Discurso no Senado Federal

RELATOS DA SUA PARTICIPAÇÃO NA REUNIÃO DA COMISSÃO DE ASSUNTOS POLITICOS DO PARLAMENTO LATINO-AMERICANO, REALIZADA NA CIDADE DO MEXICO. POSICIONAMENTO UNANIME DA DELEGAÇÃO PARLAMENTAR BRASILEIRA, CONTRARIO A LEI HELMS-BURTON. COOPERAÇÃO E INTEGRAÇÃO INTERNACIONAL NO COMBATE AO NARCOTRAFICO, LEVANDO EM CONSIDERAÇÃO A AUTONOMIA TERRITORIAL DE CADA NAÇÃO.

Autor
José Fogaça (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • RELATOS DA SUA PARTICIPAÇÃO NA REUNIÃO DA COMISSÃO DE ASSUNTOS POLITICOS DO PARLAMENTO LATINO-AMERICANO, REALIZADA NA CIDADE DO MEXICO. POSICIONAMENTO UNANIME DA DELEGAÇÃO PARLAMENTAR BRASILEIRA, CONTRARIO A LEI HELMS-BURTON. COOPERAÇÃO E INTEGRAÇÃO INTERNACIONAL NO COMBATE AO NARCOTRAFICO, LEVANDO EM CONSIDERAÇÃO A AUTONOMIA TERRITORIAL DE CADA NAÇÃO.
Aparteantes
Bernardo Cabral, Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 02/08/1996 - Página 13454
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • COMENTARIO, VIAGEM, ORADOR, PARTICIPAÇÃO, REUNIÃO, PARLAMENTO LATINO AMERICANO, ESPECIFICAÇÃO, OPOSIÇÃO, LEI ESTRANGEIRA, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), RESTRIÇÃO, PAIS, EMPRESA, COMERCIO, PAIS ESTRANGEIRO, CUBA, CRITICA, INTERVENÇÃO, DESRESPEITO, SOBERANIA NACIONAL.
  • INFORMAÇÃO, TRABALHO, UNIFORMIDADE, LEGISLAÇÃO, PAIS, COMBATE, TRAFICO INTERNACIONAL, DROGA, IMPORTANCIA, ADIÇÃO, COOPERAÇÃO, RESPEITO, SOBERANIA, AMBITO INTERNACIONAL.

O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB-RS. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, realizou-se no México, no último final de semana, uma reunião da Comissão de Assuntos Políticos do Parlamento Latino-Americano, para qual fomos designados para representar o Congresso Nacional, juntamente com Deputados que representavam a Câmara e que também foram designados pela Direção do Parlatino no Brasil.

O ponto mais importante das decisões tomadas, não há dúvida alguma, foi o documento que surgiu dos debates a respeito da Lei Helms/Burton, que, estranhamente, tem o nome de Lei da Solidariedade Econômica e Cooperativa. Mas, na verdade, trata-se de uma lei punitiva, uma lei de caráter punitivo, porque procura estabelecer regras, segundo as quais as empresas ou países que negociem, que estabeleçam relações de comércio com Cuba, por intermédio de empresas que lá utilizem patrimônio que pertenceu a empresas americanas no passado, sofrem duras, severas restrições de comércio.

Segundo os delegados do próprio governo mexicano - estavam os três mais importantes partidos representados no debate -, para o México, por exemplo, essa Lei Helms-Burton vai representar uma perda, se aplicada na sua extensão, da ordem de U$750 milhões ao ano, em nível de comércio exterior. Felizmente, o Governo Clinton, depois de sancioná-la, resolveu dar um passo político atrás, mas em um sentido positivo, porque resolveu adiar a aplicação dessa Lei até o final deste ano. Evidentemente, como se trata de um ano eleitoral nos Estados Unidos, a aplicação efetiva da Lei Helms-Burton haveria de criar uma frente externa de graves atritos para o governo Clinton e dificuldades políticas que se acresceriam a tantas outras que o presidente americano enfrenta no processo eleitoral, que, dentro em pouco, vai-se instalar nos Estados Unidos, após a realização das grandes convenções nacionais.

De qualquer forma, o importante foi a posição da bancada brasileira, unanimemente favorável ao documento, à postura condenatória à Lei Helms-Burton. A partir de uma visão dos parlamentares que lá se encontravam, membros representantes da Câmara e do Senado, oriundos de partidos os mais diferentes - o PSDB, o PMDB, o PT, o PFL -, estavam lá representados nos quatro parlamentares que foram até a Cidade do México para essa reunião.

E é evidente, Sr. Presidente, que o discurso foi unânime e o posicionamento foi comum entre todos os partidos e todos os parlamentares, no sentido de que essa postura do congresso americano é intervencionista, ultrapassa os limites de respeito à autodeterminação dos povos e tenta fazer com Cuba um tipo de pressão, um tipo de ingerência que está totalmente em desacordo com a atualidade, com a modernidade econômica e política, com a era da globalização.

Cuba, como sabemos, passa por grandes transformações internas, principalmente na estrutura de sua economia, mas deseja - e tem esse direito soberano - manter a atual estrutura política. Podemos discordar e, inclusive, ter um posicionamento crítico quanto ao fato de não se realizarem eleições diretas para presidir o país. Mas essa é uma questão interna, a ser decidida pelo povo cubano, que é dono de sua história.

No entanto, querer transformar o regime político de Cuba, querer transformar a situação política daquele país, através de pressões externas, de um jogo de influência internacional, do exercício do papel de gendarmes, de interesses soberanos de outros países, é algo que está completamente em desacordo com os tempos que vivemos. É uma atitude ultrapassada, que pertenceu ao período de Guerra Fria, que não mais existe, que pertenceu a um período de dualismo primário em que se dividia a humanidade e que, sobretudo, revela que o conceito autoritário e o papel intervencionista que alguns setores da elite americana se atribuíam infelizmente ainda persistem.

A unanimidade das manifestações caracteriza, junto a entidade com a qual o Parlatino convive, a Organização dos Estados Americanos, um posicionamento muito claro dos congressos de todos esses países contra esse tipo de prática, esse tipo de visão política. Portanto, significa também uma atitude coletiva de respeito a Cuba, a sua autodeterminação, ao direito que têm os seus cidadãos, o seu povo de escolher o rumo da sua história, o destino da sua gente.

Por outro lado, Sr. Presidente é importante reportar também que, quando procuramos participar das diversas comissões de trabalho, procuramos ser fiéis aos posicionamentos assumidos pela maioria dos membros do Senado Federal em todas as tendências e votações registradas, embora tivéssemos a liberdade de votar de acordo com a nossa visão partidária, de acordo com a nossa posição ideológica, quisemos, sobretudo, expressar um pensamento do Senado Federal do Brasil e não tão-somente o pensamento de um partido político ou de visão estreita e particularizada.

Entendíamos que, tanto na questão do narcotráfico quanto na questão relativa à Lei Helms-Burton, estávamos expressando o pensamento do Senado. Poderíamos ter sido, talvez, infiéis, ou poderíamos ter sido, talvez, não perfeitamente fiéis ao pensamento mais detalhado de cada Senador, mas cremos estar expressando, como os Deputados também procuraram fazê-lo, o pensamento majoritário da Casa.

O Sr. Eduardo Suplicy - V. Exª me permite um aparte, Senador José Fogaça?

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Ouço V. Exª com prazer, Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy - Gostaria apenas de registrar, Senador José Fogaça, que, pelo que expõe, V. Exª traduziu com muita clareza e firmeza aquilo que tem sido o objeto da reflexão de diversos Senadores relativamente à Lei Helms-Burton, pois avaliamos que, de fato, aqui, o congresso dos Estados Unidos ultrapassou o que seria de bom-senso, numa atitude discriminatória com respeito a Cuba e, inclusive, estendendo às empresas que tem ramificações por todos os demais países. Não é à-toa que os diversos países da União Européia e, agora, os países da América Latina, estão, assim como o Canadá, protestando com respeito a essa medida. Será importante que o congresso norte-americano esteja sensível à reação que se passa ao nível das casas legislativas em toda a América Latina, inclusive no Brasil. V. Exª tem a nossa solidariedade pela postura tomada na Cidade do México.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Agradeço o aparte ao nobre Senador Eduardo Suplicy.

Com muita honra, concedo o aparte ao Senador Bernardo Cabral.

O Sr. Bernardo Cabral - Senador José Fogaça, quero saudá-lo pela linearidade do seu discurso no relato absolutamente correto do que se passou, mostrando a unanimidade das decisões, a convergência das opiniões. Gostaria de lembrar que a Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional aprovou, por unanimidade, voto de repúdio a essa manifestação da chamada Lei Helms-Burton. Também quero me congratular com V. Exª. Há muito sei que quando uma missão lhe é cometida, V. Exª a cumpre com absoluta seriedade. O Senado está de parabéns pelo relato que V. Exª faz.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Muito obrigado, Senador Bernardo Cabral.

Para encerrar, Sr. Presidente, apenas tenho o dever também de reportar que a comissão, que se reuniu no segundo e no terceiro dia de trabalho, tratou da legislação comum aos diversos países no combate ao narcotráfico. Nós concordamos com todos os pontos que foram aprovados, mas registramos enfaticamente que, ao lado dessa atitude cooperativa internacional, a par de aceitarmos um processo integrado, um processo de ação conjunta no combate ao narcotráfico, a postura do Senado, a postura do Congresso Nacional é a de não repelir a participação num processo integrado de combate ao comércio de drogas, que se vale de pontos estratégicos da América Latina para chegar ao mercado norte-americano.

Aceitamos, evidentemente, todos os pontos de regime cooperativo e integrado de trabalho que foram aprovados na comissão que tratou da matéria e que leva as suas recomendações a OEA.

No entanto, Sr. Presidente, deixamos bem claro que, mesmo aceitando essa integração, essa uniformidade ou essa prática integrada de ação, o Brasil não abre mão, nem mesmo nas chamadas regiões dos grandes vazios populacionais, como a região amazônica, de exercer a sua total soberania territorial e militar. De modo que todas as operações que forem realizadas em solo brasileiro ou no espaço aéreo nacional o serão sob a égide e o comando soberano das Forças Armadas brasileiras, que estão subordinadas ao Presidente da República, que por sua vez está subordinado à Constituição Brasileira.

Registramos esse ponto com toda ênfase e pedimos que ele fosse assinalado no documento final, que será levado para todos parlamentos, todos os congressos latino-americanos, todos os congressos nacionais dos países do continente, para que haja harmonização, integração, em busca de certa base uniforme na legislação aplicável ao combate às drogas.

Deixamos bem claro que o Brasil aceita integrar-se num trabalho amplo e que, obviamente, serve ao interesse público e ao interesse nacional de cada um desses países. O que o Brasil não aceita, o que o Congresso Nacional brasileiro repudia é que esse combate ao narcotráfico possa servir de pretexto à mínima quebra da nossa soberania e do mais absoluto controle militar e do espaço aéreo do nosso território.

Feito esse registro, Sr. Presidente, queremos também agradecer ao presidente do Parlatino no Brasil, Deputado Federal André Franco Montoro, por nos ter designado para representá-lo naquela reunião.

Procuramos ser o mais fiel possível ao pensamento do Congresso, mas felizmente, mesmo sendo fiel ao pensamento do Congresso, do Senado e da Câmara dos Deputados, em nenhum momento, contrariamos o nosso sentimento individual, o nosso sentimento particular nas teses que expusemos.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/08/1996 - Página 13454