Discurso no Senado Federal

SIGNIFICADO E IMPORTANCIA DA RECENTE VISITA DO PRESENTE JACQUES CHIRAC AO BRASIL E AOS PAISES VIZINHOS URUGUAI, BOLIVIA, PARAGUAI E ARGENTINA.

Autor
Coutinho Jorge (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PA)
Nome completo: Fernando Coutinho Jorge
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • SIGNIFICADO E IMPORTANCIA DA RECENTE VISITA DO PRESENTE JACQUES CHIRAC AO BRASIL E AOS PAISES VIZINHOS URUGUAI, BOLIVIA, PARAGUAI E ARGENTINA.
Publicação
Publicação no DSF de 20/03/1997 - Página 6060
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • IMPORTANCIA, VISITA, BRASIL, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, FRANÇA, APROXIMAÇÃO, UNIÃO EUROPEIA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).
  • EXPECTATIVA, REUNIÃO, GOVERNANTE, AMERICA LATINA, EUROPA.
  • REGISTRO, INICIO, NEGOCIAÇÃO, REDUÇÃO, PROTECIONISMO, EUROPA, RESTRIÇÃO, PRODUTO AGRICOLA, BRASIL.

O SR. COUTINHO JORGE (PSDB-PA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de fazer alguns comentários sobre o significado e a importância da recente visita do Presidente Jacques Chirac ao Brasil e aos nossos vizinhos Uruguai, Bolívia, Paraguai e Argentina. Visita essa concluída ontem em Buenos Aires.

Na verdade, a visita se reveste de significado especial não apenas porque há quase 12 anos o Brasil não recebia a visita de um Chefe de Estado francês, mas porque constrói mais um elo na corrente que nos liga a esse país.

As relações Brasil X França são bem antigas, datam da época colonial e visitas dessa natureza ensejam espontâneas e sinceras considerações sobre as nossas relações. E o Presidente Chirac as resumiu brilhantemente em seu discurso aqui no Congresso Nacional, destacando as afinidades sentimentais e intelectuais, a base filosófica do Século das Luzes, o ensinamento dos grandes especialistas franceses, os ideais da Revolução Francesa, entre outros tantos pontos comuns em nossa história. Pode-se dizer que, sob o aspecto diplomático e das relações sociais, a visita foi coroada de êxito. Parabenizamos a todos que contribuíram para o sucesso, quer do lado da França, quer do lado do Brasil.

No entanto, essas referências ao passado, que muito nos sensibilizam, não constituem o motivo de nosso pronunciamento. Queremos, com base nessas evocações do passado e com os pés no presente, levantar nossos olhos para o futuro. Não para um futuro distante, a longo prazo, mas para um futuro próximo, que pode ser alcançado a partir da retomada de um diálogo entre a União Européia e o Mercosul, dentro da nova ordem mundial que se desenha no presente.

Esgotado o modelo em que o equilíbrio do mundo, na segunda metade deste século, dependeu do jogo de forças entre duas superpotências, caracterizando a chamada Guerra Fria, e a falência da hegemonia do paternalismo de quem venceu essa guerra, o modelo de equilíbrio que ora se impõe tem por base as relações entre blocos regionais, com o desejado respaldo das Nações Unidas. E a América Latina, através do Mercosul - a quarta maior estrutura econômica do mundo - tem papel de destaque nesse mundo multipolar, em que, evidentemente, se sobressai o nosso País.

Esse, para nós, é o aspecto mais importante da visita do Presidente Chirac, o qual lançou uma proposta de cunho pragmático: a organização de uma reunião de cúpula para o final de 1998, reunindo, pela primeira vez na história, os Chefes de Estado e de Governo da América Latina e da Europa. Tal reunião seria precedida de um encontro de dirigentes dos países. Queremos ressaltar a lucidez política do Presidente Chirac, que é um parlamentar, por ter escolhido o Congresso Nacional como o local apropriado para apresentar sua proposta.

Os laços entre a União Européia e o Mercosul foram explicitados pelo ilustre visitante nas seguintes palavras: "a ordem natural das coisas faz com que hoje a União Européia e o Mercosul se aproximem um do outro. As suas afinidades, a sua história comum, os seus interesses bem definidos, o apego mútuo a sua identidade e a recusa de um mundo unipolar os levam a se aproximarem, a desenvolverem os seus intercâmbios e a aprofundarem seus acordos".

O objetivo é, portanto, Srs. Senadores, unir esforços para construir um mundo multipolar. Sabemos que há um longo caminho a percorrer, duras barreiras a derrubar, mas é um começo. E um bom começo, para o Mercosul e para o Brasil. Sabemos também que a União Européia necessita de se consolidar. Somente em janeiro de 1999 será lançada sua nova moeda, o Euro, que abarcará toda a região, que se transformará em um dos pólos mais estáveis do futuro.

O Presidente Jacques Chirac reconheceu que durante muito tempo deixou-se de cultivar os laços de amizade entre os dois blocos, apontando como razões a preocupação pela construção da paz e da prosperidade na Europa e os choques provocados pela explosão do totalitarismo e de guerras que ali ocorreram. Reconheceu também que a América do Sul será, amanhã, um dos grandes pólos do mundo que hoje se forma. A proposta do Presidente, de uma reunião de cúpula, será a primeira etapa de um processo inovador e pragmático. Se for concretizada, como esperamos, só trará benefícios para as nossas regiões e para os parceiros, é claro.

Para o Brasil, em termos de perspectivas econômicas, a visita do Presidente francês foi uma boa oportunidade para se iniciarem as negociações em torno de um assunto que nos preocupa sobremaneira: o protecionismo europeu, em especial o francês, em relação aos produtos agrícolas brasileiros. Esse é um ponto delicado e crucial para que se estabeleça um diálogo franco e aberto entre os países. Ficou acertada também a realização de uma grande conferência franco-brasileira, no final deste ano, para discutir a questão agrícola e reduzir, quiçá superar, essa proteção exagerada da Europa em relação à América Latina.

O fato de empresários, pequenos e médios, fazerem parte da comitiva presidencial é muito auspicioso para as relações comerciais Brasil x França. A França, na verdade, ocupa posição de destaque entre os novos investimentos estrangeiros no Brasil, tendo passado, há pouco tempo, de quarto maior investidor para a significativa posição de segundo. Até outubro do ano passado, foi registrado US$1 bilhão em investimento direto francês no País. Mas, em termos da balança comercial, o resultado foi negativo para o Brasil. Tivemos um déficit de US$430 milhões, o que evidencia a necessidade de incrementar o comércio entre os dois países, particularmente as exportações brasileiras.

Com a estabilidade econômica e política, a abertura da economia, a política de privatizações no País, o incentivo ao capital forâneo, é factível que novas parcerias surgirão. Deve-se encontrar um denominador comum entre a política interna protecionista européia e o seu desejo de ampliar o mercado, dado que as relações comerciais são, na verdade, uma via de mão dupla.

A visita do Senhor Presidente Chirac foi muito bem recebida e aplaudida, inclusive pela imprensa nacional. Seus pronunciamentos, especialmente o que foi feito aqui no Congresso, foram bastante elogiados pelos Parlamentares. A idéia do fortalecimento dos laços entre a União Européia e o Mercosul recebeu o apoio incondicional de todos. Alinho-me a esses elogios. No entanto, quero lembrar que os gigantes econômicos estão enfrentando sérios problemas de desemprego e instabilidade social, e, evidentemente, o problema de desemprego maior se verifica na própria Europa desenvolvida.

Quero, Sr. Presidente, relembrar uma reunião que tivemos em Bruxelas, da qual participei como Presidente da Comissão do Parlamento Latino-Americano, juntamente com o Vice-Presidente Franco Montoro e outros Parlamentares. Bienalmente, o Grupo Parlamentar Europeu e o Grupo Parlamentar Latino-Americano se reúnem lá e aqui. Dessa feita, foi na Europa, em Bruxelas. E o tema que os Parlamentares franceses, alemães, italianos, por exemplo, discutiram foi a problemática atual da Europa: além, é claro, dos conflitos regionais de etnias que ainda existem, o maior problema levantado pelos Parlamentares foi o relacionado ao desemprego naqueles países, em função justamente do avanço da tecnologia, da globalização das economias.

O interessante é que, quando falávamos pelo Brasil e nos referíamos ao fato de que temos em torno de 5,5% a 6% de desemprego em relação à população economicamente ativa, os parlamentares alemães, franceses, italianos e espanhóis lembravam que existem países na Europa que têm 20%, 15%, 12%. E disseram-nos, o que nos causou um pouco de surpresa, que eles acreditam que, em função dessa realidade mundial, haverá ainda algumas gerações que estudarão, se formarão, terão qualificação profissional, mas não terão, na perspectiva atual, o emprego. Portanto, trata-se de um quadro altamente negativo para a Europa, o que, para eles, não ocorreria em relação ao Brasil, que possui um nível de desemprego muito baixo em relação ao europeu e tem uma possibilidade imensa de desenvolvimento e, portanto, de geração de emprego, face aos investimentos.

Dessa forma, essa posição do Parlamento nos alertou para a realidade difícil e complexa da instabilidade social e, sobretudo, do desemprego também na Europa. O que mostra que o Parlamento Europeu e o Parlamento Latino-Americano estão unidos, preocupados e desejam realmente discutir em conjunto a realidade desses dois grandes blocos.

Sr. Presidente, para concluir, quero lembrar que foram assinados também, na oportunidade da visita do Presidente Chirac, acordos entre Brasil e França na área da segurança, do combate ao narcotráfico e do turismo. Provavelmente, também o faremos com outros países que possuem a mesma problemática. As relações que devem ser fortalecidas não são apenas as relações comerciais: devemos unir esforços em prol de um crescimento econômico sustentado com justa distribuição da renda entre os vários grupos sociais do nosso País. Lutar para vencer a desigualdade entre os países e entre as pessoas deve ser uma grande meta, não só do nosso bloco como do bloco de lá.

Faço, Sr. Presidente, para concluir, minhas as palavras do Presidente Jacques Chirac, que dizia sempre: "é preciso procurar o crescimento onde ele estiver". Ele repetiu essa frase em vários momentos de sua viagem. E eu acrescentaria: Sim, é preciso buscar o crescimento onde ele estiver, mas é preciso também distribuir o fruto desse crescimento em favor de todos.

Eram essas as considerações, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que eu queria trazer a respeito da visita do Presidente Jacques Chirac ao nosso País.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/03/1997 - Página 6060