Discurso no Senado Federal

CRITICAS AOS REFORMISTAS DA CONSTITUIÇÃO DE 1988. NECESSIDADE DE REFORMA URGENTE NO GOVERNO PARA DAR BASE A CONSTITUIÇÃO NACIONAL.

Autor
Josaphat Marinho (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: Josaphat Ramos Marinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • CRITICAS AOS REFORMISTAS DA CONSTITUIÇÃO DE 1988. NECESSIDADE DE REFORMA URGENTE NO GOVERNO PARA DAR BASE A CONSTITUIÇÃO NACIONAL.
Publicação
Publicação no DSF de 06/10/1998 - Página 13201
Assunto
Outros > REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • CRITICA, PROCESSO, ALTERAÇÃO, NORMAS, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, MOTIVO, ALEGAÇÕES, NECESSIDADE, MODERNIZAÇÃO, ECONOMIA, GARANTIA, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, RESULTADO, URGENCIA, EXECUTIVO, FORMA, COMBATE, CRISE, NATUREZA FINANCEIRA, AMBITO INTERNACIONAL, COMPROMETIMENTO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, BRASIL.
  • CRITICA, ALTERAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, APOIO, LEGISLATIVO, ADAPTAÇÃO, PROCESSO, GLOBALIZAÇÃO, ECONOMIA, RESULTADO, COMPROMETIMENTO, SOBERANIA NACIONAL.
  • CRITICA, PROCESSO, REFORMULAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, MOTIVO, EXTINÇÃO, NORMAS, GARANTIA, CONTENÇÃO, AUMENTO, PODER, CLASSE EMPRESARIAL, PREJUIZO, MAIORIA, POPULAÇÃO.
  • NECESSIDADE, REALIZAÇÃO, TRABALHO, CONSCIENTIZAÇÃO, POVO, BRASIL, DEFESA, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, FORMA, GARANTIA, PRESERVAÇÃO, ESTADO DEMOCRATICO, CONTENÇÃO, AMBITO, PODER, CLASSE EMPRESARIAL, PAIS.

O SR. JOSAPHAT MARINHO (PFL-BA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a data de hoje assinala a promulgação, há dez anos, da Constituição de 1988. Elaborada por uma Assembléia Constituinte legitimamente eleita pelo povo, expressou os sentimentos do País naquele momento. Era, sobretudo, um produto da reação do povo brasileiro ao regime militar e aos seus abusos. Por isso mesmo a Constituição se traduziu num texto democrático e progressista: encerrou todos os direitos que a civilização moderna confere ao povo e aos cidadãos, e armou o Estado das normas e dos instrumentos indispensáveis a fazer do poder um instrumento disciplinado de ação a serviço da comunidade. Moderna e transparente, podia encerrar - e ainda pode - lapsos, equívocos. Todas as Constituições do mundo os encerram. Sendo assim, cumpria era prestigiá-la, executando-a, dando-lhe autoridade.

Infelizmente, durante todo esse largo período, houve mais preocupação de reformá-la do que de cumpri-la. Começaram a delinear defeitos na Constituição e a apresentá-la como superada. Imaginavam os corifeus das mudanças que seria enfraquecendo a Constituição, e conseqüentemente o Estado, que promoveriam a felicidade do povo brasileiro. Acusaram a Constituição de envelhecida. Na verdade, os reformadores é que a envelheceram, dela extraindo dispositivos e instrumentos que assegurariam ao Estado a intervenção devida no domínio social e econômico para conter os abusos da riqueza e do poder privado.

Além da revisão, as reformas sobrevieram e ainda estão em curso. Desde princípio, foi reformado o capítulo da ordem econômica da Constituição. Extraíram-se as normas protetoras do capital nacional e da empresa genuinamente brasileira. Suprimiram-se normas que garantiam a presença do Estado nos conflitos sociais. Extinguiram-se ou limitaram-se monopólios criados para que o Estado exercitasse sua influência como elemento de equilíbrio ou de compensação no jogo dos interesses econômicos. Tudo foi feito - dizia-se - para facilitar a ação do Estado, para eliminar formalismos, para propiciar ao Governo a ação de modernização do Estado.

Outras reformas sobrevieram, como a Reforma Administrativa. Quase a concluir-se está a Reforma da Previdência. E ainda pouco antes da eleição, o Presidente da República declarou que outras reformas seriam necessárias.

Vale dizer: essa Constituição, que o povo recebeu com tanta confiança, serve para eleger, mas não tem servido para governar nem legislar. Temos sido cúmplices do Poder Executivo na mudança indevida da Constituição. Fomos, os que nos opúnhamos a essas mudanças, chamados de atrasados, de retrógrados. Estaríamos contra a modernidade, por meio da qual o poder realizaria a felicidade coletiva.

Suprimiram-se normas, enfraqueceu-se o Estado, tudo, repita-se, em nome do desenvolvimento, a que se opunham, segundo os portadores das mudanças, os que não acompanharam as transformações sociais e econômicas.

Por mais que ponderássemos, tanto aqui e fora do Parlamento, que o progresso social e econômico não poderia ser feito senão mediante a valorização do homem, dos seus direitos e de seus deveres, por mais que se mostrasse que a queda dos regimes comunistas no Leste Europeu não determinou a mudança das constituições naquele continente, por mais que se salientasse o exemplo do universo dentro do qual nenhum regime se prestigia se não for suficientemente forte para conter o poder dos ricos em favor dos pobres, por mais que tudo isso se argüísse, o Governo insistiu nas reformas. Quase todas que pediu lhe foram dadas. Se a reforma tributária não está votada é porque o próprio Governo aquiesceu em paralisá-la na Câmara dos Deputados, pois não havia obtido o consenso entre a União, os Estados e os Municípios. Mas tudo quanto fora necessário para mudar a ordem econômica estava votado nas emendas inicialmente votadas no Congresso. Certo é que, e desgraçadamente, Sr. Presidente, mutilou-se a Constituição, mas não se adotaram as medidas necessárias ao resguardo da tranqüilidade do povo brasileiro do ponto de vista social e econômico.

Conseqüência de tudo é que, aos primeiros abalos das bolsas no mercado internacional, o Poder ruiu no Brasil. Esta é a verdade: o Poder ruiu e perdeu as condições de ser o órgão de comando das soluções necessárias.

A esta hora, já estamos batendo à porta dos organismos internacionais de socorro ou de empréstimo. Que fizeram das mudanças na Constituição? Por que não se utilizaram das normas que pleitearam, das diretrizes que estabeleceram para proteger a sociedade brasileira contra os elementos externos?

Alegaram, então, que a globalização era a forma nova de se entenderem os povos, limitando a soberania, que muitos passaram a considerar um fato ultrapassado. Tanto admitiram a globalização sem limites que o próprio Poder Executivo, depois, reconheceu que era preciso opor-lhe embargos, para preservar as singularidades do País, os seus interesses, os seus direitos, os direitos da Nação. Mas, apesar de tudo isto, a idéia corrente é de que as reformas devam prosseguir.

O Congresso foi envolvido na onda reformadora. Esta Casa, infelizmente, das emendas constitucionais propostas pelo atual Governo, não interferiu a sua autoridade senão na emenda da Previdência, porque havia sido votada, pela Câmara dos Deputados, em forma contrária aos propósitos do Governo.

Todas as demais emendas por aqui passaram sem que o Senado exercitasse a sua soberania, o seu poder, a sua função de Órgão também reformador. Em nome da pressa, da necessidade de pôr em vigor as emendas, elas foram aqui votadas sem que o Senado efetivamente interviesse nas deliberações legislativas. Fomos Órgão de registro da opinião da Câmara dos Deputados. Diga-se melhor: o Senado foi reduzido à condição de Órgão sancionador da vontade do Poder Executivo.

Ao final dessas mudanças, a crise se abate sobre o País. Aguardam-se outras medidas que, seguramente, atingirão as condições de vida da população.

O caso, portanto, é de perguntar-se: que fizeram das reformas? Que destino lhes deram? Que vantagens delas extraíram para o Estado brasileiro e para a sociedade brasileira?

Não é mais hora de pedir a solidariedade de todos para as providências que se tornarem necessárias. Temos que ser solidários com a Nação, solidários com o povo. À medida que as proposições forem para servir ao povo e à Nação, aí deveremos dar a nossa solidariedade; mas não podemos dar solidariedade ao Governo contra os interesses do Estado e da sociedade. Esta é a hora de verificar que já erramos bastante e não podemos perseverar no erro decidindo e legislando contra os interesses coletivos.

Esta, portanto, é também a hora de defender a Constituição malferida, pedir a atenção do povo para o fato de que ela representou a resistência democrática contra o poder arbitrário e não pode agora ser transformada em instrumento de interesses momentâneos em prejuízo de sua autoridade. A hora é de invocarmos a Constituição para bem cumpri-la, para fazê-la respeitada, e não para que continuemos a aceitar todas as emendas, as que se fazem sem destino certo, como comprovadamente as que até aqui se adotaram.

É hora de o povo brasileiro atentar em que as suas garantias não estão no poder transitório, residem na Constituição como documento fundamental de resguardo de seu destino.

É isso, Sr. Presidente, que desejava assinalar nesta tarde, lamentando que muitos dos que são responsáveis pelo cumprimento da Constituição somente saibam argüir contra ela e pedir a sua reforma.

É hora de reformar o próprio Governo para dar estabilidade às instituições, com base na Constituição.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/10/1998 - Página 13201