Discurso no Senado Federal

BUSCA, PELO CONGRESSO NACIONAL, DE SOLUÇÕES POLITICAS E LEGAIS PARA EVITAR NOVOS CONFRONTOS COM OS SEM-TERRA. APOIO DA BANCADA DO PMDB NO SENADO AO PRESIDENTE DA REPUBLICA, NAS AÇÕES QUE RESULTEM NA AGILIZAÇÃO DO PROCESSO DA REFORMA AGRARIA NO PAIS.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • BUSCA, PELO CONGRESSO NACIONAL, DE SOLUÇÕES POLITICAS E LEGAIS PARA EVITAR NOVOS CONFRONTOS COM OS SEM-TERRA. APOIO DA BANCADA DO PMDB NO SENADO AO PRESIDENTE DA REPUBLICA, NAS AÇÕES QUE RESULTEM NA AGILIZAÇÃO DO PROCESSO DA REFORMA AGRARIA NO PAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 25/04/1996 - Página 7087
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, APOIO, BANCADA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), GOVERNO FEDERAL, VIABILIDADE, EXECUÇÃO, REFORMA AGRARIA, ASSENTAMENTO RURAL, FAMILIA, SEM-TERRA, PAIS.
  • BUSCA, CONGRESSO NACIONAL, SOLUÇÃO, NATUREZA POLITICA, EXTINÇÃO, CONFLITO, SEM-TERRA, EXECUÇÃO, REFORMA AGRARIA, PAIS.
  • SUGESTÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRIAÇÃO, FORO ESPECIAL, EMERGENCIA, OBJETIVO, PARTICIPAÇÃO, SOCIEDADE CIVIL, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), GARANTIA, VIABILIDADE, ORIENTAÇÃO, ASSENTAMENTO RURAL, FAMILIA, SEM-TERRA, REFORMA AGRARIA, PAIS.

O SR. MAURO MIRANDA (PMDB-GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma semana depois da tragédia do sul do Pará, toda a Nação continua em estado de choque diante daquelas cenas de horror que foram transmitidas pela televisão. Sob a liderança do Presidente José Sarney, o Congresso vem buscando soluções políticas e legais que evitem novos confrontos, e não podia ser diferente. O meu Partido, pela unanimidade de sua Bancada no Senado, decidiu apoiar o Presidente da República em todas as ações que levem a uma Reforma Agrária de fato neste País. Somos a expressão política de um povo que levou um coice paralisante e selvagem, e por isso acredito que cada um de nós deve uma palavra de protesto, em nome da parte da sociedade que representa nesta Casa. E é essa a preocupação que me traz à tribuna.

Para mim, o Brasil assustou-se de repente com um fantasma que fazia parte da vida real, mas era visto apenas no reino da ficção. Nem na Itália fascista de Mussolini, mais de meio século atrás, a Reforma Agrária era tabu, como registra a revista Veja desta semana. Mas no Brasil, com todo o seu território agricultável mal distribuído, já houve tempo em que falar de Reforma Agrária era coisa comunista. Agora, diante do sangue derramado na Amazônia, temos o efeito hemorrágico do descaso. O que vemos hoje, na paisagem conflituosa que se reflete no campo, é o casamento dos sem-emprego, dos sem-teto e dos sem-terra que foram banidos pela incidência simultânea das diversas crises sociais que o Brasil está atravessando.

Como sempre, vamos trancar a porta depois de arrombada. Temo pelas soluções demagógicas de emergência num país em que as leis existem mas não são cumpridas, que tem o maior estoque de terras livres do mundo, mas que convive com a indiferença. O ambiente de terror e o medo de novos massacres não podem e nem devem dar lugar a medidas tópicas, de caráter temporário. A questão fundiária exige respostas rápidas mas consistentes, e a Reforma Agrária tem que avançar com realismo, para resolver os problemas do campo e das periferias inchadas das grandes cidades. Resolver mal agora é projetar novos agravamentos na direção do futuro.

A lição número um a ser extraída da chacina da semana passada é de que o problema já não é só do Governo. Pelo seu estampido e pelas repercussões em cadeia, é uma questão de tal vulto que envolve os interesses de toda a sociedade. Nesse sentido, foi providencial a reunião entre o Presidente Fernando Henrique Cardoso e os Presidentes do Supremo, do Senado e da Câmara, estabelecendo-se uma solidariedade entre os três Poderes para agilizar soluções de emergência. Creio que ainda não é o caso de convocar o Conselho da República, que foi criado pela Constituição, porque as instituições não estão ameaçadas. Mas é correta a advertência do Presidente da República, pedindo que seja evitada a exploração política do episódio. Não devemos brincar com o fogo onde existe pólvora. Sem despolitizar a luta legítima dos sem-terra, poderemos enfrentar dificuldades que não estão nos objetivos de uma Reforma Agrária sólida mas pacífica.

Dentro do objetivo de envolver toda a sociedade civil na aceleração dos assentamentos, quero sugerir ao Presidente da República a iniciativa de criar um foro especial de emergência, um conselho de toda a sociedade, para dividir com o INCRA ou com o cogitado Ministério Extraordinário as responsabilidades pelo encaminhamento da Reforma Agrária. Com o colegiado social legitimado pela participação do Governo e das entidades de direitos humanos, os potenciais de conflito refluiriam para uma mesa de negociação presidida pelo Ministro da Justiça. O Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, existente na estrutura do Ministério da Justiça, é acanhado na sua composição, carece dos poderes especiais por mim imaginados e não tem tido atuação eficiente na prevenção de tragédias como a que aconteceu no Pará. A idéia é a de criar um Conselho Nacional específico para orientar e viabilizar a Reforma Agrária. Hoje, aliás, vejo em alguns jornais que o Governo começou a cogitar ontem desta proposta. Fico feliz pela coincidência, mas gostaria que fizesse parte deste pronunciamento a nota que distribuí para a imprensa de Goiás, na última sexta-feira, antecipando a minha sugestão.

Penso numa representação política que inclua, além das Lideranças dos trabalhadores sem terra, os Ministérios do Planejamento, da Justiça e da Agricultura, os Partidos políticos, a Ordem dos Advogados do Brasil, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura e a Confederação Nacional da Agricultura. Acredito que essa providência, que não é uma solução mas pode ser um caminho, desde que levada a sério, possa produzir uma trégua momentânea no processo de radicalização e restabelecer os canais de diálogo entre o Governo, os proprietários e os trabalhadores. Teríamos nesse Conselho a presença de um poder moderador para liderar e encaminhar os entendimentos das diversas partes envolvidas na questão agrária.

Mas será importante que a causa seja maior que as seduções do exibicionismo político, que o esforço pelo diálogo desarme os espíritos, que os compromissos empenhados sejam cumpridos e que as pautas de discussão sejam objetivas. A cultura brasileira do assembleísmo inconseqüente terá que ser superada, em nome de soluções práticas e imediatas, tendo em vista a gravidade do momento que estamos vivendo. Não há como ignorar que o Governo perdeu o controle de seus instrumentos de iniciativa e de persuasão, restando-lhe a alternativa de repartir com a sociedade civil uma linha de ação conjunta para romper os traumas e os impasses e despassionalizar a questão fundiária.

Já passou a hora de analisar os porquês que nos levaram à tragédia de Eldorado dos Carajás e ao retrato de sangue que ela projetou do Brasil nos quatro cantos do mundo. Os fatos são do mais amplo conhecimento de toda a sociedade brasileira. Neste mesmo Senado, já ouvimos advertências recentes dos Senadores Bernardo Cabral e Iris Rezende, anunciando os riscos da perigosa indiferença do Governo. Ao desistir da viagem aos Estados Unidos, o Presidente da República poupou-se do constrangimento que iria enfrentar e que nos envergonha a todos. Ainda é cedo para avaliar todos os estragos causados pelos massacre, mas já correm versões especulativas comparando nosso ambiente social aos efeitos do movimento zapatista, que deu origem à falência do México. É óbvio que se trata de um exagero, mas é imperativo agir enquanto é tempo, para que não nos transformemos num amplo canteiro de violência.

É preciso enfrentar o problema, manter ânimo frio, tirar o combustível das mãos dos radicais e avançar rapidamente na direção de soluções criativas e finais para a Reforma Agrária.

Tenho convicções definitivas sobre os efeitos de um grande mutirão nacional pela Reforma Agrária. Ela vai interiorizar o desenvolvimento. Vai devolver os excluídos das grandes cidades às suas raízes. Vai inverter, no longo prazo, os sinais da migração desordenada e reduzir as estatísticas assustadoras da urbanização marginal, que multiplica os índices de desemprego e violência, como já acontece no entorno de Brasília. Vai reintegrar milhões de famílias ao direito de vida com dignidade. Vai permitir a organização de núcleos rurais de produção, no apoio ao surgimento de uma nova face agroindustrial do país. Vai aliviar o Estado das pressões que não pode atender nas periferias congestionadas e violentas das grandes metrópoles. E vai promover um novo patamar de distribuição de renda e de arrecadação, com a incorporação de novas forças de trabalho ao processo produtivo.

Qualquer que seja o custo atual de uma Reforma Agrária rápida e consistente, os investimentos serão mais baratos do que o preço social e econômico de novos adiamentos. O vergonhoso massacre do sul do Pará poderá significar, no futuro, aquela gota d´água, ou de sangue, que terá modificado a paisagem social e econômica do País. Acredito que chegamos a tal grau de tensão que o País não vai caminhar enquanto não forem definidos novos rumos para esta guerra declarada, e não mais silenciosa, entre a burocracia e os excluídos. Defendo para a Reforma Agrária uma consciência coletiva de toda a sociedade, no sentido de que ela é um instrumento de desenvolvimento econômico, tanto quanto é um objetivo de equilíbrio social. Ou se tem vontade política para promover a paz no campo, ou vamos aceitar o futuro de convulsão social, com todos os seus efeitos na estabilidade institucional do País.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/04/1996 - Página 7087