Discurso no Senado Federal

LAMENTANDO QUE AS FALHAS EM UM DOS MOTORES DO VLS, PRIMEIRO FOGUETE BRASILEIRO EM CONDIÇÕES DE COLOCAR UM SATELITE EM ORBITA, CULMINOU COM O FRACASSO EM SEU LANÇAMENTO. HIPOTECANDO SUA CONCORDANCIA COM O EDITORIAL DA FOLHA DE S.PAULO DE HOJE, ADVERTINDO QUE O FRACASSO DA PRIMEIRA MISSÃO ESPACIAL BRASILEIRA, APESAR DE FRUSTRANTE, NÃO PODE SER TOMADO COMO UM DESASTRE DEFINITIVO, NEM E PROVA DE INCOMPETENCIA OU MOTIVO DE CONDENAÇÃO DO PROGRAMA.

Autor
Romeu Tuma (PFL - Partido da Frente Liberal/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • LAMENTANDO QUE AS FALHAS EM UM DOS MOTORES DO VLS, PRIMEIRO FOGUETE BRASILEIRO EM CONDIÇÕES DE COLOCAR UM SATELITE EM ORBITA, CULMINOU COM O FRACASSO EM SEU LANÇAMENTO. HIPOTECANDO SUA CONCORDANCIA COM O EDITORIAL DA FOLHA DE S.PAULO DE HOJE, ADVERTINDO QUE O FRACASSO DA PRIMEIRA MISSÃO ESPACIAL BRASILEIRA, APESAR DE FRUSTRANTE, NÃO PODE SER TOMADO COMO UM DESASTRE DEFINITIVO, NEM E PROVA DE INCOMPETENCIA OU MOTIVO DE CONDENAÇÃO DO PROGRAMA.
Aparteantes
Lúcio Alcântara.
Publicação
Publicação no DSF de 05/11/1997 - Página 23889
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • COMENTARIO, INSUCESSO, LANÇAMENTO, FOGUETE, FABRICAÇÃO, BRASIL, OBJETIVO, COLOCAÇÃO, SATELITE, ESPAÇO COSMICO.
  • APOIO, EDITORIAL, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), INCENTIVO, TECNICO EM ATIVIDADES AEROESPACIAIS, CONTINUAÇÃO, TRABALHO, PESQUISA CIENTIFICA E TECNOLOGICA, DESENVOLVIMENTO, FOGUETE, COLOCAÇÃO, SATELITE, ESPAÇO COSMICO.

O SR. ROMEU TUMA (PFL-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o último sábado, dia 1º de novembro, foi um dia marcante em nossa história, na história da inteligência brasileira.

A exemplo de milhões de brasileiros, acompanhei com emoção os preparativos para o lançamento do primeiro foguete brasileiro em condições de colocar um satélite em órbita, conhecido pelo nome de VLS.

Lamentavelmente, o lançamento teve que ser abortado porque um dos motores não funcionou, mas isso, em hipótese alguma, reduz a importância do evento ou diminui o mérito dos técnicos envolvidos no projeto.

Colocar um satélite em órbita não é uma tarefa banal, o que explica, por certo, o fato de apenas oito países (EUA, Rússia, Ucrânia, França, Israel, Inglaterra e Japão) integrarem o seleto clube de países possuidores de tal tecnologia. O Brasil sofreu toda a espécie de pressão para poder ter acesso a algum tipo de tecnologia que nos permitisse acelerar a construção do VLS. Mas isso foi impossível e o VLS só ficou pronto quase 20 anos depois de iniciado o seu projeto.

Muitos foram os percalços enfrentados pelos técnicos brasileiros, civis e militares, para tentar dotar o País de uma sofisticada tecnologia, que nos remeterá a esse fechado e milionário comércio de satélites.

O VLS não chega a ter o porte dos foguetes que transportam ao espaço os astronautas norte-americanos ou russos, mas também não é um busca-pé gigante. Suas características não são nada desprezíveis para um país emergente, como o nosso, que lutou contra dificuldades de todos os tipos para poder ter acesso à tecnologia aeroespacial.

O VLS acomoda oito quilômetros de fios, 70 mil componentes eletrônicos, mede 19,5 metros de altura e pesa 50 toneladas. Quando seu lançamento, a partir da Base de Alcântara, for uma rotina, o VLS se tornará o veículo ideal para a colocação de satélites nas chamadas órbitas baixas, de até 700 quilômetros, e com peso máximo de 300 quilos.

Trata-se de um mercado orçado hoje em US$1,5 bilhão e que não pára de crescer. Segundo o Coronel Tiago Ribeiro, do Instituto de Atividades Espaciais, o foguete VLS tem um preço extremamente competitivo. O seu custo está orçado em US$6,5 milhões, enquanto seu concorrente mais próximo, o Pegasus, de fabricação norte-americana, custa US$15 milhões.

Portanto, a entrada brasileira nesse restrito mercado deve incomodar muita gente.

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Senador Romeu Tuma, desculpe-me interrompê-lo, mas o faço para prorrogar a Hora do Expediente pelo tempo permitido pelo Regimento Interno, a fim de que V. Exª possa concluir o seu discurso e possamos concluir também o exame do expediente.

O SR. ROMEU TUMA (PFL-SP) - Obrigado.

Além disso, precisamos aproveitar a privilegiada localização de Alcântara, que está a apenas dois graus do Equador, garantindo uma aceleração extra aos foguetes lançados dali.

Vejam o exemplo da Embraer. Quando começamos a fabricar o Bandeirante, numa época em que só se falava em aparelhos a jato, o projeto da Embraer era motivo de galhofa. O Bandeirante acabou se tornando um sucesso de vendas e continua voando em vários países do mundo.

Hoje, já temos tecnologia para desenvolver aeronaves a jato puro, voltadas para a chamada aviação regional ou comuter, incomodando alguns gigantes do setor, que não acreditavam na abnegação e inteligência dos brasileiros. As restrições à construção do VLS partiram do G-7, que reúne as sete nações mais ricas do mundo, sob a alegação de que o Brasil poderia se utilizar da tecnologia para construir mísseis balísticos.

O Governo brasileiro procurou demonstrar que seus objetivos eram puramente econômicos e, portanto, pacíficos. Para tanto, tirou o projeto da área militar e o transferiu, em 1994, para a Agência Espacial Brasileira, órgão civil ligado à Presidência da República.

Além disso, passou a ser signatário do MTCR, que, em português, quer dizer: Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis. Pelo tratado, o Brasil se compromete a não exportar tecnologia sensível sem o conhecimento do grupo G-7. Passamos a ser também signatários do acordo de Não-Proliferação de Armas Nucleares.

Derrubamos, portanto, os argumentos utilizados para impedir o acesso brasileiro à tecnologia para a fabricação de ligas especiais, materiais compostos de última geração e supercomputadores. O nosso foguete já poderia ter sido lançado há muitos anos não fossem as dificuldades impostas por países mais desenvolvidos. Para chegar ao VLS, técnicos brasileiros passaram por alguns constrangimentos, como o de serem taxados de contrabandistas. São fatos que merecem ser relembrados até como demonstração da abnegação e do espírito empreendedor de um punhado de brasileiros, que não querem ver o nosso País a reboque das nações mais ricas.

Os técnicos brasileiros, envolvidos no projeto, recordam que, em 1986, mandamos para os Estados Unidos 12 tubos sem costura para que recebessem tratamento térmico especial, destinado a resistir às altas temperaturas dos motores.

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE.) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. ROMEU TUMA (PFL-SP.) - Pois não, Senador Lúcio Alcântara.

O Sr. Lúcio Alcântara (PSDB-CE.) - Praticamente no início do pronunciamento de V. Exª, mas pressentindo a tendência do enfoque que está dando a seu discurso, quero aproveitar para dizer da necessidade que o País tem de mobilizar os seus cérebros, os seus recursos e a sua ação política para assegurar o nosso desenvolvimento científico, os nossos interesses comerciais. Agora mesmo, a propósito de um chamado Relatório Gartner, a imprensa está dando ampla cobertura ao que teria sido uma espécie de capitulação do Brasil diante do Projeto Sivam, quando o Presidente dos Estados Unidos, para defender 15 mil empregos - e empregos bem pagos - teria obtido do Governo brasileiro, do então Presidente Itamar Franco, uma aceitação com o Projeto Sivam. Os jornais estão cheios de declarações atribuídas a militares brasileiros, nas quais eles se insurgem contra a passividade do nosso Governo na defesa desses interesses, que poderão levar, de um lado, a grandes prejuízos na nossa balança comercial, na nossa capacidade de gerar empregos e de produzir, mas também na parte do desenvolvimento científico e tecnológico. V. Exª está dando aí todo o percurso de vicissitudes que um grupo de cientistas e militares da Aeronáutica tiveram há cerca de 20 anos para que o Brasil pudesse ingressar nesse clube de lançadores de satélites, que é um negócio milionário.

No entanto, estamos enfrentando muitas dificuldades, às vezes, talvez, por falta de uma posição mais determinada do nosso Governo. Não temos que, sob o pretexto da globalização, da integração das economias, abdicar daquilo que é da nossa soberania e do nosso interesse.

Faço uma vinculação entre o pronunciamento de V. Exª, os fatos relacionados ao Projeto Sivam, que agora estão sendo trazidos à luz pela imprensa - e talvez haja até uma certa pusilanimidade do Governo brasileiro nessas negociações -, que nos levou - V. Exª falava na Embraer - a perder, por exemplo, a venda do nosso Tucano para o outro consórcio, o Pilatos. Quer dizer, o Brasil deu o Sivam, mas não levou nada em troca.

O SR. ROMEU TUMA (PFL/SP) - Agradeço o aparte inteligente de V. Exª, que só vem engrandecer o nosso pronunciamento.

Na hora do embarque desses doze tubos que para lá foram receber o tratamento térmico, Senador Lúcio Alcântara, o Departamento de Estado reteve a carga sob a alegação de que se tratava de contrabando de material estratégico. Foram dois anos de disputa judicial para conseguir a liberação da carga. Mas, teria sido melhor que tivessem ficado por lá, pois quando chegaram ao Brasil, os tubos foram usados na estrutura externa dos motores. Nos dois primeiros testes em solo, explodiram, destruindo equipamentos caros e insubstituíveis. Os tubos restantes, levados a um teste de raios, apresentavam defeitos de estrutura, que não existiam quando os tubos saíram do Brasil.

Veja que V. Exª tem razão no seu aparte. É a concorrência desleal para evitar que um país emergente possa entrar num campo de sofisticada tecnologia e disputar provavelmente com um preço melhor.

Tudo isso agora faz parte da história aeroespacial brasileira. Afinal, conseguimos construir o foguete, colocá-lo na plataforma de lançamento e por alguns segundos milhões de brasileiros vibraram com o rastro de fogo deixado nos céus de Alcântara pelos poderosos motores do VLS.

Foram momentos de grande emoção, que antecederam a frustração de saber que um dos motores havia falhado, obrigando a sua autodestruição.

Junto-me à Folha de S. Paulo, que, em editorial da edição de hoje, adverte que "o fracasso da primeira missão espacial brasileira, apesar de frustrante, não pode ser tomado como um desastre definitivo, nem é prova de incompetência ou motivo de condenação do programa".

Lembra a Folha ainda que "todos os programas espaciais - americano, russo, chinês ou francês, que seja - sofreram reveses consideráveis tanto em seu início como na sua fase mais avançada. O programa europeu Ariane, por exemplo, perdeu o seu mais avançado foguete em 1996, depois de 15 anos de experiência e de mais de 80 lançamentos".

São palavras de encorajamento para que nossos técnicos não se deixem levar pelo desânimo. Agora, mais do que nunca, é preciso redobrar o ânimo e os esforços para que o próximo lançamento se torne realidade e motivo de orgulho para os brasileiros.

"Senta a Pua"! Diriam os valorosos pilotos da Força Aérea Brasileira, que integravam o 1º Grupo de Aviação de Caça, na II Guerra Mundial, aos seus colegas de farda que hoje colaboram com os civis encarregados do projeto de construção do primeiro Veículo Lançador de Satélites brasileiro.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/11/1997 - Página 23889