Discurso no Senado Federal

IMPORTANCIA DA RODOVIA TRANSANDINA COMO ACESSO A COSTA DO PACIFICO E SEUS POSSIVEIS REFLEXOS POSITIVOS PARA A ECONOMIA NACIONAL.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • IMPORTANCIA DA RODOVIA TRANSANDINA COMO ACESSO A COSTA DO PACIFICO E SEUS POSSIVEIS REFLEXOS POSITIVOS PARA A ECONOMIA NACIONAL.
Publicação
Publicação no DSF de 28/04/1998 - Página 7060
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • DEFESA, CONSTRUÇÃO, RODOVIA, LIGAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA, OCEANO PACIFICO, ESCOAMENTO, PRODUÇÃO, INDUSTRIA NACIONAL, AGRICULTURA, AMPLIAÇÃO, EXPLORAÇÃO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), POSSIBILIDADE, COMBATE, DESEMPREGO.
  • EXPECTATIVA, AMPLIAÇÃO, COMERCIO EXTERIOR, PAIS ESTRANGEIRO, PERU, BOLIVIA, COLOMBIA, EQUADOR, DEFESA, PRIVATIZAÇÃO, CONSTRUÇÃO, RODOVIA.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB-AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, um dos assuntos mais abordados por mim e por outros representantes da Amazônia Meridional é a urgente necessidade de implantação de saídas rodoviárias para o oeste do continente sul-americano, transpondo a barreira natural dos Andes e atingindo importantes mercados, aparentemente próximos, mas que continuam muito além de nossas reais possibilidades.

Rogo a paciência e a atenção da sociedade brasileira, através de seus legítimos representantes neste plenário, para aspectos hoje trazidos ao debate - fatos e problemas que angustiam ou causam perplexidade em regiões distantes milhares de quilômetros, neste imenso País que ainda não se deu conta do imenso potencial adormecido em suas entranhas.

O que a Rodovia Transandina tem a ver com o desempregado do ABC paulista, o consumidor do Rio Grande do Sul ou os trabalhadores das cidades onde se planejam instalar indústrias automobilísticas?

Tem tudo a ver. Basta uma leitura atenta, responsável e conseqüente dos jornais e revistas deste final de semana para que isso fique claro e incontestável em sua veracidade.

Selecionei três matérias, das muitas que li sábado e domingo, para mostrar que o caminho da emancipação econômica e da valorização industrial do Brasil passa pelas estradas que estão sendo desenhadas sobre a Cordilheira dos Andes, nas proximidades da linha do Equador. Citarei apenas três informações, embora outras, se forem corretamente interpretadas, apontem para o mesmo objetivo.

A coluna Informe Econômico, do Jornal do Brasil, na edição de sábado, apresenta o levantamento efetuado pela respeitada instituição Boucinhas & Campos a propósito do fluxo de mercadorias entre o Brasil e os parceiros do Mercosul. Como seria de se esperar, o intercâmbio com a Argentina é o grande destaque dentro da incipiente comunidade continental: as operações de exportação para os portenhos chegam a 55%, enquanto as importações atingem 75%.

Há evidentes distorções na tabela, devido à manipulação de índices e ao caráter de legalidade, ou não, das transações. No que se refere ao intercâmbio com o Paraguai, por exemplo, a nação guarani recebe 10% de nossas exportações no Mercosul, mas as importações lá representam um reles traço estatístico. Ou seja, oficialmente, compramos zero do Paraguai, segundo levantamento dos auditores da Boucinhas & Campos. Isso pode indicar que as compras ali feitas por brasileiros são ilegais. Contrabando puro e simples!

Mas o que chama a atenção são os números relativos a Chile e Bolívia, parceiros da América Andina: com os chilenos ainda existe um pequeno movimento de exportações, 15% do total que mandamos para o Mercosul, mas as importações estão na casa de zero. Esse mesmo zero aparece nas operações bilaterais com a Bolívia, um movimento tão irrelevante que não consegue sair do traço estatístico.

Como o levantamento não fala em países de fora do Mercosul, como Peru e Colômbia, seria difícil fixar números sobre o intercâmbio com esses povos. Mas, certamente, não devem estar muito acima do traço verificado nas contas bolivianas.

Ainda na edição de sábado, o mesmo Jornal do Brasil estampa a equação que tanto aterroriza os lares brasileiros neste final de século: “Vendas em baixa mantêm desemprego”. Segundo a matéria, referente a levantamentos feitos em São Paulo, “os empresários do comércio não esperam reação das vendas que, junto com os juros altos, derrubaram o faturamento e o nível de emprego no mês passado”. E os números dão razão aos temores gerais quanto à gravidade do problema: “o desemprego no comércio, que atingiu 48 mil trabalhadores em março, não será revertido em abril”. Essa informação exige repetição com ênfase e senso de responsabilidade, pois dá a verdadeira medida da grande crise nacional em nossos dias: no mês de março foram fechados 48 mil postos de trabalho apenas em São Paulo e as perspectivas para abril são ainda mais desesperadoras.

Resta confiar no imponderável e na força do amor filial em maio, porque o Dia das Mães propicia a esperança de melhores resultados para comércio e indústria - esperança que talvez entre em choque com a certeza de que, em tempos de desemprego, o melhor presente desejado por qualquer mãe é ver o filho em condições de prover a educação e o alimento de seus netos.

A terceira reportagem que trago hoje ao debate neste plenário está na edição da revista Veja que começou a ser distribuída ontem à noite. Traz o título A porta gaúcha e fala da intensidade das operações comerciais entre Brasil e Argentina, com reflexos altamente positivos para os consumidores de Porto Alegre, a metrópole brasileira mais próxima daquele país. E diz: “nos supermercados gaúchos, R$3 em cada R$100 já são gastos em compras de artigos argentinos. Essa proporção é três vezes maior que nas demais regiões do País.”

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, vamos analisar, primeiramente, essa informação vinda de Porto Alegre, que atesta a importância da proximidade e da facilidade de transporte, para os produtos de um país terem ampla circulação nos outros. É tão óbvia, é tão acaciana essa conclusão, que nem sempre lhe conferimos a real significância: os gaúchos consomem três vezes mais produtos argentinos que os cariocas, paulistas, mineiros, etc. Afinal, basta atravessar uma ponte e rodar umas poucas centenas de quilômetros para que os produtores de lá cruzem as fronteiras e cheguem ao território brasileiro. A recíproca é verdadeira, embora estejamos em desvantagem de 75% contra 55% no intercâmbio bilateral com os platinos.

Conheço bem e acredito que todos os Srs. Senadores também conhecem as condições do mercado nos países situados do outro lado da Cordilheira: submissão total a fornecedores asiáticos e da Costa Oeste dos Estados Unidos, o que estabelece um interesse muito grande pela farta produção das indústrias brasileiras. Sim, porque para eles seria deveras interessante estreitar os laços econômicos com este vizinho gigantesco, laços que só tem dois obstáculos, de fácil superação: as altas montanhas e as pequenas diferenças entre seus idiomas, ambos de origem ibérica.

As matérias do Jornal do Brasil fazem o vínculo evidente entre desemprego e vendas em baixa, porque também é acaciana a constatação de que para produzir e abrir postos de trabalho o empresário tem de ter uma perspectiva concreta de colocar sua mercadoria no mercado. Abrir mercados, portanto, é a única solução completa, concreta e definitiva para o drama da sociedade brasileira, hoje gravemente contaminada pela ociosidade compulsória de seus profissionais e pela incapacidade de oferecer oportunidades aos jovens que buscam sua primeira ocupação.

Não se trata, como acredito ter ficado claro, de questão paroquial ou de defesa de interesses estritamente regionais. Viabilizar uma saída rodoviária perene e confiável para a costa do Pacífico, através do Peru ou até mesmo da Bolívia, é uma causa que diz respeito a todo o povo brasileiro, até mesmo àqueles sulistas que tanto desdenham dos problemas da Amazônia.

As alternativas para essa abertura ocidental são do conhecimento dos Srs. Senadores que participaram de importantes debates em torno do tema. A que me parece mais viável é através do Peru, nos termos de acordos bilaterais já assinados entre os dois países e reafirmados em diversas ocasiões por seus respectivos governos: a parte final do trecho brasileiro corta os Estados de Mato Grosso, Rondônia e Acre, pela BR-364, descendo, a partir de Rio Branco, pela BR-317, até Assis Brasil, última cidade antes da fronteira peruana. Dali, correndo entre as montanhas, já existe um caminho implantado até o litoral, oferecendo como alternativas os portos de Ilo ou Callao. Esse caminho - impõe-se a reafirmação esclarecedora - já está implantado, restando torná-lo tecnicamente viável para operações rotineiras e de tráfego pesado. E o Presidente Alberto Fujimori, em mais de uma oportunidade, tem-se prontificado a dar partida às obras que lhe cabem na empreitada conjunta.

O interesse do país vizinho tem raízes concretas e sólidas: é um mercado potencial de 25 milhões de pessoas, com significativas carências no tocante ao setor alimentício. Se V. Exªs me permitem a expressão popular, implantar essa estrada e abastecer o Peru com alimentos, escoando nossa própria produção, será o exemplo clássico de “juntar a fome com a vontade de comer”, no caso, “de vender”!

Mas os mercados peruano, boliviano, colombiano e equatoriano seriam apenas os alvos mais próximos e imediatos dessa redescoberta dos caminhos brasileiros - porque o grande objetivo continuará sendo a Ásia, onde centenas de milhões de pessoas, quase famintas, sonham com um abastecimento que, em nossos dias, só a região central do Brasil pode propiciar. É essencial mencionarmos, ainda, que teremos acesso à costa oeste norte-americana, grande entreposto comercial e viário do Oceano Pacífico, produtora de alimentos e compradora de mercadorias que o Brasil sempre poderá fornecer.

O fato é que precisamos nos libertar dos estrangulamentos do Canal do Panamá e das vicissitudes das passagens através do Estreito de Magalhães.

Acredito mesmo que a iniciativa privada teria o máximo empenho em implantar e explorar comercialmente essa rodovia, pois nela estarão investidas as mais agudas esperanças de ambos os povos, no contexto da busca da unidade continental: expansão das indústrias brasileiras e satisfação das necessidades básicas peruanas.

Tudo o que se pede, aliás, é justamente isso: que as autoridades abram a perspectiva de materialização, através da privatização, do antigo sonho das comunidades amazônicas e de todos quantos se interessam pelos destinos desta grande pátria e pelo papel reservado por Deus ao seu povo generoso e trabalhador.

É hora de ter coragem e abrir novos caminhos, porque as velhas alternativas de transporte e circulação de riquezas já se mostram insuficientes para atender às exigências dos tempos modernos e, pior ainda, seu congestionamento ameaça impedir a caminhada das futuras gerações - dos nossos filhos que já batem às portas das fábricas, dos escritórios e dos estabelecimentos comerciais em busca do primeiro emprego, em sua recém-adquirida condição de adultos. Essas portas estão se fechando. Muitas, desgraçadamente, estão fechadas de forma irremediável e definitiva!

Isso hoje nos causa preocupações. Mas, em futuro muito próximo, poderá gerar revoltas e reações desesperadas de gerações inteiras.

Concluo, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, lembrando que a questão exige uma atitude em que se combinem coragem e bom senso - que são as qualidades mínimas exigidas por um povo a seus representantes e seus governantes.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/04/1998 - Página 7060