Discurso no Senado Federal

SOLIDARIEDADE AO MOVIMENTO DESENCADEADO PELO POVO CHILENO, COM O OBJETIVO DE REPUDIAR OS PRIVILEGIOS DOS SENADORES BIONICOS E VITALICIOS. EXITO DA VISITA DO PAPA JOÃO PAULO II A CUBA.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL.:
  • SOLIDARIEDADE AO MOVIMENTO DESENCADEADO PELO POVO CHILENO, COM O OBJETIVO DE REPUDIAR OS PRIVILEGIOS DOS SENADORES BIONICOS E VITALICIOS. EXITO DA VISITA DO PAPA JOÃO PAULO II A CUBA.
Publicação
Publicação no DSF de 28/01/1998 - Página 1339
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, LUTA, POVO, DEPUTADO FEDERAL, EDUARDO FREI, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, CHILE, EXTINÇÃO, PRIVILEGIO, SENADOR, DEFESA, ESTADO DEMOCRATICO, AMERICA LATINA.
  • CUMPRIMENTO, VISITA OFICIAL, PAPA, PAIS ESTRANGEIRO, CUBA, INCENTIVO, EXTINÇÃO, BLOQUEIO, NATUREZA ECONOMICA, GOVERNO ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA).

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, no Chile, no Brasil, nas Américas, queremos democracia, queremos Senadores eleitos pelo povo.

Expressamos a nossa solidariedade à luta do povo chileno e à maioria dos Deputados Federais chilenos, bem como ao próprio Presidente Eduardo Frei. Todos estão tentando acabar com uma grande anomalia criada pelo regime militar que aqui, no Brasil, recebeu a designação popular de “Senador biônico”.

Enquanto em nosso País a figura dos Senadores “não eleitos diretamente pelo povo”, designados pelo Presidente da República e votados pelos respectivos Colégios Eleitorais, foi criada pela iniciativa do ex-Presidente Ernesto Geisel, com o “pacote” de abril de 1977, e extinta em 1985, no Chile, o regime militar criou as figuras dos Senadores designados pelo Presidente da República e dos Senadores vitalícios. São os ex-Presidentes que cumpriram um mandato de seis anos de forma contínua. Trata-se, Sr. Presidente, de esdrúxula figura, pois o ex-Presidente Patrício Aylwin, que cumpriu apenas quatro anos de mandato, embora tenha sido eleito diretamente pelo povo, não tem o direito de ser Senador vitalício.

Atualmente, apenas uma pessoa pode ocupar esse cargo. Aquele que liderou o golpe militar que derrubou o ex-Presidente eleito diretamente pelo povo, Salvador Allende, golpe perpetrado em 1973: o ex-Presidente e ainda Comandante em Chefe do Exército, General Augusto Pinochet. O ex-ditador anunciou que deixará seu atual posto em 10 de março próximo. A previsão é de que, então, assumirá o posto de Senador vitalício em 11 de março.

            Desencadeou-se, no Chile, um forte movimento popular para que não haja mais Senadores designados ou vitalícios. O problema é que a maioria conservadora que compõe o Senado tem dificultado qualquer mudança nesse sentido e, obviamente, mudanças na Constituição que possam aperfeiçoar as Instituições no caminho da democracia. O Presidente Eduardo Frei encaminhou Proposta de Emenda à Constituição para terminar com as figuras dos Senadores designados e vitalícios, que, apesar de ter sido aprovada na Câmara, foi rejeitada pelo Senado, onde há nove Senadores designados. V. Exªs devem compreender que, havendo Senadores designados e ainda com a entrada de um Senador vitalício como Augusto Pinochet, esse problema se tornará ainda mais difícil para o objetivo do aperfeiçoamento da democracia.

            Há duas semanas, esteve em Brasília a Deputada Isabel Allende, filha do ex-Presidente Salvador Allende, por ocasião da inauguração do busto de seu pai pelo Governador do Distrito Federal, Cristovam Buarque, quando estiveram presentes o Embaixador do Chile Eraldo Muñoz Valenzuela, além de inúmeros brasileiros que encontraram guarida naquele país irmão, ao tempo do regime militar, como o Governador Miguel Arraes e os Deputados Federais Maria da Conceição Tavares e Almino Afonso. Foi uma cerimônia comovente, defronte do Palácio do Buriti, onde diversos Chefes de Estado de outros países das Américas e do mundo têm sido homenageados.

            A Deputada Isabel Allende relatou as dificuldades de se alterar a Constituição chilena no sentido de acabar com aquela anomalia, ou seja, com a figura dos Senadores designados ou vitalícios. Há um movimento de opinião pública favorável à realização de um plebiscito sobre a questão. Por outro lado, Isabel Allende e Deputados da “Consertation”, ou seja, do agrupamento político que inclui o Partido da democracia, democracia cristã e socialistas, devem dar entrada, no dia 11 de março, a uma denúncia contra o General Augusto Pinochet por ter praticado ações, desde 1990, quando acabou o regime militar e iniciou-se o processo de transição, como Comandante em Chefe do Exército, que “colocaram em risco a honra da Nação”. Ações como ameaças a Parlamentares, ações que obstaculizaram a Justiça e dificultaram as investigações sobre mortos e desaparecidos durante a ditadura militar, além da emissão de juízo político, o que é vedado pela Constituição do Chile - aliás, aqui no Brasil os chefes militares não costumam expressar juízo político.

Solidarizamo-nos, portanto, com a aspiração de aperfeiçoamento da democracia do povo chileno. Se no Brasil conseguimos extinguir a figura do “biônico”, ainda temos um longo caminho a percorrer. Dentre as mudanças que deveríamos instituir antes das próximas eleições está justamente a de introduzirmos as eleições diretas não apenas para os Senadores titulares, mas também para seus suplentes, obviamente pensando nos próximos. Apresentei projeto nesse sentido, dispondo que, nas eleições para o Senado Federal, cada Partido ou coligação apresentará até quatro nomes para o cargo de suplente de Senador titular, devendo o eleitor indicar quem deverá ser o primeiro e o segundo suplente. Esse projeto já tem parecer favorável de seu Relator, Senador Jefferson Péres, encontrando-se pronto para ser votado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Essa é uma proposição que aperfeiçoa nosso sistema político. Portanto, conclamo o Senado a votá-la o mais rapidamente possível, obviamente antes das próximas eleições. Cabe lembrar, também, a impropriedade de qualquer iniciativa de tornar Senadores vitalícios ex-Presidentes da República, como a que tramita na Câmara dos Deputados.

Como estamos falando da democracia nas Américas, quero concluir com o cumprimento ao extraordinário êxito da visita de João Paulo II a Cuba. Suas palavras ressoaram com incrível força pela Praça da Revolução de Havana, especialmente quando conclamou o Presidente Fidel Castro e todos os cubanos a construírem uma nação livre, democrática, com solidariedade e justiça e, aos Estados Unidos, para acabarem com o bloqueio insensato que já dura 36 anos.

Quero aqui assinalar algumas palavras do Papa em Havana, quando Sua Santidade diz que o Estado deve permitir que cada pessoa e cada religião vivam livremente sua fé. Diz que os cidadãos que acreditam em Deus devem dispor de espaços suficientes para que enriqueçam a vida nacional com suas riquezas espirituais, morais e cívicas. Mais adiante, diz que para muitos dos sistemas políticos e econômicos hoje vigentes o maior desafio continua a ser o de associar liberdade e justiça social, liberdade e solidariedade, sem que nenhum desses componentes estejam relegados a plano secundário. Atacou o neoliberalismo capitalista que subordina o desenvolvimento dos povos às forças cegas do mercado e agradeceu ao Presidente Fidel Castro, que desejou participar da Santa Missa que Sua Santidade ali estava celebrando. Expressou ainda, na homília, que “o Espírito do Senhor me enviou para anunciar a liberdade aos cativos, para dar liberdade aos oprimidos”, palavras que estavam no Evangelho de São Lucas, mas que foram recebidas com grande aplauso por parte dos cubanos que ali estavam.

Entretanto, o entendimento importante foi, também, que, na sua despedida, o Papa João Paulo II condenou, energicamente, o embargo econômico dos Estados Unidos à Cuba, qualificando-o de injusto e eticamente inaceitável por afetar indiscriminadamente a população. Afirmou que o povo cubano não pode ser privado de vínculos com outros povos que são necessários para o desenvolvimento econômico, social e cultural, especialmente quando o isolamento repercute, de maneira indiscriminada, sobre a população.

Esperamos que essas palavras e a presença de João Paulo II em Cuba seja o prenúncio de que, realmente, as modificações nessas direções possam, efetivamente, acontecer para o aperfeiçoamento da democracia, da justiça e dos princípios de solidariedade em todas as Américas.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/01/1998 - Página 1339