Discurso no Senado Federal

EFEITOS DAS MEDIDAS ANUNCIADAS ONTEM PELO GOVERNO FEDERAL, QUE IMPLICA REDUÇÃO DOS RECURSOS PREVISTOS NO ORÇAMENTO DO ANO VINDOURO. AGILIZAÇÃO DO PROJETO DE LEI DE SUA AUTORIA, QUE PROPÕE A TERCEIRIZAÇÃO PARA A COBRANÇA DOS DEBITOS DEVIDOS AO EXECUTIVO, COM VISTA A ELEVAR A ARRECADAÇÃO PARA SEREM APLICADOS NA SAUDE, EDUCAÇÃO E AGRICULTURA.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • EFEITOS DAS MEDIDAS ANUNCIADAS ONTEM PELO GOVERNO FEDERAL, QUE IMPLICA REDUÇÃO DOS RECURSOS PREVISTOS NO ORÇAMENTO DO ANO VINDOURO. AGILIZAÇÃO DO PROJETO DE LEI DE SUA AUTORIA, QUE PROPÕE A TERCEIRIZAÇÃO PARA A COBRANÇA DOS DEBITOS DEVIDOS AO EXECUTIVO, COM VISTA A ELEVAR A ARRECADAÇÃO PARA SEREM APLICADOS NA SAUDE, EDUCAÇÃO E AGRICULTURA.
Aparteantes
Jefferson Peres.
Publicação
Publicação no DSF de 12/11/1997 - Página 24473
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • COMENTARIO, GLOBALIZAÇÃO, ECONOMIA, EXTENSÃO, CRISE, MERCADO FINANCEIRO, DESEQUILIBRIO, ECONOMIA NACIONAL.
  • APOIO, PROVIDENCIA, GOVERNO FEDERAL, CONTENÇÃO, CRISE, ANALISE, EFEITO, REDUÇÃO, ORÇAMENTO.
  • NECESSIDADE, MELHORIA, EFICACIA, ARRECADAÇÃO, GOVERNO, JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, TERCEIRIZAÇÃO, COBRANÇA, DIVIDA ATIVA, PODER PUBLICO.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, o mundo mudou muito. Antigamente, para se derrotar um país, precisavámos de exércitos. Hoje, os exércitos são acionados por meio de teclas de computadores e os generais, na verdade, são os comandantes dos grandes contingentes de dinheiro que são investidos ou retirados daqui e dali. Há empresas poderosíssimas, como por exemplo a Merrill Lynch que, apenas ela, tem um fundo de US$3 trilhões. E há grandes investidores, como o Sr. George Soros, por exemplo, que manipulam fundos tão grandiosos que podem se dar ao luxo, Sr. Presidente, Srs. Senadores, de doar até US$ 500 milhões a um país. Nos dois últimos anos, ele tirou aproximadamente US$2 bilhões do seu bolso e os doou a alguns países.

Este é um mundo diferente do mundo de alguns anos atrás. Essas pessoas fazem especulação não mais contra produtos como a castanha-do-pará, a borracha ou a madeira, mas contra a moeda de países inteiros. Senador Bernardo Cabral, o Sr. George Soros fez especulação contra o Banco da Inglaterra e, nessa operação, ganhou US$1 bilhão líquido.

Isso foi feito recentemente contra os Tigres Asiáticos, contra a Tailândia, a Malásia e a Indonésia. Por último, em Hong Kong, também houve um problema desse tipo. No México, isso já tinha ocorrido, e, agora, no Brasil, houve essa questão. Todos puderam perceber que, na primeira semana, o Governo brasileiro enfrentou esse problema trocando os reais, que, para eles, seriam desvalorizados, pelos dólares. Com isso, o desembolso das nossas reservas foi de cerca de US$6 bilhões; alguns dizem que esse desembolso chegou a US$10 bilhões.

Na verdade, o discurso do Governo no sentido de que as reformas eram necessárias tinha ficado velho. Ninguém mais acreditava nele. E, de repente, esse discurso ficou mais do que atual. Não bastou mostrar que havia dinheiro para fazer a troca. Houve uma nova queda e uma subida dos juros. Vejam V. Exªs que os juros estavam no Orçamento de 1998, calculados em R$37 bilhões; isso já é um Deus nos acuda; é o PIB do Chile e do Peru juntos, todo o trabalho de duas nações juntas é o que íamos pagar de juros da dívida - de repente, Srs. Senadores, para tornar mais atrativo o real, esse montante salta para quase R$57 bilhões, ou seja, um aumento de 20 bilhões só em juros. Era necessário uma ação mais enérgica, e o Governo a tomou, no pacote divulgado ontem, que vai mexer em muitas áreas e que nos vai dar aproximadamente R$20 bilhões em recursos - mais ou menos o que tivemos de perda em juros. É claro que esses juros não devem ficar nesse patamar - saltaram de 20 para 40% ao ano. Passando a crise, e também com a reforma, é possível que baixem.

Só hoje estamos tomando conhecimento do texto oficial. Como Presidente da Comissão de Orçamento, estou indo ao Ministério do Planejamento receber o documento e mostrar o reflexo que vamos ter nos Orçamentos de 1997 e de 1998.

Mas já estávamos estupefatos - essa é a palavra -, Senadores Bernardo Cabral e Jefferson Péres, porque verificávamos que, num orçamento de mais de 430 bilhões, só tínhamos 8 bilhões de investimentos para o País inteiro. Agora vamos ter que reduzir programas. Isso significa reduzir os míseros R$8 bilhões para um País de 150 milhões de pessoas e de uma extensão territorial como essa que o Brasil tem. Vamos ter que fazer cortes. Temos que fazê-los, porque a queda do real será pior do que qualquer outra coisa. Há países que perderam 40% do valor de sua moeda. O país ficou 40% mais pobre. Então, temos de fazer isso.

Eu me perguntava: se eu estivesse no lugar do Presidente Fernando Henrique Cardoso, eu faria isso? A resposta, Srs. Senadores, é sim, eu faria.

Uma parcela da batata quente ficou nas mãos do Presidente - a responsabilidade, etc. A outra parcela foi jogada para as mãos do Congresso. Vamos ter que descascá-la e fazer o purê aqui, tornar essa batata quente palatável.

Mas eu faria exatamente isso, e só discordo de um item: não vimos, no programa do Governo, uma adequação mais precisa, para que a máquina do Governo seja melhor arrecadadora. Não me conformo em ver que há Estados, como é o caso do Estado do Rio de Janeiro, que tem cerca de R$400 milhões de arrecadação mensal e - pasmem os senhores - tem R$27 bilhões de dívida ativa; ou do Brasil, que está morrendo por US$20 bilhões de dólares, está fazendo todo esse sacrifício e mandando apertar o cinto, mas tem US$300 bilhões para receber, e a máquina, calma, quieta, passiva, dizendo que não dá para receber tudo, que não é assim. É claro! Procurador não é recebedor. Se fosse recebedor, teria o nome de recebedor, e não de procurador. O procurador chega lá, senta-se - quatro ou seis horas - e o que acontece no final? Se não recebeu, não há problema; no final do mês o dinheiro dele está do mesmo jeito. Agora, privatiza, como fizeram os Estados Unidos, o Canadá, muitos países de Europa e, recentemente, a Argentina! Porque o cidadão - está aqui a conta, vá receber - só ganha se recebeu. Assim ele vai correr atrás do dinheiro.

O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB) - V. Exª tem o aparte, nobre Senador Jefferson Péres.

O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Senador Ney Suassuna, V. Exª aborda um ponto importante. No meu relatório sobre as contas do Governo de 1996, está apontado que a dívida ativa da União é de R$40 bilhões, ou seja, créditos a receber pela União. Evidentemente que uma boa parte é de créditos incobráveis. São empresas que já desapareceram, não existem mais, não têm mais patrimônio. Mas quanto disto é recebível, Senador Ney Suassuna? Não sei. E o Governo no ano passado conseguiu cobrar, fazendo, segundo ele, um grande esforço: elevou de cento e poucos para R$300 milhões; conseguiu receber de volta R$300 milhões. Evidentemente que há alguma coisa errada nesse setor da máquina administrativa. V. Exª hoje, - li nos jornais - vem sugerindo - e não é a primeira vez que o faz - a terceirização da cobrança dos débitos do Governo. Creio que já é tempo de se pensar nisso. É impossível que desses R$40 bilhões, Senador Ney Suassuna, não se possa recuperar pelo menos um quarto disso; eu diria R$10 bilhões, na pior das hipóteses. E não se compreende a inação do Governo num assunto tão importante e tão necessário nesta hora dramática em que vivemos. Parabéns a V. Exª pelo pronunciamento e pela sugestão que fez hoje, a qual endosso.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB) - Agradeço-lhe, Senador Jefferson Péres. É muito importante o apoio de V. Exª. Fico muito feliz pelo aparte de V. Exª constar do meu discurso. Mas eu diria que está havendo um equívoco: não são 40 bilhões. No Ministério da Fazenda, em créditos vencidos sendo cobrados tinha 60 bilhões; talvez, após esses dois anos, tenha-se reduzido para 40 bilhões.

No INSS tem cerca de 35 bilhões; no Banco do Brasil tinha cerca de 27 bilhões, reduzidos porque se jogou uma parcela dizendo-se não ser mais recebível, baixou, mais deve ter aí seus l4, l5 bilhões, no mínimo; no Banco Central tem tudo aquilo que veio dos bancos que foram incorporados pelo Proer, que beiram os outros 20 bilhões; na Caixa Econômica Federal, no que se refere a saldos do sistema habitacional, cujos apartamentos não sumiram, cujas casas não sumiram, eram de pedra e cal, portanto, devem estar lá, beiram 70 bilhões.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o mais engraçado de tudo não é isso - digo engraçado, mas a palavra correta deveria ser triste - é que temos todas as terras de marinha. E, vejam bem, não são terras da Marinha, são terras de marinha que beiram todos os oceanos, lagos e rios, que devem ter, aproximadamente, 3 milhões e 500 mil imóveis, e o Governo tem cadastrado pouco mais de 50 mil. Qual é a família brasileira que mora em Copacabana, Leblon, Ipanema, Guarujá, ou qualquer outra praia, que não gostaria de ter liquidado, de uma vez por todas, o débito dessa conta? Só que o Governo não tem como vender porque não cadastrou, não sabe, não tem sequer o controle. Isso, estimado pelo próprio Secretário do Patrimônio Nacional, dá cerca de 110 bilhões. Então, é um rico que está de bolso vazio pedindo esmola, que tem toda uma fortuna para receber mas não tem a coragem de mudar a legislação e cobrar essa dívida.

É por isso, Sr. Presidente, que hoje, nesta tarde, volto a dizer que apóio o pacote do Presidente Fernando Henrique. Sei que Sua Excelência está fazendo com sacrifício, mas acho que é hora de se mudar a legislação, como fez, por exemplo, a Argentina. Há dois anos, quando apresentei esse projeto, a Argentina veio e nos fez várias perguntas; apresentamos várias sugestões e seis meses atrás eles terceirizaram também a cobrança. No Brasil, quando falamos, a primeira coisa que os Procuradores respondem é que é inconstitucional. Claro, é inconstitucional, dito por um Procurador.

Temos que ter a coragem de colocar a terceirização no ar, porque ela nos trará recursos para trazer o desenvolvimento, porque equilibrar as contas nós estamos conseguindo; agora, onde está o dinheiro para investir na educação, na industrialização, na automação, na automatização, na agricultura? Esse dinheiro está por aí e deixou de ser cobrado, é património que está inativo, como é o caso das casas da União.

Na realidade, estamos aqui chorando, dizendo que o pacote é forte, que temos que apertar o cinto e não temos como encontrar soluções. Soluções existem. É preciso ter coragem política.

Deixo aqui a sugestão ao Presidente Fernando Henrique Cardoso e à equipe econômica de que a primeira providência que deve ser tomada é mudar a legislação. Se já mexemos na Constituição milhares de vezes, por que não mexermos agora, permitindo a terceirização, onde o cidadão que for cobrar só ganha se receber. Dessa forma, chegarão recursos aqui.

Essa é a emenda que eu faria ao pacote do Sr. Fernando Henrique, dizendo que sei qual a parcela que Sua Excelência assumiu, a outra está na mão do Congresso e teremos que decidir. Precisamos e vamos ter que dar uma resposta; vamos ter que mostrar que também estamos no mesmo diapasão e no mesmo tom. O que não podemos fazer é deixar que a nossa moeda seja esmagada por todo um mecanismo perverso que foi criado no mundo de hoje, em que uma nuvem de investidores pode chegar, investir trilhões e, no dia seguinte, sacar todo esse dinheiro, deixando o País à mercê. Temos, nós do Congresso, de ter a coragem.

Como eu disse, apresentei esse projeto há dois anos - já foi até feito na Argentina seis meses atrás - e ainda não votamos, permitindo que seja terceirizada a cobrança, que se possa fazer, como se fez nos Estados Unidos, em que não só se terceirizou como foi criado um grande comitê, que negociou as dívidas passadas. Se estava devendo cem milhões, perguntava-se quanto podia pagar; conferia-se, media-se e tinha-se autoridade para dizer: vinte. Pagava-se os vinte e estava quitado. Dessa forma, eles limparam a mesa e entraram recursos para o desenvolvimento do país.

Portanto, Sr. Presidente, eram essas as colocações. Acredito que é mais do que nossa obrigação dar a resposta que o Executivo quer. Temos que ajudar o pacote, mas temos que ter a coragem também de sugerir que a máquina do Governo, a máquina de arrecadação seja modernizada, a fim de que se pare com esse mecanismo errôneo de dizer que procurador é quem tem que receber; procurador não é recebedor, se fosse não era chamado de procurador.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/11/1997 - Página 24473