Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS A RESPEITO DE ARTIGOS PUBLICADOS NO JORNAL 'CORREIO BRAZILIENSE', QUE TRATAM DE CONFLITOS NA FRONTEIRA DO BRASIL COM A BOLIVIA. SITUAÇÃO DOS BRASILEIROS QUE MORAM NA BOLIVIA.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • COMENTARIOS A RESPEITO DE ARTIGOS PUBLICADOS NO JORNAL 'CORREIO BRAZILIENSE', QUE TRATAM DE CONFLITOS NA FRONTEIRA DO BRASIL COM A BOLIVIA. SITUAÇÃO DOS BRASILEIROS QUE MORAM NA BOLIVIA.
Publicação
Publicação no DCN2 de 07/06/1995 - Página 9802
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), RELAÇÃO, MOVIMENTAÇÃO, TROPA, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, LOCAL, FRONTEIRA, BRASIL, EFEITO, CONFLITO, BRASILEIROS, REGIÃO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, ATENÇÃO, AUTORIDADE, BRASIL, OBJETIVO, BUSCA, SOLUÇÃO, PROBLEMA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO, BRASILEIROS, RESIDENCIA, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, REGIÃO, FRONTEIRA.

A SRª MARINA SILVA (PT-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, gostaria de fazer um breve comunicado a respeito de uma nota jornalística divulgada ontem no Correio Braziliense e uma manchete publicada hoje no caderno internacional do mesmo jornal.

As duas publicações abordam conflito envolvendo as fronteiras boliviana e brasileira, para onde tropas bolivianas estariam sendo transferidas, em função da presença de brasileiros no município de Cobija, que fica próximo ao município brasileiro de Brasiléia.

Tive o cuidado de entrar em contato com o comandante do Batalhão do Exército responsável por aquela área do Estado do Acre. Segundo informações colhidas junto ao comandante não haveria essa movimentação, pelo menos não com o caráter que foi anunciado no jornal desta Capital.

Hoje, pela manhã, tive oportunidade de participar de uma audiência do Embaixador da Bolívia, Jaime Baltasar, com o Presidente Sarney. Levei essas preocupações ao embaixador boliviano, e, segundo o que me informou, estaria ocorrendo realmente uma movimentação das tropas que ficavam no Município de Guajaramirim para Cobija, ali próximo à área de Brasiléia, mas que não teria a conotação dada pelos jornais.

E também, segundo ele, houve realmente uma reunião envolvendo militares da Bolívia em Titicaca, onde foi tratada a questão do abandono em que se encontram as fronteiras bolivianas, que não contariam com a presença do Estado. As autoridades bolivianas, portanto, insistiram na necessidade de um reforço na área de fronteira.

Mesmo assim, tive o cuidado de pedir às autoridades militares do Estado do Acre que nos mantenham informados se, porventura, essas denúncias estiverem realmente acontecendo conforme menciona o referido jornal.

Mas, Sr. Presidente, eu gostaria de alertar, independentemente de este fato ter esta conotação ou não, para a situação dos brasileiros que vivem na Bolívia, situação esta que precisa ser pensada pelas autoridades brasileiras. Não podemos continuar a fazer vista grossa ao que se refere a esta questão. Há alguns anos, a Comissão Pastoral da Terra, através das Lideranças ligadas à Igreja Católica, mais especificamente o Bispo D. Moacyr Grechi, fez um levantamento e, já àquela época, dava conta de que existiriam 12 mil famílias de brasileiros morando em território boliviano, próximo de Brasiléia. Essas famílias saíram do Brasil em função de uma política de centralização de terras no Estado do Acre na década de 70. Empresários pecuaristas do Sul do País compraram os antigos seringais nativos, obrigando que milhares e milhares de famílias, ou fossem para a periferia viver de subemprego, ou se retirassem do Brasil e adentrassem as matas bolivianas, para poder continuar suas atividades na extração da borracha e da castanha.

É um problema grave, porque a grande maioria dos brasileiros que ali vivem são meios-cidadãos, porque, muitas vezes, são punidos de forma injusta. Essa é uma operação muito delicada que precisa ser tratada no campo da diplomacia, pois envolve dois países irmãos, vizinhos. Entretanto, não podemos admitir que filhos da nossa Pátria sejam obrigados a morar em terras estrangeiras, onde são tratados muitas vezes de forma discriminada, por não terem abrigo em seu próprio País.

Foi o que aconteceu com os milhares de acrianos que tiveram que sair da sua Casa para irem viver em um outro país, com outra cultura, outros costumes e outras leis.

Chamo a atenção para esse problema, porque compreendo que no momento em que o Governo Federal está falando em democratização da terra, em fazer assentamentos de famílias, é fundamental que se levem em conta essas populações que estão completamente deserdadas, vivendo em condições subumanas.

Gostaria ainda de registrar aqui os conflitos que muitas vezes ocorrem envolvendo civis, bolivianos ou brasileiros, deste lado ou do outro lado da fronteira. A sugestão dada pelo Presidente José Sarney, durante a conversa pela manhã, foi de que se fizesse o que já ocorre no Estado da nossa querida Senadora Emilia Fernandes, onde existe, segundo S. Exª, os comitês de fronteira. Esses comitês de fronteira resolvem determinados conflitos que ocorrem entre as duas populações vizinhas.

Vou procurar, depois, a Senadora Emilia Fernandes e, também, o Presidente José Sarney, que tem conhecimento dessa proposta, de como ela funciona nas áreas de fronteiras nos demais Estados, para estudar a viabilidade de a implementarmos no Estado do Acre, na nossa fronteira com a Bolívia e com o Peru.

Alerto para esse fato e insisto que, da nossa parte - do Governo brasileiro, dos Parlamentares, principalmente dos Parlamentares do Acre e da Amazônia - deve haver uma preocupação, mesmo porque já existe um precedente histórico envolvendo a Bolívia e o Brasil.

E tenho certeza que nós hoje, à luz de uma nova realidade nas relações com outras nacionalidades, não temos interesse em qualquer tipo de conflito que possa vir acontecer entre as duas populações.

Estou mantendo-me informada com relação ao fato, que, sendo uma denúncia de primeira página, com certeza, leva a algum tipo de preocupação. Sou conhecedora da quantidade de famílias que existem do lado boliviano e também da falta de perspectiva do lado brasileiro para que essas famílias possam voltar. O meu interesse é no sentido de que se criem possibilidades para resgatarmos a cidadania daqueles brasileiros que hoje estão completamente fora do nosso País por falta de oportunidade.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 07/06/1995 - Página 9802