Discurso no Senado Federal

TRANSCURSO DOS 270 ANOS DE FORTALEZA.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • TRANSCURSO DOS 270 ANOS DE FORTALEZA.
Publicação
Publicação no DSF de 16/04/1996 - Página 6330
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO CEARA (CE).

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dia 13 de abril, Fortaleza completou 270 anos de sua instalação como vila. Como ex-Prefeito de Fortaleza, no período de março de 1979 a maio de 1982, não poderia me furtar de registrar seu aniversário, discutindo ainda seus problemas e potencialidades.

Erguida à beira do oceano, numa breve chapada, margeando o riacho do Pajeú, a cidade de Fortaleza teve, na sua topografia, o principal motivo determinante da sua futura expansão física. Tudo começou, efetivamente, no Forte de Shoonenborch, que marcou o período de dominação holandesa no Ceará. Mas, foi em volta da capela construída pelo português Álvaro de Azevedo Barreto, que passou a se organizar a vila de Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção, criada pela Provisão do Conselho Intramarino, de 11 de março de 1725.

A vida de Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção evoluiu politicamente, tornando-se sede do Governo, quando pelo alvará de 17 de janeiro de 1799, o Ceará sapara-se da Capitania de Pernambuco. Sua elevação à vila ocorreu em 13 de abril de 1726, todavia, ainda demorariam mais vinte anos para que a próspera concentração urbana tivesse sua importância reconhecida. Isso só aconteceu a 17 de março de 1823 quando, por deliberação imperial, era a Vila de Nossa Senhora da Assunção, elevada à categoria de cidade, sob a denominação de Fortaleza de Nova Bragança. Esse pomposa acréscimo toponímico seria esquecido pelo tempo, perdurando o nome, já implicitamente significativo, Fortaleza.

De suas áreas verde, embora a relação verde/habitante ainda esteja longe da ideal, gostaria de destacar, com um certo orgulho, que iniciei este processo de implantação de parques com a construção Lagoa do Opaia - 11 hectares; Lagoa de Parangaba - 3,48 hectares; Alagadiço - 3,15 hectares e parque Pajeú com 1,4 hectares, culminando com o Parque Ecológico do Cocó com 472 hectares e da Maraponga com 31,30 hectares, ambos construídos pelo governo Estadual, além de mais uma dezena de outros.

Apesar de ser uma das cidades mais agradáveis do Brasil, Fortaleza convive com problemas comuns às grandes cidades.

Fortaleza e sua Região Metropolitana constituem-se no maior pólo de atração do fluxo migratório intra-estadual. Isso deve-se, basicamente, ao fato de a capital ser, por tradição, o maior núcleo concentrador de atividades sócio-econômicas do Ceará. Contingentes migratórios têm contribuído significativamente para o aumento da população da Região Metropolitana de Fortaleza.

Deve-se ressaltar o fato de que a Região Metropolitana de Fortaleza concentra 53,4% da população urbana do Ceará, sendo o Município de Fortaleza responsável por mais de 82% desse contingente.

A população do Município de Fortaleza tem crescido aceleradamente nas últimas quatro décadas num fenômeno de intensa urbanização. Isso se deve, sobretudo, ao poder de atração que a cidade exerce como maior núcleo concentrador de atividades sócio-econômicas do Estado. A industrialização foi impulsionada nos últimos anos por incentivos fiscais e financeiros da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste - Sudene e do Banco do Nordeste do Brasil - BNB.

Significativa foi a terceirização da economia, com crescimento do comércio e serviços em geral. Desse modo, as outras cidades do Ceará não apresentam condições de crescimento para competir com a Capital. Outro fator importante que tem contribuído, ao longo do tempo, para expulsar populações interioranas rumo à Capital, é o fenômeno cíclico das secas. Além disso, a decadência das culturas do algodão, carnaúba e mamona, grandes empregadores de mão-de-obra, contribuíram para o fato.*

Ocupando uma área de 136 quilômetros quadrados, o Município de Fortaleza apresenta uma população de 1.999.972 habitantes, conforme dado de uma pesquisa direta realizada pelo Sistema Nacional de Empregos - Sine - CE. Sua densidade demográfica está em torno de 5.952 habitantes por quilômetro quadrado. É a expressão da concentração espacial das atividades econômicas do Estado, haja vista que, dos então 178 municípios do Ceará (dados de 1990), no máximo seis têm certa relevância econômica. Evidencia-se, portanto, o marcante desequilíbrio do quadro econômico do Ceará. Concentra 1\3 da população do Estado, sendo responsável por 72% da composição total do emprego. Por outro lado, faz parte de uma das mais débeis regiões metropolitanas do Brasil, por situar-se no Nordeste, região tradicionalmente reconhecida como "menos desenvolvida".

Segundo os dados da Secretaria de Ação Social, de 1991, existiam 313 favelas que abrigam em torno de 545 mil indivíduos, nas quais registram-se grandes flutuações de renda, provenientes do desemprego e das atividades informais, em condições de habitabilidade e saneamento extremamente precários.

Nesse contexto, surge um elevado índice de mortalidade infantil, em que 63 crianças, em mil nascidas, morrem antes de completar o primeiro ano de vida, acima da média do Estado, que é 51/1000.

Pesquisa recente do Departamento de Saúde Comunitária da Universidade Federal do Ceará - UFC -, realizada em uma das favelas de Fortaleza, revelou a existência de 60% das crianças em estado de desnutrição de segundo grau.

Outra conseqüência que o crescimento exagerado tem ocasionado é o evolutivo processo de caos no trânsito. A cidade tem hoje 280.000 veículos e chegará a 400.000 no ano 2000, se mantiver a atual taxa de crescimento. Uma das causas dos problemas, principalmente no tocante à fluidez no tráfego, é uma lei de uso e ocupação de solo ultrapassada, que não fornece meios de proibir que se construam altos edifícios e shopping centers em ruas sem condições de escoamento. Uma nova lei está sendo apresentada ao debate pela Prefeitura de Fortaleza.

Ainda com relação a esse problema, o Governo do Estado conseguiu recursos junto ao Eximbank, do Japão, e estará iniciando brevemente a construção do metrô de superfície de Fortaleza, que irá se articular com os sistemas de ônibus e os terminais desses coletivos. Está sendo lançado o programa Viva no Trânsito, que atuará na área de educação, da engenharia de tráfego e no controle do processo.

Portanto, como se viu, Fortaleza constitui pólo concentrador de atividades no Estado, sendo, assim, centro de atração da população migrante, e detendo um terço da população do Estado e 72% da composição total do emprego.

Para uma população de 2 milhões de habitantes, mais de 700 mil compõem a População Economicamente Ativa - PEA (pessoas com mais de dez anos de idade empregadas ou que procuram emprego), das quais 664 mil acham-se ocupadas e 106 mil desempregadas.

Da população ocupada, apenas 331 mil acham-se no setor formal da economia, contra 333 mil - e estou dando apenas números redondos - do setor informal.

Menos de 1% da população total apropria-se de 13% da renda global. Enquanto outros 33% detêm apenas 8% da renda.

Dezenove por cento da população ganha de zero a meio salário mínimo.

Quarenta e sete por cento da população ocupada ganha de zero a um salário mínimo.

Setenta e sete por cento da população ocupada ganha de zero a três salários mínimos.

Com relação ao meio ambiente, a vegetação original de Fortaleza foi quase toda devastada, à exceção dos mangues, sendo que a cobertura vegetal significativa observada no município, atualmente, é antrópica.

As faixas de preservação de primeira categoria dos recursos hídricos, rios Maranguapinho, Ceará, Cocó, e outros, foram ocupadas com edificações, principalmente pela população de baixa renda, que não tem acesso à moradia e que sofre inundação a cada estação chuvosa, com ocorre atualmente.

Os corpos d´água são poluídos pelo lançamento in natura de esgotos variados e pela deposição de lixo às suas margens.

A rede pública de drenagem recebe ligações clandestinas de esgotos.

Existe uma dissociação entre a legislação de uso e ocupação do solo em vigor e a cidade existente, que compreende parcelas legais e ilegais.

Há incompatibilidade entre o adensamento elevado de ocupação do solo e a infra-estrutura implantada, geralmente deficitária, destacando-se a relativa ao saneamento básico nos serviços de água e esgoto.

O território do município encontra-se, quase totalmente, parcelado ou em vias de parcelamento, porém como nem todo loteamento foi implantado, existem vazios urbanos, seja nos lotes desocupados das áreas adensadas ou nas zonas periféricas de ocupação rarefeita.

A demanda potencial de habitação para o município é da ordem de 345.679 unidades, sendo que 66.040 referem-se à construção, 160.900 a melhorias e 118.730 ao tratamento de áreas faveladas (Plano Estadual de Habitação Popular do Estado do Ceará - 1987/1991)

É importante ressaltar um excelente programa do Governo do Estado na capital, na área de saneamento básico. Com o valor total de R$266 milhões, o SANEAR possibilitará o saneamento de mais de 80% fortalezenses, com uma rede de esgotos, colocando a cidade nos primeiros lugares do Brasil. Esse programa está em fase de conclusão.

O problema da violência e da segurança está sendo atenuado pelo Governo do Estado por meio de um engenhoso Sistema Integrado de Defesa Social - SINDES -, que usa a mobilização social e comunitária para apoiar as ações do Estado.

Dentre os grandes desafios que Fortaleza enfrenta, ressalta-se a questão do emprego. O segundo é a falta de moradia. É claro que o analfabetismo e o mau atendimento hospitalar também são importantes, mas podem ser equacionados paralelamente a esses primeiros aqui referidos.

Por último, gostaria de dizer que os problemas da cidade refletem a situação do interior, que, com a seca e a decadência de culturas importantes, como o algodão, tem empurrado os rurícolas para a Capital, além da natural tendência à urbanização, observada em todo o mundo.

Afinal, Fortaleza e o interior são vasos comunicantes, faces de uma mesma moeda. Tanto o Governador Tasso Jereissati como o seu antecessor, o Sr. Ciro Gomes, enxergaram com clareza esse problema e, após o ajuste fiscal do Estado, deram prioridade a uma série de ações para dar sustentabilidade econômica ao interior e permitir que a população lá permaneça, vivendo com dignidade. Essas ações, que começam a mostrar a sua cara com maior nitidez em 1996, têm como uma de suas diretrizes garantir ao interior estradas, energia e água o ano todo, independentemente de estações climáticas.

Os recursos do BID recuperaram estradas integrando regiões. O PROURB já iniciou a construção de 40 barragens de porte médio e obras para Fortaleza e as cidades do interior. Esses reservatórios juntamente com os já existentes e com o açude Castanhão, cuja construção foi iniciada durante a recente visita do Presidente Fernando Henrique Cardoso ao Nordeste, praticamente permitirão a execução de um ambicioso plano de interligação de bacias, atraindo indústrias e agroindústrias. Nos vazios hídricos, as pequenas localidades contarão com poços profundos equipados com dessalinizadores, e o Projeto São José intensificará o processo de eletrificação rural, ainda este ano. O acréscimo de novas áreas de irrigação, como Araras Norte, Tabuleiro Russas e Baixo Acaraú, e a adoção de um novo modelo de gestão, inclusive dos atuais perímetros, irão reproduzir no Ceará histórias de sucesso, como do pólo Petrolina-Juazeiro. E mais: o PRODETUR está viabilizando para o turismo a faixa litorânea de Caucaia e Itapipoca, mediante a promoção daquelas regiões.

As indústrias estão-se instalando cada vez mais fora de Fortaleza, segundo dados do JUCEC, Junta Comercial do Estado do Ceará, para 1995. E o complexo portuário de Pecém fornecerá condições, a partir da empresa-âncora, a siderúrgica, para a instalação de um pólo metal-mecânico.

Espera-se que com essas intervenções no interior do Estado, Fortaleza possa crescer de maneira mais ordenada pela atenuação de seus fluxos migratórios.

Gostaria de encerrar afirmando que apesar dos problemas, a cidade de Fortaleza é ainda uma das mais agradáveis de se viver, sendo um dos grandes centros culturais e turísticos do país.

Parabéns, Fortaleza!

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/04/1996 - Página 6330