Discurso no Senado Federal

QUESTIONANDO A PRIORIDADE QUE O PRESIDENTE DA REPUBLICA ESTA DANDO A EMENDA DA REELEIÇÃO. PONDERANDO QUE ESTA QUESTÃO NÃO PODE SER TRATADA COM PRECIPITAÇÃO.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. POLITICA PARTIDARIA.:
  • QUESTIONANDO A PRIORIDADE QUE O PRESIDENTE DA REPUBLICA ESTA DANDO A EMENDA DA REELEIÇÃO. PONDERANDO QUE ESTA QUESTÃO NÃO PODE SER TRATADA COM PRECIPITAÇÃO.
Publicação
Publicação no DSF de 28/01/1997 - Página 3203
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ALTERAÇÃO, NORMAS, DEMOCRACIA, REELEIÇÃO, INTERESSE PARTICULAR.
  • CRITICA, PRIORIDADE, EMENDA CONSTITUCIONAL, REELEIÇÃO, RELAÇÃO, MATERIA, INTERESSE NACIONAL, NECESSIDADE, DEBATE, CONGRESSO NACIONAL.
  • POSIÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), ADIAMENTO, DATA, VOTAÇÃO, REELEIÇÃO.

O SR. MAURO MIRANDA (PMDB-GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como ator principal da política brasileira, o Presidente Fernando Henrique Cardoso deve cuidar para que as acrobacias de seu discurso não comprometam todo o espetáculo da democracia.

Quando foi eleito para presidir os destinos do País, a reeleição não fazia parte do script que foi aprovado por 150 milhões de brasileiros. O tema foi lançado em meio ao seu mandato, passou a ter o apoio da maioria da sociedade, e grande parte deste Congresso, inclusive eu, apoiamos a tese e temos grande dose de cumplicidade com a evolução do tema como a Prima donna da atualidade política brasileira. Mas a questão fundamental é que esta ópera não pode ter um único personagem, como parece querer o Presidente. O Congresso, o povo, os partidos, as lideranças, a imprensa e os políticos têm que ser respeitados como integrantes dessa caravana.

Quando o Presidente defende a reeleição, com unhas e dentes, está misturando as aspirações pessoais do homem com os deveres do estadista, que deve falar pelo conjunto da sociedade. Por acaso, por necessidade ou por estar convencida de que deve ser assegurado o sucesso da política econômica, a sociedade quer. Mas não precisa ser do jeito que a fórmula única do Presidente quer impor. Os dados da equação incluem questões importantes, como prazos de votação, que, não sei porque, passaram a ser mais importantes que as questões de mérito. Isso é desrespeitar as regras mínimas do jogo democrático e não faz justiça ao estilo e ao passado do Presidente, um intelectual afinado com a civilidade e um político cuja principal virtude tem sido o amor pelas instituições. É hora de o Presidente sopesar os efeitos de suas palavras, impedir que elas possam ser injustamente interpretadas como desequilíbrio emocional e guardar-se contra o varejo perigoso do tiroteio vulgar.

O Presidente afirmou na semana passada que há momentos que requerem rupturas. Se colocarmos suas palavras num contexto mais amplo da história, não há nada a contestar, porque a humanidade, como sabe o nosso professor, construiu seus grandes momentos de afirmação através de movimentos revolucionários. E é desse jeito que entendo o que é ruptura.

O Presidente há de entender que a expressão é muito forte para retratar este instante da vida brasileira, em que tudo está no lugar, o povo está satisfeito com o Real, o Congresso apenas exerce as suas prerrogativas, o diálogo político é pleno e a democracia palpita. A menos que o Presidente se explique melhor e dê nomes aos bois, saindo das ameaças imprecisas, sou tentado a entender a sua mensagem como o anúncio de um rompimento de bons princípios de convivência política.

Se o Presidente quer endurecer e manter a data de 29 de janeiro para votar a reeleição, é um direito dele. Da mesma forma como é direito do PMDB ou de qualquer outro partido adiar por uma semana essa decisão importante do Congresso. Isso é legítimo e democrático. Não sei por que uma decisão histórica de tanta importância, uma decisão que vai alterar o universo de nossos costumes políticos por todo o futuro, deva, repentinamente, ser tratada com tanta precipitação.

O Código de Trânsito está sendo discutido pelo Congresso há três anos. As reformas administrativa, tributária e da Previdência estão aqui há mais de um ano. Por que resolver tão rápido uma questão tão importante? Que mistérios escondem tanta radicalização, a ponto de o Presidente falar em ruptura? Por causa de uma única semana? Se o Presidente não tem motivos para jogar tudo numa ameaça de rompimento com a sua base política, o PMDB tem razões para sustentar o calendário da votação, pois aprovou, em convenção nacional, a vinculação de datas entre a reeleição e a escolha de novas Mesas do Senado e da Câmara.

A opinião pública tem todo o direito de conhecer as razões das agruras do Presidente, quando chega a esses limites incompreensíveis de desabafo. Ele é o condutor de nossos destinos e quando fala sensibiliza todos os poros da sociedade que representa e que lhe deu o mandato de chefe supremo.

O Presidente tem o poder de incendiar, de acalmar, de moderar e de imprimir, quando exprime o seu pensamento, porque já não é mais o sociólogo das grandes obras acadêmicas, mas o maestro que mantém a orquestra afinada ou não. Nós somos parte dessa orquestra que obedece ao seu comando no Congresso. Nos últimos dias alguns desarranjos de interesses multiplicaram o som estridente dos instrumentos de percussão. É hora dos violinos, dos oboés e dos clarinetes, como diria muito melhor que este engenheiro o nosso especialista Artur da Távola.

O Presidente é o condutor, e deve reconvocar toda a orquestra para um diálogo amplo, sem preconceitos, pensando na platéia que espera um concerto digno de ser ouvido. Este Presidente que eu desejo devolvido ao bom-senso é o Fernando Henrique Cardoso com quem tive a honra de conversar, recentemente, numa entrevista pessoal, no Palácio do Planalto. Lúcido, bem humorado, falando na sua determinação pessoal de não interferir na eleição para as Mesas do Congresso e revelando uma grande estima pelos companheiros dos vários partidos que o apóiam.

Tenho contado aos amigos que eu me senti como alguém que falava com aquele amigo que encontramos todos os dias. Foi assim que ele me deixou naquela atmosfera de cordialidade. E é assim que eu gostaria de vê-lo sempre ao dirigir-se aos liderados, à opinião pública e aos partidos. Mais do que ninguém, e como disse recentemente o Presidente José Sarney, os desencontros circunstanciais da política não podem e nem devem ser resolvidos no grito.

Era o que eu tinha a dizer. Sr. Presidente. Muito Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/01/1997 - Página 3203