Discurso no Senado Federal

ANALISE DA IMAGEM DO CONGRESSO NACIONAL PERANTE A OPINIÃO PUBLICA.

Autor
José Fogaça (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO.:
  • ANALISE DA IMAGEM DO CONGRESSO NACIONAL PERANTE A OPINIÃO PUBLICA.
Aparteantes
Ademir Andrade, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DSF de 12/06/1996 - Página 9659
Assunto
Outros > LEGISLATIVO.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, PRESTIGIO, CONGRESSO NACIONAL, REFERENCIA, OPINIÃO PUBLICA, RESULTADO, PESQUISA, OPINIÃO, DIVULGAÇÃO, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).

O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do Orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs.. Senadores, voltarei a um tema abordado na semana passada, que vem sendo candentemente discutido e polemicamente tratado nas duas Casas do Congresso Nacional, que diz respeito à imagem da Câmara e do Senado. Não se trata de um assunto que pode ser considerado menor, nem tampouco uma questão inferior, porque compreender o papel do Poder Legislativo é entender a democracia.

Recentemente, recebi uma publicação muito interessante do Instituto Gutemberg, que é mantido pelo Dr. Sérgio Buarque de Gusmão, em São Paulo. Esse trabalho, de alguma forma, corrobora aquilo que procurei trazer à reflexão dos meus Pares na semana anterior, ou seja, o Congresso Nacional não é, nunca foi e jamais será uma instituição apoiada e reconhecida por unanimidade nacional.

A revolta de alguns Deputados a respeito de um comentário do jornalista Arnaldo Jabor, o descontentamento, a insatisfação, a indignação, que foi, de certa maneira, repassada à imprensa. O clima que tomou conta e que perpassou a semana inteira aqui no Congresso leva-me mais uma vez a insistir nesta questão: o quanto é importante entendermos isso, até para podermos, nós mesmos, Senadores e Deputados, conviver com os conceitos, com a imagem, com a compreensão e até com a incompreensão que se tem do papel do Congresso Nacional.

Não é possível e nunca acontecerá que, por unanimidade, a sociedade brasileira venha a tecer elogios absolutos, completos e definitivos ao Congresso. Isso é rigorosamente impossível, por uma razão: porque o Congresso Nacional é uma Casa de conflitos, de contradições, de contraposição, não só de idéias. Aqui, circulam não só idéias. As idéias, muitas vezes, revestem interesses e, portanto, esta também é uma Casa de conflito de interesses, interesses que estão localizados lá fora na sociedade brasileira, mas que aqui têm o seu ponto e o seu momento crucial de decisão.

De modo que, antes de mais nada, é preciso deixar bem claro que o Congresso é uma instituição que, quando falta, todos chamam, mas quando está presente é a instituição que todos mais criticam. Estranho, inaceitável? Não. É assim no mundo inteiro. Serve até como um espécie de enigma: o que é o que é que, quando não existe todos querem e, quando existe, todos criticam? O Congresso Nacional. Por quê? Porque ele toma decisões que são parcializadoras dos interesses nacionais e do interesse público. São decisões que fazem generosidade a alguns e mal a outros, justiça a alguns e chorar a outros; que glorificam alguns e indignam outros. Nem por isso ele está deixando de cumprir o seu papel.

Quando se aprova a reforma da Previdência, é possível que aqui estejamos atendendo a um determinado interesse público e a um interesse nacional, mas, seguramente, há uma série de corporações na sociedade brasileira que não querem a reforma da Previdência, que contra ela são absolutamente posicionadas e que passam a ver o Congresso como inimigo público número um, no momento em que aprovar a reforma da Previdência.

Isso significa o quê? Que o Congresso, portanto, não tem valor nenhum? Que o Congresso deve ser fechado? Que o Congresso é uma instituição que não tem prestígio ou que não merece respeito?

Não. Isso significa que ele está fazendo o seu papel de resolver conflitos políticos e de interesse da sociedade.

E brasileiro digno - aqui falo de cada cidadão - é aquele que diz: "Fiquei irritado com o Congresso, indignado com o Congresso, porque ele ´pisou nos meus calos' e nos meu direitos, ou até nas minhas conquistas" - seja lá o que diga -, "mas eu, como brasileiro, não abro mão da existência do Congresso porque, errado ou certo, tomando decisões que me servem ou que não me servem, tomando decisões que me fazem amá-lo ou odiá-lo, é ele, Congresso, é ali que se devem tomar as decisões cruciais e fundamentais em nome da sociedade brasileira".

Uma reflexão maior e mais ampla pode nos levar a supor, portanto, que o Congresso Nacional só teria prestígio como instituição se todos os brasileiros unanimemente o adorassem, exaltassem-no, enaltecessem-no ab aeterno. Não! Isso não irá acontecer nunca! Enquanto tivermos uma sociedade dividida, uma sociedade dualista, de pobres e ricos, de opressores e oprimidos, de exploradores e explorados, de pequenos e grandes, enquanto tivermos uma sociedade assim, de privilégios e de injustiças, o Congresso terá papéis que serão sempre parciais e setoriais e que, portanto, serão vistos pela sociedade brasileira do ponto de vista parcial e setorial.

A população, pelas pesquisas recentemente mostradas no DataFolha, reconhece, sim, por ampla, por absoluta e por total maioria a importância do Congresso. Agora, o que a população pode não gostar é das decisões que ele toma. O cunho, o conteúdo, a orientação dessas decisões, tudo isso é outro problema, que dependerá do posicionamento social, da inserção política, da circunstância que está sendo vivida por cada brasileiro ou por cada grupo social nesse momento.

É bem possível que membros integrantes de uma determinada empresa estatal, como recentemente ocorreu com a Light, no Rio de Janeiro, prefeririam imensamente que a empresa não fosse privatizada, porque as vantagens funcionais - e vamos chamar assim as conquistas sociais obtidas por aqueles funcionários - seriam mantidas. Uma vez que a empresa passe a ser privada, esses funcionários terão uma vida muito semelhante a quase 50 milhões de outros brasileiros, trabalhadores contratados por empresas privadas no Brasil, as mesmas dificuldades, os mesmos problemas.

Logo, a decisão serve a um determinado interesse público, mas desserve a outros. E é assim a cada passo do processo político.

Lembro-me de quando se votou na Assembléia Nacional Constituinte a reforma agrária. Num dia vieram aqui os representantes do Movimento dos Sem-Terra pedindo que se implantasse a reforma agrária. A proposta feita inicialmente provocou reação de outro setor da sociedade. Surgiu um grupo chamado UDR, do qual nunca se tinha ouvido falar e que não tinha nenhuma participação anterior na vida institucional brasileira. A UDR existiu em função de decisões do Congresso, como reação a decisões do Congresso, com uma atitude contrária a ações políticas encaminhadas dentro do Congresso Nacional. E evidentemente, como teve um ano, um ano e seis meses, dezoito meses para se articular, para se preparar, para se organizar, em pouco mais de um ano aquela proposta dos sem-terra teve aqui nas galerias do Congresso uma resposta e uma reação fortíssima e que levou ao fim e ao cabo ao texto que acabou estabelecendo-se, que não é nem de uma reforma agrária dinâmica e radical, mas também não é a de um impedimento ou de uma obstaculização definitiva à reforma agrária.

E esse texto que está na Constituição é bom? Não sei. Não sei se é bom. Mas o texto que está na Constituição é resultado do processo de conflito. Se perguntarmos àqueles membros da UDR, que teve aquele papel, cumpriu aquele papel, fez aquilo que fez, encheu galerias, trouxe agricultores de avião para Brasília, reagiu contra a reforma agrária com veemência e com força, se perguntarmos hoje a eles se estão contentes com o texto produzido na Constituinte, dirão: "Não. Nós odiamos o Congresso pelo que fez em matéria de reforma agrária, porque permitiu a desapropriação de terras através de títulos da dívida agrária, que são títulos podres."

A UDR e seus remanescentes odeiam o Congresso. Ao mesmo tempo, o Movimento dos Sem-Terra também odeia o Congresso, porque não toma as decisões céleres, ágeis, dinâmicas que possam levar a que a reforma agrária seja feita num átimo, de uma hora para outra.

E por que a UDR e o Movimento dos Sem-Terra não gostam do Congresso? O Congresso deixou de cumprir seu papel? Não. Ao contrário. Talvez exatamente porque tenha cumprido muito bem o seu papel é que nenhum dos lados consegue gostar daquilo que foi feito. Porque o que foi feito é uma média equilibrada, racional e democrática dos conflitos e das forças em conflito na sociedade brasileira.

Quando digo isso, não estou referindo-me ao meu papel como Congressista, porque esse será fazer uma opção e lutar por um dos lados dessa questão. Toda vez que o Congresso tomar decisões que eu não goste, estarei insatisfeito profundamente com o Congresso. E isso me leva, em decorrência, a entender que o Congresso é uma Casa desprestigiada, desqualificada? Não. Talvez ao entender esse papel, esse destino inevitável que o Congresso possui na estrutura de uma sociedade, destino que não possuem o Poder Executivo e o Poder Judiciário, nossos queridos colegas Deputados não se insurgissem, não se enraivecessem e não se indignassem de forma tão enfática como fizeram no episódio Arnaldo Jabor.

Esta é uma Casa onde quem enxerga um lado não enxerga os milhares de outros. Isso é o destino, a tragédia e talvez a própria grandeza desta Instituição. Quem aprende a conviver com isso e a entender tal fato aprende, principalmente, a exercer com muito mais isenção, tolerância e espírito de compreensão as críticas que são feitas ao Congresso Nacional.

Estou falando aqui, Srª Presidente, Srªs e Srs.. Senadores, a respeito de uma publicação que recebi do Instituto Gutemberg e para o qual devotei algumas horas, alguns momentos importantes de leitura. Esse instituto trata de analisar a opinião pública, o comportamento e a tendência da mídia e da imprensa brasileira. Lá há um texto da maior importância analisando uma pesquisa do DataFolha.

O DataFolha fez uma pesquisa sobre quais são as instituições de prestígio no País e concluiu que a instituição de mais prestígio no Brasil é a imprensa e a de menos prestígio é o Congresso Nacional.

Nos estudos feitos pelo Instituto Gutemberg, não com outra, mas em cima da mesma pesquisa, há um detalhe e uma análise muito interessantes. A pergunta que é feita a cada um dos entrevistados é a seguinte: você acha que a seguinte instituição é uma instituição com muito prestígio, com algum prestígio, ou sem nenhum prestígio? Esta era a pergunta.

De fato, apenas 26% dos cidadãos responderam que o Congresso Nacional é uma instituição que tem muito prestígio. Essa é uma fantástica surpresa: 26% dos cidadãos têm a opinião unânime de que tudo que está aqui merece ser considerado e prestigiado. Esse percentual é muito maior do que o que racionalmente se deveria esperar.

A resposta importante é a daqueles cidadãos que, por uma razão ou por outra, não gostam do Congresso. Eu, Senador, não gosto do Congresso quando o mesmo decide contrariamente aos meus interesses, aos interesses do meu estado, dos grupos sociais que represento e do pensamento político que procuro trazer a esta Casa.

A resposta dada por essa imensa maioria foi a de que o Congresso deve ter algum prestígio, não um prestígio total e absoluto, porque, se eu lhe der um prestígio total e absoluto, estou me comprazendo e aceitando tudo que aqui é decidido. E não é assim que deve ocorrer. Não aceito tudo que aqui é decidido. Logo, devo reconhecer que o Congresso deve ter algum prestígio, porque, como instituição, precisa existir e ser preservado.

O Congresso é uma instituição indispensável ao processo democrático, e, como disse, quando não existe o Congresso não existe a democracia. Contudo, chamado a tomar decisões, o Congresso vai fazer justiça e, ao mesmo tempo, fazer chorar; será generoso e, ao mesmo tempo, mal; será, ao mesmo tempo, amado e odiado.

Há alguma dúvida quanto a isso?

Não. É assim, porque este é o sistema de conflitos que a democracia exige, este é o sistema de decisões conflitivas, contraditórias, de absoluto e permanente contraponto de idéias e de interesses.

E o interessante nessa pesquisa do DataFolha, segundo a análise do Instituto Gutemberg, é que 70% da população considera que o Congresso tem prestígio. Isso significa que o Congresso está, inclusive, acima da imprensa como uma instituição que é importante para as pessoas.

Mas o fato de uma instituição ser importante não significa que ela deva ser amada, porque ela decide coisas de que eu não gosto, que me atingem e que ferem meus interesses. Logo, sei que é importante, mas não gosto.

E será assim cada vez que uma decisão for tomada. É por isso que, mais uma vez, é importante ressaltar: a população compreende, sim, o papel do Congresso, compreende e sabe o quanto é importante.

Não quero elogios ao Congresso, eu não quero unanimidade brasileira e nacional em favor do Congresso, como elogios ao seu trabalho e às suas decisões. O que eu quero do povo brasileiro, da cidadania desse País, é só uma coisa: que o Congresso jamais seja fechado. A imprensa comete apenas um crime definitivo, total e absoluto contra o Congresso, é quando um jornalista comete a suprema estupidez de pedir o fechamento do Congresso.

Fora isso, criticar, ironizar, fazer um humor crítico em cima dos nossos processos de decisão e do nosso comportamento, isso é parte também do processo de tolerância democrática que um sistema de conflitos exige e que este corpo de mil lados, este poliedro enigmático que é a vida de um Congresso exige de nós.

Por isso fico insistindo, Srªs e Srs Senadores, não em rebater os colegas, não em tentar desdizê-los, nem em tentar esvaziar a sua indignação, mas somente em dizer que é inútil essa truculência de querer colocar jornalistas na cadeia porque criticaram o Congresso. Essa é uma truculência tão inútil que se torna desnecessária.

O exercício do poder, nesse caso, está tragicamente destinado a essa multiplicidade de ódios e de amores em relação ao Congresso Nacional. Faz parte do nosso dia-a-dia, da nossa vida.

É evidente que uma inverdade, uma mentira, a publicação de um fato não comprovado, a manipulação de uma notícia em desfavor desse ou daquele é um delito de opinião, é um delito de imprensa. Entretanto, não é um delito criticar o Congresso, como não deve nos frustrar, nem deve nos amesquinhar o fato de saber que cada um olha o Congresso pelo viés do seu interesse e, segundo esse viés, o Congresso pode não lhe agradar.

Esta é uma realidade de democracias com sociedades divididas socialmente, como a brasileira, em que há tanta pobreza e, ao mesmo tempo, tanta riqueza concentrada; este é um destino trágico e inevitável. Se tivéssemos nós uma sociedade equilibrada, igualitária, sem diferenças e contradições, o Congresso seria um mar de rosas e uma tranqüilidade permanente.

Quero, então, fazer disso, não uma convocação para maior indignação, mas um apelo, isto sim, à tolerância, à compreensão com o que dizem os jornalistas, porque é o ingrediente necessário e inevitável desta Instituição. Ou compreendemos isso, ou seremos vítimas dessa nossa própria idiossincrasia.

Quero dizer, também, que essa pesquisa do DataFolha, sob a análise do Instituto Gutemberg, é a prova cabal, e para mim definitiva, daquilo que estou dizendo. O povo brasileiro, na verdade, quase por unanimidade, prestigia o Congresso, a Instituição. E esse povo que entende que o Congresso tem prestígio - segundo a pesquisa, 70% dos entrevistados - é o mesmo que tem todo o direito de não gostar daquilo que decidimos hoje; de odiar o que decidiremos amanhã e de amar aquilo que será decidido depois de amanhã.

É assim a vida e o processo de decisões democráticas numa sociedade conflituada.

O Sr. Ademir Andrade - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Com prazer, ouço V. Exª.

O Sr. Ademir Andrade - Com o brilhantismo de sempre, faz V. Exª um análise perfeita da nossa realidade e fala a respeito do Congresso Nacional e, também, da imprensa. O discurso de V. Exª busca, inclusive, uma espécie de entendimento, de convívio e de aceitação de críticas mútuas. Tem toda a razão V. Exª e, igualmente, o comentarista da Rede Globo, Arnaldo Jabor. A carapuça não serviu para mim; creio que para V. Exª também não. Acredito que não serviu para muitos congressistas; para outros, no entanto, serviu, o que os aborreceu.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Senador Ademir Andrade, recebi críticas violentas de um jornalista de meu Estado por ter votado a favor do CPMF. O que posso fazer é simplesmente conviver com isso democrática e respeitosamente porque fiz essa opção com consciência. Até admito que, numa perspectiva de longo prazo, esteja errado. Mas, numa perspectiva de curto prazo, depois das demonstrações que fez aqui o Ministro Adib Jatene sobre a situação calamitosa do sistema de saúde, tomei essa decisão. Sei que desagradei muitas pessoas porque inúmeras empresas escrevem para esta Casa solicitando que não votemos o CPMF.

Fiz uma opção: amada por uns, odiada por outros. Não há escapatória para isso.

Perdoe-me V. Exª porque interrompi o seu aparte.

O Sr. Ademir Andrade - A análise de V. Exª, Senador José Fogaça, é perfeita. Só acrescento ao seu discurso um ponto de vista. Na verdade, este Congresso vai continuar sendo assim e vai chegar o dia em que ele será mais querido e mais adorado. Esse dia, evidentemente, dependerá do processo de aprendizado político de nossa população. Uma coisa tem que ficar clara: este nosso Congresso e a própria imprensa têm culpa nesse processo, porque os meios de divulgação deste País são monopolizadores e pregam sempre a idéia de que o político é ruim, é sujo, é desonesto. Infelizmente, grande parte de nossa população assimila esse tipo de divulgação. Na verdade, a maioria do Congresso hoje representa uma minoria da população. Isso é um fato. Quando falo ao povo por onde ando, faço uma comparação. Temos uma população composta por 80% de pobres e apenas 20% de parlamentares defendem seus interesses; enquanto 80% dos parlamentares defendem os 20% restantes da população, a mais aquinhoada, a mais bem situada. Pelo tipo de democracia que temos, pelo próprio tipo de leis que fazemos, que, na verdade, prorrogam a situação de injustiça em que vivemos, dando-lhe continuidade e perpetuidade, tornando difícil transformar a desigualdade social absoluta em que vivemos, temos um país hoje em que esse desnível é calamitoso. Infelizmente, este Congresso age sempre pela força da minoria que domina esta Nação, que tem poder político e sabe manipulá-lo, a ponto de influenciar, diretamente, os meios de comunicação, porquanto os proprietários de rádios e redes de televisão estão vinculados a interesses das elites dominantes. Tudo isso precisa ser mudado, mas para que isso aconteça é necessário que a população compreenda e participe efetivamente do processo político, sabendo que não existe outra forma de corrigir as injustiças sociais deste País a não ser por intermédio da política. O Congresso Nacional, evidentemente, é um instrumento dessa transformação. Precisamos contar com a compreensão e a conscientização política do povo, para fazer com que esta Instituição fique cada dia melhor. Creio que isso está acontecendo, embora a passos muito lentos. Era esta a contribuição que gostaria de dar ao discurso de V. Exª.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Obrigado, Senador Ademir Andrade. V. Exª há de convir que, no século em que vivemos, os momentos de democracia e, portanto, de aprendizado útil e consistente do processo democrático foram muito escassos. Esta é uma das razões pelas quais as instituições democráticas talvez não sejam, muitas vezes, bem compreendidas. Ainda não temos na vida republicana, além do Presidente Juscelino Kubitschek, em mais de 100 anos de República, exemplo de um Presidente que tenha sido eleito pelo voto direto, tenha cumprido todo o mandato e tenha entregue o poder a outro Presidente eleito pelo voto direto. Só há uma exceção em 100 anos de República, que é Juscelino Kubitschek.

O Sr. Pedro Simon - O Presidente Eurico Dutra não conta?

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Não conta porque ele também teve o seu mandato reduzido, de 6 para 5 anos, pela Constituinte.

O Sr. Pedro Simon - Com a concordância dele.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Com a concordância dele, evidentemente. Mas foi uma situação também de não normalidade.

De modo que este País tem de ter algumas razões para as dificuldades que conhecemos de convivência com a democracia. Mas, baseando-me no que acaba de afirmar, Senador Ademir Andrade, quero dizer que V. Exª aprofundou muito aquilo que eu estava aqui analisando. V. Exª falou de outra faixa da população, que não tem acesso às informações, que não debate as questões do Congresso, que muitas vezes não opina e não é ouvida; uma população que também não é aquela que faz essas críticas. Veja V. Exª: o universo ao qual me refiro é dessa mesma classe a que V. Exª se refere como uma classe privilegiada. Essa categoria social tem o poder de receber informações e de emitir opinião. São essas contradições, embora não sejam as contradições globais da sociedade brasileira, que nos levam às contradições que temos como instituição.

V. Exª há de convir que a mesma elite beneficiada é também a que critica, porque são as contradições do interior da elite que aqui se conflituam, sem falar naquela imensa e definitiva contradição entre os exploradores e os explorados, a que V. Exª faz referência.

Quero, sobretudo, ao fazer esta análise, dizer que talvez a pesquisa do DataFolha fosse mais transparente, mais bem intencionada se tivesse mostrado esse lado da questão, se tivesse dito que na soma entre aqueles que dizem que o Congresso Nacional tem algum prestígio estão aqueles que compõem 70% da opinião pública brasileira, que logo é perceptível, que a população respeita o papel do Congresso, mas essa população não poderá jamais gostar unanimemente do que aqui é decidido. Se compreendermos isso, vamos deixar de lado as raivas momentâneas e aprovar a Lei de Imprensa, uma lei que será branda mas eficaz; uma lei que vai impedir que a mentira prevaleça e permitir que a verdade, afinal de contas, tenha vez.

É isso apenas que me parece deva ser encaminhado neste momento, quando se discute a Lei de Imprensa no Congresso Nacional.

Obrigado, Srª Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/06/1996 - Página 9659