Discurso no Senado Federal

USO IRRACIONAL DOS RECURSOS HIDRICOS E NECESSIDADE DE COMPROMISSO COM O MEIO AMBIENTE, VISANDO A UM DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL.

Autor
Junia Marise (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MG)
Nome completo: Júnia Marise Azeredo Coutinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • USO IRRACIONAL DOS RECURSOS HIDRICOS E NECESSIDADE DE COMPROMISSO COM O MEIO AMBIENTE, VISANDO A UM DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL.
Publicação
Publicação no DSF de 18/04/1996 - Página 6456
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • COMENTARIO, RECEBIMENTO, OFICIO, ASSOCIAÇÃO MUNICIPAL, LAGO DE FURNAS, APRESENTAÇÃO, RELATORIO, CONFIRMAÇÃO, INJUSTIÇA, IRREGULARIDADE, UTILIZAÇÃO, RECURSOS HIDRICOS, IMPLANTAÇÃO, PROJETO, USINA HIDROELETRICA, CONTAMINAÇÃO, AGUAS INTERIORES, INUNDAÇÃO, TERRAS, EXPULSÃO, POPULAÇÃO, MUNICIPIOS, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG).
  • DEFESA, NECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, EFICACIA, UTILIZAÇÃO, RECURSOS HIDRICOS, SIMULTANEIDADE, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, GARANTIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO.

A SRª JÚNIA MARISE (PDT-MG. Como Líder. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores, não há futuro para um mundo constituído por grande número de predadores, de poluidores, de pessoas, organizações e setores sem visão de desenvolvimento sustentável, de longo prazo.

Não há futuro quando essas grandes e perigosas concentrações de poder não têm - ou operam deliberadamente como se não tivessem - a noção de que o lucro fácil de hoje pode significar a catástrofe de amanhã.

Estou recebendo Ofício da Associação dos Municípios do Lago de Furnas, apresentando o relato do Primeiro Encontro dos Municípios Atingidos pelos Lagos de Furnas, no meu Estado de Minas Gerais, em que se enfatizam as "injustiças a que foram submetidos com o processo de enchimento dos reservatórios das hidrelétricas, especialmente no que diz respeito à Região do Vale do Rio Grande."

Trata-se de assunto da maior importância para o desenvolvimento de Minas Gerais, para a preservação do meio ambiente, para o uso atual e futuro dos mananciais hídricos de Minas Gerais.

A importância desse assunto pode ser verificada pelo fato de que o Lago de Furnas possui um volume de água sete vezes superior ao da Baía da Guanabara, no Rio de Janeiro.

Meu compromisso pessoal com a defesa do meio ambiente não me permite calar ante a falta de providências adequadas por parte das autoridades governamentais, ante as promessas não realizadas pelos governantes, dos programas não cumpridos, e dos objetivos proclamados e não realizados.

O Lago de Furnas está poluído por resíduos sanitários e industriais, lançados diretamente, sem qualquer tratamento técnico.

Trinta e quatro municípios do Estado de Minas Gerais estão sendo diretamente prejudicados pela contaminação das águas do Lago de Furnas, o que representa um perigoso foco de enfermidades para essas populações, que não mais dispõem de água limpa e de boa qualidade.

O resultado dessa situação é, resumidamente, o seguinte: o meu Estado, Minas Gerais, exporta energia limpa e barata para outras regiões do Brasil e, ao invés de receber uma merecida compensação por essa externalidade positiva para o desenvolvimento de outras regiões, recebe, em troca, POLUIÇÃO e desorganização de suas atividades econômicas.

Trata-se de situação inaceitável, não apenas em relação a Minas Gerais, mas de algo deplorável para qualquer Unidade da Federação.

O mais grave de todo esse quadro é a situação de penúria das populações que foram expulsas de suas terras em decorrência do represamento das águas que formam o Lago de Furnas.

As indenizações pagas aos moradores da área inundada foram irregulares, de valor muito abaixo do de mercado, não permitindo que essas pessoas, humildes agricultores, conseguissem recomeçar suas atividades em outras localidades.

Trata-se de situação duplamente injusta e iníqua: os pequenos agricultores perdem com a indenização a preço vil, perdem com a expulsão de suas terras; são obrigados a emigrar e nada recebem em compensação.

As principais conseqüências dessa falta de visão das autoridades governamentais são a desestruturação das atividades econômicas preexistentes, o desemprego, a favelização, o subemprego, a degradação ambiental e os desajustamentos sociais, pessoais e familiares de grande número de pequenos agricultores.

Nada disso é considerado pelos grandes projetos de usinas hidrelétricas: basta verificarmos que multidões de desempregados foram gerados por Itaipu, para cuja construção foram expulsas de suas terras cerca de 42 mil pessoas; em Sobradinho, foram expulsas aproximadamente 70 mil pessoas.

O chamado Plano 2.010 da Eletrobrás expulsará cerca de 300 mil pessoas de suas terras, o que significa verdadeira tragédia humana para essas famílias, as quais dificilmente receberão alguma compensação digna por serem obrigadas a realizar essa nova diáspora.

O Governo Federal e as empresas encarregadas de implantar esses grandes projetos hidrelétricos precisam urgentemente refletir sobre as graves conseqüências sociais e econômicas desses megaempreendimentos.

Não se pode encarar a retirada forçada de milhares e milhares de famílias, de seres humanos, como uma mera questão de custo/benefício econômico, muito menos como um problema de engenharia, economia ou gerência de projeto.

É necessário previamente se encontrar uma solução para os grandes contingentes de desempregados, principalmente mão-de-obra não qualificada, que surge após a conclusão das obras de engenharia.

Até o presente momento, as empresas responsáveis pela implantação desses megaprojetos têm sido incapazes de assumir os custos sociais decorrentes de sua ação; elas não compensam as chamadas externalidades negativas que produzem para as populações locais.

As populações diretamente afetadas pela inundação de suas terras pagam um preço extraordinariamente alto para o desenvolvimento de outras regiões do País.

O progresso resultante da energia elétrica gerada em solo mineiro não retorna às populações expulsas de suas terras; esse benefício é exportado e serve principalmente para aumentar as desigualdades regionais, piora a distribuição de renda em nosso País e para que algumas regiões continuem mais ricas e a maioria de nossos municípios continuem mais pobres.

Muitas dessas pessoas que tomam as decisões que implicam a expulsão de milhares e milhares de pessoas de suas terras nunca viram um migrante, nunca sofreram privações, nunca participaram de uma tragédia humana dessas proporções: conhecem o assunto, ao máximo, do ponto de vista teórico.

Por isso, Sr. Presidente, concluindo aqui a minha manifestação, eu desejo reafirmar que tudo aquilo que estou defendendo, neste momento, após o encaminhamento deste manifesto dos Municípios que integram a região do Lago de Furnas, eu o faço em benefício das populações que são afetadas pelos grandes projetos hidrelétricos. Ela não se aplica apenas ao meu Estado, Minas Gerais, mas igualmente a todas as regiões geoeconômicas brasileiras, que passam por problemas dessa mesma natureza.

É verdade que esses projetos e a construção dessas usinas são importantes e fundamentais para a geração de energia elétrica em nosso País, mas nós não podemos e não pode também o Governo Federal dissociar a questão econômica da questão social em projetos dessa natureza.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/04/1996 - Página 6456