Discurso no Senado Federal

CONTENTAMENTO DIANTE DAS DECLARAÇÕES DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO SOBRE O PROCESSO IRREVERSIVEL DA MUNICIPALIZAÇÃO. DEFESA DA MUNICIPALIZAÇÃO, ACOMPANHADA DE INVESTIMENTOS NA INFRA-ESTRUTURA ECONOMICA E SOCIAL.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • CONTENTAMENTO DIANTE DAS DECLARAÇÕES DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO SOBRE O PROCESSO IRREVERSIVEL DA MUNICIPALIZAÇÃO. DEFESA DA MUNICIPALIZAÇÃO, ACOMPANHADA DE INVESTIMENTOS NA INFRA-ESTRUTURA ECONOMICA E SOCIAL.
Publicação
Publicação no DSF de 05/06/1997 - Página 10947
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, DECLARAÇÃO, AUTORIA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, NECESSIDADE, APLICAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, MUNICIPIOS, INTERIOR, PAIS, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, INVERSÃO, FLUXO, MIGRAÇÃO INTERNA, IMPEDIMENTO, PROCESSO, EXODO RURAL, DESCONCENTRAÇÃO INDUSTRIAL, CIDADE, PROMOÇÃO, INSTALAÇÃO, INDUSTRIA, PROCEDENCIA, EXTERIOR, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO CENTRO OESTE, ESTADO DE GOIAS (GO).

O SR. MAURO MIRANDA (PMDB-GO. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, o Brasil está ficando mais municipal e menos federal. E este é um fato tão saudável quanto me parece irreversível. São notórios os sinais de que estamos começando um grande movimento de marcha batida para o interior, e são essas evidências que me levam a acreditar que não tardaremos em ter um país menos injusto na distribuição espacial da renda. As mazelas sociais que se agravaram nas últimas décadas, pela concentração do processo industrial em torno das grandes cidades, fizeram de nossas megalópoles verdadeiros purgatórios de desajustes existenciais. O trânsito é caótico, faltam moradias, proliferam os esgotos a céu aberto nas periferias, os hospitais públicos não funcionam, a insegurança amedronta a classe média, e o desemprego multiplica a marginalização social. Tudo isso porque as grandes cidades cresceram artificialmente, por força da migração descontrolada que veio no rastro da pobreza do nosso interior. Inverter os sinais desses movimentos migratórios é a única saída, e isso não vai acontecer se não adotarmos políticas consistentes de fortalecimento dos municípios de pequeno e de médio portes. 

Creio que não estou exagerando quando falo nas evidências da interiorização. Reconheço que essas políticas tardaram demais, mas a verdade é que o governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso vem promovendo alguns avanços expressivos. Dias atrás, numa solenidade pública no Palácio do Planalto, o próprio Presidente foi taxativo quando afirmou que é nas cidades que as coisas acontecem, e que as políticas oficiais devem acompanhar essa realidade. Outra afirmação presidencial que guardei na minha memória dizia que "é um atraso ser contra a municipalização". Entendi o recado como uma pauta pública que deverá orientar as futuras ações de todos os Ministros. Os que são detentores de mandato popular e os que vieram da carreira acadêmica.

Coincidência ou não, o Presidente falava para os participantes do Forum Nacional dos Secretários de Transportes, e lá estava presente, um dia depois de ter sido empossado, o ministro Eliseu Padilha, que é um municipalista militante e assumido. Tão municipalista quanto Íris Rezende, que conhece como poucos políticos, neste país, as realidades e as necessidades do nosso interior. Não por acaso, os dois novos ministros são grandes figuras públicas do PMDB, o partido de raízes interioranas mais fortes e que por isso detém o maior número de prefeitos em todo o país. Mas seria injustiça excluir o nome de Arlindo Porto entre os ministros mais comprometidos com a causa municipalista.

Não posso deixar de registrar outras evidências. Poucos dias depois de ter sido empossado no cargo, o ministro Carlos Albuquerque anunciou a extinção da CEME e do INAN, e a transferência dos encargos e dos recursos desses órgãos para a gestão municipal. No Ministério da Educação, o ministro Paulo Renato tem sido inexcedível no esforço para fortalecer as redes municipais de ensino, e vem adotando ações dinâmicas para instalar novas escolas profissionalizantes no interior. Nesse cenário geral de fatos e de intenções positivos, quero dar destaque ao compromisso público assumido pelo Sr. Milton Selligman. Na direção do Incra, ele pretende municipalizar as ações da Reforma Agrária, uma promessa que quero aplaudir, porque tenho sido defensor intransigente da tese.

Ao lado da influência direta dos setores governamentais, estamos assistindo neste país a um movimento intensivo de relocalização dos grandes investimentos. Os empreendimentos da área automotiva, por exemplo, estão chegando com novas concepções que mudam a geografia que concentrava quase tudo no ABC paulista. O eldorado dos grandes investimentos, nas últimas décadas, cumpriu o seu papel, é verdade. Mas o que ocorre é algo como a redescoberta de um outro país, muito maior e de horizontes abertos para absorver e multiplicar riquezas. Um enorme universo físico de mais de cinco mil municípios que podem ter participação ativa no esforço de prosperidade. A Nação deve ao Presidente Fernando Henrique Cardoso a decisão histórica de criar incentivos fiscais para a instalação de novas montadoras no interior. Para mim, essa decisão quebrou o domínio hegemônico do Centro-Sul na formação do PIB nacional. Mas é indispensável que o BNDEs passe a atuar de maneira sintonizada com o espírito dessa tendência que foi inaugurada pelo Presidente, arrostando até resistências internacionais que se seguiram à divulgação da Medida Provisória.

O Centro-Oeste, região que foi praticamente abandonada pelos investimentos oficiais desde a inesquecível passagem de Juscelino Kubitschek pela Presidência da República, teve um crescimento expressivo graças à revolução espontânea que aconteceu no setor primário. Em Goiás, o processo industrial é recente mas vive uma fase de constante expansão, com a criação de novos pólos de desenvolvimento que influenciam o crescimento de municípios periféricos. O grupo Perdigão está instalando o seu complexo agroindustrial na região de Rio Verde, enquanto já temos a garantia da presença da Vicunha em Anápolis e aguardamos a confirmação praticamente assegurada dos grupos japoneses Honda e Mitsubishi. 

Mas não é só isso, senhoras e senhores Senadores. O noticiário econômico de hoje traz a informação de que quatro outras montadoras deverão vir para Goiás. Da China viriam fábricas de tratores, de empilhadeiras e de motocicletas, e da Argentina viria uma fábrica de tratores, a Vitoy. E o mais importante é que das 25 montadoras que pretendem instalar-se no país, com quase três bilhões de dólares em investimentos diretos, nenhuma delas está procurando os Estados do eixo econômico Centro-Sul. Estão aí os indícios reais de que a interiorização do desenvolvimento já não é apenas um sonho.

É uma alegria muito grande constatar que a onda de desconcentração dos investimentos ganha adeptos de peso como o senador Artur da Távola, este notável intelectual que honra o Senado e a quem considero o mais urbano de nossos colegas. Expoente dos meios culturais do Rio de Janeiro, onde nasceu e construiu sua vida de homem público, é ele que vem pregar, como fez na última segunda-feira, uma política de incentivos para a agroindústria, com o objetivo de gerar empregos e fixar o homem nos pequenos e médios centros urbanos. Não posso deixar de aplaudir uma posição de tanta sensibilidade e altruísmo para um problema que é muito mais do Brasil que do Rio de Janeiro. São exemplos como o do senador Artur da Távola que recompensam o exercício da atividade política.

A proposta do nobre Senador pelo Rio de Janeiro é de extrema oportunidade, numa análise realista sobre o que está ocorrendo no país. Temos um fenômeno migratório espontâneo em busca de novas fronteiras de desenvolvimento localizadas na Amazônia e no Centro-Oeste. No médio e longo prazos, esse movimento vai contribuir para aliviar as pressões sociais sobre as cidades de grande porte e ocupar os grandes espaços vazios do território nacional. É preciso, porém, no meu entender, refletir rapidamente sobre o lado preocupante da questão, que seria o deslocamento dos problemas das megalópoles para as cidades do interior. E é por isso que defendo e continuarei defendendo uma política municipalista. Não basta induzir a desconcentração, mas fazer com que ela seja acompanhada de investimentos na infra-estrutura econômica e social. Não podemos repetir o fracasso da Transamazônica. Não basta a inversão dos movimentos migratórios, mas inverter também as prioridades dos investimentos que são de responsabilidade do Estado.

Em entrevista recente à revista "Cidades", o presidente do IBGE, Simon Schwartzmann, analisa os dados do último censo que ainda estão para ser divulgados, e confirma que a população está fugindo para as novas fronteiras do interior, em busca de melhor qualidade de vida e de oportunidades de trabalho, porque a absorção de migrantes pelos grandes centros chegou ao limite da exaustão. Ele afirma que há uma dependência direta entre os efeitos da pressão demográfica e a capacidade de administrar o município. Eu acompanho o raciocínio do presidente do IBGE, que acha imprescindível dotar municípios pequenos, médios ou grandes dos mesmos serviços básicos de infra-estrutura, para que as famílias não tenham que emigrar.

Ao encerrar minhas palavras, quero voltar às estimulantes declarações do Presidente da República sobre o processo irreversível da municipalização. É nessa postura presidencial que deposito as minhas esperanças, pensando da mesma forma como deve estar pensando a totalidade dos prefeitos brasileiros. Ele é o Presidente, e é ele quem comanda a burocracia. Enfatizando a necessidade cada vez maior de um entrosamento forte nos três níveis de poder - União, Estados e Municípios -, o Presidente considerou que nenhum argumento deve servir de desculpa para impedir essa aliança de propósitos. "A cidadania cobra das burocracias, quando as burocracias se transformam em escudo para proteger privilégios próprios ou de grupos privados". E é com esse recado irreparável do Presidente que concluo o meu pronunciamento, esperando que ele ecoe como lei em todas as esferas de decisão do Governo Federal.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/06/1997 - Página 10947