Discurso no Senado Federal

VIGENCIA DA NOVA LEI AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO E PRESERVAÇÃO DA FLORESTA AMAZONICA.

Autor
Gilberto Miranda (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: Gilberto Miranda Batista
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • VIGENCIA DA NOVA LEI AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO E PRESERVAÇÃO DA FLORESTA AMAZONICA.
Publicação
Publicação no DSF de 16/04/1998 - Página 6603
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • IMPORTANCIA, PESQUISA CIENTIFICA, BIODIVERSIDADE, REGIÃO AMAZONICA, REGISTRO, INFERIORIDADE, CONHECIMENTO, FAUNA, FLORA.
  • IMPORTANCIA, LEGISLAÇÃO, PROTEÇÃO, MEIO AMBIENTE, PREVENÇÃO, PUNIÇÃO, CRIME, VITIMA, ECOSSISTEMA, INCENTIVO, EDUCAÇÃO, ECOLOGIA.

           O SR. GILBERTO MIRANDA (PFL-AM. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, da Amazônia já se falou muito, mas pouco tem sido dito sobre os mistérios que cercam sua inesgotável diversidade ecológica. Para reverter esse quadro, cientistas do mundo inteiro se debruçam hoje sobre a infinita capacidade de a Amazônia reunir, armazenar e reproduzir fauna e flora, as mais variadas possíveis. Estudos e pesquisas têm-se multiplicado na região com o propósito de investigar as razões que justifiquem tamanha prodigalidade da natureza. Quanto mais se investiga, tanto mais se acumulam novas classificações, o que acaba por impulsionar novos e intrigantes sistemas explicativos dentro do universo científico.

           Mais do que o maior pulmão da terra, a Floresta Amazônica passa a ser reconhecida como o mais rico e indecifrável ecossistema do planeta. Para se ter uma ligeira idéia do que significa isso, cabe transcrever trecho da reportagem publicada pela revista Veja, em edição de dezembro último, integralmente destinada à Amazônia. Diz o trecho: “Só de 1990 até hoje, 7 espécies de macacos, duas de aves, alguns roedores e dezenas de peixes e sapos novos foram encontrados na Amazônia e descritos pelos cientistas. Apenas no Parque Nacional do Jaú, em cinco anos de estudo, foram descobertas doze novas espécies de peixes, duas de sapos, dois roedores e duas árvores. Numa reserva indígena no Xingu, os pesquisadores acharam quatro sapos e um novo papagaio.”

           Diante dessa objetiva constatação, a estupefação toma conta da consciência da comunidade científica nacional e internacional, que se pergunta, com perplexidade, como pôde as sucessivas transformações geológicas moldar um ambiente ecológico tão belo e, simultaneamente, tão vasto e complexo... Para espanto de todos, segundo cálculo recente de pesquisadores, a Floresta Amazônica abriga, em seu território, entre 5 milhões e 30 milhões de plantas diferentes.

           Ora, a simples leitura de números tão distantes entre si indica o mais absoluto desconhecimento do que seja, na realidade, a Amazônia. Trata-se de um intervalo quantitativo que sugere a equivalência de uma imensidão sideral, a imensidão de um buraco negro, o buraco da ignorância humana. No caso da Amazônia, o infinito de nossa ignorância adquire proporções assustadoras, uma vez que o valor infinitesimal de nosso conhecimento sobre a região significa nada, ou quase nada, na rota histórica da Ciência rumo ao domínio da natureza.

           A impressão que se tem é que tudo ainda se engatinha quando se trata do mapeamento da área amazônica. Até o momento, 30 mil plantas foram devidamente catalogadas e classificadas conforme a padronização científica de gênero e espécie, o que, ao final, eqüivale a 10% das plantas de todo o planeta. Das 30 mil espécies de hoje até os 5 milhões de amanhã, há ainda muito chão a percorrer e muita biologia a descrever, supõem os botânicos mais otimistas.

           Do lado da fauna, a diversidade acompanha a mesma dimensão de infinidade. Segundo dados publicados na mesma edição de Veja, há mais de 300 espécies de mamíferos circulando pelo ecossistema amazônico, compreendendo os bichos mais simpáticos aos mais inóspitos. Enquanto, na primeira categoria, qualquer turista se estarreceria com a beleza selvagem da onça-pintada, do lobo-guará, do tamanduá-bandeira ou do boto cor-de-rosa; na segunda, se espantaria com os hábitos nada convencionais da preguiça, da ariranha ou da suçuarana.

           Mais ainda, se o assunto for a biodiversidade fluvial, a Amazônia possui quase 3 mil espécies diferentes. Apenas para ilustrar, só nas águas do Rio Negro, nadam 450 espécies distintas de peixes já identificadas e descritas pelos cientistas. Para efeito de comparação, em toda a Europa, as espécies de água doce não chegam a somar 200 unidades.

           Todavia, apesar de toda sua rica biodiversidade, a Floresta Amazônica esconde, com muita sabedoria, seu patrimônio ecológico dos olhos e da depredação humana, graças a que grande parte de sua preservação tem sido historicamente garantida. Como narra o zoologista José Márcio Ayres, citado pela Veja, se uma pessoa percorrer 10 quilômetros, a céu claro, numa mata virgem de terra firme, verá, no máximo, 2 ou 3 bandos de macacos, uma cutia e, quiçá, um veado. Isso comprovaria a capacidade natural de a Floresta se proteger contra atentados que visem tão-somente a sua depredação.

           Aliás, se não fosse por dispor dessa característica, muito mais da Amazônia já teria sido dizimado. Nesse sentido, a recente sanção da Lei Ambiental pelo Presidente Fernando Henrique desempenhará papel crucial no processo inadiável de proteção e preservação do território amazônico. As práticas usuais e criminosas de atear fogo à Floresta visando à criação de pastagem, as atividades predatórias de corte indiscriminado de árvores visando à comercialização clandestina de madeira, tudo está devidamente tipificado como transgressão penal na nova Lei, conforme a Seção II, que versa sobre os crimes contra a flora.

           Ainda que o artigo 43, que previa detenção para quem fizesse uso de fogo em florestas, tenha sido vetado pela Presidência da República, o Artigo 41 não deixa margens a dúvidas, uma vez que identifica como crime a provocação de incêndio em mata ou floresta. No caso da derrubada de árvores, o artigo 45 expressa, categoricamente, que “cortar ou transformar em carvão madeira de lei (...) para fins industriais, energéticos ou para qualquer outra exploração, econômica ou não”, acarretará ao transgressor, além da multa, reclusão de um a dois anos.

           À proteção da fauna a Lei reserva uma seção especial dentro do capítulo intitulado “Dos Crimes Contra O Meio Ambiente”. Nela, o artigo 29 prevê que, se alguém “matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre (...) sem a devida permissão (...)”, incorrerá em detenção de 6 meses e multa. Isso não se destina, decididamente, ao uso que os índios brasileiros fazem culturalmente da caça e da pesca, já que para estes a sobrevivência do homem deve estar, necessariamente, associada a um relacionamento simbiótico e equilibrado com a natureza.

           A propósito, se dependesse da milenar sabedoria das comunidades silvícolas da Amazônia, tartarugas, ariranhas e jacarés jamais serviriam de banquete a turistas desastrados, predadores e perversos. Para exatamente evitar que, neste mundo pós-moderno, a exploração devastadora dos recursos econômicos da Amazônia promova desequilíbrios irreversíveis no ecossistema da região, surge o artifício democrático da Lei Ambiental como meio regulador de tantas distorções no relacionamento homem/natureza.

           Como bem se observa, a partir do momento em que a Lei entrar em vigor - no próximo dia 30 de março -, a Floresta Amazônica poderá respirar com menos insegurança quanto a sua sobrevivência. Porém, mais do que o poder coercitivo e penal da Lei, o que importa aqui é o caráter civilizador, didático-pedagógico, que ainda deve ser realçado como pano de fundo de todo o projeto normativo do meio ambiente nacional. Se, no domínio da moralidade, dos costumes e dos valores nacionais, a preservação do meio ambiente não prevalecer na consciência do cidadão brasileiro, de nada adiantará todo o esforço do Estado em regulamentar o relacionamento do cidadão brasileiro com a exuberante natureza do País.

           Em síntese, aproveito a ocasião não só para juntar minha voz às milhares outras que não se cansam de exaltar a maravilha da Amazônia, mas também para enaltecer o papel que a nova Lei Ambiental deve desempenhar na política de proteção e preservação da Floresta Amazônica e de toda sua infinita biodiversidade. Tenho convicção de que, com a intervenção da Lei Ambiental, uma alvissareira perspectiva parece surgir no horizonte do País, no seu incessante processo de amadurecimento e de civilização.

           Era o que eu tinha a dizer.

           Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/04/1998 - Página 6603