Discurso no Senado Federal

COMEMORAÇÃO, NO PROXIMO SABADO, DO DIA DA CRIANÇA. PREOCUPAÇÕES DE S.EXA. COM O ELEVADO CONTINGENTE DE CRIANÇAS QUE TRABALHAM NAS AREAS RURAIS E URBANAS DO NOSSO PAIS.

Autor
Valmir Campelo (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/DF)
Nome completo: Antônio Valmir Campelo Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • COMEMORAÇÃO, NO PROXIMO SABADO, DO DIA DA CRIANÇA. PREOCUPAÇÕES DE S.EXA. COM O ELEVADO CONTINGENTE DE CRIANÇAS QUE TRABALHAM NAS AREAS RURAIS E URBANAS DO NOSSO PAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 09/10/1996 - Página 16588
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, DIA NACIONAL, CRIANÇA.
  • ANALISE, CRITICA, SITUAÇÃO, CRIANÇA, MENOR, OBRIGATORIEDADE, TRABALHO, SUBEMPREGO, ZONA URBANA, ZONA RURAL, PAIS.
  • DEFESA, EMPENHO, GOVERNO, SOCIEDADE, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, POPULAÇÃO, ASSISTENCIA SOCIAL, CRIANÇA, MENOR ABANDONADO, PAIS.

O SR. VALMIR CAMPELO (PTB-DF. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no próximo sábado, todo o Brasil estará comemorando o "Dia da Criança". Meninos e meninas da classe média ganharão presentes, serão levados aos parques de diversões, aos cinemas, às sorveterias e terão direito a um dia inteiro dedicado a eles.

Nesse mesmo dia, cerca de 3 milhões de meninos e meninas menores de 14 anos não terão o que comemorar. Precisarão levantar cedo, não para receberem presentes, irem ao parque de diversões ou participarem de alguma atividade festiva nas escolas. Nada disso, até porque esses 3 milhões de crianças não estudam. Levantam cedo para trabalhar nas grandes cidades ou em propriedades rurais, que lhes pagam um salário irrisório e lhes exigem esforços além do que a sua idade pode suportar.

O último levantamento realizado pelo IBGE revela que 42% dos menores da área rural trabalham. No setor urbano, esse percentual chega a 24%.

Lamentavelmente, essa é a realidade da criança em nosso País. Em vez de estar na escola, estudando e se preparando para a vida, esse imenso contingente de pequenos brasileiros ocupa subempregos no campo e nas grandes cidades.

É muito comum encontrarmos crianças trabalhando como se já fossem adultas. Trabalham no corte da cana-de-açúcar, do sisal ou de outras culturas, em olarias, serrarias, oficinas, fábricas, tecelagens, pedreiras, etc, etc, etc...

Resta claro, entretanto, que nenhuma criança trabalha porque quer. Ela trabalha para sobreviver ou para complementar o orçamento familiar.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não resta dúvida de que a situação dessas crianças trabalhadoras, bem como a tragédia de outros tantos meninos e meninas de rua que perambulam por este País mendigando um pedaço de pão, ou vivendo de pequenos furtos, é a manifestação mais cruel e contundente do vergonhoso quadro de exclusão social que caracteriza o Brasil.

Chega a ser bizarra a situação de um país como o Brasil, que ocupa o penúltimo lugar no quesito distribuição de renda nas estatísticas mundiais.

Mais bizarro ainda é que todos, governantes e sociedade, sabemos disso. Movimentos sociais e programas governamentais defendendo os direitos da criança à educação, à saúde, a uma vida melhor, enfim, surgem todos os dias com estardalhaço e marketing muito maiores que a ação e os resultados.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, todos os jornais de hoje destacam em primeira página que a inflação no mês de setembro último foi a menor registrada em 38 anos.

Dizem as manchetes que níveis inflacionários tão baixos só foram registrados de 1958 para trás.

Em 1958, o Brasil vivia a euforia do início da construção de Brasília, da instalação da indústria automobilística e se embalava ao som da imortal música de João Gilberto e Vinícius de Moraes.

Naquele ano, o salário mínimo correspondia a algo em torno de 600 e poucos reais por mês e não existia, proporcionalmente à população da época, um volume tão grande de crianças fora da escola ou abandonadas.

O Brasil ingressou na década de 90 com um contingente de 64 milhões de pessoas em situação de pobreza, isto é, com rendimento igual ou inferior a meio salário mínimo.

A inflação de 1996 baixou para níveis iguais aos de 58. No entanto, o salário mínimo, hoje, não passa de R$112,00 por mês.

Quem sabe seria hora, Sr. Presidente, de comemorarmos o "Dia da Criança" com um amplo, verdadeiro e abrangente programa de distribuição de renda!

Acredito que todos concordamos que o abandono da criança brasileira é conseqüência direta da perversa distribuição da renda nacional. Ou será que deveríamos dizer da escandalosa concentração da renda nacional?

Poderíamos comemorar o "Dia da Criança" com um programa nacional de geração de empregos para que todo pai de família pudesse garantir o sustento e a educação de seus filhos.

Poderíamos comemorar o "Dia da Criança", Srªs e Srs. Senadores, com a adoção de um salário mínimo que não nos fizesse vergonha perante o mundo.

Talvez assim, no próximo ano, pudéssemos comemorar o 12 de outubro com a consciência mais tranqüila, sem nos chocarmos com a presença de crianças abandonadas em cada esquina.

Talvez, assim, aquela pequena parcela da sociedade brasileira que concentra a quase totalidade da renda nacional se desse conta de que o mundo só se tornará humano na medida em que os seres humanos se empenharem como seres solidários e de justiça, embarcados em um mesmo destino histórico.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/10/1996 - Página 16588