Discurso no Senado Federal

RELATANDO DOSSIE ELABORADO PELO FORUM NACIONAL PELA DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TELECOMUNICAÇÃO.:
  • RELATANDO DOSSIE ELABORADO PELO FORUM NACIONAL PELA DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO.
Publicação
Publicação no DSF de 14/06/1996 - Página 9961
Assunto
Outros > TELECOMUNICAÇÃO.
Indexação
  • REGISTRO, DOCUMENTO, DEBATE, AMBITO NACIONAL, DEMOCRACIA, COMUNICAÇÕES, CRITICA, FALTA, ORDEM, SITUAÇÃO JURIDICA, SETOR, ATUAÇÃO, GOVERNO, MANUTENÇÃO, PRIVILEGIO, REPRESSÃO, RADIO, COMUNIDADE.
  • CRITICA, GOVERNO, FALTA, POLITICA NACIONAL, TELECOMUNICAÇÃO, INTEGRAÇÃO, TECNOLOGIA.

A SRª BENEDITA DA SILVA (PT-RJ. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que me traz a esta tribuna hoje, como tem sido a minha atuação desde o início do mandato, é um assunto da maior importância e relevância e que pode ter reflexos e um impacto econômico, cultural e social ainda não imaginados, caso nós, Senadores da República não nos conscientizarmos e tomarmos uma posição. O assunto é o caos jurídico em que se transformaram as comunicações em nosso País.

Os dados que darei a seguir constam de um documento, um dossiê das comunicações, elaborado pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, que eu gostaria de registrar nesta Casa, para que V. Exªs tomem conhecimento e, mais do que isso, tomem uma posição. Esse documento já foi protocolado na Presidência da República, na Procuradoria-Geral da República, no Supremo Tribunal Federal e nos Ministérios das Comunicações e da Justiça.

Nesta matéria, não se pode mais falar em herança de outros governos. Nesta matéria, segundo o dossiê, é o próprio Governo Fernando Henrique que descumpre leis, exclui a participação da sociedade, não abre para o debate público e atua em benefício dos oligopólios da área das comunicações. Mas os fatos registrados pelo dossiê também demonstram a responsabilidade do Legislativo e do Judiciário na alimentação dessa lei da selva em que transformaram as comunicações em nosso País.

No Brasil, a cada dia, está assumindo feições mais nítidas o processo de convergência tecnológica, um processo que se registra no mundo inteiro, ou seja, a integração crescente entre as tecnologias de telecomunicações, comunicação social e informática. Porém, as práticas do governo se mostram desprovidas de um sentido estratégico e demonstram a inexistência de políticas públicas nas comunicações, o que resulta em descaminhos e graves prejuízos para o interesse público.

Vamos tratar de alguns desses assuntos, começando pela aprovação da "Lei Mínima" das telecomunicações na Câmara dos Deputados. Ao aprovar essa lei, dando início à regulamentação da emenda que retirou da Constituição o monopólio estatal das telecomunicações, a Câmara protagonizou um triste ato de submissão ao Poder Executivo e gerou uma aberração do ponto de vista jurídico e político:

. O Congresso Nacional anulou-se, atribuindo ao Executivo a responsabilidade de propor a regulamentação da matéria em até seis meses; durante esse período, o Congresso renuncia a qualquer iniciativa, passando a aguardar o Executivo.

. O projeto aprovado na Câmara dos Deputados definiu que a limitação em 49% do capital votante aberto para estrangeiros permanecerá por apenas três anos; nesse período, o governo fica com o arbítrio de poder legislar sobre as restrições. Ressalte-se que os investidores estrangeiros se mostravam satisfeitos com a limitação dos investimentos a 49%, situação bem mais liberal e vantajosa do que o limite de 33% no Japão e 25% nos EUA.

E o Ministério também assume a responsabilidade exclusiva pela condução da política de telecomunicações, neste período crítico de início de recomposição do modelo das telecomunicações, ou seja, anulou-se neste período inicial o princípio constitucional consubstanciado no instituto do órgão regulador.

Outra importante denúncia do dossiê são os dois pesos e as duas medidas adotadas para liberar o serviço de TV por assinatura via satélite e a truculência e a violência da repressão às rádios comunitárias de baixa potência. No caso da TV por assinatura via satélite - o DTH (Direct to Home) -, o Ministério das Comunicações, ainda durante a discussão da "Lei Mínima", outorgou, através das Portarias 87 e 88, permissões para explorar, por 15 anos, esse serviço. Essas permissões foram outorgadas apesar de graves irregularidades:

- não existe regulamentação para esse serviço;

- as permissões foram dadas como se esse serviço estivesse amparado em outros atos legais, forçando-se uma interpretação e omitindo-se a realidade de que esse serviço gera outros fatos sociais, com importantes impactos culturais, políticos e econômicos;

- não houve a cobrança de valores pelas outorgas, como determina o Decreto 1.719, de 28/11/95.

Dessa forma, os dois grupos, como já estão divulgando amplamente, poderão operar imediatamente mais de cem canais de TV, com sinal digital, a partir de satélites americanos, através de consórcios com a Hughes e o grupo Murdock.

No caso das rádios comunitárias, apesar de estar sendo discutida a sua regulamentação na Comissão de Comunicação, Ciência e Tecnologia, da Câmara, com a tramitação de 9 projetos, entre eles, o do próprio Governo, quando estão sendo feitas ainda as audiências públicas, onde o movimento social, os empresários e a maioria dos parlamentares fazem um esforço para construir um consenso em torno da matéria, e quando já há, em todo o Congresso, a convicção de que é preciso regulamentar esse tipo de comunicação democrática e sob controle das comunidades, o que fez o Governo através do Ministério? Mandou fechar, apreender todos os equipamentos e processar criminalmente os seus responsáveis.

No mesmo caso do DTH, há um vácuo legal, não legítimo, para esse tipo de comunicação. As rádios comunitárias efetivamente estão prestando serviços da maior relevância às comunidades carentes, que nunca tiveram acesso a qualquer direito de se comunicar. Por que então esse tipo de comportamento tão diferenciado? O dossiê do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação tem muito mais denúncias e pede ao Congresso que examine e, assumindo o seu papel de representação social, legisle para a construção de um modelo efetivamente estratégico de interesse público para a totalidade da área das comunicações.

Eu vou cumprir a minha parte. Nesta data, estou pedindo a publicação na íntegra do dossiê para conhecimento dos Srs. Senadores, ao mesmo tempo em que estarei dando entrada em projetos na área de comunicação, para contribuir com o debate e formulação de uma política de comunicação que incorpore a participação da sociedade no processo de aquisição e uso desse instrumento estratégico para a cultura e a economia brasileira.

Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/06/1996 - Página 9961