Discurso no Senado Federal

ESCASSEZ DE VERBAS NOS MINISTERIOS MILITARES, PREJUDICANDO AS ATRIBUIÇÕES CONSTITUCIONAIS DAS FORÇAS ARMADAS.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FORÇAS ARMADAS.:
  • ESCASSEZ DE VERBAS NOS MINISTERIOS MILITARES, PREJUDICANDO AS ATRIBUIÇÕES CONSTITUCIONAIS DAS FORÇAS ARMADAS.
Publicação
Publicação no DSF de 14/11/1995 - Página 2966
Assunto
Outros > FORÇAS ARMADAS.
Indexação
  • CRITICA, AUSENCIA, VERBA, DESTINAÇÃO, EXERCITO, MARINHA, AERONAUTICA.
  • COMENTARIO, INSUFICIENCIA, SOLDO, MILITAR, FORÇAS ARMADAS.
  • PRECARIEDADE, EQUIPAMENTOS, FORÇAS ARMADAS.
  • IMPORTANCIA, FORÇAS ARMADAS, SEGURANÇA, BRASIL.
  • DEFESA, DESTINAÇÃO, VERBA, ATENDIMENTO, DESPESA, SOLDO, MANUTENÇÃO, AQUISIÇÃO, MATERIAL, EQUIPAMENTOS, FORÇAS ARMADAS.

            O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT. Pela ordem. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a crônica escassez de verbas no orçamento dos ministérios militares está pondo em risco o cumprimento das missões conferidas às Forças Armadas pela Constituição Federal, quais sejam, a defesa da Pátria, a garantia dos Poderes constituídos e, se convocadas para tal, a manutenção da lei e da ordem.

            As dificuldades por que passam o Exército, a Marinha e a Aeronáutica, na luta contra a exigüidade de recursos, são amplamente conhecidas, a começar pelo descontentamento das tropas, cujos salários têm sido aviltados, especialmente nos últimos anos. Essa insatisfação, aliada à falta de estímulos para o prosseguimento nas carreiras militares, tem provocado maciças transferências para a reserva num efetivo que, proporcionalmente, já é dos menores entre os países latino-americanos.

            Outro fator, igualmente preocupante, que pode comprometer o desempenho das Forças Armadas, é o progressivo sucateamento do seu material bélico, que pode levar a uma situação de colapso, dentro de mais algum tempo, caso as autoridades não atentem para a necessidade de urgente socorro financeiro.

            É certo, Sr. Presidente, que o papel das Forças Armadas e o conceito de segurança nacional têm passado por ampla revisão nas últimas décadas. O incalculável poder de destruição das armas modernas tornou a humanidade consciente de que as conseqüências de uma nova guerra, qualquer que seja o vencedor, serão devastadoras para todo o planeta. Também contribuíram para uma ampla revisão dos conceitos de estratégia a política de distensão, iniciada nos anos 70, e o desmantelamento do bloco de países liderados pela ex-União Soviética, seguido da emblemática queda do Muro de Berlim, processos que inauguraram a nova fase nas relações internacionais e marcaram o fim da chamada Guerra Fria.

            Nem por isso, no entanto, podem as Forças Armadas descurar-se do papel da guardiãs de nossas fronteiras e de nossa soberania. Lembraria, a esse propósito, advertência feita pelo Almirante Mário César Flores, então Ministro, em entrevista concedida à revista Novos Estudos, editada pelo CEBRAP - Centro Brasileiro de Análise e Planejamento: "É importante que as Forças Armadas tenham alguma capacidade defensiva, de forma a constituírem um fator de "dissuasão de aventuras." Esse o alerta do então Ministro da Marinha, acrescentando que tais "aventuras", nos dias de hoje, são menos improváveis, mas não impossíveis.

            Citaria também, Sr. Presidente, argumento do renomado jurista Ives Gandra da Silva Martins, em artigo intitulado "A importância das Forças Armadas", publicado no periódico O Estado de S. Paulo em janeiro deste ano. Alerta o articulista para o fato de que entre 1945 e 1991 morreram, em conflitos regionais, "quase tantos combatentes quanto aqueles que pereceram durante a I Guerra Mundial".

            As advertências contidas neste pronunciamento, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não devem ser interpretadas, absolutamente, como alarmistas. Pelo contrário, entendo que os cenários da vida nacional e das nossas relações internacionais, hoje, são auspiciosos. Internamente, vivemos um processo de amadurecimento político e de solidificação das nossas instituições. No contexto internacional, integra-se o Brasil, com a sua participação no MERCOSUL, à tendência mundial de redução de barreiras burocráticas e alfandegárias, além de ampliar as suas relações comerciais com países de todos os continentes.

            Minha intenção, portanto, ao denunciar a situação de precariedade em que se encontram as Forças Armadas brasileiras, é dar a elas, como ocorre nos países desenvolvidos, efetivas condições de garantir a segurança nacional no mais amplo sentido, incluindo-se aí a proteção ambiental e o combate ao tráfico, e de participar do projeto de desenvolvimento que deve congregar todos os segmentos organizados da sociedade.

            É forçoso, porém, reconhecer que as Forças Armadas, por absoluta exigüidade de recursos, estão desaparelhadas para desempenhar as elevadas missões que lhes são confiadas. Em suas constantes e justas reivindicações, os ministros militares têm levado ao conhecimento do Chefe da Nação a situação de penúria que impossibilita às Forças Armadas até mesmo saldar suas dívidas para com os fornecedores.

            Não reclamam os Ministros militares salários de marajás para o efetivo de suas Armas, nem verbas para projetos megalomaníacos ou megalômanos, mas recursos suficientes para conter a insatisfação das tropas, honrar os compromissos financeiros, investir nos projetos prioritários e, sobretudo, evitar o sucateamento dos equipamentos bélicos.

            São reivindicações, como se pode observar, modestas. O próprio Ministro do Exército, General Zenildo Lucena, já declarou que a Forma terrestre não tem a pretensão de armar-se completamente, mas sim de preservar as chamadas ilhas essenciais, como os centros de guerra eletrônica, de informatização, de qualificação do efetivo e de desenvolvimento tecnológico. O mesmo ocorre com as demais Forças, que elegeram suas prioridades dentro dos novos conceitos de estratégia militar, que privilegiam o conhecimento científico-tecnológico e a interação com a sociedade civil na busca do desenvolvimento econômico e social.

            Dentro dessa ótica, que integra a defesa do território nacional com a inteligência civil e o desenvolvimento de pesquisas, notadamente no campo da tecnologia nuclear para fins pacíficos, são prioritários, por exemplo, o sistema de comunicações militares por satélite, o projeto Calha Norte, o programa do Veículo Lançador de Satélites, o Sistema de Vigilância Aérea da Amazônia (projeto SIVAM), a estruturação de forma de paz permanente e o desenvolvimento do submarino nuclear.

            É importante salientar, Sr. Presidente, que o Brasil é um dos países que menos gastam com as Forças Armadas e que, proporcionalmente, mantém um dos menores efetivos da América Latina. Quadro comparativo, publicado pelo jornal Correio Braziliense, no primeiro semestre, demonstra que nossos gastos com a defesa são de 2,56% do Produto Nacional Bruto, contra 3,4% da Argentina, 9,5% de Cuba e 10,5% do Chile.

            O efetivo da nossa Força-base, o Exército brasileiro, é de apenas 202 mil homens para uma população de 157 milhões de habitantes. Nos demais países citados, os números são os seguintes: na Argentina, efetivo de 35 mil homens para 37 milhões de habitantes; no Chile, 54 mil soldados para 13 milhões e 600 mil habitantes; em Cuba, 145 mil soldados para uma população de 10 milhões de habitantes.

            Em relação ao território, essa desproporção é ainda muito maior, pois cabe ao nosso efetivo militar defender 8 milhões 511 mil quilômetros quadrados contra 2 milhões 766 mil da Argentina, 756 mil do Chile e apenas 110 mil quilômetros quadrados de Cuba. Detentor de 47% do território da América do Sul, o Brasil tem 23 mil quilômetros de fronteiras com 16 países vizinhos.

            Esses números, Sr. Presidente, Srs. Senadores, são eloqüentes por si sós para demonstrar que as Forças Armadas necessitam de mais recursos para cumprir suas missões constitucionais. Essa situação há muito vem sendo denunciada pelas autoridades militares e pelos analistas do setor e exige providências imediatas.

            O já citado jornal Correio Braziliense, em matéria assinada pelo analista militar Roberto Lopes, no mês de março, denunciou que, em conseqüência do estrangulamento econômico, "metade dos 852 aviões e helicópteros da Força Aérea brasileira está estocada - guardada em hangares - ou em processo de `canibalização` - sendo desmontada para prover de peças aeronaves em atividade". E mais, asseverou que o valor em combate dos 28 caça-bombardeiros entregues à FAB pela EMBRAER "é quase uma ficção", por estarem operando sem o seu radar mais importante, sem mísseis modernos e sem uma linha de suprimentos adequada.

            Assim, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não causa espécie a informação divulgada pelo jornal O Globo em 28 de março do corrente. Na matéria intitulada "Fernando Henrique quer solução para falta de recursos das Forças Armadas", o jornal informa que, devido à falta de recursos para a manutenção dos equipamentos, a maioria dos Ministros, e não só os militares, hoje não se sente segura em viajar nos jatos da Força Aérea Brasileira.

            A questão do progressivo sucateamento das Forças Armadas foi também destacada pelo Jornal do Brasil, em matéria publicada na edição do dia 13 de julho. Após salientar que as Forças Armadas Brasileiras "têm um dos menores orçamentos relativos do mundo", adverte: "Por falta de dinheiro, os pilotos da FAB devem cumprir, este ano, um total de 140 mil horas de vôo. Há cinco anos voavam, no mínimo, 220 mil horas" E acrescenta: (...) as instruções de tiro e os exercícios militares envolvendo veículos motorizados foram limitados ao extremamente necessário. Os poucos investimentos feitos pelo Ministério do Exército, geralmente envolvendo compra de equipamentos usados de exércitos de outros países, são garantidos por R$450 milhões captados no exterior.

            O Presidente Fernando Henrique Cardoso, felizmente, parece estar atento à questão militar e à necessidade de maiores investimentos na defesa nacional. O Plano Plurianual, encaminhado ao Congresso Nacional em 31 de agosto, destina RS$5,6 bilhões para investimentos militares no período 1996/1999. Tais recursos nem de longe representam a efetiva necessidade das Forças Armadas brasileiras, mas já proporcionam um grande alívio, se levarmos em conta a situação de penúria por elas enfrentada.

            Assim, merece aplausos a corajosa atitude do Presidente Fernando Henrique Cardoso, quando se propõe a resgatar o prestígio e a eficácia de nossos efetivos militares, lembrando-se ainda que os investimentos públicos em defesa nacional contribuirão para a melhoria da infra-estrutura do País, conforme salientou o Ministro do Planejamento, José Serra. Esta, aliás, é uma tendência mundial, apontada pelo jurista Ives Gandra em seu referido artigo: "Em todos os países civilizados, hoje, as Forças Armadas estão se profissionalizando e se vinculando ao desenvolvimento econômico, interagindo, ao gerar desenvolvimento tecnológico, e se beneficiando deste desenvolvimento produzido pela sociedade".

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a defesa nacional não é uma questão militar, mas uma questão política. Como tal, deve merecer a atenção não apenas das autoridades do setor e do Presidente da República, comandante supremo das Forças Armadas, mas também do Congresso nacional e de toda a chamada sociedade civil. O soerguimento do prestígio e da eficácia de nossos efetivos militares impõe-se para que nossa capacidade de defesa do território e da soberania não fique, num prazo muito curto, irremediavelmente comprometida. Ao pleitear maior atenção do Estado brasileiro para com as Forças Armadas, quero cumprimentar o Presidente Fernando Henrique por sua elevada compreensão do papel que lhes cabe na defesa nacional e na contribuição para o nosso almejado desenvolvimento.

            Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/11/1995 - Página 2966