Discurso durante a 163ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CONSEQUENCIAS DE PORTARIA DO MINISTERIO DA AGRICULTURA E DE DECRETO ASSINADO HOJE PELO GOVERNADOR EM EXERCICIO DO ESTADO DO PARANA, ANIBAL CURY, SOBRE O TRANSITO DE ANIMAIS VIVOS ENTRE OS ESTADOS DO PARANA, SANTA CATARINA E RIO GRANDE DO SUL. DIFICULDADES NA COMERCIALIZAÇÃO DO TRIGO NACIONAL, EM VIRTUDE DO CARTEL FORMADO PELOS MOINHOS.

Autor
Osmar Dias (S/PARTIDO - Sem Partido/PR)
Nome completo: Osmar Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PECUARIA. POLITICA AGRICOLA.:
  • CONSEQUENCIAS DE PORTARIA DO MINISTERIO DA AGRICULTURA E DE DECRETO ASSINADO HOJE PELO GOVERNADOR EM EXERCICIO DO ESTADO DO PARANA, ANIBAL CURY, SOBRE O TRANSITO DE ANIMAIS VIVOS ENTRE OS ESTADOS DO PARANA, SANTA CATARINA E RIO GRANDE DO SUL. DIFICULDADES NA COMERCIALIZAÇÃO DO TRIGO NACIONAL, EM VIRTUDE DO CARTEL FORMADO PELOS MOINHOS.
Aparteantes
Iris Rezende.
Publicação
Publicação no DSF de 09/10/1996 - Página 16632
Assunto
Outros > PECUARIA. POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • CRITICA, EDIÇÃO, PORTARIA, MINISTERIO DA AGRICULTURA (MAGR), PROIBIÇÃO, TRANSPORTE, ANIMAL, PROCEDENCIA, ESTADO DO PARANA (PR), DESTINAÇÃO, ESTADO DE SANTA CATARINA (SC), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), MOTIVO, EXISTENCIA, FEBRE AFTOSA, REBANHO, SUINO.
  • CRITICA, DECRETO ESTADUAL, AUTORIA, ANIBAL CURY, GOVERNADOR, ESTADO DO PARANA (PR), PROIBIÇÃO, ENTRADA, ANIMAL, PROCEDENCIA, ESTADOS, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO SUL, AMEAÇA, REDUÇÃO, PREÇO, SUINO, BRASIL, MERCADO INTERNACIONAL, AUMENTO, DESEMPREGO, SETOR, IMPEDIMENTO, ESCOAMENTO, PRODUÇÃO, SUINOCULTURA.
  • APREENSÃO, ORADOR, REDUÇÃO, PRODUÇÃO, TRIGO, PAIS, RESULTADO, FORMAÇÃO, MONOPOLIO, PRODUTOR, MOINHO DE TRIGO, PREFERENCIA, AQUISIÇÃO, PRODUTO EXPORTADO.

O SR. OSMAR DIAS ( -PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje trago a esta tribuna um assunto que considero de interesse nacional, embora pareça ser de interesse apenas dos Estados do sul - Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Explico a razão disso.

No momento em que o tema mundial é a globalização da economia e os grandes blocos se formam exatamente para o fortalecimento dos países e dos seus mercados, tomam-se atitudes em nosso País totalmente contrárias a essa tendência de globalização e medidas que ferem o princípio federativo.

Há alguns dias, o Ministério da Agricultura baixou portaria, proibindo a transferência de animais vivos do Paraná para Santa Catarina e o Rio Grande do Sul. A alegação é que, existindo há dezesseis meses um foco de febre aftosa no Estado do Paraná, este não teria condições sanitárias ideais para mandar animais vivos para Santa Catarina e o Rio Grande do Sul, que já estão livres da febre aftosa há mais de 24 meses.

Essa alegação, se não for analisada com rigor, parece correta. No entanto, Sr. Presidente, a mesma não está correta, porque o foco de febre aftosa ocorreu numa região extrema do Paraná, no noroeste do Estado, e a produção de suínos é mais intensa nas regiões oeste, sudoeste, sul e central do Paraná.

Faltou visão do Ministério da Agricultura para estabelecer um raio de segurança em torno do foco da febre aftosa, que efetivamente existiu, e para proibir a transferência de animais daquela região para outras do próprio Estado do Paraná e para os Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Aí, sim, estaria agindo corretamente o Ministério da Agricultura.

Depois de várias gestões que fizemos, inclusive junto ao Ministro Arlindo Porto, não houve nenhuma decisão diferente do Ministério, que manteve a portaria.

Pois bem, os preços no Paraná despencaram. De R$0,85 o quilo do suíno, começamos a comercializar entre R$0,72 e R$0,74, e há hoje uma tendência de extermínio das matrizes que já chega a 20% do total de matrizes do Estado do Paraná, ocasionada por reflexos negativos tanto dessa portaria quanto das circunstâncias que cercam hoje a suinocultura nacional, já que o preço dos grãos está relativamente alto, o custo da ração é alto e inviabiliza a atividade neste momento.

A portaria do Ministério da Agricultura fortalece ainda mais essa tendência negativa em atividades como a suinocultura e a própria bovinocultura, porque elas são interligadas e seus preços são interdependentes.

Pior do que a portaria do Ministério da Agricultura, Sr. Presidente, foi o decreto assinado hoje pelo Governador. Embora seja do meu Estado, e eu devesse aplaudi-lo - é uma retaliação às atitudes tomadas por outros Estados, mais especificamente pelo Secretário de Agricultura do Estado de Santa Catarina, que é o idealizador da portaria -, não posso fazê-lo, porque estaríamos aqui ferindo o princípio federativo.

Sr. Presidente, veja a gravidade desse decreto assinado pelo Governador em exercício, Aníbal Cury, que entra em vigor amanhã e será publicado no Diário Oficial do Paraná:

      Nenhum animal ou produto de origem animal, sob qualquer forma, inclusive embutidos e mel, oriundos dos Estados do Sul, poderão adentrar o território do Paraná sem o competente certificado de inspeção federal.

O Decreto detalha essa exigência, colocando barreiras que serão fiscalizadas pelas Secretarias Estaduais de Segurança Pública, de Agricultura, de Saúde e da Fazenda.

Pois bem. Estabelecemos, a partir daquela portaria do Ministério e desse Decreto, uma situação até engraçada: estamos colocando porteiras nos nossos Estados e impedindo o tráfego de animais de um Estado para outro. A repercussão nos preços não se dará apenas nos três Estados, mas no mercado nacional inteiro, uma vez que não se criam suínos apenas em Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná. Temos um rebanho nacional de 33 milhões de cabeças, espalhadas por todo o Território Nacional. O próprio Nordeste tem hoje 30% desse rebanho. A suinocultura nacional, que já empregou cerca de 500 mil pessoas, tendo perdido 20% desses empregos em função do abate de matrizes, está sendo ameaçada por essa briga e por esse capricho entre os Estados.

Está certo que o Secretário de Agricultura de Santa Catarina tenha os seus interesses comerciais; todavia, na Portaria do Ministério da Agricultura, há uma confissão, Sr. Presidente. Lá está escrito que "apenas produtores integrados poderão trafegar com seus animais". Ora, daí estamos estabelecendo direitos a produtores integrados a grandes empresas, que poderão pagar o preço que quiserem no suíno, já que elas estão mandando no mercado, porque apenas o suíno que elas compram poderá trafegar de um Estado para outro.

Está claro, está evidente que o cartel tomou conta dos interesses nacionais. Não podemos aqui deixar de incluir indústrias, inclusive do próprio Estado do Paraná, que estão mandando nas decisões do Ministério da Agricultura. Eu esperava do Ministro Arlindo Porto uma atitude mais severa, mais rigorosa.

Amanhã, estarei com S. Exª e cobrarei novamente essa atitude, porque o absurdo dessa portaria do Ministério só é menor que o absurdo do decreto do Governador do Paraná, que, ignorando as conseqüências para o mercado nacional e para os produtores, que já estão abandonando as suas atividades, baixa um decreto que é mais político do que técnico, com a finalidade de dizer para o povo do Paraná que tem "peito" para trancar as fronteiras daquele Estado.

Sr. Presidente, o que está acontecendo, neste momento, trará conseqüências sérias ao Brasil. Se estamos dizendo que os suínos do Paraná, do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina não podem trafegar internamente, será que os importadores comprarão a nossa carne? É evidente que não. A Argentina já se manifestou dizendo que, se o suíno não serve para o Brasil, não serve para a Argentina. Assim são os países importadores do mundo inteiro, que já estão se manifestando.

Se não escoarmos o excedente de produção que existe claramente, estaremos abarrotando o mercado de uma carne que é pouco consumida em nosso País infelizmente, porque o consumo não passa de nove quilos per capita, enquanto a Dinamarca consome 64 quilos per capita, a França consome 45 quilos, os Estados Unidos consomem 50 quilos per capita, temos aqui um consumo baixíssimo, ora em função do poder aquisitivo, ora do hábito alimentar ou até de preconceitos equivocados em relação à carne suína. De qualquer forma, já temos problemas com essa atividade que gera empregos e criaremos outros ao invés de tentar resolvê-los.

Quero trazer o alerta ao Governo Federal, que está causando problemas para a suinocultura, e aos Governos Estaduais que, ao invés de fomentarem fatos políticos para sempre estarem presentes na imprensa, deveriam criar sim, alternativas.

Tenho indicado alternativas para a suinocultura e para outros setores da atividade agrícola de nosso País; infelizmente, parece que vale mais aparecer na primeira página do jornal, do que na casa do pobre agricultor ou do suinocultor com uma medida que possa amenizar esse drama que vive a suinocultura nacional.

O Sr. Iris Rezende - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. OSMAR DIAS - Ouço V. Exª, Senador Iris Rezende.

O Sr. Iris Rezende - Senador Osmar Dias, desejo registrar a minha admiração pelo comportamento de V. Exª na vida pública. Tive o privilégio de conviver com V. Exª, quando Secretário da Agricultura do seu Estado; acompanhei o seu trabalho durante dois governos e o tenho feito também nesta Casa. V. Exª, a cada dia, dá-nos uma lição de postura, de comportamento. Seria muito natural que essas observações fossem levantadas por Senadores de outros Estados; no entanto, vem V. Exª ministrar mais uma lição. Quando o seu Estado realmente toma uma atitude indevida, V. Exª se insurge levado, tenho a certeza, pelo espírito público e pelo sentimento patriótico de V. Exª. É claro que todos nós devemos defender os nossos respectivos Estados, mas não podemos ficar limitados, nesta Casa, à ação de defesa dos interesses daquelas áreas porque temos que pensar no Brasil. Nesta tarde, V. Exª foi muito feliz ao enfocar esse assunto. Creio que o seu discurso deva ser motivo de reflexão do Governador, bem como, do Ministro da Agricultura porque problemas dessa ordem não podem mais ocorrer, neste País, pois redundam em prejuízos insanáveis para a agricultura brasileira. Meus cumprimentos a V. Exª.

O SR. OSMAR DIAS - Agradeço a V. Exª que me fez lembrar de um episódio semelhante. Eu era o Secretário de Agricultura do Paraná e V. Exª o grande Ministro da Agricultura que foi. Naquele momento, tínhamos problemas sérios com a febre aftosa. O Estado de São Paulo, naquele instante, tinha mais focos de febre aftosa que o Paraná, tomou uma atitude igual aos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Os técnicos do Ministério acharam por bem fechar a barreira do Estado de São Paulo, impedindo o ingresso de animais do Paraná para São Paulo. E foi V. Exª com inteligência e com competência que nos recebeu, aceitou os argumentos técnicos, porque estes são sempre imperiosos, diante de qualquer outro tema político ou comercial. Os argumentos técnicos devem ser respeitados e V. Exª soube respeitá-los, determinando no mesmo dia que aquela medida fosse revogada, e assim aconteceu. Essa atitude corajosa está faltando agora.

Lembro esse fato porque essa portaria do Ministério da Agricultura nem é original. Ocorreu antes e já trouxe prejuízos ao País.

Agora, além de apontar o problema, quero indicar a solução. Iniciei dizendo qual a estratégia a ser seguida. Falo isso baseado em observação de dados técnicos. Se o foco, Senador Iris Rezende, ocorreu numa determinada região do Estado, que se localize esse foco e o cerque com um raio, tecnicamente recomendado - aí vamos consultar os técnicos - de 80, de 100, de 200km, e fechem suas fronteiras. Dirão, certamente, ser impossível determinar essas fronteiras dentro de um Estado. Não é impossível: a mesma rodovia trafega num Estado e entre os Estados. Estamos num único País, não podemos dar tratamento diferenciado.

O Sr. Iris Rezende - Senador Osmar Dias, V. Exª me concede um aparte?

O SR. OSMAR DIAS - Pois não, Senador Iris Rezende.

O Sr. Iris Rezende - V. Exª tem toda razão. O Estado de Goiás sofreu muito as conseqüências da febre aftosa. Pela sua localização geográfica, confrontando com muitos Estados, era muito difícil uma campanha que atendesse às exigências e acabasse, de uma vez por todas, com a aftosa em nosso território. Foi uma luta realmente gigantesca. Hoje, felizmente, há mais de 15 meses não temos notícia de um foco em nosso Estado. Inclusive a campanha nacional está buscando o trabalho realizado em Goiás como modelo a ser seguido em outros Estados. Não é para mencionar isso que pedi pela segunda vez o aparte a V. Exª, aproveitando sua generosidade, mas para dizer que em Goiás, há 2, 3, 4 anos o comportamento da Secretaria da Agricultura era justamente este: surgia um foco num município, aquelas propriedades nas proximidades do foco eram interditadas, não era permitida a saída nem a entrada de rebanhos, mas não se prejudicava uma região inteira ou o Estado. A nível nacional, o comportamento tem de ser esse. Surgido um foco no Estado do Paraná, que seja interditada apenas a região próxima ao foco, o que é absolutamente razoável para impedir a propagação da doença.

O SR. OSMAR DIAS - É verdade, Senador, ainda mais se isso estivesse ocorrendo com o Estado do Mato Grosso do Sul.

O Estado do Mato Grosso do Sul abate uma parte apenas do seu rebanho e a outra parte é abatida ou no Estado do Paraná ou no Estado de São Paulo. Supondo que ocorresse esse fato com o Estado do Mato Grosso do Sul, como estariam os pecuaristas hoje se essa medida fosse adotada pelo Paraná e por São Paulo? O preço, que já não é remunerador, cairia ainda mais e o Mato Grosso do Sul ficaria ilhado, sem poder escoar a sua produção de bovinos, o que seria um caos para o Estado.

Essa portaria já está sendo um caos para o Estado do Paraná. Pior do que essa portaria e o decreto do Governador é a teimosia que faz com que essa queda de braço não olhe para os verdadeiros interesses que estão sendo atingidos com a portaria, que são os interesses de quem já está sacrificado numa atividade geradora de empregos, e que poderia se viabilizar no País, caso o Governo não incomodasse apenas. Mas incomodando, ela se inviabiliza.

Vou encerrar, fazendo um outro alerta. O Brasil produziu, este ano, menos de três milhões de toneladas de trigo até agora. O Brasil consome em torno de oito milhões e quatrocentas mil toneladas de trigo. O produtor, entretanto, não consegue comercializá-lo, porque os moinhos, de novo, formaram um cartel para dar preferência ao trigo importado. Pagam pelo trigo importado mais de US$ 200,00 a tonelada e não aceitam pagar sequer o custo de produção do nacional, que é hoje em torno de R$ 12,00 a saca.

Todos os produtores nacionais acreditaram quando o Governo garantiu-lhes que este ano o preço do trigo seria bom. Entretanto, o trigo não alcançou o PH - Peso Hectolitro, que deve ser de em torno de 80, para conseguirem o preço de garantia. Os produtores não conseguem atingir o PH, porque o clima não está sendo bom para a colheita em razão das chuvas. Pelo fato de o Peso Hectolitro não estar na faixa aceitável, estão vendendo o trigo a R$ 6,00 a saca, quando encontram comprador. Nem as cooperativas, que têm essa obrigação, estão comprando o trigo. Poderiam colocá-lo junto aos seus estoques com EGF - Empréstimo do Governo Federal, com opção de venda. Elas deveriam estar colocando-o no seus estoques, para permitir que os produtores, vendendo o trigo, obtenham dinheiro para plantar a safra de verão.

Isso não está acontecendo, porque existe um cartel dos moinhos - ninguém pode negar. Combinaram derrubar o preço do trigo, porque a Argentina colherá 14 milhões de toneladas. Caso não haja trigo aqui, vão buscá-lo na Argentina. Mas vão buscá-lo a que preço?

A nossa dependência já chega a 80% do nosso consumo e vai aumentar ainda mais com a inércia do Governo, que assiste à formação do cartel e não toma uma atitude.

Qual atitude poderia o Governo tomar? Ora, o Governo poderia, por exemplo, liberar os recursos em EGF, ou AGF, adquirindo esse trigo agora. O próprio Governo poderia, se quisesse, ganhar dinheiro com essa aquisição, porque o preço, sem dúvida alguma, vai disparar no mercado internacional. As safras estão razoavelmente boas nos outros países. Só que os estoques são os mais baixos da história do século. Hoje, no mundo, há alimento em estoque para mais 50 dias. Todas as commodities estão com os seus estoques baixos, e o Governo brasileiro não percebe que se está destruindo um setor fundamental para a agricultura dos Estados do Centro-Sul para baixo. Está permitindo que os moinhos, numa atitude imediatista, tomem conta dos negócios do trigo.

Faço esses alertas para que dois setores fundamentais, que geram muito emprego, não sejam, de vez, exterminados em nosso País.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/10/1996 - Página 16632