Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM O INDISCRIMINADO DESMATAMENTO DAS FLORESTAS BRASILEIRAS. COMENTANDO RESPOSTAS DO MINISTRO DO MEIO AMBIENTE, DOS RECURSOS HIDRICOS E DA AMAZONIA LEGAL, A REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES ENVIADO POR S.EXA. EM DEZEMBRO PASSADO, ACERCA DA COMPRA DE TERRAS NA AMAZONIA POR MADEIREIRAS ASIATICAS E ATIVIDADES POR ELAS DESEMPENHADAS NO BRASIL.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • PREOCUPAÇÃO COM O INDISCRIMINADO DESMATAMENTO DAS FLORESTAS BRASILEIRAS. COMENTANDO RESPOSTAS DO MINISTRO DO MEIO AMBIENTE, DOS RECURSOS HIDRICOS E DA AMAZONIA LEGAL, A REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES ENVIADO POR S.EXA. EM DEZEMBRO PASSADO, ACERCA DA COMPRA DE TERRAS NA AMAZONIA POR MADEIREIRAS ASIATICAS E ATIVIDADES POR ELAS DESEMPENHADAS NO BRASIL.
Publicação
Publicação no DSF de 18/10/1997 - Página 22296
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • APREENSÃO, AUMENTO, DESMATAMENTO, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, EXPLORAÇÃO, MADEIRA DE LEI.
  • ANALISE, RESPOSTA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO MEIO AMBIENTE (MMA), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, AUTORIA, ORADOR, ESCLARECIMENTOS, CONTROLE, EMPRESA ESTRANGEIRA, EXPLORAÇÃO, MADEIRA, REGIÃO AMAZONICA.
  • EXPECTATIVA, RESPOSTA, MINISTERIO DO MEIO AMBIENTE (MMA), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, AUTORIA, ORADOR, ASSUNTO, PROCESSO, LICITAÇÃO, EXTRATIVISMO, MADEIRA, FLORESTA NACIONAL, TAPAJOS, APREENSÃO, FALTA, CONTROLE, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), DESTRUIÇÃO, FLORESTA AMAZONICA.
  • URGENCIA, NECESSIDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROVIDENCIA, PROTEÇÃO, ECOSSISTEMA, FLORESTA AMAZONICA.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL-MA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há longos anos, preocupo-me com o desmatamento indiscriminado das nossas florestas. Essa dilapidação de nossas riquezas naturais, verdadeiro privilégio divino, é testemunha, a olhos vistos, por todos quantos têm oportunidade de percorrer o Brasil. Os esqueletos de antigas e densas florestas, mesmo as ciliares, apontam seus últimos troncos esfacelados e retorcidos - quando ainda existem - para os céus, como a pedir o socorro, que nunca lhes foi oferecido.

Os incêndios, Sr. Presidente, não são a pior desgraça que envolvem nossas matas fechadas. Antes e acima deles, está a busca das madeiras nobres, numa exploração desenfreada que, por uma única árvore de valor econômico apreciável, depreda as que a circundam. Além da sua importância no complexo da biodiversidade, ignora-se - por falta de informação e de fiscalização - o valor inestimável das plantas circundantes, que guardam em seus genes o segredo de poderosos remédios em uso ou a serem ainda descobertos, ou guardam fibras, combustíveis e uma infinidade de outras essências que já ajudam ou ainda socorrerão a humanidade.

No ano passado, as informações de que madeireiras do sudeste asiático, depois de devastarem as florestas de seus países, estariam aportando no Brasil para aqui exercerem as suas atividades, levaram-me a formalizar, em 3 de dezembro, o Requerimento de Informações nº 1149, ao Sr. Ministro do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, solicitando amplos esclarecimentos sobre o assunto.

Nesse requerimento, Sr. Presidente, entre outras indagações, perguntei se o ministério dispunha de evidências sobre a compra de terras na Amazônia por empresas madeireiras do sudeste asiático para fins de exploração florestal; se havia empresas madeireiras asiáticas já registradas no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis -IBAMA; se existiam indícios ou evidências sobre celebração de "contratos de gaveta", entre as empresas asiáticas e proprietários de terras na região, visando ao fornecimento de madeira de uma forma encoberta; quais as indústrias florestais, localizadas na Amazônia, que teriam sido adquiridas, até então, por empresas asiáticas. 

A resposta do ministério, datada de 5 de maio do corrente ano, informa no seu primeiro item:

      "No cadastro nacional do INCRA, não há registro sobre a compra de terras por empresas estrangeiras. Entretanto, informações levantadas pela Superintendência do IBAMA do Estado do Amazonas consta que a empresa WTK solicitou registro para plano de manejo no total de 205.000 hectares."

A seguir, registra o Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal que, do conhecimento do IBAMA, as empresas sob controle de grupos asiáticos, com atividades na Amazônia são: "Madeiras Compensadas Cia. Agro-industrial Compensa S.A.", assumida por chineses em 1996, com 16.850 hectares no Amazonas; a AMAPLAC (adquirida pela WTK), assumida por malasianos em 1996, sediada no Amazonas, com 1.200.000 hectares no Município de Caramari, no Juruá, e 210.000 hectares no Vatumã; a SIFEC, sem registro de compra de terras pela empresa; e a EIDAI DO BRASIL, com 34.710 hectares no Pará.

Em outros dois itens, diz mais o citado ministério:

      "Informamos que o Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal e o IBAMA estão articulados na região com o Exército, a Aeronáutica, a Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República, com vistas ao acompanhamento e controle das empresas estrangeiras da região. O IBAMA não tem, em suas atribuições institucionais, o poder para atuar ou limitar, por qualquer meio, aquisição de arrendamento de imóvel rural em território nacional. Suprimento de matéria-prima por terceiros é permitido pela legislação vigente, e os contratos apresentados, analisados e aceitos pelo IBAMA cumprem as exigências legais.

      A fiscalização do IBAMA é bastante rigorosa junto a empresas transnacionais que atuam na Região Amazônica sejam de origem asiática, suíça, alemã, etc. Por exemplo, a empresa AMAPLAC já foi auditada duas vezes, e o Plano de Manejo apresentado pela mesma foi indeferido pelo IBAMA. Estas empresas estão na mira dos técnicos e fiscais do IBAMA pelo simples fato de serem estruturadas, organizadas e com atuação forte no mercado madeireiro."

Mais recentemente, através do novo Requerimento de Informações nº 556/97, aprovado pela Mesa Diretora a 21 de agosto passado e, a 28 do mesmo mês, enviado ao Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, voltei a registrar minhas preocupações em relação ao processo de licitação para a exploração madeireira da Floresta Nacional do Tapajós, a primeira floresta de propriedade pública na Amazônia a ser explorada pela iniciativa privada.

Fiz, então, com o assessoramento de Consultores especializados do Senado, 15 perguntas relacionadas ao problema. Indaguei sobre critérios técnicos, sobre a estimativa do volume máximo de madeira a ser explorado por ano na área licitada. Pedi a relação dos três grupos de espécies madeireiras a serem exploradas; se será permitida a exploração de outros produtos florestais de importância econômica para as comunidades locais. Perguntei se a pretendida exploração madeireira respeitará os critérios de sustentabilidade e se foi elaborado pelo Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA - o plano de manejo da Floresta do Tapajós. Desejei também saber como se dará o controle e a fiscalização sobre essa exploração. E, entre outros pedidos de esclarecimento, igualmente pedi a relação das empresas que já adquiriram o edital de licitação e se existe previsão de licitação de outras florestas nacionais da Região Amazônica.

Decorridos mais de 30 dias, ainda não recebi - ao contrário do que preceituam os arts. 50, § 2º, da Constituição, e 216 do Regimento Interno do Senado - as respostas devidas pelo Sr. Ministro de Estado do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal.

Nesses dois requerimentos, deixei clara a minha opinião de que a concessão de floresta pública para a exploração pela iniciativa privada é adotada em vários países com tradição de exploração florestal e os resultados são positivos. Entretanto, nesses países há um controle efetivo da atividade por parte do Estado, a fiscalização é eficiente e cumpre rigorosamente o seu papel.

      "Sabemos que, em nosso País, infelizmente, a realidade é outra" - disse na Justificação mais recente. E aduzi: "A Amazônia brasileira, apesar de dispor de um terço das florestas tropicais mundiais e ser depositária de uma imensa e incalculável biodiversidade, vem sendo implacavelmente destruída. Não há controle algum em relação à exploração dos recursos naturais, os planos de manejo florestal são sistematicamente descumpridos e a fiscalização é insuficiente e precária."

Vê-se, pela resposta do Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, que o próprio IBAMA - não obstante todos os seus esforços e a sua articulação com o Exército, com a Polícia Federal e com a Aeronáutica - nada pode fazer para coibir os abusos de empresas internacionais, nem o INCRA possui em seu cadastro qualquer registro sobre compra de terras por empresas estrangeiras.

Tal situação, portanto, parece-me incompreensivelmente caótica, já que os próprios órgãos governamentais, aos quais deviam caber o registro e a fiscalização dos empreendimentos rurais mantidos por empresas estrangeiras em nosso País, não estão em condições de manter controle sobre tais atividades.

As minhas preocupações e suspeitas, infelizmente, acabam de estabilizar-se a partir do evento ocorrido a 8 deste mês de outubro, quando, em solenidade na sede do Banco Mundial, o famoso e respeitado WWF - Fundo Mundial para a Natureza, lançou os novos mapas continentais de florestas, com base em estudos que vão até o ano 1994.

Concluiu-se que o Brasil ainda é o País que mais perde florestas a cada ano. Na América Latina, o desmatamento atinge 41% da área original. A situação mais crítica é a da Mata Atlântica, que teve 93% de sua cobertura destruída. Dois terços da cobertura florestal do mundo estão destruídos. E está na Ásia - naquela região que estaria exportando madeireiras para o Brasil - o pior cenário de devastação florestal. A região asiática perdeu 88% de sua cobertura original (31,76 Km² de florestas) e só 5% do que restou estão legalmente protegidos.

O evento do Banco Mundial, Sr. Presidente, coincide com entrevista que o biólogo americano Edward Wilson - apontado pela revista Time como um dos 25 americanos mais influentes da atualidade - deu à revista Veja, na edição de 17 de setembro passado.

Duas vezes agraciado com o Prêmio Pulitzer por seus livros ("Diversidade da Vida" e "Naturalista"), Professor na Universidade Harvard, Edward Wilson registrou ponderações que merecem a nossa atenção. Adverte o biólogo que, até agora, fracassaram "quase todos os processos de recomposição artificial das florestas tropicais (...)".

      "(...) as matas tropicais estão sendo danificadas de forma tão indecente que mesmo as mais modernas tecnologias de reflorestamento não poderão trazê-las de volta à vida ..."

Prossegue o biólogo: "Gastamos o patrimônio natural sem que ele possa ser reposto com a mesma intensidade."

Em outras considerações, conclama Edward Wilson a que os governos, a exemplo do que já existe na Indonésia, exijam possa a mata ser economicamente utilizada, só "depois de mapeada, polegada por polegada, num processo meticuloso em que cada árvore de valor científico e ambiental é identificada. A atividade madeireira só pode ser exercida nas bordas da cobertura vegetal, de modo que não haja um impacto imediato muito grande e, a longo prazo, a mata possa se recompor naturalmente..."

Sobre a Amazônia, observa o biólogo de Harvard o que já é do nosso conhecimento, isto é, que "as florestas de clima são exuberantes apenas na aparência", formando os chamados "desertos úmidos". São uma vasta e complexa cobertura vegetal fincada num solo arenoso, fertilizado apenas por uma delgada capa de material orgânico. Sendo o mais frágil de todos os ecossistemas, o "deserto úmido" - e agora digo eu - não se presta para outros fins senão o de manter a exuberância das florestas a serem exploradas de modo racional e inteligente.

Na verdade, Sr. Presidente, não temos razões para acreditar na eficiência da nossa fiscalização.

A realidade institucional do nosso País, no que tange à exploração de recursos naturais, não recomenda a aparente despreocupação do Governo Federal. A observância de planos de manejo florestal sustentável impostos pela legislação vem sendo amplamente descumprida; essa desobediência generalizada reflete a falta de vontade política, por parte do Poder Público, em exigir o cumprimento da lei e em corrigir as graves deficiências do IBAMA, que o tornam incapacitado a promover uma fiscalização efetiva.

Diariamente, nos jornais e nas televisões, tomamos conhecimento de que o IBAMA não tem nem recebe recursos para bem desempenhar as tarefas que lhe cumpre na preservação das nossas florestas. Temos de ter humildade para admitir a confissão da incapacidade histórica de atuação efetiva dos órgãos de fiscalização ambiental, aliada à falta de vontade política, por parte do Poder Público, em exigir o cumprimento da lei.

As florestas nacionais foram criadas para fins econômicos, mas temos o dever de garantir um modelo racional de desenvolvimento que possibilite a exploração sustentável e a manutenção da biodiversidade da Região Amazônica.

É nesse sentido que, mais uma vez, apelo à sensibilidade do Governo Federal, para que, às suas prioridades, acrescente o da proteção eficaz e indiscutível das nossas florestas tropicais, o tesouro brasileiro de valor inestimável para futuras gerações.

Não é possível, Sr. Presidente, que tendo este País criado um ministério para cuidar especificamente dessa fundamental questão para a Nação brasileira e para o mundo, que este assunto seja ainda negligenciado como está sendo hoje. Ou tomamos uma providência já, ou amanhã será tarde demais. Aí estão os asiáticos, invadindo a nossa Amazônia. Há denúncias seguidas da imprensa, da tribuna do Senado Federal, como já o fiz tantas vezes, mas nenhuma providência efetiva por parte do Governo Federal foi adotada. Por enquanto, o que temos como resposta a esses requerimentos de informação nada mais é do que falácia pura, porque nenhuma providência, nenhum fato concreto foi tomado; nenhuma ação de fato o Governo tomou.

O Presidente da República, Doutor Fernando Henrique Cardoso, não pode ficar alheio a essa situação. Não basta que o ministro se movimente, se agite e pouco faça; é preciso que o próprio Presidente da República seja o líder dessa campanha em favor da preservação de nossas florestas.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/10/1997 - Página 22296