Discurso no Senado Federal

JUSTIFICANDO PROJETO DE LEI QUE APRESENTARA EM BREVE, DISPONDO SOBRE OS CRIMES CONTRA OS COSTUMES.

Autor
José Bonifácio (PPB - Partido Progressista Brasileiro/TO)
Nome completo: José Bonifácio Gomes de Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CODIGO PENAL.:
  • JUSTIFICANDO PROJETO DE LEI QUE APRESENTARA EM BREVE, DISPONDO SOBRE OS CRIMES CONTRA OS COSTUMES.
Publicação
Publicação no DSF de 24/05/1996 - Página 8710
Assunto
Outros > CODIGO PENAL.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ATUALIZAÇÃO, CODIGO PENAL, REDUÇÃO, LIMITE DE IDADE, EFEITO, PRESUNÇÃO, CRIME, MOTIVO, INICIO, EDUCAÇÃO, LIBERDADE, SEXO, MENORIDADE.

O SR. JOSÉ BONIFÁCIO (PPB-TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero cumprimentar o Senador Totó Cavalcante por estar assumindo momentaneamente a Presidência do Senado, o que é uma grande honra para nosso Estado.

Informo ao Sr. Presidente e aos Srs. Senadores que, amanhã, vou apresentar um projeto de lei sobre um fato que vem alcançando as manchetes dos jornais. O Supremo Tribunal Federal, recentemente, numa decisão que anuncia o começo de mudanças na mentalidade de nosso povo, uma decisão corajosa, absolveu um cidadão acusado do crime de estupro presumido, por ter mantido relações sexuais, com o consentimento da vítima, uma menina menor de 14 anos.

Nosso Código Penal data de 1940. Com o desenvolvimento dos meios de comunicação, com a programação televisiva que entra em todos os lares brasileiros a mostrar sexo até na novela das 6 horas, por isso tudo, é preciso haver mudanças em nosso comportamento e até em nossas consciências, para acompanharmos essa modernidade que se manifesta em nosso País.

No capítulo que aborda os crimes contra os costumes, sugerimos mudanças nos arts. 215 a 218, 220, 224 e 227, do Código Penal, de 1940.

      POSSE SEXUAL MEDIANTE FRAUDE

      "Art. 215. ...........

      ..............................

      Parágrafo único. Se o crime é praticado contra mulher virgem, menor de 16 (dezesseis) anos e maior de 12 (doze):

      ATENTADO AO PUDOR MEDIANTE FRAUDE

      "Art. 216. ............................

      .....................................

      Parágrafo único. Se a ofendida é menor de 16 (dezesseis) maior de 12 (doze) anos:

      SEDUÇÃO

      "Art. 217. Seduzir mulher virgem, menor de 16 (dezesseis) anos e maior de 12 (doze), e ter com ela conjunção carnal, aproveitando-se de sua inexperiência ou justificada confiança."

      CORRUPÇÃO DE MENORES

      "Art. 218. Corromper ou facilitar a corrupção de pessoa maior de 12 (doze) anos e menor de 16 (dezesseis), com ela praticando ato de libidinagem, ou induzindo-a a praticá-lo ou presenciá-lo."

      RAPTO CONSENSUAL

      "Art. 220. - Se a raptada é maior de 12 (doze) anos e menor de 18 (dezoito) anos, e o rapto se dá com o seu consentimento:"

      A PRESUNÇÃO DE VIOLÊNCIA

      "Art. 224. .......................

      a) não é maior de 12 (doze) anos:

      MEDIAÇÃO PARA SERVIR À LASCÍVIA DE OUTREM

      "Art. 227. ..............................

      ...............................

      § 1º Se a vítima é maior de 12 (doze) anos e menor de 16 (dezesseis) anos, ou se o agente é seu ascendente, descendente, marido, irmão, tutor ou curador, ou pessoa a que esteja confiada para fins de educação, de tratamento ou de guarda."**

Quanto à presunção da violência, hoje se a pessoa é menor de 14 anos, existe a presunção legal. Não importa que não haja violência, que o ato aconteça com o seu consentimento total, a lei prevê a presunção. E o nosso objetivo é abaixar a idade para essa presunção, tendo em vista que atualmente todas as crianças, mocinhas de 12 anos, já estão sabendo, por intermédio da televisão, de todos os meios de comunicação, do cinema, o que é sexo e como pode se pode fazê-lo, numa verdadeira educação sexual.

O Código Penal instituído pelo Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, denominou os crimes sexuais sob a epígrafe: "Crimes contra os Costumes".

O referido Diploma legal reduziu o limite de idade de 16 (dezesseis) anos para 14 (catorze) anos para o efeito de presunção de violência. Justificando a medida, o Ministério da Justiça e Negócios Interiores aduziu, à época, que "com a redução do limite de idade, o projeto atende à evidência de um fato social contemporâneo, qual seja a precocidade no conhecimento dos fatos sexuais. (...) Ora, na época atual, seria abstrair hipocritamente a realidade o negar-se que uma pessoa de 14 (catorze) anos completos já tem uma noção teórica, bastante exata, dos segredos da vida sexual e do risco que corre se se presta à lascívia de outrem."

Passados mais de 40 anos, a assertiva descrita assume proporções muito mais evidentes. O extraordinário avanço tecnológico das últimas décadas levou a sociedade a profundas transformações. Recebe-se hoje uma quantidade de informação jamais recebida em qualquer outro tempo. Os meios de comunicação - rádios, jornais, revistas e, principalmente, televisão - deram à sociedade uma nova face.

Com isso, os tabus inerentes à sexualidade evidenciados àquela época desapareceram. Nos atuais dias não há ignorância sexual. Otavio Frias Filho, em artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo de 18 de agosto de 1994, bem enfatiza a questão ao afirmar que "um adolescente de hoje sabe mais sobre sexo do que qualquer filósofo do passado. (...) É impossível manter as crianças numa ignorância nebulosa sobre o assunto quando imagens do sexo seguro estão por toda parte."

A AIDS, síndrome que aflige o mundo, está levando educadores e governos a reverem suas posições quanto à oportunidade sobre a iniciação da educação sexual. É cada vez mais comum crianças receberem informações no âmbito familiar e nas escolas sobre os riscos de doenças sexualmente transmissíveis.

O projeto que ora apresentamos visa tão-somente adaptar a lei penal à realidade social. Não se pode, hoje, conferir ignorância a um jovem de 12 (doze) anos. Nesta idade, as mutações físicas e psicológicas já se manifestaram, e o elevado nível de informação os tornam capazes de discernir sobre a oportunidade e a propriedade dos seus atos. Aos 16 (dezesseis) anos, o jovem adquire maturidade suficiente para a prática de atos da vida civil e terá, em contrapartida, consciência plena das conseqüências penais.

A presunção de violência, na opinião do ilustre jurista Heleno Cláudio Fragoso, "deve desaparecer da lei, pois dá lugar a soluções injustas, não tendo correspondência, por vezes, na realidade. O abuso sexual dos incapazes de consentir ou de opor resistência deve dar lugar a uma figura de delito específica, à semelhança do que ocorre em certas legislações estrangeiras."

Com o escopo de trazer aos ilustres pares o debate sobre o assunto que ora se trava nos tribunais e que ganha especial relevo na sociedade, sobretudo, visando a atualização da lei penal, o projeto concentra-se basicamente na diminuição do limite de idade para efeito de presunção de violência (art. 224), reduzindo-o para 12 (doze) anos. Prevê, ainda, de igual forma, a redução da idade de 18 (dezoito) para 16 (dezesseis) anos nas circunstâncias agravantes que compõem os tipos penais relativos aos crimes sexuais.

Em síntese, são essas as razões que nos levam a apresentar o presente projeto de lei.

Sr. Presidente, tenho notícias, inclusive, de que existem projetos que eliminam a presunção total da violência, mas acredito que a sociedade não deve se libertar dos seus costumes tão de repente. Se baixamos o limite de idade de 16 para 14 em épocas anteriores, entendo que é o momento oportuno para que baixemos de 14 para 12, intermediando, assim, a vontade dos mais afoitos de uma liberação da presunção total de violência que, acredito, no futuro, será totalmente revogada das nossas leis penais.

Sr. Presidente, em nosso Estado, houve o caso de uma ação de revisão criminal de processo oriundo da minha cidade, Tocantinópolis. Um cidadão foi condenado a seis anos de reclusão por ter mantido relações sexuais com uma moça muito mais experiente do que muitas outras mulheres de maior idade. Pela presunção da violência, ele sofreu essa condenação. E o Tribunal de Justiça, em uma ação de revisão criminal, o absolveu oferecendo os mesmos argumentos que justificam o projeto de lei que ora apresento.

Devemos levar aos nossos Congressistas, ao Senado Federal e à Câmara dos Deputados a discussão de um problema que não pode mais ser adiado.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/05/1996 - Página 8710