Discurso no Senado Federal

MASSACRE DOS SEM-TERRA NO ESTADO DO PARA.

Autor
Junia Marise (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MG)
Nome completo: Júnia Marise Azeredo Coutinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • MASSACRE DOS SEM-TERRA NO ESTADO DO PARA.
Publicação
Publicação no DSF de 25/04/1996 - Página 7027
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • LEITURA, DEPOIMENTO, PROFESSOR, CONFIRMAÇÃO, OCORRENCIA, VIOLENCIA, POLICIA MILITAR, MORTE, CRIANÇA, TRABALHADOR RURAL, SEM-TERRA, TENTATIVA, DESOBSTRUÇÃO, RODOVIA, ESTADO DO PARA (PA).
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, MANIPULAÇÃO, INFORMAÇÃO, IMPEDIMENTO, APURAÇÃO, PUNIÇÃO, POLICIA MILITAR, RESPONSAVEL, MORTE, TRABALHADOR RURAL, INEFICACIA, IMPLANTAÇÃO, REFORMA AGRARIA.

O SRª JÚNIA MARISE (PDT-MG. Como Líder, pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, também venho falar do massacre dos sem-terra ocorrido no Estado do Pará.

Trago alguns depoimentos que reputo de fundamental importância neste momento, pois retratam a quebra de uma montagem que está sendo divulgada para a opinião pública do nosso País pelas autoridades daquele Estado.

      "Professoras desmentem versão da Polícia Militar e dizem que havia crianças na rodovia"

      "Testemunhas contam que PMs deram vivas após dispararem contra sem-terra"

      "Duas professoras públicas de Belém que assistiram da janela de um ônibus ao massacre dos sem-terra, em Eldorado dos Carajás, afirmam que crianças foram mortas no ataque da Polícia Militar. As professoras chegaram a traçar um quadro ainda mais dantesco da ação da polícia militar: "quando os tiros pararam e a Polícia Militar desobstruiu a rodovia, os policiais começaram a dar vivas e aplaudir" - disse Ana Maria, uma das professoras. Segundo as mesmas, que estavam em janelas opostas do ônibus, puderam contar seis crianças, com idades presumíveis de 6 a 10 anos, esticadas à beira da estrada, cheias de sangue e provavelmente mortas."

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esse é o retrato de um país que, horrorizado, perplexo e indignado, assistiu às cenas transmitidas pelas emissoras de televisão desse massacre, executado à sangue-frio, aos trabalhadores sem terra.

Certamente poderíamos aqui fazer uma comparação: os bandidos são libertados da prisão com armas e até carros para que possam fugir, mas os trabalhadores sem-terra estão sendo hoje recebidos com cassetetes, como já aconteceu em Belo Horizonte, quando a Polícia Militar retirou dos sem-terra de Governador Valadares as armas que possuíam, que nada mais eram que as suas ferramentas de trabalho.

Agora, no Pará, essa situação se agravou mais, porque, realmente, estamos constatando que está havendo, sobretudo por parte das autoridades, a intenção de manipular todas as informações e até mesmo o processo em andamento, impedindo que essas irregularidades cometidas não possam ser apuradas devidamente e punidos os culpados.

As evidências contradizem a Polícia Militar, que alega legítima defesa. Doze vítimas foram mortas com tiros na cabeça depois de dominadas. Os 19 trabalhadores sem-terra assassinados foram vítimas de uma cilada da Polícia Militar. A operação foi cuidadosamente preparada pelo serviço reservado da Polícia Militar, com a colaboração dos fazendeiros e empresários locais.

Tenho em minhas mãos as declarações publicadas na imprensa, inclusive com informações detalhadas por parte das professoras, e a conclusão do Coordenador do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo, Paulo Sérgio Pinheiro, que esteve no local acompanhando a Comissão de Direitos Humanos, e lá constatou a violência que foi praticada.

Nos últimos vinte anos, argumenta ainda, dos 200 casos de homicídios ocorridos no Pará, só 2 foram responsabilizados. O mesmo coordenador denunciou, ontem, o desaparecimento criminoso dos boletins de entrega das armas aos 155 policiais militares.

Ontem, o Batalhão de Parauapebas, considerado o mais duro da operação, confirmou o sumiço de uma prova fundamental, que são as cautelas que identificam os policiais que estavam com porte de armas. Essa hipótese, segundo ainda o Promotor Luiz César Tavares Bibas, é muito improvável, porque configura desrespeito ao regimento militar, passível de punições disciplinares.

Esse fato realmente retrata um País de vergonha, dos massacres e das execuções sumárias. Nós temos um Governo, hoje, que só dá privilégios às elites e aos banqueiros, enquanto a população sofre com uma política sem respeito à vida humana.

O que nós queremos dizer neste momento, Sr. Presidente, é que a sociedade brasileira não aceita mais esse tipo de tratamento. O Governo promete a instalação de um novo Ministério voltado para a reforma agrária, mas, na verdade, estamos verificando, nesses meses, que a questão da reforma agrária é apenas de um Governo que faz-de-conta. Se o Presidente Fernando Henrique Cardoso tivesse, desde o início de seu governo, vontade política para fazer a reforma agrária neste País, teria salvo 19 vidas que foram assassinadas no Pará.

A situação realmente é grave, Sr. Presidente. E é tão grave que certamente, mais uma vez, este Governo vai manipular as informações e se recusar a admitir a própria responsabilidade. Mas a sociedade brasileira, que acompanha esse fato com perplexidade, com indignação, porque não perdeu a capacidade de se indignar, certamente estará a cobrar uma ação decisiva: a vontade política do Governo para fazer a reforma agrária.

O SR. PRESIDENTE (Odacir Soares) - A Presidência pede a V. Exª que conclua o seu discurso.

A SRª JÚNIA MARISE - Sr. Presidente, agradeço a V. Exª e quero reafirmar, em nome do nosso Partido e, sobretudo, em nome da sociedade brasileira, o nosso questionamento às ações deste Governo que agora se vê às voltas com esse problema e com o grande Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e que ainda não aceitou a responsabilidade de fazer a reforma agrária neste País. Nós esperamos que ele a faça a fim de dar um pedaço de chão a esses trabalhadores que querem trabalhar.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/04/1996 - Página 7027