Estado de Roraima, no Rio Branco, no Baixo Rio Branco, lá perto do Município de Mucajaí. Depois, na saída da foz do Rio Mucajaí, onde ele encontra o Rio Branco; depois, da cidade de Boa Vista; e o ponto 4, lá em cima, no Município de Amajari, no Rio Uraricoera, que é o principal rio que vem da Terra Indígena Yanomami.
Mais um eslaide, por favor.
Então, a gente coletou 75 amostras de peixes dessas regiões, que estão divididas em 20 espécies diferentes dos 4 níveis tróficos possíveis, e todos eles foram encaminhados para o laboratório do Instituto Evandro Chagas, em Belém do Pará, que é uma referência nacional que trata dessa temática da contaminação por mercúrio. E as amostras revelaram que em todos os peixes, sem exceção, tinham níveis de contaminação, e esses níveis variavam de acordo com o nível trófico do pescado. Então, já se sabe que os peixes maiores e os peixes carnívoros acumulam quantidades maiores de mercúrio no seu corpo.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO CESAR BASTA - Com isso, à medida que esse consumo vai aumentando - eu vou concluir -, as pessoas que se alimentam desse pescado podem ter riscos importantes para a sua saúde.
E a mensagem final desse último trabalho é que o problema não está restrito aos territórios indígenas. Não é só o povo ianomâmi que está sendo contaminado, está sendo impactado pelas atividades garimpeiras. O peixe que está lá em cima - o mercúrio desce e chega aqui embaixo - está sendo vendido nos mercados e feiras livres do Estado de Roraima, e todo cidadão amazônida que consome, tem o hábito de consumir regularmente pescado, pode estar sujeito aos efeitos da contaminação por mercúrio.
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Então, essa é a principal mensagem desse estudo final.
Enfim, eu vou parar por aqui e fico à disposição para tirar dúvidas das pessoas que quiserem informações adicionais.
Obrigado, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Quero agradecer ao Dr. Paulo César Basta, Pesquisador da Fiocruz, pelo trabalho que acaba de apresentar aqui, com precisão científica, muito positiva, muito importante para esse esclarecimento.
Todo esse trabalho pode ser entregue, depois, à assessoria da Comissão, para que o Relator possa se debruçar sobre ele e incluí-lo no seu relatório final, para apreciação do conjunto dos Senadores da Comissão e aprovação a posteriori, para apresentarmos ao Poder Executivo.
Continuando a 7ª Reunião, com a participação dos convidados, eu vou passar a palavra à Deputada Célia Xakriabá, que fará a sua manifestação.
A SRA. CÉLIA XAKRIABÁ (PSOL - MG. Para expor.) - Obrigada, Sr. Presidente.
Obrigada, Sr. Secretário de Saúde Weibe Tapeba, que tratou também dessa responsabilidade da situação ianomâmi. Eu fui a primeira Parlamentar a estar no território a convite do Secretário de Saúde, acompanhando toda a situação, porque nós povos indígenas temos tratado isso de maneira transversal. Quanto à saúde também, a Dra. Ana tem sido uma parceira da Fiocruz, assim como o Jorge Luiz também no compromisso com o Ministério da Educação.
Antes de estar aqui, eu vinha acompanhando. Eu estava em outra agenda, mas acompanhei algumas indagações sobre o porquê de, agora, enquanto o Ministério dos Povos Indígenas tem uma representante dos povos indígenas, a Funai, depois de 55 anos, tem uma representante dos povos indígenas, e o Sr. Weibe Tapeba...
Mas é preciso lembrar a responsabilidade de outros indígenas que passaram por ali nos quatro anos, nessa responsabilidade de tratar sobre essa responsabilização.
Atenho-me a essa situação, porque eu sempre digo: vocês acham que, se não fosse um Ministério dos Povos Indígenas conduzido por uma Ministra dos Povos Indígenas, a Secretaria de Saúde sendo conduzida por um indígena, que tem compromisso, a Funai sendo conduzida, Parlamentares conduzindo, teria essa situação de emergência como teve? - com essa comitiva no território ianomâmi. Teria todo esse engajamento para tratar de maneira emergencial? Teria toda essa situação para se dedicar à apuração do genocídio? - cuja palavra ninguém gosta de escutar, mas foi um genocídio programado quando existiu também negligência.
Atenho-me a isso porque eu quero tratar de uma questão que tem sido muito polêmica, e ninguém quer falar sobre esta situação, mas, todas as vezes, em outras reuniões - esta é a sétima -, tenho falado do infanticídio para criminalizar a população ianomâmi.
É preciso dizer que, nesta Comissão, estou aqui hoje não somente como Deputada, mas como Presidente da Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais, onde também foi aprovado um requerimento para tratar dessa situação.
É importante a gente não distrair, não desviar o pensamento. Querem criminalizar as nossas mulheres e as crianças indígenas, mas, ao mesmo tempo, para além de discutir infanticídio, nós temos que ter o compromisso de discutir o genocídio, o suicídio nos territórios indígenas, o etnocídio.
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Nessa apresentação que se coloca aqui, quando se mata um povo, está-se matando o nosso modo de vida. É etnocídio, é a matança da identidade.
Ainda ontem, a ex-Ministra Damares pediu o desarquivamento do PL 119, de 2015, sobre o infanticídio. Não se pode fazer isso sem processo de consulta livre e prévia, informada aos territórios que estão sendo vítimas dessa criminalização. Quando se ouve a palavra "matar", e a palavra "matar" é muito grave, ela precisa ser tratada não só a partir do âmbito penal - penal, jurídico, de lei e de criminalização. A palavra "matar" é muito séria, mas, para nós, povos indígenas, também é sério quando a gente escuta "matar um rio", matar 70% das crianças que estão com vida contaminadas pelo mercúrio. A palavra "matar" é muito séria, e eu quero me ater a, mais uma vez, dizer: nós também achamos que é crime, embora não esteja no Código Penal, quando se mata um rio, é ecocídio. Então, é preciso se ater também aos processos que têm sido desviados aqui para criminalizar também a nossa população indígena.
Quero ainda pedir que o Secretário de Saúde... Porque, quando nós fomos ao território ianomâmi, se falava do investimento de 2 bilhões, e ninguém quer falar sobre onde foram investidos os 2 bilhões, querem tratar muito mais do que aconteceu nesses poucos dias, da conduta do Secretário de Saúde Indígena. Ninguém quer falar da responsabilização do que existiu, dos 4 bilhões.
E, ainda, no relatório elaborado pela Comissão de Direitos Humanos, que trata também da violação da situação do povo ianomâmi, foi apresentado que a ex-Ministra relatou positivamente à Comissão Interamericana de Direitos Humanos o conteúdo do Projeto de Lei 191, de 2020...
(Soa a campainha.)
A SRA. CÉLIA XAKRIABÁ (Bloco/PSOL - MG) - Mais um tempo, Sr. Presidente.
... que propunha a legalização da atividade de garimpo. Ela sugeriu a aprovação pelo Congresso Nacional, a legalização do garimpo, que é exatamente a causa morte, o que intensificou a mortalidade e a desnutrição no território ianomâmi.
Então, é preciso aqui, mais uma vez, me ater ao que eu já falei da outra vez nesta Comissão tão importante, Sr. Presidente: quando se trata de vida, sobretudo de vida do povo ianomâmi, quem é que não se sensibilizou? Eu estive com o Secretário. Até os policiais choravam - o Secretário me contava - quando se carregava uma criança ianomâmi queimando de febre por malária. Aqui não se trata de questões partidárias, porque as pessoas que não se sensibilizam com causa morte por fome e desnutrição do povo ianomâmi não se tratam de inimigo, de adversário político; são adversárias humanitárias.
Para concluir, nós precisamos também, nesta Comissão, e eu vejo pouco falar disso, de tratar da situação, dos casos subnotificados de mais de 30 meninas grávidas de garimpeiros, que é a violência sexual. Querem falar de infanticídio? Vamos falar de violência sexual que foi ocasionada também por essa violência ao território e pela matança, pelo "de comer" e pelo "de beber" do povo ianomâmi.
Falou-se aqui também de recurso - Sr. Presidente, eu não estava aqui -, da importância de os Parlamentares também se sensibilizarem e enviarem emendas para essa situação, porque, como é de conhecimento, o Secretário Weibe Tapeba já falou que, se continuar dessa maneira, até o meio do ano, a saúde vai entrar em colapso com o Orçamento aprovado e vigente para este ano. Para isso, nós já elaboramos uma carta a ser enviada para 200 Parlamentares, sensibilizando para o envio de emenda parlamentar para a saúde indígena, para a Funai e para o Ministério dos Povos Indígenas. Também enviamos ainda ontem, protocolamos ontem, uma emenda à medida provisória ao Ministério da Saúde para que se garanta que 5% das vagas do Mais Médicos também sejam direcionadas para os DSEIs. Eu sei que lá no território ianomâmi já chegou o Mais Médicos.
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E quero dizer, para finalizar, que nós estamos aqui lutando para combater as diversas mortes. Nós queremos matar é a fome, nós queremos matar é a violência, mas nós não queremos matar os direitos. Quando se fala de infanticídio, nós não temos medo da Justiça, nós temos medo é da injustiça. Portanto, é muito importante se ater aqui a isto: se se quer falar de infanticídio, vamos também tratar, acionar o art. 231 da Constituição, que fala da proteção dos territórios indígenas. Não podemos fazer um debate nas costas do povo ianomâmi, sem a participação dos povos ianomâmis, de lideranças ianomâmis, sobretudo de mulheres ianomâmis, porque as nossas vidas importam.
Para finalizar, a situação do povo ianomâmi não é somente uma situação localizada no Estado de Roraima, porque me assustou bastante, na reunião passada, quando se disse que o problema do povo ianomâmi só ele vai resolver. Um povo que morre de fome não tem força para lutar. Por isso é importante o engajamento, o compromisso de toda a sociedade, mas, sobretudo, do Senado, do Congresso Nacional e do Executivo nessas tratativas tão importantes, porque, diante de algo que assolou, que comoveu o mundo, esta Casa também não pode ficar omissa e tratar a justiça pela metade.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Muito obrigado, nobre Deputada Célia Xakriabá, pela sua participação. Você conhece o âmago dessas questões, que são questões recorrentes nesse cenário a que nós temos assistido nos últimos meses.
Paralelamente, uma coisa que causa alento são as providências que começam a gestar no sentido de que se possa, de forma efetiva e permanente, resolver esse problema, porque aí é uma questão de Estado, não um problema de Governo. Então, o Estado brasileiro tem toda responsabilidade no sentido de implementar políticas públicas que possam mitigar todas essas situações que ocorreram e que não se repetirão se o Estado estiver presente.
Para lidar com o caráter emergencial da crise humanitária, o que seria preciso fazer para melhorar, o mais rápido possível, o perfil nutricional e alimentar das comunidades indígenas afetadas pelo garimpo, como tem sido discutido aqui, eu gostaria que os três convidados - o Ricardo Weibe, o Jorge Luiz e o Paulo Cesar - pudessem responder a essas indagações que eu vou fazer de uma forma até mais ampla. A primeira é: qual seria esse perfil nutricional, alimentar? Vejam bem, eu pude constatar - e deixei exatamente para a apresentação, para quando viessem os representantes do Ministério da Saúde - que as cestas básicas que estão sendo distribuídas aos ianomâmis contêm sardinha em lata, carne seca, jabá, arroz, feijão, farinha, leite, enfim. V. Sas. consideram adequada, em termos nutricionais, a distribuição desses alimentos para a cultura alimentar dos ianomâmis? Essa é uma pergunta.
Esses alimentos contêm os nutrientes necessários para auxiliar o tratamento da desnutrição que essa etnia tem enfrentado de uma forma tão perversa? Que outros alimentos seriam importantes para atender a essa demanda e, obviamente, fazer uma recomposição orgânica dos índios ianomâmis, que hoje vivem submetidos a essa desnutrição quase extrema?
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Então, essas eram as perguntas que eu gostaria de deixar aqui para vocês três responderem, porque isso me chamou muito a atenção quando estive na área conversando com algumas pessoas em Boa Vista, na Conab, que prepara as cestas básicas, porque eles diziam para mim que muitos daqueles alimentos que vão na cesta básica o índio não usa, ele simplesmente descarta. Não há um planejamento, uma planificação para atender a esse ponto especificamente de alimentos que tenham um poder de nutrição de resposta mais rápida orgânica?
Quem gostaria de falar?
Ricardo Weibe, com a palavra.
O SR. RICARDO WEIBE NASCIMENTO COSTA (Para expor.) - Bom, primeiro, também quero parabenizar pela presença a nossa Deputada Federal Célia Xakriabá, que abrilhanta esta audiência pública. Ela traz informações que corroboram com a visão da Secretaria Especial de Saúde Indígena. Inclusive, nós estamos aqui operando, como foi colocado, um orçamento que foi planejado ainda na gestão passada, e nós entendemos que a saúde indígena, pelo conjunto da sua complexidade, precisa de muito mais recursos. A saúde indígena, de fato, é cara, requer muito mais investimento, porque ela acontece num cenário de muita complexidade, dificuldade de acesso, são territórios, realmente, como foi colocado aqui, no caso ianomâmi, de modal aéreo. Isso, de fato, encarece a nossa operação, mas a saúde indígena, como política de Estado, precisa chegar a todos os territórios indígenas ocupados por populações indígenas. Eu queria fazer esse registro.
Primeiro, Senador Chico, que preside esta audiência, esta Comissão, coloco inclusive nossa contrariedade. Quando nós começamos a atuar, nós identificamos que tínhamos cerca de 4 mil cestas de alimentos paradas, lá no mês de janeiro ainda, acho que na sede da Funai. Nós identificamos que essas cestas iriam, inclusive, vencer e iriam estragar enquanto o povo ianomâmi passava fome. Por esse tipo de legado, que é um malefício real - enquanto o povo ianomâmi passava fome, tinha 4 mil cestas de alimentos paradas num depósito -, a gente precisa, de fato, apurar responsabilidades.
Evidentemente, quando nós começamos a atuar assegurando uma ampliação da assistência no território ianomâmi, porque a crise foi gerada também por conta da presença dos garimpeiros, da desassistência por conta da falta de profissionais, do fechamento de unidades de saúde, do desabastecimento dessas unidades de saúde, mas, evidentemente, a causa principal era a contaminação das águas dos rios, a desnutrição grave, severa, aguda naquele território, e o estado não estava preparado naquele momento para aquela crise, então, o que foi possível naquele momento, pelos contratos que o estado tinha naquele momento, até porque a emergência sanitária nem tinha sido ainda editada como portaria do Ministério da Saúde, se usou o que tinha.
Evidentemente, com muita responsabilidade, na Sesai, em conjunto com a Funai, nós estabelecemos um novo protocolo e alteramos, inclusive, a composição dessa cesta de alimentos. Então, nós alteramos, aproximando os hábitos alimentares do povo ianomâmi, mudando aquela estrutura de composição das cestas que nós tínhamos. Essa história da sardinha, de algum tipo de outro enlatado, linguiça, que nós tínhamos lá, nós alteramos isso. A sardinha até que, no começo, foi bem absorvida por parte do povo ianomâmi, era o único tipo de nutriente que nós tínhamos ali em condição de ajudar aquela comunidade naquele momento, mas nós alteramos isso. Nós alteramos, fizemos um protocolo a partir de uma indicação do próprio Centro de Operações de Emergência; fizemos uma nota técnica, partilhada entre a Funai e a Sesai, mudando a composição dessa cesta de alimentos. E nós temos discutido inclusive com o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome a necessidade de nós aproveitarmos também a produção local de verduras e legumes que possam chegar a essas comunidades. Evidentemente, há dificuldade, a logística é muito complexa, nós temos dificuldade de armazenamento e também para fazer a entrega desse tipo de alimentação, mas nós incluímos a farinha e a carne seca para que possam chegar no território ianomâmi e a gente consiga superar essa situação da nutrição no território.
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Há, de fato, um plano de nutrição. Ele começou pela Casai. Esse plano tem a presença de profissionais de nutrição, tem a presença de médicos, nós temos nutricionistas. Esse GT pensou inclusive em ter uma abordagem também na adaptação da suplementação nutricional. Nós incluímos, por exemplo, o açaí na composição dessa suplementação para que seja mais bem aceita principalmente pelas nossas crianças ianomâmis.
Evidentemente que a nossa saída desse cenário de desnutrição está muito longe ainda, requer muito esforço. Não baixou ainda o nosso desafio ou risco, mas nós estamos realmente empenhados em superar essa crise com a ajuda dos outros ministérios. Por isso é que o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, dirigido pelo Ministro Wellington Dias, tem sido um parceiro da Sesai e do Ministério da Saúde para pensar nessas alternativas da alimentação específica e também do acesso à água potável para o povo ianomâmi.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - O Jorge Luiz não...
Paulo Cesar. Você é médico, agora vamos apertar você!
O SR. PAULO CESAR BASTA (Para expor.) - Pena o Senador Marcos Pontes não estar aqui também porque ele fez perguntas importantes sobre essa temática e seria importante ele escutar o que a gente tem para dizer.
Eu começo pela pergunta que ele fez: se é possível estabelecer uma relação direta entre a questão da desnutrição e o avanço do garimpo. Para tentar elucidar essa questão, eu digo que a primeira providência do garimpeiro quando entra no território é promover a devastação da cobertura vegetal, a derrubada da floresta, a mudança do curso dos rios, fazer cavas, fazer grandes buracos dentro da área nativa e, com isso, promover uma mudança no ecossistema local. Então, como já foi citado no relatório lido pela Joenia, os animais de grande porte, como a anta, o veado, o caititu e outros animais que são fonte de proteína, que são fonte alimentar para os povos ianomâmi, quando não são diretamente abatidos pelo garimpo, eles são afugentados. Isso faz com que a obtenção desse alimento fique cada vez mais difícil, as pessoas tenham que cobrir distâncias cada vez maiores para ter acesso a essas proteínas naturais.
À medida que o garimpo destrói a cobertura vegetal, ele também diminui a disponibilidade de produtos alimentares que são provenientes da coleta. Por exemplo, a castanha, o açaí, o buriti, a bacaba, os cogumelos, enfim, outros produtos, diversos alimentos que são fruto de coleta e que ajudam a alimentação dos povos indígenas são diretamente comprometidos. Com a expansão do garimpo, as terras agricultáveis que são utilizadas para roça, para as lavouras das famílias e das comunidades também ficam comprometidas. As áreas diminuem sua disponibilidade, e, além disso, essas áreas ficam contaminadas. E, para piorar a situação de uma vez, os garimpeiros contaminam os rios, como foi mencionado, contaminam os peixes, uma das principais fontes de nutrientes para essas populações. Então, esse é um processo de associação direta da presença do garimpo com a escassez de alimentos naturais dentro do território.
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Por outro lado, o garimpo usa duas estratégias de cooptação, de aliciamento das comunidades. A primeira é a promessa, principalmente para homens jovens, de enriquecimento fácil, de acesso ao ouro, de acesso a bens e mercadorias que vêm da cidade, e isso faz com que o garimpo tire esse homem jovem de dentro da comunidade. E o homem jovem dentro da comunidade tem dois papéis importantes. Há uma divisão tradicional do trabalho nas comunidades ianomâmis, no qual o homem vai abrir uma clareira na floresta para que sua esposa vá fazer o roçado, vá fazer a sua lavoura. Depois, a esposa fica responsável pela manutenção da roça, onde são produzidos basicamente carboidratos, como mandioca, inhame, cará, milho, batata-doce, banana, etc., e o homem fica com a função de buscar proteína por intermédio da caça do animal na floresta ou, então, do pescado ou dos produtos de coleta. Como esses produtos estão escassos, eles não vão chegar às famílias. A dupla ação negativa do garimpo é que o homem, que é responsável por esse trabalho, é retirado da sua comunidade, ele é levado para dentro do garimpo, então, ele desguarnece a sua família: ele não vai ter condições de levar, para alimentar sua mulher e seu filho, nenhum tipo de proteína e vai deixar sua família em condições de vulnerabilidade, sujeita à violência sexual, sujeita a diversos abusos e a outros tipos de violações. Aí se fecha um ciclo terrível que compromete diretamente a segurança alimentar nos territórios.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO CESAR BASTA - Essa é a primeira parte da minha resposta. Se o senhor me conceder mais um pedaço, então, para estabelecer essa relação clara entre a presença do garimpo e a insegurança alimentar, a fome e a desnutrição nos territórios...
E, com isso, as pessoas vão adoecendo.
Outras consequências da mudança do ecossistema é que aumenta a população de mosquitos e, com isso, as doenças transmitidas por mosquito aumentam. Eu tinha dados para apresentar da expansão da malária nos territórios ianomâmis ao longo dos últimos anos. É impressionante, de 2007 para 2020, o número de casos de malária falciparum dentro do território ianomâmi aumentou 87 vezes. Então, as pessoas doentes, com febre, consumidas também não têm condições... Como disse a Célia, quem tem fome não tem força para lutar. Então, esse é um problema importante.
E como é que faz para enfrentar esse problema? A desnutrição, assim como praticamente todos os eventos em saúde, é um evento multicausal, é um evento de determinação complexa. Então, para isso, ela requer ações igualmente complexas.
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO CESAR BASTA - Mais uns minutinhos?
A primeira providência que eu costumo citar para enfrentar a desnutrição é garantir a soberania, a segurança e a soberania do território. Então, a desintrusão dos invasores é a primeira providência, mas não é o suficiente, porque o Estado brasileiro tem que garantir que esses invasores não vão retornar para dentro do território. É a partir da desintrusão que vai começar o processo de recuperação dos territórios e de recuperação da sociedade local.
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Enfim, é necessário também, como foi dito aqui pelos colegas que me antecederam, garantir serviços públicos essenciais para essa população. Com a contaminação do ambiente, a contaminação dos rios e dos peixes, as fontes naturais de alimento e as fontes naturais de água não estão mais disponíveis. As comunidades não têm água potável para beber, não têm alimentos em quantidade e qualidade suficiente para manter a sua energia, manter a sua vitalidade. Então, o Estado precisa garantir serviços públicos essenciais, precisa garantir a presença de serviços de saúde. Como foi dito aqui, vários serviços foram desativados, vários postos foram queimados, vários desvios de recursos, de vacinas, de medicamentos... Então, toda criança... Quem é pai ou quem é mãe aqui sabe que uma criança é um ser humano frágil, que precisa fazer um acompanhamento regular, que precisa ter cumprida a sua caderneta de vacina, que precisa ter uma assistência adequada à sua alimentação. Infelizmente, as crianças ianomâmis foram abandonadas pelo Estado brasileiro durante décadas, e esse abandono ganhou seu auge nos últimos quatro anos. Então, o Estado precisa assumir esse papel de ofertar esses serviços públicos essenciais.
Isso também não é suficiente. É preciso que existam projetos de remediação, de recuperação dessas áreas recuperadas. Tem que se fazer reflorestamento das áreas que foram devastadas. Precisa-se pensar, com os engenheiros do Senador Marcos Pontes, em soluções para descontaminação das áreas, descontaminação da terra, descontaminação do rio.
É preciso pensar também, o Estado tem que pensar em projetos de etnodesenvolvimento, no qual as populações indígenas sejam envolvidas desde a concepção dessas propostas ao desenvolvimento dessas propostas, à execução, à avaliação da eficácia dessas propostas e, sobretudo, à repartição dos benefícios que, porventura, sejam oriundos dessas propostas. E essas propostas precisam valorizar as vocações locais, tanto sob o ponto de vista das pessoas que vivem no território como das vocações do ambiente, e não se chegar com pacotes fechados de projetos desenvolvimentistas achando que garimpo é sinônimo de riqueza...
(Soa a campainha.)
O SR. PAULO CESAR BASTA - Muitas vezes, o garimpo é o que perpetua a pobreza e acentua ainda mais as desigualdades em saúde.
E, por fim, Senador, se o senhor me permite, fazendo referência à fala da Deputada Joenia Wapichana, a recuperação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional(Consea), que foi uma das primeiras ações do Governo Lula, a recuperação dos programas de aquisição de alimentos, dos programas da agricultura familiar, dos programas relacionados à cesta básica nas escolas ou à merenda escolar, desculpe, isso tudo tem que ser trabalhado em parceria com a Embrapa, com desenvolvimento de sementes, para poder levar alimentos apropriados à população. E, enquanto isso tudo não acontece, infelizmente, a cesta básica é emergencial, cumpre um papel importante para matar a fome das pessoas. Naturalmente, as cestas precisam ser adequadas às tradições e à realidade local.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Eu gostaria de agradecer... (Pausa.)
A Senadora Damares acaba de chegar. V. Exa. vai querer...
A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar PP/REPUBLICANOS/REPUBLICANOS - DF) - Sim...
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - V. Exa. dispõe de cinco minutos.
A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar PP/REPUBLICANOS/REPUBLICANOS - DF) - Senador, eu sou mulher!
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Seis minutos!
A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar PP/REPUBLICANOS/REPUBLICANOS - DF. Para discursar.) - Eu lamento não ter assistido à apresentação do Secretário Especial de Saúde Indígena, do Dr. Jorge Luiz e do Dr. Paulo, mas eu já conheço o trabalho do senhor e eu prometo que eu vou assistir com muito cuidado depois ao que vocês falaram.
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Esta Comissão quer mesmo não só acompanhar a saída dos garimpeiros, ela começa com um objeto, mas ela ampliou muito o seu leque, para a gente apresentar respostas.
E, nesse sentido, eu queria, com todo o respeito, me dirigir à Deputada que está presente.
(Soa a campainha.)
A SRA. DAMARES ALVES (Bloco Parlamentar PP/REPUBLICANOS/REPUBLICANOS - DF) - Deputada, eu quero muito conversar com a senhora sobre o projeto de lei de que nós pedimos o desarquivamento, um projeto aprovado por um número absurdo de votos na Câmara que chegou ao Senado, já passou por uma Comissão, está aqui desde 2015, amplamente discutido. É um projeto para proteger mulheres indígenas e crianças. Se esse projeto já tivesse sido aprovado, Deputada, talvez a gente não teria tanto para discutir nesta Comissão. Quando esse projeto diz que o Estado é obrigado a cuidar de uma criança desnutrida, é uma redundância, Dr. Paulo? Talvez seja, mas é um projeto que traz para o agente público a obrigação, inclusive, de, se preciso, tirar a mulher vítima de estupro da comunidade, a criança vítima de estupro da comunidade. É um projeto que foi amplamente discutido com os povos, criado pelas mulheres indígenas e leva o nome de uma mulher indígena. Então, Deputada, eu me coloco à inteira disposição para conversar com a senhora, com muito carinho, com muita atenção, e, se precisar, para a gente melhorar o projeto de lei.
Acreditem, eu tenho anos na causa - anos. Eu tenho uma história. E, nos últimos anos, a minha história - Senador, me permita, é um minuto só - tem sido rasgada por um jogo de narrativas. Eu não vou morrer como assassina de índios, de indígenas; eu não vou morrer como genocida. Eu quero a oportunidade de mostrar o trabalho que eu fiz por 30 anos e o trabalho que eu ainda quero muito fazer com os povos.
Com todo o respeito, sou mãe de uma menina indígena. Eu convivo com as comunidades e eu demonstrei isso em três anos em que fui Ministra: um ano cumprindo um PPA que a gente recebe de um Governo anterior, que é o que está acontecendo contigo agora, e dois anos de pandemia. E a política indígena não era a minha responsabilidade. E eu fiz tudo que estava dentro da minha atribuição e, às vezes, extrapolei.
Assim, eu só precisava fazer esse registro, Deputada, porque as redes já estão fervendo de novo com a Senadora assassina. Nesta Comissão, a gente tem Senadores comprometidos com a causa que querem uma resposta.
Muito obrigada por esta oportunidade.
E, Deputada, quero muito conversar contigo, muito mesmo, para a gente, se precisar... Eu não sou autora do projeto, eu participei dessas discussões lá na Câmara e aqui no Senado e quero continuar essa discussão para a gente encontrar caminhos para proteger mulheres e crianças indígenas.
Muito obrigada, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Eu vou conceder dois minutos para V. Exa. se manifestar, por conta do adiantado da hora e também em função do compromisso dos nossos convidados. V. Exa. dispõe de dois minutos.
A SRA. CÉLIA XAKRIABÁ (PSOL - MG) - Vou até concordar com os dois minutos, mas eu poderia dizer: eu sou mulher e sou indígena.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Mais um minuto, então! (Risos.)
A SRA. CÉLIA XAKRIABÁ (PSOL - MG. Para expor.) - No enfrentamento à violência... E os companheiros que estão aqui sabem que nós, além de ser Deputada, somos cofundadora da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas. É muito difícil fazer um debate... Inclusive, nas mulheres indígenas, existe uma diversidade de mulheres indígenas, mais de 305 povos, mais de 274 línguas faladas. E aí, quando fala da violência, nós não somos a favor da violência! Todos os meses, nós enfrentamos, nos posicionamos na questão de violências sexuais, de mulher guarani-caiová que foi queimada viva ano passado, das casas de reza, de crianças...
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Inclusive, hoje, a questão de trocar trabalho por comida é crime, trocar também comida para tentar saciar a fome de meninas que são vítimas do garimpo também é crime. Todas as vezes que tratamos dessas violências, nós tratamos com muita responsabilidade.
Eu vou dizer, agora, à Senadora que disse que quer dialogar: não tenho problema nenhum com dialogar, mas quero dizer que, embora eu não tenha mais de 40 anos na causa, é porque isso, na verdade, não é uma causa; eu sou a causa, nós somos a própria causa. Então, é muito importante dizer que... Eu entrei também com uma proposta, protocolamos um projeto lei para que sei crie o dia 5 de setembro como Dia de Combate à Violência contra as Mulheres Indígenas; entraria com um projeto de lei, mas não entrei não por falta de criatividade; é porque nós mulheres indígenas temos um modo de fazer os processos. Iremos começar esse projeto de lei, a minutar esse projeto de lei, agora na Mobilização Nacional Indígena, com as mulheres indígenas de todo o Brasil, e vamos terminar na Marcha das Mulheres Indígenas, que será em setembro. Teremos oito meses. Então, quando falamos que consultamos, se foram cinco mulheres indígenas...
(Soa a campainha.)
A SRA. CÉLIA XAKRIABÁ (PSOL - MG) - Mesmo eu sendo indígena, eu tenho o cuidado de consultar 305 povos diferentes. Nós precisamos de projetos de lei, ainda que com as melhores ideias - e, mesmo sendo indígena, eu tenho tomado cuidado com isso -, que sejam de acordo com os territórios indígenas. Para a gente pensar no combate à violência, temos que pensar também em soluções do próprio território, porque não é penalizando que a gente vai resolver também toda a situação, mas, principalmente, que os agressores - parte da violência - sejam parte da solução também.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Quero agradecer a sua participação. Acho que ela foi oportuna, desde o início. É por isso que, na verdade, é interessante o contraditório. Com isso, nós enriquecemos, na verdade, as proposições que nós queremos apresentar ao final deste ciclo que nós temos de 120 dias. Tenho certeza de que haverá, realmente, um belo trabalho para que o Poder Executivo possa estar consciente das suas responsabilidades para proteger, de uma forma cuidadosa e definitiva, os nossos povos indígenas e, agora, nesse caso especificamente, os ianômamis.
Quero agradecer a participação do Ricardo Weibe Nascimento Costa, que é tapeba, do Ceará; do Jorge Luiz Rocha Reghini Ramos; e do Paulo Cesar Basta, da Fiocruz.
Eu não sabia que já tinha trabalhado, no início da sua carreira de médico, lá no nosso Estado, no Estado de Roraima, algumas décadas atrás, não é?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Há 25 anos. Parabéns pelo estudo científico da mais alta complexidade e da mais importante eficiência, eficácia, para acompanhar este momento que, de uma forma transversal, vai juntando todos esses pontos para que possamos, na verdade, ajudar a decifrar... Não é decifrar, eu não diria decifrar, mas a solucionar essas questões tão relevantes que nós estamos vivendo hoje.
Então, agradeço a presença dos três participantes desta audiência pública.
Vou continuar a sessão apresentando...
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Ainda tem participação?
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Não, encerramos, mas pode, se quiser se manifestar...
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA. Para discursar.) - Presidente, é porque aqui no Senado, assim como no Congresso Nacional como um todo, a gente tem que se transformar em mil para dar conta de tudo. Eu estava ali na CCJ, com alguns projetos de lei, e acabou que eu não participei deste segundo momento aqui da audiência.
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Eu estava ali na CCJ, com alguns projetos de lei, e acabou que eu não participei desse segundo momento aqui da audiência, mas eu queria cumprimentar todos, Presidente, e destacar algumas ações que eu acho que são, assim, bem pertinentes.
A gente está vivendo, como eu coloquei já, uma crise sanitária grave em relação aos povos ianomâmis e esta Comissão nasce, na verdade, com esse objetivo, mas eu queria também destacar as ações que o Governo Federal tem feito em relação a este momento. Logo no primeiro dia em que o Presidente Lula assumiu a Presidência da República, ele já fez a revogação do decreto pró garimpo, porque, na verdade, é inconstitucional, é criminosa a exploração do garimpo em terras indígenas.
Então, eu acho que esse gesto do Presidente foi muito importante. Nós tivemos a ida, por duas vezes, do Presidente Lula, só neste ano, aos povos ianomâmis: nós tivemos no dia 21 de janeiro e nós tivemos, agora, no dia 13 de março, ou seja, o Presidente da República, que é a autoridade máxima do Brasil, Deputada Célia, vai à região. É exatamente uma demonstração do apreço dele e da determinação, sobretudo, do atendimento a esses povos.
E a criação, também, do Comitê de Emergência, que não é apenas um setor. São vários ministérios envolvidos nessa ação, ou seja, você reúne, na verdade, uma força-tarefa para encontrar uma saída e uma alternativa para combater esse nível de desnutrição tão profunda. E, agora, nós temos aí, com essa finalização destas ações, ontem, ou foi anteontem, em que a Ministra anuncia a construção de dois hospitais para os povos ianomâmis.
Então, são ações que eu acho que são importantes, que precisam ser destacadas e eu gostaria de fazer esse destaque, mais uma vez, Presidente, pedindo desculpas aí pela minha não participação neste segundo momento aqui desta audiência.
E cumprimento, mais uma vez, a Deputada, que também tem vindo aqui, com muita frequência, a esta Comissão.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Muito obrigada pela sua participação já ao final dessas discussões.
E eu gostaria de dizer para V. Exa. que não se preocupe, porque, inclusive, o Presidente teve que se ausentar por três vezes aqui da mesa para dar presença em outras Comissões, porque são simultâneas, mas estamos fazendo nosso papel e V. Exa. está aqui presente, assim como a nossa Ministra, a nossa Senadora Damares.
Eu gostaria de agradecer a presença de todos e dizer que as suas contribuições paralelas, por solicitação do Relator desta Comissão, serão extremamente relevantes ao longo e ao curso desse ciclo.
Então, muito obrigado pela presença dos senhores.
Itens extrapauta.
Com a anuência do Plenário, coloco em votação os seguintes requerimentos extrapauta.
2ª PARTE
EXTRAPAUTA
ITEM 1
REQUERIMENTO Nº 13, DE 2023
Requer, em aditamento ao Requerimento n. 12 - CTEYANOMAMI, o qual dispõe sobre a realização de audiência pública com o objetivo de tratar sobre as providências que estão sendo adotadas para rastreabilidade da lavra e comercialização do ouro, a inclusão de representante da Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais - APCF no rol de convidados.
Autoria: Senador Chico Rodrigues
2ª PARTE
EXTRAPAUTA
ITEM 2
REQUERIMENTO Nº 14, DE 2023
Requer que sejam prestadas, pela Exma. Sra. Ministra de Estado da Saúde, Nísia Trindade Lima, informações sobre o contrato com a empresa Icaraí Turismo Táxi Aéreo, que forneceu aeronaves para o transporte de profissionais de saúde e de indígenas Yanomamis.
Autoria: Senadora Eliziane Gama
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2ª PARTE
EXTRAPAUTA
ITEM 3
REQUERIMENTO Nº 15, DE 2023
Requer, nos termos do art. 58, § 2°, V, da Constituição Federal, que seja convidada a Senhora Deputada Silvia Waiãpi, ex-Secretária de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, a comparecer a esta Comissão, a fim de discutir a retirada de garimpeiros das Terras Yanomami.
Autoria: Senador Dr. Hiran
2ª PARTE
EXTRAPAUTA
ITEM 4
REQUERIMENTO Nº 16, DE 2023
Requer que sejam prestadas, pelo Senhor Ministro de Estado da Educação, Camilo Santana, informações sobre a situação da oferta de serviços de educação na Terra Indígena Yanomami.
Autoria: Senadora Eliziane Gama
2ª PARTE
EXTRAPAUTA
ITEM 5
REQUERIMENTO Nº 17, DE 2023
Propõe a realização de audiência pública, com o objetivo de discutir com os especialistas, da área da ciência, a mitigação dos impactos do garimpo ilegal na Reserva Yanomami.
Autoria: Senador Astronauta Marcos Pontes
2ª PARTE
EXTRAPAUTA
ITEM 6
REQUERIMENTO Nº 18, DE 2023
Requer nos termos do art. 58, § 2°, V, da Constituição Federal, que seja convidado representante da Empresa Voare Táxi Aéreo, a comparecer a esta Comissão, a fim de prestar informações sobre transporte nas ações de saúde pública na Terra Indígena Yanomami.
Autoria: Senador Astronauta Marcos Pontes
2ª PARTE
EXTRAPAUTA
ITEM 7
REQUERIMENTO Nº 19, DE 2023
Requer, em aditamento ao Requerimento 17/2023 - CTEYANOMAMI, de autoria do Senador Astronauta Marcos Pontes, a inclusão de dois convidados na audiência pública destinada a discutir com especialistas, da área da ciência, a mitigação dos impactos do garimpo ilegal na Reserva Yanomami.
Autoria: Senadora Eliziane Gama
Proponho ao Plenário, com base no art. 235, inciso III, alínea d, item 5, combinado com o art. 89, inciso I, do Regimento Interno do Senado Federal, a votação em bloco dos itens.
Os Srs. Senadores que aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovado.
Em votação os requerimentos. (Pausa.)
Eles estão aprovados e seguirão o curso desta Comissão. (Pausa.)
Vamos votar a ata das reuniões anteriores.
Havendo número regimental, coloco em votação as atas das 5ª e 6ª reuniões, solicitando a dispensa da leitura.
Os Srs. Senadores que as aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovadas.
Apresentação de requerimentos.
Nós estamos aqui sugerindo aos Srs. Senadores membros desta Comissão que nós teremos até amanhã para apresentar os devidos requerimentos para que nós possamos fechar esse ciclo de requerimentos e dar curso às reuniões com os eventuais convidados.
Na verdade, nós temos uma... Eu vou, até por uma questão regimental, mas também pelo pleito apresentado aqui pela Senadora Eliziane, pelo Senador Humberto Costa, pela Senadora Leila e pela Senadora...
Qual foi o outro que assinou? (Pausa.)
A Senadora Zenaide Maia também subscreveu esse documento, pedindo para que fossem feitas algumas modificações no calendário da primeira ida à área, com o que nós concordamos. Não tenho... É fazer apenas um sobrevoo nas comunidades. Eu, na verdade, que conheço a realidade, acho que seria muito importante esse contato direto dos membros da Comissão, até porque nós tivemos o cuidado de fazer o convite para a Presidenta da Funai. Ela deverá estar presente conosco, e seria interessante que fosse mantida a visita a duas ou três comunidades próximas ali do Surucucus. Eu não vejo, assim, nenhuma dificuldade.
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E a Presidenta Joênia Wapichana, conversamos aqui sobre a companhia dela nessa viagem, que será obviamente muito importante, facilitaria muito na análise e interpretação da situação em que os ianomâmis estão vivendo hoje. Nós não podemos olhar a distância, temos olhar de forma presencial.
Essa é a minha sugestão, mas, de qualquer forma, está aqui o ofício encaminhando ao Presidente da Comissão, e eu quero apenas - só temos presente a Senadora Eliziane - saber se ela concorda, qual é o impedimento que acharia nesse não pouso nessas áreas.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Presidente, deixa eu lhe falar: na verdade, sobre apenas o sobrevoo, eu conversei inclusive... Em toda decisão que nosso gabinete toma, a gente sempre conversa com os movimentos, com as entidades e com as próprias comunidades, com os próprios povos, e há, na verdade, um certo temor em relação a conflitos com os próprios garimpeiros nessas três comunidades que nós destacamos aqui.
Então, a ideia seria só um sobrevoo lá, e a gente faria a visita, de fato, ao Surucucu.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Olha, veja bem, pelas informações que nós temos, em duas dessas comunidades já não tem mais nenhum garimpeiro - duas - e as outras estão sendo evacuadas possivelmente até o dia 5, dia 6, eu acho, de abril...
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Então, a gente poderia deixar esse ponto aqui específico, como a gente ainda tem mais um tempinho, para a gente tomar uma decisão sobre elas...
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Sim, sem problema.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - ... até para sentir.
A nossa observação é só sobre isso, sobre clima de tensão...
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - O. k.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Eu lembro, Senador Chico, quando nós estivermos lá, e olha que nós estivemos... Naquela nossa primeira visita, em que o senhor inclusive estava, a gente nem chegou a ir às comunidades. Eu fui depois, numa segunda ida, mas naquela primeira... E houve ali uma manifestação terrível - o senhor lembra disso, não é? Eu citei agora há pouco - inclusive foi com a Joenia - que ela quase foi agredida fisicamente. Houve distribuição de áudios nos Whatsapps de garimpeiros, enfim, há um conflito, o senhor sabe, o senhor é de lá, e sente isso.
Então, essa nossa preocupação é só sobre a questão de segurança mesmo...
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - O.k.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - ... e não é nem para a gente, e, sim, para os povos ianomâmis. Na verdade, a nossa preocupação é com eles, sobretudo.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Não, mas nós...
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Então, acho que se a gente pudesse deixar esse item específico apenas, ainda tem tempo...
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Está certo, sem problema, esse item ficará para ser decidido posteriormente aos outros.
E a visita à Casai, na parte da tarde, até, porque, como há uma apresentação lá no Pelotão Especial de Fronteira, onde estão sendo comandadas todas as operações lá na área, é importante, obviamente, e é por isso que está aqui na agenda. Posteriormente - já vai encerrar lá para meio dia, 1h, e é uma hora e quinze minutos de voo do Surucucus para Boa Vista -, então, haveria o almoço. Depois, nós nos deslocaríamos para Boa Vista, à Casai, teríamos a visita à Casai, que é importante, obviamente, à casa de apoio; também ao hospital de campanha que foi instalado; ao Hospital Geral de Boa Vista, como foi solicitado também aqui. Inclusive, o Dr. Ricardo Weibe fez uma apresentação detalhada daqueles indígenas que passam na verdade pelo atendimento hospitalar lá no Hospital Geral.
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Foi solicitada a visita ao Hospital Geral - foi solicitada pelos quatro Srs. Senadores e nós acatamos - e a visita ao Hospital da Criança Santo Antônio, que tem uma assistência muito, muito, muito eficiente. O Prefeito Arthur Henrique tem dado total assistência a essas crianças ianomâmis, tanto que hoje vocês verificam, pelo que foi apresentado aqui, que não houve nenhuma grave, nos últimos 15 dias, eu acho, em relação às crianças ianomâmis.
Bom, então, ficaria acatada essa sua solicitação e as visitas manteriam o roteiro anterior que nós apresentamos.
Uma questão apenas... (Pausa.)
Também, Senadora Eliziane, foi colocado aqui: debate no auditório do Ministério Público Federal.
Veja que nós havíamos solicitado preliminarmente, na agenda original, que houvesse, na verdade, uma audiência pública na Assembleia Legislativa do Estado. Por quê? Porque obviamente nós somos políticos e ali é a Casa da população, ali é a Casa do povo e não teria, no nosso entendimento...
Veja que ali tem uma Comissão de oito Senadores, de oito Senadores que iriam, na verdade, ouvir comentários... E acho que nós não podemos ficar acuados, afinal de contas é uma representação externa do Senado da República, e nós iríamos, na verdade, com total poder e responsabilidade também em ouvir as manifestações.
Então, esse também é outro...
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Senador Chico...
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - ... item que nós, na verdade, queríamos discutir.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Senador Chico, realmente, no caso específico aqui, citei o caso da Joenia. Nós fizemos uma audiência pública na Assembleia Legislativa. Na verdade, nós nem conseguimos fazer uma audiência pública, nós fomos recebidos pelo Presidente. Senador Chico, foi impraticável aquilo que aconteceu, quer dizer, o nível de mobilização contra e a falta de controle ali em relação aos Parlamentares, e havia ali vários Senadores também.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Senadora...
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Então, assim, eu acho que nós já tivemos um retorno do que aconteceu em relação à Assembleia Legislativa. Os Parlamentares podem todos ir para a sede do Ministério Público Federal. Mas, sinceramente, eu acho que não passou segurança na experiência que nós tivemos. Como eu disse, por muito pouco, o nosso carro não foi... O nosso carro, não; a gente não foi agredido ali! As pessoas vieram de uma forma tão terrível que foi uma coisa assustadora.
Então, eu realmente acho que é inseguro, pela experiência que nós tivemos, pela experiência que nós tivemos e pela vulnerabilidade a que os Parlamentares foram submetidos naquele momento ali de a gente repetir uma experiência que nós já tivemos. Eu acho que o auditório do Ministério Público Federal é um ambiente onde nós teríamos uma melhor tranquilidade para a realização dessa audiência pública.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - No auditório do Ministério Público Federal não cabem 40 pessoas, como V. Exa. presenciou, pois nós estávamos juntos lá.
Então, eu acho que, na verdade, naquele momento, estava no clímax mesmo. Naquele momento, nós estávamos no clímax mesmo da presença dos garimpeiros na área ianomâmi e o clima era tenso. Hoje você verifica que a cidade está totalmente pacificada. Aliás, uma coisa que inclusive a mim me chamou muito a atenção, Senadora Eliziane, foi que, exatamente quando foi judicializada a questão e houve a determinação de retirada desses garimpeiros, até hoje, dia 29, não temos notícia de nenhum conflito ainda com essa retirada dos garimpeiros. Eles estão saindo de forma espontânea, porque houve a decisão judicial. Então, no estado, pelo menos para nós, que vivemos lá, o clima é de absoluta tranquilidade.
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Eu acho que isso daria para o Relator - e para nós, da Comissão, como um todo - mais subsídios, mais informações. Agora, nós podemos deixar para as próximas sessões definir essa ida à Assembleia Legislativa. Eu entendo que, em função do que nós vivemos lá hoje, um clima de paz, de tranquilidade, etc., não haveria nenhum temor, como houve na época, mas vamos deixar para decidir na próxima sessão.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Presidente, eu fiz uma sugestão.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Sim, sim.
A SRA. ELIZIANE GAMA (Bloco Parlamentar PSD/Republicanos/PSD - MA) - Eu quero deixar consignada essa minha sugestão por precaução e em cima de uma experiência que nós tivemos lá atrás.
O senhor é Presidente da Comissão, o senhor é morador do estado, e naturalmente que a sua posição tem um peso, e até de responsabilidade em relação à Comissão. Mas o meu posicionamento é de uma experiência terrível que nós tivemos.
O SR. PRESIDENTE (Chico Rodrigues. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) - Foi o que viveu. Isso é compreensível, totalmente compreensível.
Antes de encerrar a sessão, eu convoco a sessão para amanhã às 9h da manhã, para continuarmos com...
O e-Cidadania na verdade apresenta algumas questões. Eu vou ler apenas algumas.
Júlia Falcão, do Rio de Janeiro, pergunta: "Como proteger os povos originários de crises futuras?". Olha que a pergunta é recorrente.
Anna Beatriz, de São Paulo: "Qual a melhor forma de proteger o povo ianomâmi sem prejudicar sua cultura?"
Eduardo Almeida, do Rio de Janeiro: "Na visão do Executivo Federal, quais as principais causas para a crise na terra indígena ianomâmi?"
Serão distribuídas para os participantes, que acredito que deverão retornar com essas informações para os senhores internautas.
Nada mais havendo a tratar, agradeço a presença dos convidados e dos Srs. e Sras. Senadoras para a audiência, e declaro encerrada a presente reunião.
Muito obrigado e boa tarde.
(Iniciada às 8 horas e 44 minutos, a reunião é encerrada às 13 horas e 42 minutos.)