Discurso no Senado Federal

PROTESTOS CONTRA O TRATAMENTO DADO POR PARTE DA IMPRENSA A POPULAÇÃO E AS INSTITUIÇÕES PUBLICAS ALAGOANAS, A PARTIR DA TRAGEDIA PESSOAL QUE ENLUTOU DUAS FAMILIAS: AS MORTES DE PAULO CESAR FARIAS E DE SUZANA MARCOLINA DA SILVA.

Autor
Guilherme Palmeira (PFL - Partido da Frente Liberal/AL)
Nome completo: Guilherme Gracindo Soares Palmeira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IMPRENSA. ESTADO DE ALAGOAS (AL), GOVERNO ESTADUAL.:
  • PROTESTOS CONTRA O TRATAMENTO DADO POR PARTE DA IMPRENSA A POPULAÇÃO E AS INSTITUIÇÕES PUBLICAS ALAGOANAS, A PARTIR DA TRAGEDIA PESSOAL QUE ENLUTOU DUAS FAMILIAS: AS MORTES DE PAULO CESAR FARIAS E DE SUZANA MARCOLINA DA SILVA.
Publicação
Publicação no DSF de 16/07/1996 - Página 12109
Assunto
Outros > IMPRENSA. ESTADO DE ALAGOAS (AL), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, IMPRENSA, OFENSA, REPUTAÇÃO, ESTADO DE ALAGOAS (AL), DIVULGAÇÃO, ARBITRIO, VIOLENCIA, IMPUNIDADE, FALTA, RESPONSABILIDADE, GOVERNO ESTADUAL, APURAÇÃO, HOMICIDIO, EMPRESARIO.
  • DEFESA, COMPORTAMENTO, IMPARCIALIDADE, GOVERNO ESTADUAL, INVESTIGAÇÃO POLICIAL, HOMICIDIO, EMPRESARIO, ESTADO DE ALAGOAS (AL).

O SR. GUILHERME PALMEIRA (PFL-AL. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, talvez não fosse mais nem o momento de ocupar esta tribuna para tratar de um assunto que considero da maior seriedade, não digo em âmbito nacional, mas no âmbito do meu Estado.

Tive oportunidade de ouvir vários pronunciamentos, hoje, aqui nesta Casa, em que se tratou normalmente de um pessimismo que, lamentavelmente, vem grassando no nosso País. Vi as dificuldades que vivem diversos Estados e o nosso País; mas precisamos viver e ter um certo otimismo, sob pena de mergulharmos naquilo que não queremos.

Lamentavelmente, venho tratar de algo desagradável de que tem sido vítima o meu Estado. Poderia ter esperado, como estou inscrito para amanhã, e ouvir um maior número de companheiros sobre esse tema que trago ao debate. Por que Alagoas está pagando pelos pecados e pelas dificuldades de todo o nosso País? Porque, depois de uma ocorrência lamentável no meu Estado, passa ele a ser vítima de determinado grupo da imprensa e de determinados elementos que não vêem o que tem Alagoas de positivo e se fixam naquilo que não é bom nem para o País, muito menos para Alagoas.

Sr. Presidente, o tratamento dado por uma pequena parte da imprensa à tragédia pessoal e humana que enlutou duas famílias em Alagoas obriga-me a vir a esta tribuna, menos para comentar esse episódio do que para lembrar que há limites éticos e profissionais que, ultrapassados, terminam atingindo, de forma lamentável, a honra, a dignidade e a privacidade dos que nada têm a ver com as posições pessoais e os preconceitos deste ou daquele jornalista, deste ou daquele jornal. Generalizar opiniões preconcebidas, disseminar suspeitas incabíveis, distorcer a realidade e induzir a erros grosseiros por simples parcialidade, seguramente não contribui nem para o esclarecimento da verdade que se busca, nem para a tranqüilidade pública. Não me refiro apenas aos meios de comunicação. Quero aludir, também, àqueles que, investidos de autoridade pública, não resistem aos apelos, às pressões e às demandas dos profissionais da informação, ultrapassando todas as fronteiras da conveniência, do equilíbrio e da isenção que o exercício de suas funções exige. Em geral, o fazem menos em detrimento de sua própria autoridade do que em prejuízo de sua indispensável credibilidade.

Todas essas circunstâncias, que são públicas e notórias, terminaram transmitindo à opinião pública nacional uma falsa impressão de que em meu Estado imperam o arbítrio, a violência, a impunidade, a conivência e a irresponsabilidade. Por todas estas razões, quero deixar consignado, desde logo, o comportamento exemplar, sereno, isento e imparcial do Governo de Alagoas e das autoridades locais, em todo esse episódio. A começar pelo Governador Divaldo Suruagy e pelo Vice-Governador Manoel Gomes de Barros, que esteve em exercício e que, nos limites de suas possibilidades e de suas responsabilidades, deram às autoridades federais todo o respaldo, todo o apoio e toda a cooperação possíveis que lhes foram solicitadas pelo Ministro da Justiça, em nome do Governo Federal. Para a ida a Maceió, a fim de colaborar nas investigações criminais de uma equipe do Departamento de Medicina Legal da Universidade Estadual de Campinas, pediu-se ao Governo do Estado um convite formal do próprio Governador. O Executivo alagoano atendeu imediatamente, sem que a isto estivesse obrigado, uma vez que a responsabilidade para a investigação criminal é da competência da Secretaria de Segurança Pública dos Estados, nos casos indicados pela lei.

As autoridades policiais do Estado, a equipe do Instituto Médico Legal e do Instituto de Criminalística e o Delegado que preside o inquérito foram exemplares, até mesmo diante de algumas atitudes impertinentes, incabíveis e inoportunas, ao prestarem toda a colaboração que lhes foi solicitada, ainda que a isto não estivessem legalmente obrigadas. Houve comedimento, exação profissional e cooperação para quantos se apresentaram em Alagoas em nome de interesses legítimos da apuração criminal. As testemunhas, informantes e pessoas que podiam prestar esclarecimentos, arrolados pelo Presidente do inquérito policial foram inquiridas, reinquiridas, perquiridas e algumas vezes importunadas para repetir à exaustão o que já tinham dito, esclarecido e repetido nos seus depoimentos. Nada disso transpareceu em boa parte da imprensa, simplesmente porque alguns não buscavam a verdade, mas procuravam os culpados de sua predileção. Outros, por alguma forma de interesse, passaram à opinião pública a impressão de que não havia interesse na apuração ou que, generalizadamente, se sonegavam provas. Nada mais lamentável e mais longe da verdade.

Os atos praticados pelas autoridades estaduais foram, quer sob o ponto de vista jurídico, quer sob a ótica da responsabilidade legal, rigorosamente impecáveis. Ninguém extrapolou sua autoridade, ninguém exorbitou de seus poderes. Entretanto, atos rotineiros, providências legais e iniciativas indispensáveis foram apresentadas como resultantes de um estado geral de verdadeira anomia. Ninguém nega que Alagoas, como de resto inúmeros outros Estados brasileiros, têm deficiências, enfrentam problemas e passam por dificuldades financeiras que, em última análise, decorrem da mudança estrutural que vive o País. Os vencimentos dos servidores estaduais estão em atraso, como de resto também ocorre em pelo menos nove outras unidades da Federação. A Polícia Civil e a Polícia Militar enfrentam, como as suas congêneres em todo território nacional, percalços de toda a natureza. Mas isto não significa que haja desídia, desordem ou os serviços públicos não funcionem. Podem funcionar com alguma precariedade, como também ocorre nos estados mais desenvolvidos da Federação, mas cumprem com o seu dever no limite de suas possibilidades e de sua dedicação, mesmo em condições adversas.

No afã de descobrir cumplicidades inexistentes, vínculos de criminalidade nos atos mais rotineiros e solidariedade da classe política alagoana para com desvios de conduta que se verificam em todas as sociedades, homens públicos ilibados em meu estado foram duramente atingidos em sua honra, em sua conduta e em suas atitudes e posturas.

É uma Alagoas, Sr. Presidente, que só existe na má-fé, na irresponsabilidade e nos preconceitos pessoais de alguns maus profissionais. É meu dever repelir tais insinuações e protestar contra esse tratamento dado a um povo e uma sociedade conhecidos por sua hospitalidade, sua devoção ao trabalho e sua diligência.

Um jornal chegou a associar o crime à cumplicidade da política de meu estado e à ineficiência policial. O que posso dizer é que os índices de criminalidade em Alagoas não são maiores nem menores do que na maioria dos estados brasileiros. A alegada ineficiência da polícia não é uma questão local, mas um desafio nacional, em quase todas as unidades da Federação. 

Poderia alinhar dados, fatos, índices e estatísticas que provam essa afirmação. Vou apenas apelar para o testemunho insuspeito de um dos maiores jornais brasileiros, o Jornal do Brasil. Em sua edição de 17 de agosto de 1982, num sereno, equilibrado e contundente editorial, sob o título "A Querela da Polícia", mostrou que uma tese apresentada à Universidade de São Paulo, naquele ano, evidenciava essa situação, ao registrar que dos 60 mil inquéritos recebidos pela Justiça paulista, 17 mil foram mandados de volta à polícia para investigações complementares e 19 mil desde logo arquivados por falta de prova. Nem por isso ninguém ousou acusar o Governo desse estado de omissão nem a sua classe política de cumpricidade com o crime organizado.

Peço desculpas ao Senado por estar tratando de uma questão regional. Trata-se menos de minha indignação pessoal e de minha revolta em nome dos brios alagoanos, duramente atingidos, do que do inqualificável tratamento dado - repito - por uma pequena parte da imprensa a toda a sociedade e às instituições públicas de meu estado. A contribuição de Alagoas ao esforço nacional de desenvolvimento é sem dúvida pequeno, porque é proporcional à sua população e ao seu território. Mas nem por isso pode ser desqualificada, como uma exceção.

Temos dado à Federação brasileira todo o esforço que se pode esperar de brasileiros conscientes de seu papel na construção do Estado. Não somos mais, nem somos menos patriotas do que os brasileiros de outras regiões. Temos problemas para superar nossas próprias deficiências, mas nunca negamos ao Brasil o tributo de nossa contribuição em todas as áreas da atividade humana. A classe política de Alagoas não tem mais virtudes, mas também não possui mais defeitos do que a classe política brasileira, considerada em seu conjunto. O nosso patrimônio cultural e humano honra o nosso estado e é penhor mais do que suficiente de que os nossos padrões civilizatórios são os mesmos da civilização brasileira.

É um injustiça, uma ofensa ao nosso caráter e a nosso sentimentos tratar-nos a todos como não integrados à sociedade e à civilização brasileiras. Os erros, os desvios, as aberrações e a marginalidade devem ser tratados como tais, onde quer que existam, onde quer que ocorram. Não se pode imputar suspeição onde ela não existe. Não se pode atribuir incúria onde ela não ocorre. Não se pode distribuir atestados de incompetência, como se essa parte arrogante e impudente da imprensa que nos atacou, que nos ataca, que nos fere e nos feriu, fosse o padrão de bom comportamento nacional.

Felizmente, Sr. Presidente, a maior parte dos meios de comunicação nacional se rende ou se rendeu às evidências, fazendo-nos justiça. Mas nem por isso podemos esquecer os agravos, perdoar as injustiças e aceitar os insultos. Em nome dos que foram tão duramente atingidos, dos que tiveram a sua honra atassalhada, em nome dos injustiçados, deixo aqui o meu protesto, a minha reação, a minha repulsa. Podemos ter todos os defeitos, e podemos errar, porque os defeitos e os erros são inerentes às condições humanas. Podem acusar-nos de muitas faltas, mas não podem, sem a nossa justa indignação, acusar-nos de sermos passivos, subalternos ou coniventes com os agravos que nos fazem, em nome de mesquinhos, subalternos e inconfessáveis interesses.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/07/1996 - Página 12109