Discurso no Senado Federal

ANUNCIO DO INOVADOR ACORDO FIRMADO ENTRE A VOLKSWAGEN E OS METALURGICOS DO ABC E DO TAUBATE/SP. IMPORTANCIA DO DIALOGO ENTRE O SENADOR ANTONIO CARLOS MAGALHÃES E O EMBAIXADOR DOS EUA, RELATIVO A QUESTÃO DA CONCESSÃO DE VISTO DE ENTRADA AQUELE PAIS AO DEPUTADO FERNANDO GABEIRA. PONDERAÇÕES SOBRE A MANIFESTAÇÃO DOS APOSENTADOS NO PALACIO DO PLANALTO, NA ULTIMA QUARTA-FEIRA.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.:
  • ANUNCIO DO INOVADOR ACORDO FIRMADO ENTRE A VOLKSWAGEN E OS METALURGICOS DO ABC E DO TAUBATE/SP. IMPORTANCIA DO DIALOGO ENTRE O SENADOR ANTONIO CARLOS MAGALHÃES E O EMBAIXADOR DOS EUA, RELATIVO A QUESTÃO DA CONCESSÃO DE VISTO DE ENTRADA AQUELE PAIS AO DEPUTADO FERNANDO GABEIRA. PONDERAÇÕES SOBRE A MANIFESTAÇÃO DOS APOSENTADOS NO PALACIO DO PLANALTO, NA ULTIMA QUARTA-FEIRA.
Publicação
Publicação no DSF de 24/01/1998 - Página 1237
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
Indexação
  • COMENTARIO, PROBLEMA, CONCESSÃO, EMBAIXADA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), VISTOS DE ENTRADA, FERNANDO GABEIRA, DEPUTADO ESTADUAL.
  • DEFESA, CONCESSÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, AUDIENCIA, APOSENTADO, DEBATE, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, ACORDO COLETIVO DE TRABALHO, INDUSTRIA AUTOMOTIVA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), FLEXIBILIDADE, JORNADA DE TRABALHO, PREVENÇÃO, DESEMPREGO.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ACORDO, INDUSTRIA AUTOMOTIVA, SINDICATO, METALURGICO, REGISTRO, IMPORTANCIA, PARTICIPAÇÃO, TRABALHADOR, DECISÃO, INVESTIMENTO, EMPRESA.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, DOCUMENTO, AUTORIA, SINDICATO, APRESENTAÇÃO, SUGESTÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMBATE, DESEMPREGO.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, antes de falar sobre o acordo firmado, na semana passada, entre a Volkswagen e o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e de Taubaté, registro a importância do diálogo que houve entre V. Exª e o Embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Melvin Levitsky. Inclusive hoje o Jornal do Senado e a imprensa informam que, relativamente à solicitação feita pela maioria dos Srs. Senadores, referente à concessão de visto ao Deputado Fernando Gabeira, o Embaixador menciona que, nos Estados Unidos, há uma lei segundo a qual pessoas que tenham participado de ações terroristas ou de luta armada não podem ingressar no país.

É importante que as autoridades norte-americanas reflitam a respeito do assunto antes da decisão final, uma vez que o Embaixador, segundo revela o Jornal do Senado, comprometeu-se a dar uma resposta oficial do Governo de seu país nos próximos dias. Seria interessante que as autoridades americanas considerassem, primeiro, o que foi mencionado pelos Srs. Senadores mediante o documento enviado, ou seja, que o Deputado Fernando Gabeira foi anistiado pelo País, por decisão do Congresso Nacional, do Executivo, dos órgãos da Justiça. S. Exª fez uma autocrítica de sua participação na luta armada e hoje é membro do Congresso Nacional, participa ativamente das instituições democráticas brasileiras, das quais é um defensor. S. Exª se destaca na defesa dos direitos humanos, da cidadania, tanto no Brasil quanto fora, como, por exemplo, no Timor Leste, no Tibete, como representante do Partido Verde.

No momento do seqüestro, o Deputado Gabeira pensou na troca do Embaixador pela libertação de outros companheiros, inclusive o próprio Embaixador, mais tarde, chegou a revelar que o Deputado, em depoimento, declarara que, naquela hora, poderia ter ocorrido a morte do Embaixador, não tivesse havido a decisão do Governo brasileiro de libertar os presos políticos. É preciso, portanto, considerar, Sr. Presidente, que o Governo dos Estados Unidos permite, sim, o ingresso de pessoas que participaram de luta armada. Ainda ontem, o Presidente Bill Clinton recebeu, na Casa Branca, o Presidente do Estado Palestino, o Sr. Yasser Arafat. Inúmeras vezes, os Estados Unidos receberam o Primeiro-Ministro de Israel, Yitzhak Rabin, líder que contestou as instituições que havia antes da formação do Estado de Israel, até que conseguiu a formação do mesmo.

Poderíamos citar inúmeros exemplos. Os Estados Unidos receberam recentemente o Presidente da República Popular da China com grandes honras; o Presidente Richard Nixon teve, nos anos 70, a ousada iniciativa de visitar a República Popular da China e de restabelecer, precedido pela política diplomática do pingue-pongue, as relações diplomáticas com o Estado que havia sido resultado de uma revolução armada legitimada.

Houve momentos da história do Brasil em que pessoas avaliaram que deveriam derrubar um governo constitucionalmente eleito. Refiro-me ao Governo do Presidente João Goulart. Nessa ocasião, navios norte-americanos deslocaram-se para a costa brasileira e estavam prontos para uma ação armada. E vale ressaltar que, no caso, se tratava de um governo constitucionalmente eleito.

Ainda nesta semana, V. Exª, como Presidente do Senado Federal, expressou a sua opinião de que o Governo militar cometeu falhas, mas fez algo de bom. Eu, por exemplo, tenho uma discordância com V. Exª, muito respeitosamente, mas fiquei preocupado com os registros da imprensa sobre essas observações de V. Exª, pois acabaram tendo uma conotação no sentido de que V. Exª poderia estar com saudades do regime militar. Tenho certeza de que não: de que V. Exª defende, hoje, as instituições democráticas, assim como compreende muito bem que este Senador é um defensor - e radical - das instituições democráticas.

Sabe o Presidente Fernando Henrique Cardoso que, ao acompanhar os aposentados perante o Palácio do Planalto, eu estava agindo democraticamente. Colaborei para que houvesse tranqüilidade e não ocorresse nenhum incidente grave. Mas V. Exª também já acompanhou uma grande manifestação até o Palácio do Planalto, certo dia, formada sobretudo por pessoas do Estado da Bahia, em defesa do Banco Econômico. V. Exª foi a uma audiência com o Presidente, mas a imprensa registrou o fato como uma caminhada cívica e democrática. (Pausa).

V. Exª nega com a cabeça, mas a percepção que tive foi que V. Exª defendeu os interesses do Estado da Bahia, e o Presidente avaliou que seria interessante a preservação daquela instituição bancária, ainda que absorvida pelo Excel.

Conforme declarações de Maria Machado Cota, Presidente da Confederação Brasileira dos Aposentados e Pensionistas, ao jornal O Globo de hoje, há mais de um ano estão pedindo audiência junto à Presidência. Vou solicitar a ela o registro desse pedido para que tenha V. Exª esses dados e, quem sabe, possamos ambos ponderar ao Presidente Fernando Henrique Cardoso que os ouça antes da reforma da Previdência. Eles também querem expressar a sua opinião.

Também gostaria de fazer ver às autoridades norte-americanas que seria de bom senso conceder o visto de entrada nos Estados Unidos a Fernando Gabeira, representante do Congresso Nacional e do povo brasileiro, para partilhar da cerimônia de entrega do Oscar, ao qual concorre o filme “O que é isso, companheiro?”, e para o lançamento do livro de mesmo nome.

Outro assunto que quero abordar, Sr. Presidente, é o inovador acordo coletivo entre os metalúrgicos do ABC e de Taubaté e a Volkswagen.

O ataque especulativo contra várias moedas na Ásia ocorrido em outubro do ano passado e a conseqüente crise financeira que se abateu sobre o Brasil e levou o Governo a baixar medidas como a elevação das taxas de juros e um pacote fiscal, com o propósito de reduzir despesas e elevar receitas públicas, agravaram o cenário econômico brasileiro. O desaquecimento da economia levou várias empresas a procurar saídas no sentido de reduzir seus custos de produção.

Em meio a essa difícil conjuntura, cabe registrar a importância do acordo coletivo firmado, na semana passada, entre a Volkswagen do Brasil Ltdª e os Sindicatos dos Metalúrgicos do ABC e de Taubaté.

A Volkswagen do Brasil, em dezembro último, alegou ter que efetuar 10 mil demissões em suas fábricas de Anchieta e Taubaté, a fim de compatibilizar seus custos à nova realidade de retração do mercado verificada após a crise. Em reação à intenção da empresa, os trabalhadores realizaram forte manifestação de protesto em 15 de dezembro passado. Houve então um recuo por parte da empresa e o começo de negociações visando preservar o emprego.

Para discutir a situação com os sindicatos, vieram ao Brasil sindicalistas alemães a fim de expor a experiência por que passaram em 1993. A Volkswagen contratava na Alemanha 105 mil trabalhadores e, caso não houvesse acordo, ameaçava demitir 30 mil empregados. Um entendimento entre as partes resultou numa redução de 13% do salário e de 20% da jornada de trabalho. Mesmo assim, houve a perda de 10 mil postos de trabalho, e hoje, na Alemanha, a empresa contrata 95 mil pessoas. Segundo o sindicato alemão IGMetal, o acordo não garantiu empregos como se esperava. O conhecimento dessa experiência reforçou a convicção dos trabalhadores de que não deveriam ceder facilmente à intenção da empresa de cortes de salário e de jornada.

Diferentemente do acordo da Força Sindical, realizado entre o Sindicato de Metalúrgicos de São Paulo e o Sindipeças, em que ficou acertada uma redução de salários de 10% e diminuição de jornada de trabalho de 20%, por adesão, o acordo com a Volkswagen é regido por princípios distintos e menos prejudiciais aos trabalhadores.

Pelo acordo, a empresa poderá convocar somente os empregados necessários para o trabalho em jornada adicional. Foi criado o Banco de Dias, além do Banco de Horas que já existia. Sempre que o volume de produção tiver que ser reduzido devido a uma retração do mercado, os empregados trabalharão quatro dias por semana das três primeiras semanas do mês e três dias por semana na última semana, sem prejuízo salarial. Os dias não trabalhados constarão do Banco de Dias e deverão ser repostos conforme a necessidade da empresa.

Hoje, a jornada de trabalho da Volkswagen é de 42 horas semanais. Parte dos trabalhadores integra o regime de turnos de trabalho de 5x2, cinco dias de trabalho por semana e dois turnos por dia, e o restante, o regime de 6x1, seis dias de trabalho por semana e um turno por dia. O acordo estabelece, ainda, que em meados de 1999 todos os trabalhadores passarão a seguir o regime 6x1, mantendo a carga horária semanal.

Como passo inicial do acordo, foi implementado um programa de demissões voluntárias. No período de 17 de dezembro a 09 de janeiro, 4.062 pessoas aderiram ao plano, das quais somente 740 não estão aposentadas. A fábrica de Anchieta, que possui 22.600 trabalhadores, após as demissões passa a ter 19.000, e Taubaté, de 7.500, ficará com 6.900 empregados.

O pagamento da primeira parcela do 13º salário, que era efetuado em fevereiro de cada ano, foi transferido para junho. A possibilidade de venda de um terço das férias passa a não mais vigorar, tendo os empregados que gozá-las integralmente.

Estima-se que as perdas salariais dos trabalhadores devem ser da ordem de 1,2% e virão da diminuição do adicional noturno, que passa de 30% para 25%, e da redução dos valores a serem pagos a título de alimentação e transporte.

Para 1998, a participação dos empregados nos resultados da empresa também sofrerá uma queda. O valor mínimo será de R$2.100 e o valor máximo de R$2.800. Em 1997, essas importâncias variavam de R$2.650 a R$3.001. É importante ressaltar que a participação nos resultados requer o direito de os trabalhadores conhecerem dados relativos à evolução da produção, bem como os econômicos.

Segundo Luiz Marinho e Antonio Eduardo de Oliveira, presidentes de ambos os sindicatos de metalúrgicos que firmaram o acordo, que ontem estiveram visitando o Senado e mantiveram audiências com o Ministro do Trabalho e o Presidente da República, houve duas cláusulas importantes para assegurar o futuro dos trabalhadores: os 12 meses de garantia de emprego e, em especial - e esta é a cláusula a que quero me referir e que me traz à tribuna do Senado -, a decisão de se produzir em São Bernardo e em Taubaté, a partir do ano 2000, a nova família de automóveis da Volkswagen, o denominado projeto PQ24. Dessa maneira se está assegurando o futuro dessas unidades a curto, médio e longo prazos.

Há cerca de dois anos que a direção da Volksvagen estava por decidir se aquela nova linha seria produzida no México, na Argentina, em outro país ou em alguma outra região do próprio Brasil. Com essa decisão, condição fundamental para que os trabalhadores aceitassem o conjunto das cláusulas do acordo anexo, que peço seja transcrito na íntegra, deu-se um passo de grande importância, inclusive para o desenvolvimento de ambas as cidades e regiões vizinhas.

Ressalto, Sr. Presidente, pelo que sei, tratar da primeira vez em que trabalhadores, de alguma forma, partilharam, por parte da empresa, da decisão de investir. Precisamos avançar na direção da redemocratização das relações de produção. No âmbito das empresas privadas, públicas e das estatais, faz-se necessário caminhar na direção de maior informação para todos aqueles que participam do esforço produtivo e do da criação de riqueza. A democracia só fará sentido na medida em que trabalhadores estejam partilhando das decisões dos empresários. Só assim, Senador Lúdio Coelho - com quem tantas vezes tenho dialogado - tanto no campo, onde é importante trabalhadores estarem partilhando das decisões juntamente com os proprietários de unidades agropecuárias produtivas, como na indústria e no comércio, é importante possam os trabalhadores participar de decisões sobre como é efetuada a distribuição da riqueza.

Sr. Presidente, nesse sentido houve algo inovador: os trabalhadores participando da decisão da Volkswagen de, em Taubaté e em São Bernardo, produzir uma nova família de automóveis a serem vendidos pelo mundo inteiro a partir do ano 2000. Obviamente, no esforço que todo o ABC, Taubaté e cidades vizinhas estão fazendo para fortalecer a sua economia, essa decisão, da qual partilharam os trabalhadores, é de grande importância para o desenvolvimento de suas regiões.

Ontem, na audiência com o Presidente Fernando Henrique Cardoso, os Presidentes dos Sindicatos dos Metalúrgicos do ABC e de Taubaté levaram sugestões para atacar o desemprego no setor, conforme documentos anexos, que peço sejam transcritos.

O Governo Fernando Henrique Cardoso sancionou anteontem a lei que autoriza o contrato temporário de trabalho. Insistiu na votação desta lei, que dá poucas garantias aos trabalhadores, e, por isso, não obteve o consenso das principais organizações sindicais brasileiras. Se conseguiu o apoio da Força Sindical, também ouviu a crítica severa da Central Única dos Trabalhadores e de outras entidades. A situação é tão mais preocupante, porque grave é o quadro do desemprego e tênues são as proposições até agora apresentadas para assegurar um crescimento das oportunidades de trabalho.

Gostaria de salientar as ponderações e alertas de especialistas na área do Direito Trabalhista sobre esse contrato.

Que lição se pode tirar do acordo com a Volkswagen? Parece-me que ele mostra que a revisão das normas que regulam as relações de trabalho só será saudável se ocorrer com a participação dos trabalhadores e dos seus sindicatos. Essas negociações, a exemplo do que ocorreu no caso da Volkswagen, devem incluir a participação dos trabalhadores nos resultados das empresas, compromissos de garantia de emprego e, em especial, nas decisões de investimento das empresas. E mais: também a participação dos trabalhadores na elaboração das políticas econômica, industrial e comercial.

Ontem o Presidente, que demorou bastante em receber, em audiência, os Presidentes do Sindicato dos Metalúrgicos e da CUT, pelo menos agora se abriu para um diálogo. Vamos ver se se pode construir de fato essa participação dos trabalhadores, inclusive na elaboração da política econômica e industrial, para que todos os brasileiros tenham condição de partilhar das decisões e da riqueza construída em nossa Nação.

Sr. Presidente, peço sejam transcritos os documentos do acordo e entregues ao Presidente da República, anexando-os ao meu pronunciamento.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/01/1998 - Página 1237