Discurso durante a 116ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

ALERTANDO PARA AS DIFICULDADES QUE ATRAVESSA A CAFEICULTURA NO BRASIL.

Autor
Osmar Dias (S/PARTIDO - Sem Partido/PR)
Nome completo: Osmar Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • ALERTANDO PARA AS DIFICULDADES QUE ATRAVESSA A CAFEICULTURA NO BRASIL.
Aparteantes
Ernandes Amorim, Gerson Camata.
Publicação
Publicação no DSF de 14/08/1996 - Página 13851
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, LAVOURA, CAFE, MOTIVO, INFERIORIDADE, PREÇO, MERCADO INTERNACIONAL, APREENSÃO, DESEMPREGO.
  • ANALISE, ORIGEM, MAIORIA, TRABALHADOR RURAL, SEM-TERRA, REDUÇÃO, LAVOURA, CAFE, CRITICA, ATUAÇÃO, MINISTERIO DA INDUSTRIA DO COMERCIO E DO TURISMO (MICT), AUSENCIA, DEFESA, COMERCIO, PRODUTO NACIONAL, ESPECIFICAÇÃO, ALGODÃO.
  • SOLICITAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, SENADO, MOBILIZAÇÃO, GOVERNO, ALTERAÇÃO, POLITICA AGRICOLA.
  • COMENTARIO, REDUÇÃO, AREA, CULTIVO, MUNDO, AUMENTO, CONSUMO, ALIMENTOS, NECESSIDADE, POLITICA AGRICOLA, BRASIL, ATENÇÃO, GLOBALIZAÇÃO, ECONOMIA, VALORIZAÇÃO, PRODUTO EXPORTADO.
  • SOLICITAÇÃO, ARLINDO PORTO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA AGRICULTURA (MAGR), PROPOSTA, GARANTIA, EMPREGO, LAVOURA, CAFE.

O SR. OSMAR DIAS (Sem Partido-PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje de manhã, o noticiário da televisão apresentou uma entrevista com um cafeicultor de determinado Estado. Perguntado sobre que atitude tomaria a respeito da situação dos preços do mercado internacional do café, o cafeicultor respondeu que iria erradicar a sua lavoura e implantar pastagem.

A situação em que vive a cafeicultura não deixa muitas outras alternativas aos produtores. Estou falando, Srs. Senadores, de uma cultura que está presente em dez Estados do Brasil - portanto, que interessa nacionalmente -, que participa da balança comercial com US$2 bilhões todos os anos, que está presente em 1.850 municípios deste País, em 200 mil propriedades - em especial, em pequenas propriedades - e que foi, durante muitos anos, a alavanca do desenvolvimento nacional.

Foi a cultura do café que promoveu o desenvolvimento de muitos Estados do nosso País. Ela deve interessar inclusive não apenas aos cafeicultores - aliás, antes que me perguntem, não tenho um pé de café -, mas ao Presidente da República, porque essa cultura gera um milhão de empregos diretos na lavoura e três milhões de empregos na cadeia de produção, inclusive na indústria e exportação.

Sob o aspecto social, nem dá para discutir: é a lavoura, de longe, que emprega mais mão-de-obra; é a cultura que gera mais empregos no campo e que evita, dessa forma, que as médias e grandes cidades sejam pressionadas ainda mais por trabalhadores em busca de empregos.

Ouço, nesta Casa, leio na imprensa e até assisto em novelas à discussão de um tema de extraordinária importância, que é a reforma agrária. Mas, de repente, as pessoas falam sobre reforma agrária esquecendo-se das causas que levaram milhares de famílias a estar, hoje, na fila, aguardando - muitas, aliás, a maioria delas espera em vão - o assentamento em um pedaço de terra, em uma propriedade. Isso, certamente, alcançará uma pequena e quase insignificante minoria, diante do universo de famílias que hoje aguardam a sua oportunidade.

Posso afirmar que a maioria das famílias que hoje anseiam pelo assentamento um dia foram ou trabalhadores numa lavoura de café ou cafeicultores, que, por causas diversas, encontraram a única solução possível: o abandono da lavoura, com a erradicação apoiada principalmente - incrível! - pelo Governo, em 1975.

Embora ainda estejamos vivendo um momento em que a lavoura de café participa com 5,2% da balança comercial, o Governo Fernando Henrique não está dando a devida atenção a essa cultura. Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo, para onde foi a coordenação da política de comercialização do café? Parece que dá importância apenas para o setor automotivo, peças e brinquedos. Já temos o desastre na cultura de algodão, praticamente esquecida por esse Ministério, que não investiga, na origem, se há ou não subsídios. E, por não investigar, permite a importação do algodão, que chega ao nosso País subsidiado e competindo de forma desigual com o produto nacional, reduzindo a cultura do algodão para praticamente um terço da área plantada há alguns anos. O algodão, como cultura anual, gera intensamente empregos; na cultura do café, como lavoura permanente, ocorre o mesmo.

Não quero que aconteça com o café o que aconteceu com o algodão. A afirmação de um entrevistado de hoje de manhã, de que vai erradicar sua lavoura de café para plantar pasto, será regra se o Governo Fernando Henrique não nos ouvir.

Hoje, tomamos uma iniciativa importante na Comissão de Assuntos Econômicos: o Presidente Gilberto Miranda e demais membros criaram uma subcomissão que vai tratar desse assunto nesta Casa.

Um simples pronunciamento feito por mim, na semana anterior, já provocou a manifestação de países exportadores. A Colômbia, por intermédio da sua Federação de Produtores de Café, encaminhou-me ofício com um convite, para que uma comissão do Senado vá à Colômbia e negocie com esse país exportador um acordo, principalmente no sentido da organização dos países exportadores.

Quero explicar o que ocorre: o Brasil produz, em anos bons, de 25 a 28 milhões de sacas de café, sendo ainda o maior produtor mundial, apesar de todos os desastres na política de exportação e de toda a inconseqüência de atos como o da extinção do órgão que coordenava a política cafeeira, o IBC, em 1990. Ainda assim, o Brasil é o maior produtor e o maior exportador, comercializando cerca de 16,5 milhões de sacas, com um faturamento de mais de US$2 bilhões todos os anos. A Colômbia, por sua vez, é o segundo maior produtor, com uma colheita em torno de 16 milhões de sacas, em alguns anos, e 13 milhões, em outros.

Pois bem, somando-se a produção do Brasil com a da Colômbia, chegaremos a representar de 42% a 43%, às vezes até 45% do mercado mundial de café. Se nos organizássemos a ponto de promover um encontro e um acordo com esse segundo maior produtor mundial, estaríamos propiciando o início de uma nova fase no mercado internacional de café, uma vez que esses dois países juntos poderiam ditar a política de comercialização internacional do produto.

Isso não ocorre porque, a partir da quebra do acordo internacional do café, na década de 80, os países importadores se organizaram a ponto de determinarem os preços do mercado internacional. Alguém poderá dizer:"Como o Senado Federal pode pregar o aumento de preços do café? E os consumidores?"

Ora, houve queda de um terço no preço do café: há dois meses, a saca custava US$140, hoje não chega a US$100, e já se fala que pode custar US$85. Isso é um desastre, porque o custo de produção cresceu 70% em apenas um ano, enquanto houve redução de preços que chegou a 30%. A redução pode ser ainda maior, se nada for feito. Pois bem, os consumidores não usufruíram de nenhum benefício decorrente da queda dos preços do café. Pelo contrário, mesmo em pleno Real, os preços do cafezinho continuaram a crescer; igualmente, os preços dos derivados.

Fiz questão de convidar o Senador Gerson Camata para participar do meu pronunciamento; sei que S. Exª vai fazê-lo. Pela importância dos seus Estados na cafeicultura, outros Senadores também o farão. Mas, Senador Gerson Camata, quis convidá-lo porque acompanhei, antes de ser Senador, a sua luta pela cafeicultura. Presto-lhe uma homenagem, lembrando-me dos tempos em que eu era Secretário da Agricultura e sabia que existia um Senador preocupado com o café do Brasil.

Hoje convido e convoco o Senado Federal para participar desse esforço, que será de extrema importância, no sentido de segurar no campo esses três milhões de trabalhadores, em toda a cadeia de produção do café. Do contrário, eles pressionarão ainda mais o já combalido e precário mercado de trabalho dos grandes centros urbanos.

Sei que no tempo da mídia, no tempo em que a mídia, às vezes, é mais importante do que os feitos e os fatos, existem governos que promovem verdadeiras festas, com rojões, com direito a champanhe francês, para comemorar a eventual criação de dois mil empregos decorrentes da instalação de uma fábrica como, por exemplo, no Paraná, da Renault. Digo eventual porque nem sei se serão dois mil empregos. Fazem uma festa! Parece que se salvou o mercado de trabalho e que não haverá, daqui em diante, mais desempregos no nosso Estado e nosso País.

Quando se fala em um mercado de trabalho em que poderá haver um milhão de empregos diretos e três milhões indiretos, o Governo se cala. Parece que o Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo ainda acredita que vamos comer porcas, arruelas, parafusos, porque não fala no produto primário, não estabelece uma alíquota de proteção para produtos importados com subsídios, como não organiza o mercado para produtos de exportação, como o café.

Os plantadores de cacau da Bahia sentiram o drama da falta de coordenação política; os de café sentem o mesmo. E nós, que representamos os Estados produtores de café, que sentiremos a influência direta da derrocada da cafeicultura nacional, devemos reagir para que possamos, a partir do Senado, mobilizar o Governo e fazer com que o Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo dê mais atenção a um setor de extrema importância para a balança comercial, para o emprego - campo econômico e campo social - e para que o Itamaraty também se envolva nesse pretenso acordo que pretendemos fazer com os países exportadores. Estou propondo a união dos países exportadores para que, organizados, possam eles ditar os preços no mercado internacional. Os preços são determinados por informações, e muitas vezes essas informações não são verídicas.

O Sr. Ernandes Amorim - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. OSMAR DIAS - Concedo o aparte, com satisfação, ao Senador Ernandes Amorim.

O Sr. Ernandes Amorim - Senador Osmar Dias, mediante este pronunciamento, V. Exª aborda um assunto que é grave e que deveria estar sendo objeto de discussão permanente por parte desse Governo, que não tem política para a área agrícola. Represento um Estado, Rondônia, que também tem como base a produção de café, razão pela qual tenho acompanhado a evolução dessa questão no âmbito nacional. Assisto, com interesse, a programas como o Globo Rural. Em uma das apresentações - sei que V. Exª também assistiu - mostraram um agricultor que, diante da lavoura tão carregada, tão sadia, num momento em que o café está produzindo, estava desanimado, eu diria, desesperado, pedindo socorro, na iminência de ter que extinguir a lavoura em plena produção, por falta de apoio, por falta de uma política governamental que dê sustentação à cafeicultura no Brasil. Sabe-se que qualquer um dos tantos sem-terra que temos, se ganhasse terra para trabalhar, optaria pela plantação de café, principalmente porque se trata de uma lavoura em relação à qual o Brasil tem um passado brilhante e também porque nossa terra é apropriada para esse cultivo. Sentimos, portanto, a falta de governo na área da agricultura, especialmente no que se refere à cafeicultura. Assistimos também, no Globo Rural desta semana, ao desespero dos produtores de cebola. A produção de algodão no Brasil não é valorizada. Quando não há, importa-se o produto, às vezes até daqueles que concorrem deslealmente com o agricultor brasileiro. No meu Estado, Rondônia, também a cacauicultura sofre as mesmas conseqüências da falta de assistência. Hoje não se tem mais cacau, porque a vassoura-de-bruxa acabou com as lavouras. Não há nenhum programa de recuperação de cacau nesse Estado, não há apoio. Houve publicidade em torno da possibilidade de haver apoio para a recuperação das lavouras cacaueiras no nosso Estado, mas os recursos não chegaram. Por tudo isso, nobre Senador, sentimos que falta governo, falta apoio ao homem do campo quase que em todas as áreas produtivas da agricultura. Cabe ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, por intermédio do Ministro da Agricultura, não só atentar para esses problemas, mas acompanhá-los, para que se tragam soluções para os produtores de café e de outras lavouras no Brasil.

O SR. OSMAR DIAS - Obrigado, Senador Ernandes Amorim, por ilustrar a importância da cafeicultura para o nosso País e por alertar esta Casa para o fato de que estamos perdendo as perspectivas positivas do futuro da cafeicultura mundial. Fiz o mesmo alerta, no ano passado, em relação à safra de grãos. Disse que havia uma dinâmica no mercado internacional que apontava para estoques baixos. E hoje há estoques de alimentos no mundo para apenas 50 dias. Corre-se o risco de que futuras gerações sofram a falta de alimentos. Poderemos ter problemas não apenas em relação àqueles que não têm dinheiro para comprar comida, mas também com a falta de oferta de comida no mundo, porque, se hoje plantamos 0,3 hectares por habitante, daqui a 50 anos, a projeção é de que estaremos plantando 0,15 hectares, portanto, apenas a metade.

Há necessidade de que países como o Brasil cumpram um importante papel nesse cenário mundial. A China aumenta o seu consumo, e o Brasil está de olhos fechados; os Estados Unidos, pela primeira vez depois da Segunda Guerra Mundial, abrem o sistema de quotas e permitem que os produtores plantem o que quiserem, e o Brasil continua de olhos fechados; o mundo caminha para a globalização, e o Brasil fala em política agrícola, voltando os seus olhos apenas para o território nacional.

E o café, Senador Gerson Camata, que em nosso País ainda significa essa estupenda fonte de renda, tem essa perspectiva. Hoje existe um consumo mundial de 105 milhões de sacas e uma produção mundial média de 93,5 milhões de sacas. Há, portanto, carência e necessidade de se aumentar a produção de café em 11, 12 milhões de sacas. E só há dois ou três países que podem fazê-lo. Entre eles está o Brasil, que pode ampliar nesse volume sua capacidade de produção, porque temos tecnologia moderna, do café adensado, que permite, por unidade diária, que se produza três a quatro vezes mais o que se produzia com o café tradicional.

Essa tecnologia poderia ser adotada pelo Governo, que, aliás, está agindo equivocadamente, no momento de safras, liberando estoques, quando estamos colhendo a produção, jogando 15 mil sacas de café. Aí, um técnico do Governo me diz: "Mas 15 mil sacas não é nada; o Brasil consome 10 milhões de sacas de café todos os anos". Mas como não é nada? Em plena safra? Isso faz com que se balize o preço pelo preço de leilão, que é baixo. É esse um dos fatores que têm derrubado o preço no mercado brasileiro e, em conseqüência, no mercado internacional.

Estamos chutando nossa canela, estamos jogando contra nosso patrimônio, porque estamos reduzindo o preço no momento em que o Brasil vai exportar. Mas isto não é só inconseqüência; isto é incompetência também. E isto precisa ser alertado. Se há aqueles que não conhecem o assunto, que consultem aqueles que conhecem. E há muitos que conhecem o assunto que poderiam estar hoje dando opiniões e sugestões, para que essas burrices não fossem praticadas num momento tão inoportuno quanto este.

O Sr. Gerson Camata - V. Exª me permite um aparte?

O SR. OSMAR DIAS - Com satisfação, ouço V. Exª.

O Sr. Gerson Camata - Senador Osmar Dias, fico feliz em ver a competência com que V. Exª expõe ao Senado, ao País e principalmente ao Governo a situação em que se encontra a cafeicultura brasileira. Mas a imagem, os traços fundos e cruéis que V. Exª apresenta retratam bem a realidade de toda a agricultura brasileira. Dentro do quadro do café, por exemplo, veja V. Exª que os cafés produzidos no Paraná, que são os chamados bebidas moles, estão chegando ao preço de R$80 a saca. Os bebidas duras, os cafés tipo Riado do Espírito Santo, já estão a R$60 a saca, e isso não paga mais o custo de produção. Veja V. Exª que ocorre um outro problema ainda mais sério. O Espírito Santo atravessa um longo período de estiagem; duas pragas estão destruindo a cafeicultura do Espírito Santo: a seca e o Governo; sendo que no resto do País só há uma praga. Há uma comoção; o Estado, apesar de geograficamente pequeno, é o segundo maior produtor de café do Brasil, e toda a mão-de-obra agrícola é baseada quase que essencialmente na monocultura do café. Nós vivemos um momento crucial na história do Espírito Santo, e não se vê - V.Exª acentuou bem isso - nenhuma atenção do Governo no sentido de dar um amparo, uma mão ou até de aumentar essa produção, porque, além de criar empregos, vai criar dólares na hora da exportação. Pelo contrário, V. Exª salientou bem: eles aguardaram certinho a hora em que o agricultor tinha acabado de fazer a sua colheita, a hora em que ele se preparava para reter um pouco, para ver se melhorava o preço, para jogar o seu café no mercado, aí o Governo abriu o leilão, para derrubar o mercado e atrapalhar a vida. Não sei de que lado esse pessoal está trabalhando. E há um outro fato ao qual certamente V. Exª vai chegar: o Brasil abriu o mercado brasileiro para automóvel estrangeiro, para geladeira estrangeira, para bonequinha de matéria plástica estrangeira, para tecido estrangeiro e em nenhum momento se preocupou com o enorme poder de barganha que representa isso, de colocar produtos brasileiros em troca. Pelo contrário, foi uma generosa abertura do mercado em troca de nada. Não se tentou, em nenhum momento, colocar nenhum produto brasileiro no mercado internacional em troca da abertura de um mercado tão grande como é o mercado brasileiro às grandes empresas multinacionais. Mas há ainda preocupações que afloram no discurso de V. Exª. Lembra-se V. Exª de que, há três anos, foi fundada aqui em Brasília a Associação dos Países Produtores de Café. Como o café não merece mais importância na mídia brasileira, naquele dia estavam aqui 27 Ministros de Agricultura e três Vice-Presidentes de República de países produtores de café. Nesse dia, o Vice-Presidente da Costa Rica disse-me que, durante os três dias dessa reunião, não saíra nenhuma nota em nenhum jornal brasileiro. Ele me disse: "O Brasil não se apercebe do que está acontecendo aqui. Pela primeira vez, os produtores vão-se organizar". Nesse mesmo dia, três indivíduos carregando uma bandeira vermelha quebraram uma vidraça do Congresso Nacional. Saíram todos nas televisões e em todos os jornais. Então propus que saíssemos todos em passeata e quebrássemos o vidro do Congresso, porque assim iriam descobrir que, no Brasil, está-se fundando a Associação dos Países Produtores de Café. O mais grave dessa reunião - V. Exª sabe disso - é que se acordou uma maneira de nós, países produtores - Brasil, Colômbia, Costa Rica, México, Índia, até o Vietnã veio a essa reunião, pela primeira vez no Brasil - resolvermos o problema, que seria estabelecer a política de retenção. O primeiro país que não cumpriu foi o Brasil - V. Exª sabe disso. Aqui se fundou e se estabeleceu a política da retenção; o primeiro país que não cumpriu foi exatamente o Brasil, por obra e graça do Governo, que não era esse, era outro, mas que não cumpriu. Penso que a hora dessa frente que V. Exª anuncia, já que por parte do Executivo, por parte dos Ministérios do Governo, há um descuido total, o Poder Legislativo vai ter que assumir essa bandeira e salvar o que resta da cafeicultura. Daqui a pouco, vamos ter que fazer também um grupo para salvar o milho, a soja, o feijão, o arroz, para salvar o Brasil, a agricultura brasileira, que está indo toda no roldão dessa política desastrada a que estamos assistindo; até agora impacientes, mas, agora, com o grito de V. Exª de protesto e de alerta.

O SR. OSMAR DIAS - Senador Gerson Camata, é de extrema importância o aparte de V. Exª. O Presidente já vai apertar a campainha, a luz já acendeu, mas peço um pouco de tolerância, porque todas as vezes que vou me inscrever para falar, Sr. Presidente, já há vinte oradores na frente.

O SR. PRESIDENTE (Ney Suassuna) - O tempo de V. Exª já está exaurido em três minutos, mas, por favor, conclua.

O SR. OSMAR DIAS - Obrigado, Sr. Presidente, tendo em vista a importância do café e em homenagem aos cafeicultores, que continuam resistindo, apesar dos preços baixos. Há uma esperança: não temos mais no Ministério da Agricultura um Ministro preocupado apenas com juros e correção monetária: temos um Ministro da Agricultura que é de um Estado produtor, que é Minas Gerais. Sei que o Ministro Arlindo Porto vai tomar conhecimento deste meu pronunciamento. Como nas últimas três semanas tentei falar com S. Exª, pelo telefone, e não consegui, tem sido difícil, vou falar pela tribuna do Senado; talvez assim S. Exª, lendo este pronunciamento, entenda a importância de o Ministério da Agricultura também assumir uma certa liderança, porque não é possível aceitar, Senador Gerson Camata - V. Exª é um dos maiores entendidos do assunto -, V. Exª sabe que eram 16 fazendas experimentais que o Ministério da Agricultura tinha no tempo do IBC, no tempo do Ministro Pedro Simon e de outros Ministros da Agricultura. Hoje, são apenas duas fazendas que não funcionam.

Temos 27 técnicos do Ministério da Agricultura, no Brasil inteiro, tratando do assunto café, um produto de R$2 bilhões na balança comercial e de 4 milhões de emprego. Isso é uma brincadeira, e o Ministro Arlindo Porto, sendo de Minas Gerais, interpretará bem as palavras que estou dizendo aqui. Não fará, com certeza, uma proposta tão ridícula como a que foi feita, ainda neste Governo, quando o Ministro era outro.

O outro Ministro se preocupava com juros e correção monetária e encontrou uma fórmula mágica para fazer reagir os preços no mercado internacional: queimar os estoques de café do Brasil. Meu Deus do céu! Não tem nem o que analisar de uma proposta dessas: queimar o nosso café para fazer reagir o preço no mercado internacional?!

Quanto à Associação dos Países Produtores, nessa carta encaminhada e assinada pelo Presidente da Federación Nacional de Cafeteros da Colombia, Jorge Gardenas Gutierrez, há reclamação que essa associação foi criada há três anos - V. Exª assim o lembrou -, mas só que o Brasil, como maior produtor mundial de café, foi o primeiro a quebrar um acordo feito pela Associação. Assim não é possível, temos que tratar esse assunto com seriedade dentro e fora do País.

Temos tecnologia, competência e conhecimento de longos anos na produção de café. Estamos jogando fora um patrimônio nacional imenso e continuaremos discutindo quantas "industriazinhas" vamos gerar em determinado município, sendo que mil ou dois mil pés de café gerariam a mesma quantidade de empregos.

Vamos parar de brincar e falar sério! A questão do café é muito importante, Sr. Presidente. Por isso, tomei mais alguns minutos de V. Exª.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/08/1996 - Página 13851