Discurso no Senado Federal

DEFENDE UMA ATUAÇÃO CONJUNTA DO GOVERNO FEDERAL, DAS FORÇAS ARMADAS, DOS EXECUTIVOS ESTADUAIS E MUNICIPAIS E DA PROPRIA POLICIA FEDERAL PARA COMBATER O CRIME ORGANIZADO EM TODO PAIS. PROTESTO CONTRA A PROGRAMAÇÃO EXIBIDA PELAS REDES DE TELEVISÃO NO BRASIL.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. TELECOMUNICAÇÃO.:
  • DEFENDE UMA ATUAÇÃO CONJUNTA DO GOVERNO FEDERAL, DAS FORÇAS ARMADAS, DOS EXECUTIVOS ESTADUAIS E MUNICIPAIS E DA PROPRIA POLICIA FEDERAL PARA COMBATER O CRIME ORGANIZADO EM TODO PAIS. PROTESTO CONTRA A PROGRAMAÇÃO EXIBIDA PELAS REDES DE TELEVISÃO NO BRASIL.
Publicação
Publicação no DCN2 de 26/05/1995 - Página 8813
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. TELECOMUNICAÇÃO.
Indexação
  • ANALISE, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, AUMENTO, VIOLENCIA, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ESTADO DE MATO GROSSO (MT), MOTIVO, INCAPACIDADE, ESTADO, GARANTIA, SEGURANÇA, CIDADÃO.
  • COMENTARIO, RESTABELECIMENTO, CONVENIO, GOVERNO ESTADUAL, PREFEITURA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), FORÇAS ARMADAS, COMBATE, VIOLENCIA, CRIME.
  • DEFESA, URGENCIA, UNIÃO, GOVERNO FEDERAL, FORÇAS ARMADAS, GOVERNO ESTADUAL, GOVERNO MUNICIPAL, POLICIA FEDERAL, EFICACIA, COMBATE, CRIME ORGANIZADO, PAIS.
  • PROTESTO, VIOLENCIA, PROGRAMAÇÃO, EMISSORA, TELEVISÃO, INCENTIVO, CRIME, PREJUIZO, FORMAÇÃO, JUVENTUDE, NECESSIDADE, CRIAÇÃO, CONSELHO, ETICA, OBJETIVO, CONTROLE, ABUSO, MEIOS DE COMUNICAÇÃO.

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em face da permanente investida da marginalidade, que não oferece nenhuma trégua à prática diuturna das agressões ilimitadas à ordem pública, torna-se necessário o cumprimento do convênio celebrado entre o Governo do Rio de Janeiro, a Prefeitura de sua Capital e as Forças Armadas do País.

O acordo objetiva conter a marcha da violência que infelicita cariocas, fluminenses e quem mais, em desavisada viagem, visite o belo e outrora hospitaleiro Estado do Rio de Janeiro.

Já não é sem tempo. As patrulhas militares do Exército, da Aeronáutica e da Marinha praticamente recolheram-se aos quartéis.

Tanto bastou para que toda sorte de criminosos voltassem mais agressivamente ainda às suas condenáveis atividades, dado que a ausência de reação policial efetiva garante-lhes a impunidade das investidas contra o patrimônio e a vida do cidadão.

Conforme sentencia oportuno editorial de recente edição do Jornal do Brasil, vive-se no Rio em verdadeiro "estado de sublevação".

A beligerância mostrou-se mais exaltada no tiroteio de que foi alvo, em pleno ar, um helicóptero da Polícia Militar, causando a amputação traumática do braço de um de seus oficiais-tripulantes. Na mesma operação, que pretendia aprisionar criminosos alojados no morro da Lagoinha, um soldado foi morto, atingido na cabeça por disparo de fuzil AR-15, mesma arma que, no dia seguinte, serviu para a execução sumária de um jovem empresário, ante a primeira dificuldade de se o seqüestrar.

Lá já não se contam atos de violência como ocorrências policiais; adicionam-se os números de mortos, em cada dia, resumindo-os nas baixas semanais de uma guerra interminável, deflagrada pelo crime organizado. O ato inofensivo de andar pelas ruas é uma temeridade; os morros foram dominados pelas quadrilhas de traficantes, que exploram os moradores submetidos pelo terror.

As crianças transportam drogas nas lancheiras que simulam levar para a escola; multiplicam-se casos de estupros. A vida outrora pacífica de quem lá reside não tem qualquer valor, sob a tirania dos chefes do tráfico, arvorados em juízes de tribunais sumários, carrascos frios e sanguinários que forçam a convivência, impõem a "lei do silêncio", determinam as execuções.

Ora, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para o editorialista, os episódios locais antecipam "uma tendência que se espalha pelo País: o esfacelamento do Estado e a sua incapacidade de garantir segurança mínima aos cidadãos". Preocupa a todos, com efeito, a reprodução de chacinas, seqüestros em séries, roubos à mão armada e outros atos de violência que, infelizmente, fazem parte do cotidiano do Rio de Janeiro, em outras unidades da Federação, entre as quais o meu Estado de Mato Grosso.

Aí se configuram gravíssimas demonstrações da omissão do Poder Público, indicativas de que está em curso um processo endêmico de convulsão social. Deve ser tratada como questão de segurança nacional a convivência da sociedade organizada, cujos membros trabalham e honram os seus impostos, com a marginalidade que reina desafiadora nos morros e coleciona vítimas indefesas.

A esse propósito - da necessidade de se garantir a segurança do organismo social frente à invasão desestabilizadora da violência -, estuda a Sociologia o elenco provável das causas determinantes da criminalidade, transitando desde a situação de miséria em que vive parcela ponderável da população, passando pela formação escolar e familiar inadequadas, chegando, até mesmo, à influência muitas vezes nefasta dos meios de comunicação, em especial da televisão, na construção do indivíduo.

Pesquisa da Secretaria de Justiça do Rio de Janeiro, há pouco divulgada, demonstra que apenas na programação infantil de uma única emissora foram apresentadas 58 cenas de violência, correspondentes a pouco menos de 35% das mais de 150 imagens violentas exibidas num só dia. Vejam bem, num programa infantil, foram apresentadas 58 cenas de violência.

Os capítulos das novelas, em uma semana, retrataram 150 crimes; os seriados, 79; e outros programas, 74 cenas de violência e terror.

Transmitidos cerca de 80 programas, foram exibidos 288 homicídios e tentativas de homicídio, 386 agressões, 248 ameaças, 6 seqüestros; 11 crimes sexuais; 71 casos de condução de veículos, com risco para terceiros, por motoristas drogados; 7 cenas de uso ou tráfico de drogas; 65 de formação de quadrilha; 43 roubos; 16 furtos; 7 estelionatos e 183 outros ilícitos penais, totalizando 1.377 cenas de crimes em uma só semana na televisão brasileira.

Raciocinem bem, Srs. Senadores, o que significa isso! Lamentavelmente, os programas direcionados às crianças brasileiras exibem mais da metade das cenas de violência contadas em toda a programação. Então, se esses dados correspondem a mais de cem episódios de violência por dia, podemos calcular que, a cada ano, 36.708 dessas cenas são exibidas à nossa infância. O que será da nova geração de brasileiros?

Por sua vez, o Mestre J. Cretella Júnior, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, leciona que:

      a segurança das pessoas e das coisas é elemento básico das condições universais, fator absolutamente indispensável para o natural desenvolvimento da personalidade humana.

Tratando-se de bem inviolável resguardado pelo Direito, até mesmo por definição, nem por isso está imune às pressões pessoais e impessoais originadas do contexto social.

Por isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, as agressões, aí implícitas, representam perigo a ser enfrentado pela própria força do indivíduo agredido, num primeiro instante, e pela "força organizada do meio social", em seguida, já que a ameaça a uma pessoa constitui intimidação ao total da coletividade, exigindo repressão. Decorre, daí, o conceito de "ordem pública", instituto que em si mesmo encerra as condições mínimas "essenciais a uma vida social conveniente".

Segue-se que o Estado, detendo o "poder de polícia", exerce-o, em sentido amplo, para "restringir a atividade nefasta do cidadão", quando esse a outro - ou à coletividade - prejudica. A rigor, a manutenção da ordem pública, internamente, é da competência das políticas militares estaduais, enquanto a segurança do País contra o inimigo externo, as invasões e as guerras, reserva-se às Forças Armadas.

Na Federação brasileira, o exercício do poder de polícia, em cada Unidade, não pode ultrapassar as garantias de direitos do cidadão, as prerrogativas e as liberdades, conforme ditam a Constituição e as leis. Nada impede, porém, o socorro da União, quando evidenciada a incapacidade de o Estado-membro exercer eficientemente a manutenção da ordem pública.

Em função disso, não prosperou a intenção governamental de decretar o estado de defesa no Rio de Janeiro, visando à captação de recursos para combater o crime organizado. Mesmo porque a Prefeitura deve obter a liberação de empréstimo superior a R$100 milhões para essa finalidade, e o Senhor Presidente da República nada opõe à Operação Rio II, a ser desencadeada pela Forças Armadas.

Conclusivamente, os acontecimentos do Rio de Janeiro, renovados em maior ou menor grau em dezenas de outras grandes cidades brasileiras - entre as quais a capital do meu Estado, Cuiabá, que ultimamente tem sido alvo também de aumento brutal de assassinatos e outros tipos de crimes que ocorrem no País -, demonstraram a incapacidade de a autoridade pública local garantir a segurança da população, obrigando-a à formalização de convênios com o Poder Central. Foi necessária a ajuda de oficiais e soldados do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, para conter, embora por breve período, a ação das quadrilhas de traficantes e de ladrões, misturados a outros tipos de malfeitores.

Não obstante o Senhor Presidente da República e o Governador do Estado do Rio de Janeiro terem restabelecido o convênio, no último dia 28 de março, para dificultar ou mesmo eliminar as ações criminosas no Rio de Janeiro, remanesce insatisfeita a exigência de serem viabilizadas as medidas que, a nível nacional, detenham a queda dos níveis de segurança e o crescimento da violência nas numerosas outras grandes cidades brasileiras.

Na conjuntura ora vivida pela sociedade, em que os atos de violência repetem-se nas ruas e nos lares, a qualquer hora do dia ou da noite, a cidadania teve revogados os seus mais elementares direitos, como, por exemplo, o de ir e vir nas praças e vias públicas, sem ser molestado. Entendemos, por isso, que se deve promover, com a urgência urgentíssima, uma atuação conjunta do Governo Federal, das Forças Armadas, dos Executivos Estaduais e Municipais e da própria Polícia Federal brasileira para combater o crime organizado em todo o País, não só no Rio de Janeiro.

Não se pode desmentir a existência de um quadro de violência urbana, que ademais promete transbordar das grandes capitais para as regiões interioranas, principalmente pela maneira com que a televisão brasileira vem fazendo sua programação, com cenas brutais de violência no decorrer do dia todo. Lamentavelmente, a televisão brasileira, hoje, não ensina nada, pelo contrário, apenas prejudica a formação moral de nossa juventude. Por isso, nesta oportunidade, impõe-se ao Estado a correção de sua incapacidade para garantir a segurança dos cidadãos.

Não queremos que volte a censura para os veículos de comunicação social, mas teria de haver um conselho de ética para fazer com que a programação de nossas emissoras de televisão resguardasse a formação moral da nossa juventude.

Cumpre ao Estado encontrar os mecanismos condicionadores de uma reação firme, enérgica e decisiva contra a onda de criminalidade, hoje avassaladora e impune, que tantos cidadãos, prestantes e inocentes, têm-se engolfados nos últimos dias.

Por isto, neste instante, quero fazer meu protesto pela maneira com que as televisões brasileiras vêm fazendo sua programação e cumprimentar o Governo Federal e o Governo do Estado pelo convênio assinado, para dar maior segurança ao povo do Rio de Janeiro. Espero que convênios como esse possam ser implantados em outros Estados da Federação, a fim de dar segurança ao povo brasileiro e, em especial, ao povo matogrossense.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 26/05/1995 - Página 8813